
Escreve
António Afonso
Para compreender melhor esta crónica, devemos situar-nos, em termos de tempo, nos anos 50 do século passado, num lugar remoto no Nordeste Algarvio, a rádio não era extensiva a todos, a televisão não tinha chegado e os outros meios de comunicação, alguns não tinham nascido.
Ao final da tarde, ao regressarmos da escola, tínhamos de realizar tarefas que nos tinham sido confiadas previamente, como sejam: ir ao poço buscar água, alimentar os animais, preparar a lenha para alimentar a lareira durante a noite, etc. Conjugávamos então parcerias com os amigos e tudo se resolvia, airosamente, desta forma de ajuda mútua.

Os trabalhos eram feitos em ardósia (pedra preta, com um caixilho de madeira de cantos arredondados), escrevíamos com giz, ou na falta dele, fabricávamos nós os próprios lápis com taliscas do Barranco da Corte (Xisto foliáceo), só posteriormente passávamos tudo a limpo para o caderno.
Devo acrescentar, que esta pedra, que vos falo, não é mais que um antepassado do célebre computador Magalhães. Ainda hoje, quando as crianças me pergunta a idade eu respondo dizendo-lhe que sou da idade da pedra. – Então o tio é "muita" velho!

O primo Afonso era, sem sombra de dúvida, um exímio contador de histórias, umas vividas outras imaginadas, reproduzidas com tanta graça e realismo que nos atraía como as tivéssemos a viver in loco; havia sido guarda republicano a cavalo nas planícies do Alentejo e aí acumulado muitas vivências; homem corpulento com voz grossa que brotava dos confins da alma, que nos encantava simplesmente!
Que Saudades desses tempos de criança!