Mais um texto escrito pelo nosso saudoso Amigo há trinta e sete anos!
Mais uma vez a sua visão, conhecimento da região e cultura estão patentes e se olharmos para o presente vamos encontrar ainda que naturalmente em formas diversificadas os coutos cinegéticos, as pousadas ou o aproveitamento do rio.
Mais uma vez patente o que costumo afirmar:- Luís Cunha fazia a diferença em Alcoutim.
JV
(PUBLICADO NO JORNAL DO ALGARVE DE 10 DE MARÇO DE 1973)
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Escreve
Luís Cunha
Modernas tendências para a diversificação e as especializações, caracterizam a juventude amante do “sol-nado”, que, à certeza do descanso que a calma noite garante, prefere a dos riscos do dia cheio de perigosa inovação.
Estes sentimentos subtraíram à capital outras honras de exclusivos, como o de o Algarve, hoje e muito justamente, embandeirar em capital turística do País.

Berrado do Guadiana, de Alcoutim, cá aparece, ressuscitado, o velho pregão: quem quer figos, quem quer merendar?! E que figos são esses que agora a terra montanheira se propõe ofertar à capital do turismo? O que se oferece, para adoçar a boca, que na capital e zona balnear não exista? O que é isto que nos vem dos serros, gritado da rua?
O turista – sabe-se – saturado de um ano inteiro de vida rotineira, refastela-se por uns dias ao sol ardente dos argênteos areais da praia, mas a natural monotonia desse ambiente cedo deixa de ser a novidade que procurava, o diferente, a carne em sangue para melhor dizer. A mais concludente prova disto, temo-la em que a excelência sem igual dos espaçosos areais, a amenidade da temperatura das águas e clima do Sotavento, não conseguem, por falta de complementos, deixá-lo competir com o Barlavento. E ai de nós se para subtrair o turista ao bocejo do enfado ensaiamos oferecer-lhe a estafa física da caça e dos desportos náuticos, esse complemento diferente, essa “carne fresca” que a região serrana põe, como figos maduros, como merendinha, à disposição do infatigável Nenrode, caçador de emoções.
Em cada curva perenemente verde, o rio maravilhoso parece abruptamente acabar, mas, de súbito, nova e majestosa paisagem se oferece e o peito e respiração se oprimem ante a iminência de esmagamento de encontro aos contrafortes das curvas, que logo se dilatam em inefável gozo, no desfrute da novidade.



As águas do Guadiana, segundo o abalizado parecer de ictiólogos cujo nome não nos ocorre, são as melhores para a procriação do barbo, que chega a atingir mais de 12 quilos. Em qualquer dos inúmeros barrancos e grandes ribeiras do concelho seria fácil construir pequenas represas para sua criação, de molde a proporcionar abundância de pesca desportiva.
Muitos outros motivos há, na região alcoutinense, para ofertar ao turismo de movimento, aquele que espalha dinheiro e difunde cultura, mas as condições climáticas – ar extremamente seco e salutar – bem como o calmo sossego que nas zonas menos expostas, poderia conservar-se, seriam aliciante convite a esse outro turista que procura ou necessita de repouso.

Pergunta-se, então: neste Sotavento sem outra variante para o turismo balnear, não será antiturismo o deixar apodrecer nas árvores os figos maduros, estas merendinhas a oferecer-se a quem quiser colhê-los?