quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Um conto de reis versus cinco euros

Pequena Nota:

Esta rubrica do blogue tem tido pouca adesão apesar das nossas diligências nesse sentido.

Pretendíamos apresentar maneiras de escrever diferentes e de versões observadas pelos prismas que cada um utiliza.

Além do que aqui escrevemos, temos tido o cuidado de convidar este ou aquele amigo mas a verdade é que a nossa missão não tem sido fácil por motivos que não vou explicar ou tentar fazê-lo.

Como dissemos na APRESENTAÇÃO deste blogue, a grande percentagem de texto e ilustrações teriam a ver com Alcoutim e o seu concelho, admitindo esporadicamente como já tem acontecido, textos que nada tenham com este binómio.

Uma das excepções por nós utilizada tem a ver com as FIGURAS que não são exclusivas de Alcoutim e que abrimos ao Baixo Guadiana.

Este nosso Amigo, que pelo menos já visitou Alcoutim por três vezes, à nossa solicitação ficou meio embaraçado visto não lhe ser fácil escrever sobre Alcoutim, apesar do traquejo que tem de escrita em variadíssimos jornais diários e regionais.

Fique à vontade, disse-lhe, que não sendo possível escrever sobre Alcoutim, que escrevesse o que quisesse.

Aqui apresento o texto que teve a amabilidade de nos enviar e que marca sem qualquer dúvida a sua maneira de escrever em funções daquilo que “vê”.

Agradecendo-lhe, fazemos votos para que nos possa brindar com outros textos.


Escreve

Fernando Lino


Numa terra bué-re-re de longe havia um reino, o reino de Cacatim. Este topónimo derivava do nome do rei Cacatim, que tal como em Marco de Canavezes dava a sua graça quer ao castelo, quer à rua principal do povoado e ainda ao campo de torneios medievos, que se enchia com os súbditos de todo o reino, uma vez por ano, sempre na segunda sexta-feira de Setembro.

Cacatim era um reino deprimido, onde poucos eram os rebentos humanos que nasciam e muitos aqueles que abandonavam estas terras ou deixavam este mundo na esperança de outro melhor. Não havia indústria artesanato ou comércio, que pudesse fazer evoluir uma urbe tão ao género dos contos de Charles Dickens, em que uma corte hegemónica, tudo secava à sua volta qual eucalipto australiano. Mas ai de quem criticasse este estado de coisas, as perseguições seriam acto contínuo.

Todos se vergavam perante D. Cacatim com receio de represálias e de que os empregos junto da coroa, quase a única oferta que havia, se fechassem aos familiares daquele que ousasse afrontar D. Cacatim. Até um velho republicano de fama que ultrapassava o reino de Catatim, se tinha rendido aos encantos de sua majestade. Apenas um cronista, de seu nome Fernão Serrano, insistia em se rebelar contra esta pasmaceira em que se tinha transformado este território sob os hospícios de el-rei D. Cacatim. O pobre do cronista até foi alvo da ira de D. Cacatim, na forma de um edital régio, que o zurzia e acusava de ser o comandante da ala traidora anti-Cacatim.

O rei em nome do progresso do reino, nada fazia, mas era prol na distribuição de almoçaradas e unguentos pelos súbditos. Entre as suas ideias mais populares pontuavam a de oferecer um tratamento para a sarna a todos aqueles que daquela maleita sofressem ou ainda a de criar uma praia de águas paradas para todos aqueles que tivessem uma pele sem patologias. E assim alcançou fama nos reinos contíguos sendo-lhe dado o cognome de D. Cacatim, “O Penso Rápido”, pois os seus projectos eram um misto de imediatismo, mediatismo e vacuidade.

Um dia chegou ao reino, um reputado dramaturgo italiano de seu nome Nanni Moretti, juntamente com o seu grupo de teatro. Trazia com ele uma peça para apresentar no dia de festas do reino, a tal segunda sexta-feira de Setembro.

O palco foi montado no rossio e toda a população se entusiasmou com esta iniciativa inaudita no reino. Chegado o dia, a praça estava repleta e a história era sobre um tirano que com papas e bolos enganava os tolos. Mas por fim, a grei tomava consciência de um princípio universal, justo e revolucionário: o de que a soberania reside no povo. Após esta tomada de consciência, a plebe revoltava-se e corria com o tirano. O nome desta peça que tanto fez pensar toda a assistência e também a D. Cacatim, que da varanda do seu palácio a escutava, era “O Caimão”.

O rei após a representação teatral, mandou de imediato correr com o dramaturgo, o grupo de teatro e os seus pertences e ainda ordenou que dali em diante nunca mais se abrissem as portas aos saltimbancos, pois eles poderiam trazer novas ideias perniciosas ao reinado de D. Cacatim.

Mas o povo ficou a pensar…
Moral da história: Há cataratas tão ilusórias, que deixam o homem cego.