sábado, 29 de agosto de 2009

D. Miguel Luís de Meneses, o Conde que foi Duque



D. Miguel Luís de Meneses, filho do D. Manuel de Meneses, 4º Conde de Alcoutim e de sua mulher, D. Maria da Silva que foi Dama da Rainha D. Catarina.

Teria nascido cerca de 1565.

Como primeiros títulos, usufruiu os de Conde de Alcoutim (5º) e de Valença (6º) que competiam aos herdeiros da Casa de Vila Real.

Já usava o título em 1580.

Foi 8º Conde e 6º Marquês de Vila Real. Governou Ceuta por muitos anos com acerto e felicidade.

Casou a primeira vez em 1604 com D. Isabel de Lencastre, filha do Duque de Bragança D. Teodósio I e da Duquesa D. Brites de Lencastre, a qual morreu sem geração em 21 de Abril de 1626.

Por carta de 14 de Dezembro de 1620, Filipe III de Portugal (IV de Espanha) concedeu-lhe o título de 1.º Duque de Caminha.

Casou segunda vez com sua sobrinha D. Maria Brites de Meneses, filha de seu irmão, D. Luís de Noronha e Meneses, que lhe veio a suceder no título e de sua mulher D. Juliana de Meneses, de quem também não teve descendência.

Esta D. Maria Brites quando viúva, passou a segundas núpcias com D. Pedro Portocarrero, conde de Medelin.

O 5º Conde de Alcoutim teve, porém, uma filha natural da castelhana D. Maria Xuar, em Ceuta, à qual deixou os bens livres e tentou deixar a sua casa.

Chamou-se D. Antónia de Meneses, criou-se no Mosteiro de Almoster (Santarém) e seu pai casou-a com D. Carlos de Noronha que foi Presidente da Mesa da Consciência e Ordens e que pretendeu suceder na Casa de Vila Real.

D. Miguel Luís de Meneses possuía vastíssimas terras e tinha honras de parente e tratamento de sobrinho de el-rei.

Para a expedição organizada em 1624, a fim de restabelecer o domínio Português na cidade de Baía, no Brasil, que tinha sido tomada pelos holandeses, contribuiu com 16.500 cruzados.

Faleceu a 10 de Agosto de 1637 e não tendo descendência directa, sucedeu-lhe o seu irmão e sogro, como já se disse, D. Luís de Noronha e Meneses, indo para seu sobrinho e cunhado, o título de Duque de Caminha.

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Brasões da Sala de Sintra, Anselmo Braamcamp Freire, Imprensa-Nacional Casa da Moeda

Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira

Dicionário Ilustrado da História de Portugal, Edições Alfa, 1982

Nobreza de Portugal e do Brasil, Edições Zairol, Lda., Lisboa, 2000.

História Genealógica da Casa Real Portuguesa, António Caetano de Sousa, Edição QuidNovi/Público – Academia Portuguesa da História (fac-similada da de 1946)

Wikipédia, a enciclopédia livre.


Pequena nota

Com esta nota biográfica do 5º Conde de Alcoutim, terminámos o roteiro que nos tínhamos proposto efectuar – apresentar notas biográficas sobre os seis Condes de Alcoutim.

Sem respeitarmos a cronologia, iniciámos o trabalho no Jornal do Baixo Guadiana com D. Pedro, o 2º e depois com D. Manuel, o 4º, possivelmente os que tiveram maior nome. Os quatro restantes já tiveram lugar neste ALCOUTIM LIVRE e possivelmente tiveram mais leitores do que se fossem publicados na imprensa regional algarvia que demonstra não estar muito virada para a escrita deste tipo.

Quando cheguei a Alcoutim há quarenta e tal anos, nunca ninguém me falou nos Condes, assunto praticamente desconhecido da população local.

Eu também desconhecia o título nobiliário e tive conhecimento dele através de um simples Anuário Comercial que o então correspondente me emprestou. A partir daí iniciei as minhas “pesquisas orais” e encontrei duas ou três pessoas que tinham conhecimento da sua existência.
A nível de leitura recorria à Biblioteca Municipal de Faro quando me era possível e foi lá que comecei por consultar alguns dos trabalhos base sobre o Algarve, comportando naturalmente Alcoutim.

A sala estava quase sempre deserta.

Não esqueço que o responsável na altura pela Biblioteca, pessoa muito reservada e que eu já conhecia de nome, devia ter notado que eu com alguma frequência ali me deslocava. Não lhe teria passado despercebido o meu interesse por Alcoutim e então a única “ajuda” que me prestou foi chegar junto de mim e perguntar-me se havia alguns arquivos capazes de consultar em Alcoutim! Podia ter dito, mesmo pensando que não o iria praticar:- Se precisar de alguma coisa, diga, que eu ajudarei se puder.

Em contrapartida direi que a senhora que me atendia e que não teria qualquer formação na área, foi sempre extremamente simpática e procurou-me sempre, apesar das suas limitações, ajudar-me o que algumas vezes aconteceu. Não podia deixar de escrever isto. Os nomes, é o que menos interessa.

Isto passou-se há mais de 35 anos mas ainda hoje é fácil encontrar.

Há cinco anos e numa área geográfica completamente diferente solicitei audiência ao senhor Director da Biblioteca que desceu as escadas do seu gabinete e veio ter comigo perguntando-me o que é que eu desejava.

Disse-lhe que andava completando um trabalho e gostaria de o enriquecer, por isso pedia-lhe que como director da biblioteca me desse algumas pistas para eventuais pesquisas.

Ele, que já me conhecia de nome, através da minha colaboração em jornais, disse-me que quem conhecia do assunto era eu e que aguardava a publicação do meu trabalho para a biblioteca dispor dele.

Isto revela a sua incompetência profissional e a verdade é que quando o poder político mudou, foi imediatamente substituído.

Acrescentarei que ofereci a algumas bibliotecas esse meu trabalho, mas àquela, não.

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Barrada, povoação dinâmica à beira da estrada



Pertence à freguesia de Martim Longo, ficando-lhe próximo, a cerca de 3 km de distância e muito perto da EN 124, do seu lado esquerdo, que atravessando a Serra do Caldeirão, no sentido norte/sul nos leva ao Barranco do Velho, de onde se podem tomar várias direcções.

Por esse facto, é dos poucos “montes” do concelho que ainda possui um pequeno estabelecimento comercial, beneficiando do movimento da estrada e onde se pode tomar uma bebida fresca ou quente, conforme a época do ano, além de um pequeno restaurante recentemente criado.

O topónimo, que consta do Novo Dicionário Corográfico de Portugal (1), é muito frequente no país, tal como o seu plural. No primeiro caso são conhecidas nove e no segundo, três.

Barrada significa terra de semear em encostas, fora das vargens, segundo José Pedro Machado e que já se atesta no país em 1258. (2) Ainda que conheçamos pouco da zona, pensamos que o topónimo se ajusta plenamente.


A agricultura, principal actividade destas gentes, andou sempre ligada à pastorícia e temos conhecimento que no século XVIII, António Dias, deste “monte”, faz na Câmara o manifesto dos seus gados, constituído por bovinos, caprinos e ovinos. (3)

Em Maio de 1844 pairou sobre esta região uma horrível trovoada que devastou as searas. (4)

Fazia parte da Junta de Paróquia de Martim Longo, em 1858, José Rodrigues residente neste “monte”.

Abordaremos agora o aspecto populacional pois é sempre importante analisá-lo.

No censo de 1911 tem 128 habitantes e ocupa a 5ª posição a nível de freguesia. Em 1940 o número passa para 176 e sobe ao 2º lugar, só ultrapassado por Santa Justa.
Vinte anos depois mantém o lugar passando a população a ser de 190 habitantes. A partir daqui começa o decréscimo em todo o concelho e dez anos depois, ou seja, em 1970, o número era de 146 e tinha sido ultrapassado pelo Pessegueiro.

Em 1981 viviam no monte 121 pessoas e dez anos depois, segundo os últimos dados, oficiais que possuímos, eram 114.

Presentemente, conforme indicação que pedimos e recebemos, rondará a meia centena.

Como se verifica por estes dados, esta povoação foi sempre das mais importantes da freguesia.




Não possuímos indicações quanto à criação do posto escolar que teria existido e depois transformado em escola que presumo ter encerrado em 1989. (5) Em 2000 o edifício é adaptado e inaugurado um núcleo museológico denominado “Espelho de Nós”que a informação diz pretender traduzir as origens daquela povoação, com a ligação da comunidade à Serra do Caldeirão. (6)

Não o conhecemos nem tencionamos conhecê-lo e o seu acesso está condicionado.

Como por todo o concelho, mais ou menos acentuadamente, tomando em consideração vários factores de interesse, também neste monte existiam fornos comunitários para cozer o pão, existindo regras ancestrais para a sua utilização, de forma a que todos pudessem usufruir dos mesmos. (7)

De referir igualmente, nas proximidades da povoação, uma eira situada na encosta de uma pequena elevação.

Após o 25 de Abril este monte tomou a fama de ser a povoação mais “esquerdista”, pelo menos da sua freguesia. Efectivamente não se tratava de esquerda ou direita, mas sim aproveitar as oportunidades para vencerem as grandes dificuldades da vida.

É nesta altura criada uma Cooperativa Agro-Pecuária que em 1987 comprava bens intermédios, alugava máquinas (2 tractores, 1 debulhadora, 1 moinho de martelos); produzia farinha e azeite que vendia. Possuía armazéns para a secção de compra e venda de produtos (8) para cuja construção a Cooperativa foi apoiada pela Direcção Regional de Agricultura do Algarve, (9)

Em 1985 foi criada uma queijaria através do programa Leader. (10)

Fracassou a tentativa de turismo rural levada a efeito em 1995.


Existe uma associação designada por Centro Cultural e Recreativo da Barrada onde os associados se juntam para conversar, tomar uma bebida ou disputar uma partida de “sueca” ou de “três setes”.

Em frente da sede social o espaço disponível foi ajardinado. (11)


Construiu-se ultimamente uma casa mortuária.

Após um interregno, realizou-se recentemente a Festa Anual.

É dos poucos montes do concelho que possui saneamento básico, acabado de efectuar.


NOTAS
(1)– A.C. Amaral Frazão, Editorial Domingos Barreira, Porto, 1981
(2)- Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, Horizonte/Confluência, 1º Vol., 1993, pág.220.
(3)– Manifeztoz e Arolam toz da Camera doz gadoz, pág. 59
(4)– Acta da Sessão da Câmara Municipal de Alcoutim de 3.11.1844.
(5)– Jornal do Algarve de 29 de Março de 1990.
(6)– Jornal O Postal de 15 de Junho de 2000.
(7)– “Potencialidades turísticas do nordeste algarvio – I”, Susana Faísca, in Jornal do Algarve de 24 de Abril de 1985.
(8)– Caracterização da Produção Animal do Baixo Guadiana, Engs. C. Alves da Costa e A. Costa Cardoso, 1987.
(9)– Jornal do Algarve de 14 de Fevereiro de 1985.
(10)– Jornal da Serra de Novembro de 1995
(11)– Alcoutim, Revista Municipal, nº 6 de Janeiro de 1999, pág. 9

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Colaborador do Alcoutim Livre candidato à Presidência da Câmara de Peniche


Depois da apresentação das candidaturas da CDU, PS e PSD à Câmara de Peniche, apareceu outra que não era esperada, a do BE composta por independentes e três filiados no Partido e que concorre à Câmara e à Assembleia Municipal.

O cabeça de lista à Câmara é Fernando Lino, penicheiro, de 49 anos.

Foi militante do PS e representou-o várias vezes na Assembleia Municipal onde se bateu pelos seus pontos de vista.
Em 2002, encabeçou a lista de candidatos por Leiria do Movimento Partido da Terra (MPT) às eleições legislativas.
É a primeira vez que o Bloco de Esquerda concorre em Peniche onde nas últimas eleições para o Parlamento Europeu alcançou um votação significativa.

Que obtenha ao que se propôs, são os nossos votos.

Um "Milagre" desconhecido dos alcoutenejos


[Igreja Matriz de S. Salvador. Óleo de JV, 1970]

Quem mexe nestes assuntos sabe que uma das bases de informação para o que aparece escrito sobre o passado das “pequenas terras de Portugal” tem por base aquilo a que se convencionou chamar MEMÓRIAS PAROQUIAIS.

Sebastião José de Carvalho e Melo, que veio a ser Marquês de Pombal, por aviso de 18 de Janeiro de 1758, faz remeter a todos as paróquias um interrogatório onde se solicitam informações de carácter geográfico, demográfico, histórico, etc. e os estragos eventualmente causados pelo terramoto de 1 de Novembro de 1755.

Esta importante informação juntamente com outras do mesmo tipo vieram constituir 44 Volumes e cujas datas extremas são 1722-1832.

Na posse de cópias,no que se refere a Alcoutim, vamos tentando ler o mais correctamente possível o documento, o que temos vindo a realizar sem dificuldades de maior.

Temos de ter em conta que é documentação com mais de dois séculos e meio, com casos de tinta repassada, deterioração de vários tipos, os termos e grafia apresentados, sendo esta última muito variada de pessoa para pessoa, tudo isto provoca entraves a uma melhor leitura.

O Pároco da Freguesia de O Salvador do Mundo, ao responder ao quesito 7, refere algo que desconhecíamos completamente, pois nunca o encontrámos referido em qualquer trabalho e por outro lado não existe tradição local daquilo que expõe e tentaremos descrever.

Ao descrever o templo diz que do lado da Epístola estão três altares, o SS Nome de Jesus, seguindo-se-lhe o do Senhor Jesus dos Milagres, de recente levantamento (1750) e nele se venera um devotíssimo Senhor Crucificado, Imagem milagrosa e de muitos prodígios, seguindo-se um terceiro altar com capela abobadada e onde se encontra a venerável Imagem da Doutora Santa Catarina, protectora das Almas. “Esta capela é privilegiada todos os dias e se reforma o seu privilégio de quinze em quinze anos.”

Diz o pároco e confirma-se que toda a parte da Epístola está defronte da vila de Sam Lucar de Castela e do seu castelo. E continua o sacerdote: é digno de memória que no tempo das guerras, governando em Sam Lucar do Guadiana um hereje ou pouco católico, a artilharia começou a atirar a esta igreja (...) destruindo os telhados da Igreja e paredes, abrindo com as balas muitos buracos nas mesmas, havendo resposta de parte a parte.

E agora vai o “milagre”:- As balas que batiam na parede da Capela das Almas não a penetravam, deixavam o sinal onde tinham batido mas acabavam por cair no chão, não fazendo outro qualquer efeito

Para terminar, afirma o pároco:- Estes testemunhos infalíveis do prodígio, ainda hoje se podem ver!

Não sabemos a que guerras se refere o informador, para as da Restauração da Independência, acho-as muito distantes (c. de 90 anos), talvez queira referir as da Sucessão de Espanha (1704/1713) que aqui se fizeram sentir.

Aqui fica esta referência histórico/lendária que as Memórias Paroquiais nos deixaram.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Anunciar é sempre útil!



A Câmara Escura de hoje, podia ter vários títulos, tal a riqueza de elementos que apresenta. Podíamos realçar os verdejantes e alinhados “pinheiros de jardim”, escolher as rosas “chá”ou optarmos pelas malvas-rosas de colorido variado.

Outro aspecto a poder salientar seria o contraste nos tipos de construção com a utilização prática da lusalite ou folha zincada e isto pondo de parte o veículo protegido das intempéries ou a frondosa árvore com sombra acolhedora, pois até estávamos no mês de Agosto de 1992, já lá vão por isso sete anos.

O quadro estava disposto à beira da estrada e o “anúncio” chamava a atenção para os passantes, da existência de tal serviço, já que para as pessoas do monte penso não seria necessário.

Optámos pelo ineditismo do anúncio por tais paragens.

Julgo que o quadro desapareceu em parte, mas ficou a fotografia.

domingo, 23 de agosto de 2009

Zeca - O tempo de criança

Poema Livre de
José Temudo



[Vista parcial de Alcoutim na década de 30 do século passado]

A CRIANÇA ZECA

Vem, Zeca
vem comigo.

Não me estranhes,
nada receies de mim.

Sou teu amigo,
sê-lo-ei até ao fim!

O coração que em ti pulsa
é o mesmo que pulsa em mim.

Porque tu és o meu
primeiro eu.

Talvez o melhor,
o mais livre,
o mais natural,
o mais sincero,
o menos convencional!

O que só nadava na margem do rio,
o que não gostava da escuridão,
o que não ia ao monte sozinho,
o que temia a solidão.

O que gostava do amigo como de um irmão,
o que na luta não pontapeava o vencido!

O que viu, seduzido,
o amigo almoçar pão e toucinho cozido!

O que viu, em silêncio, amedrontado,
corpos a boiar no rio.

O que passava pelo cemitério a correr,
sentindo na espinha um calafrio.

O que nas árvores ou no chão,
entre estevas, alecrim e rosmaninhos,
como se fosse um ladrão,
roubava ovos dos ninhos!

O que viu, sem compreender,
uma revolução a acontecer.

O que ouviu o silêncio que precede a morte,
dos que, em dia de má sorte,
vão ser pela manhã fuzilados.

O que viu e ouviu, espantado,
o relinchar do cavalo reprodutor,
cheio de entusiasmo, fremente,
montar a fêmea, aberta ao cio, obediente.

O que viu, admirado, atónito, aflito,
o nascimento de um burrito!

O que surpreendeu, sem deixar de olhar,
um homem e uma mulher a (é melhor calar...)

O que não perguntou aos Pais,
curioso, ingénuo, inocente,
Ele já sabia por demais,
Donde vinham os meninos/

O que não gostava da escola,
o que esquecia os livros na sacola.

O que gostava de jogar
à bilharda, ao berlinde, ao pião,
o que gostava de ganhar,
de ser sempre o campeão.

O que sofria quando a Mãe chorava,
o que, feliz, sorria, quando ela o abraçava.

O que ouvia falar de Deus,
de anjos, de arcanjos e de santos,
de crentes e de ateus.

O que tudo isso esqueceu,
o que ficou como nasceu!

O que saiu chorando
da terra que o viu crescer
e viver brincando,
sem saber,
sequer imaginar,
que jamais iria voltar,
àquele tempo, àquele lugar!


Vila do Conde, 31 de Dezembro de 2008.
J.T.


[Grupo de alunas com a Prof. D. Arminda. José Temudo, que não andava na escola, é o terceiro (está sentado) a contar do lado esquerdo e as duas meninas à sua esquerda são suas irmãs. Anos 30]


Pequena nota
De certa maneira já apresentei aos meus visitantes/leitores este colaborador do ALCOUTIM LIVRE que domina as vertentes poesia e prosa de uma maneira muito própria.

Neste poema o autor, colocando a memória ao seu serviço, após sete décadas passadas, rebuscando palavras simples mas muito ajustadas, dá-nos uma verdadeira panorâmica das vivências alcoutenejas observadas e retidas por uma criança inteligente e observadora.

Quem sabe o que era Alcoutim na década de trinta do século passado, encontrará aqui pontos proeminentes.

E mais uma vez o poeta termina demonstrando um grande carinho
pela terra que o viu crescer e viver brincando, sem saber, sequer imaginar, que jamais iria voltar, àquele tempo, àquele lugar!
JV

sábado, 22 de agosto de 2009

A Catredal do Algarve e o seu Cabido - Sé de Faro



Valioso trabalho do falecido investigador algarvio, José António Pinheiro e Rosa, que nos deixou desenvolvida bibliografia, em dois volumes, de 16X24 e que no seu conjunto comportam 422 páginas.

É ilustrado com gravuras a cores e a preto e branco. Apresenta igualmente uma planta desdobrável da Sé de Faro.

Neste exaustivo trabalho que devia constar pelo menos de todas as bibliotecas do Algarve, o que eu não estou convencido que aconteça, encontramos variadíssima informação, incluindo quadros de desempenho.

Ainda que não possua índice toponímico, localizámos referências a Alcoutim e a Martim Longo e a algumas figuras religiosas que passaram por este concelho.

Assim, a pág. 176 do I Vol. refere Diogo de Figueiredo Mascarenhas (1676-1696) como Arcediago de Lagos da Sé de Faro.

No II Vol., pág. 13, Joaquim José Cavaco (1840-1848) como cónego reitor e que foi pároco da Matriz de S. Salvador, sendo conhecido pelas suas ideias liberais, a pág. 17, o cónego prebendado, Dr. António Luiz de Macedo e Brito, da família dos Condes da Ravelada (Vaqueiros), a pág. 35, ao celeiro de Martinlongo, a pág. 179 às contas do celeiro de Martinlongo de 1826 e 1827.

Nas pág. 214 e 215 encontramos indicações sobre os celeiros de Martinlongo, Alcoutim, “Contos” de Vaqueiros, e Miuças de Martim Longo.

Mais outras certamente se encontrarão.

Constituindo uma Separata dos “Anais do Município de Faro – nº XII para o I Volume (1983), o II diz respeito `a Separata – nº XIII (1984) e foram compostos e impresso na Tipografia União – Faro.

Faltará dizer que o trabalho, há muito esgotado, foi-me oferecido por um leitor em 2007.

Atendendo a que não foi possível executar informaticamente uma cópia da capa, apresentamos a lombada (a carneira) e parte da capa e contracapa.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Colcha de "carapulo"



A urdidura desta colcha era feita primitivamente em linho vindo depois a ser substituída por linha.

O branco representado na teia contrasta com outra cor, normalmente o azul anil ou preto e isto proveniente de lã tingida nessas cores. Os desenhos geométricos a que dão origem vão-se repetindo harmoniosamente.

Sendo primitivamente o azul obtido através de uma planta criada nas ribeiras, o anil,
passou-se depois a adquirir umas pedrinhas vendidas nas casas da especialidade. À água aquecida com urina, juntavam-se-lhe as pedrinhas e só depois a lã que lá devia permanecer de 8 a 10 dias. A cor assim preparada não desbotava.

O “carapulo” é uma técnica em que se repuxa o fio de maneira a formar figuras, na maior parte das vezes geométricas e onde as estrelas são muito frequentes.

Estas colchas, conhecidas por colchas de aparelho, serviam para utilizar nos animais como enfeite em dias festivos, casamentos, baptizados, festas pagãs ou religiosas e isto no que diz respeito às azuis.

As pretas tinham um sentido mais sóbrio e usavam-nas quem andasse de luto e em determinadas circunstâncias.

A representada na fotografia estava a ser utilizada como embelezamento da janela no dia da procissão de Nª Sª da Conceição, 8 de Dezembro, na vila de Alcoutim.

Eram tecidas em teares rudimentares.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Miguel Ferrera

Pequena nota
Há quatro ou cinco dias a notícia chegou-me por mensagem no telemóvel. Procurei junto do informador mais elementos que afinal não possuía. Devia ter falecido há poucos dias.

Fiz outro contacto telefónico. Do outro lado confirmam-me a morte mas não sabem dizer quando, talvez fins de Julho.

Voltei a contactar outro amigo. Sabe dizer-me quando faleceu o D. Miguel de Sanlúcar? Não tenho conhecimento de nada. Perguntou no café se alguém sabia alguma coisa (local, Vila de Alcoutim). Enquanto uns diziam que ainda era vivo houve alguém que disse que tinha morrido ia para seis, sete meses.

Com tantas dúvidas, não podia avançar com qualquer notícia.

Nova tentativa de esclarecimento. Agora através de” e-mail” para o país vizinho. O afastamento por uns dias só possibilitou hoje a informação mais segura.

Como era possível D. Miguel Ferreira ter falecido em Fevereiro e em Alcoutim ser facto desconhecido! Confesso que me custou a acreditar.

E agora, a informação para mim mais chocante, que dou por intermédio de uma amiga que me disse que a família lhe informou e estava naturalmente bastante chocada com isso, que não tinha ido nenhum português, que tivessem tomado conhecimento, a acompanhá-lo à ultima morada!

Não foi o povo (sabe-se o que é o povo a que pertenço) e os seus eleitos que o representam, não dispunham de barco para os transportar! Onde está a apregoada (quando convém) fraternidade com os sanluquenhos?

Tudo isto me custa a acreditar.

JV



Morreu o D. Miguel em Fevereiro e só agora o consigo confirmar.
Não era um alcoutenejo mas era como se fosse.
Nasceu em Sanlúcar do Guadiana em 1920 onde sempre viveu explorando o comércio tradicional que desde os princípios do século passado a família possuía, primeiro o avô, depois o pai que faleceu quando ele tinha 20 anos e se encontrava às voltas com a guerra civil no interior do país.

No seu comércio misto, típico das pequenas terras, de tudo vendia.
Os portugueses eram bons clientes principalmente de conhaques (Pedro Domec e Terry), vidros (duralex), chocolates, louça de esmalte, caramelos e ferramentas de corte, nomeadamente machadas enxadas e tesouras de podar.

Nessa altura o escudo valia o dobro da peseta!

Em contrapartida os espanhóis vinham buscar a Alcoutim outras coisas como o café, tabaco (20-20-20), oiro, cordas, etc.

D.(Sr.) Miguel, como era tratado pelos portugueses, tinha com todos um excelente relacionamento, era uma pessoa muito prestável e bastante considerada.

Também eu mantive com ele um bom relacionamento e agradeceu-me imenso a oferta que tive o gosto de lhe fazer do meu primeiro trabalho em livro, Alcoutim, capital do nordeste algarvio (subsídios para uma monografia), de que veio a adquirir vários exemplares para oferecer a familiares e amigos, o que muito me honrou.

Com ele falava em tudo excepto sobre a Guerra Civil.

Exerceu as funções de Alcaide na sua terra natal.

Deste espaço envio as minhas sentidas condolências à família e em especial aos seus filhos, Angélica e Miguel Ângelo, podendo terem a certeza que se estivesse em Alcoutim e soubesse do acontecido nunca teria deixado de os acompanhar nesse momento tão difícil.

Não me importava de ser o único português.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

P. José Pedro Rodrigues Teixeira

Nasceu na freguesia de Giões em 16 de Outubro de 1802, sendo filho de Pedro Rodrigues e de Ana Teixeira.

A numerosa Família Teixeira que se mantinha ainda muito activa no séc. XIX no concelho de Alcoutim, os seus membros desempenharam os lugares mais importantes no aspecto político, militar, administrativo, eclesiástico, comercial e agrícola, tendo muitos dos seus elementos ligados a outras famílias com poder semelhante, mantendo-se assim por muitas décadas no poder local.

Depois como é habitual devido à evolução da vida foram a pouco e pouco abandonando o concelho. Enquanto os que por aqui nasceram foram mantendo alguma ligação com a terra que os viu nascer, os outros naturalmente afastaram-se por completo vendendo os haveres que por cá possuíam.

José Pedro seguiu a carreira eclesiástica tal como o padrinho de baptismo, o Padre José Rodrigues Teixeira, liberal por pensamento político e que aqui já apresentámos a nota biográfica que nos foi possível, estamos convencidos que seria seu familiar, talvez tio.

Pensamos que seria o mais velho de nove irmãos e que foram:- Dionísio (1806-1883) que já aqui referimos, Maria Dionísia (?) Pedro José (1810-1890) que foi secretário da Câmara durante mais de 40 anos, Francisco Pedro (?) António Pedro (1816-1857) que exerceu funções na Alfândega, José Rodrigues Teixeira (?) Joaquim Pedro (1818-1905) que foi professor e Ana Dionísia. (1)

São estes os que indica no seu testamento efectuado em Martim Longo a 8 de Dezembro de 1868, sendo na altura já falecidos


Exerceu a sua actividade na freguesia de Martim Longo desde 1834 até à data do seu falecimento ocorrido em 22 de Maio de 1869, por isso durante trinta e cinco anos, segundo o que consta no seu memorial funerário, mandado levantar pelos irmãos e existente no cemitério de Martim Longo. (1)

Em 1838 era designado por Reverendo Padre Encomendado tendo anteriormente por ventura sido coadjutor.

Sabemos que por decreto de 28 de Janeiro de 1841 e por Mercê de D. Maria II, que se encontra no liv.16, fl. 106v. e 107 (Torre do Tombo) foi nomeado Pároco da Igreja de Nª Sª da Conceição do lugar de Martim Longo.

O seu homólogo de Alcoutim era cunhado do seu irmão Pedro José Rodrigues Teixeira que por sua vez veio a ter um filho que seguiu a mesma carreira e veio a substituir o tio materno que tinha o mesmo nome.

Segundo a relação dos 40 maiores contribuintes do concelho, em 1855, o Padre José Pedro Rodrigues Teixeira ocupava o 4º lugar.

À sobrinha Maria Dionísia deixou-lhe o direito de descobridor da mina das Cortes Pereiras e a parte que tem na das Ferrarias ou da Cova dos Mouros.

Tanto as duas irmãs como esta sobrinha, possivelmente filha da que tem o mesmo nome, estiveram muitos anos em sua casa sofrendo as impertinências do seu génio, segundo afirma.

NOTA
(1) – Foi trasladado do primitivo cemitério, terreno hoje ocupado pelo Centro de Dia de Martim Longo. Aproveito a oportunidade para chamar a atenção de quem de direito para a mutilação, que nos parece recente, do monumento funerário do P. José Pedro Rodrigues Teixeira. O pedestal deve ser reposto na sua dignidade e é único no cemitério da freguesia de Martim Longo.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

D. Miguel de Meneses, o único Conde de Alcoutim que não foi a Ceuta!


[A Capela de Sto. António e a Casa dos Condes. Óleo de JV de Junho de 1972]

D. Miguel de Meneses, 3º Conde de Alcoutim era filho dos segundos condes, D. Pedro de Meneses e D. Brites de Lara.

O título foi-lhe confirmado por carta régia de 1 de Julho de 1543, por isso, após o falecimento do pai.

Deve ter nascido entre 1525 e 1528.

Foi 4º Marquês de Vila Real, alcaide-mor de Leiria e 4º Conde de Valença.

Em 1555 pagou o dote, que prometera, pelo casamento de sua irmã, D. Bárbara de Lara, com o 2º Conde de Castanheira, D. António de Ataíde.

Casou em princípios de 1557 com D. Filipa de Lencastre, filha do Comendador-Mor da Ordem de Cristo, D. Afonso de Lencastre.

Ainda que tivesse sido o 6º Capitão de Ceuta, ao contrário dos seus antecessores nunca lá foi, sendo a mesma governada por representantes em seu nome.

Por carta régia de 12 de Julho de 1557, foi-lhe confirmada a qualidade de juro e herdade no título, com a cláusula de que os seus sucessores logo que herdassem a Casa, se chamassem marqueses de Vila Real.

Foi um proprietário riquíssimo, mantendo a Casa, que aumentava de geração em geração.

Em 1557 assistiu ao último conselho de fidalgos e vereadores da Câmara de Lisboa, que após a morte de D. João III, deu à rainha viúva D. Catarina a regência do Reino e a tutoria de D. Sebastião.

Não deixou descendência, mas em 1563 alcançou carta para lhe poder suceder na Casa, seu irmão, D. Manuel de Meneses, como veio a acontecer.

Morreu vítima de coice de um cavalo em Março de 1564.

____________________________

Brasões da Sala de Sintra, Anselmo Braamcamp Freire (3 Vol.) Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1996.

Nobreza de Portugal e do Brasil, Edições Zairol, Lda, Lisboa, 2000

História Genealógica da Casa Real Portuguesa, António Caetano de Sousa, Edição QuidNovi/Público – Academia Portuguesa da História, (Vol II e V).

Dicionário Ilustrado da História de Portugal - Edições Alfa, 1982

Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira

domingo, 16 de agosto de 2009

Os parreiros


[A caminho da Lourinhã]

Há uns anos atrás li numa acta da Sessão da Câmara de 17 de Março de 1877 que entre uns tantos requerimentos apareciam estes que além do nome da pessoa apresentavam uma designação a todos comum.

José Corvo, Parreiro da Lourinhã
José Luiz, Parreiro do Vinagre
António Felipe, Parreiro do Pontal (1)

Estes requerimentos solicitavam uma indemnização motivada pelos estragos provocados pela Grande Cheia do Guadiana que tinha devastado as margens do rio.
A Câmara, conhecendo a razão dos requerentes, a todos informou positivamente.

Neste pequeno apontamento não está em causa a formalização do pedido e dos resultados que daí vieram, mas sim saber o que seria um parreiro.

Dicionário para a esquerda, enciclopédias para a direita e o termo nunca apareceu. Certamente que se tratava de um regionalismo.

Era natural relacionar o termo com “parra de videira”mas não dava para ir mais além.

Foi um tio por afinidade e natural de Alcoutim que acabou por me explicar o que era um parreiro pois nos seus tempos a actividade existia sendo exercida nas margens do rio.

O parreiro era um homem que se comprometia a guardar os bens agrícolas que existiam nas margens do rio e numa determinada zona que pudesse vigiar. Contratava verbalmente com os proprietários das várzeas uma espécie de “maquia” a receber por esse trabalho e que era calculada em função da área, do número de árvores e das culturas praticadas.

Não admira que fosse escolhida a designação de parreiro já que em tempos passados as margens estavam cobertas de vinha e seria esta talvez a primeira preocupação. Depois devia de se ter estendido a outras culturas.

Reparar que as zonas das suas intervenções, neste caso, aparecem bem definas: Lourinhã a Norte de Alcoutim e Vinagre e Pontal a Sul.

Se as margens do rio foram devastadas com as enxurradas, não eram apenas os proprietários os prejudicados, os parreiros perderam igualmente a sua “maquia”.

Há muitos anos que esta actividade deixou de existir pelo abandono agrícola das várzeas do rio pelo que o termo se foi esboroando com o decorrer dos anos.

Não consta do Dicionário do falar Algarvio, de Eduardo Brazão Gonçalves.

Aqui fica esta pequena explicação para quem desconheça o termo.

NOTA

(1) - Em 1867 era parreiro no Pontal, Filipe José que consta como testemunha num assento de casamento. Possivelmente será ascendente do  indicado.

sábado, 15 de agosto de 2009

Centro Cultural, Social e Recreativo de Afonso Vicente - Alcoutim





Foi criado em 13 de Abril de 1981.
São considerados sócios fundadores, o Doutor António do Nascimento Joaquim, Virgílio Joaquim Afonso e Manuel Joaquim Mestre Gomes.
A legalização da associação foi publicada na III Série do Diário da República de 8 de Maio de 1981.

O edifício sede foi adquirido por 12 contos.

Tinha uma porta de ferro e uma janela de madeira como a foto mostra.
Um “pial” (poial) para acesso constituído por resto de mó que pertenceu ao moinho da Pateira.

Entretanto foi colocada por cima da porta uma placa identificativa da mesma e que foi obtida por diligências do sócio fundador, Virgílio Joaquim Afonso.

Pagava-se de quota, na altura, 20$00 mensais e a jóia estava fixada em 500$00.

Existiam duas divisões, uma sala ladrilhada com televisor e outra mais pequena que funcionava como cozinha/bar, havendo fogão a gás e frigorífico.

Já havia energia eléctrica.

Presidia à direcção Avelino Pereira, sendo secretário José Joaquim Mestre e tesoureiro Manuel Joaquim dos Santos.



Em princípios dos anos 90, a sede social sofreu obras importantes mantendo-se a estrutura inicial com o arranjo do telhado, chão e paredes, o acrescento de uma pequena divisão que servia de arrecadação, e de suporte ao bar que passou para a sala e agora com balcão de alvenaria e coberto a mármore. Já existe uma máquina de café.

Importante a feitura de uma casa de banho, com o mínimo de requisitos e que se tornava indispensável, além de um pátio / esplanada onde se podia estar protegido pela sombra de duas parreiras.

Em 1995, realiza-se o 1º Convívio-Festa de Afonso Vicente apoiado pela Câmara Municipal e Junta de Freguesia, cujos lucros se destinavam a este Centro.

No ano seguinte teve lugar o 2º CONVÍVIO e porque criticámos não ter sido apresentado um balancete do resultado da Festa do 1º, assumimos a responsabilidade de o fazer neste com o controlo mais eficiente possível. Apresentámos um saldo de Esc. 165.921$00.

O CONVÍVIO/FESTA continuou nos dois anos seguintes e se a memória não me falha, só voltou a ser feito mais um, após o intervalo de um ou dois anos.



Em 2005 a associação efectuou uma candidatura ao programa Leader+ para obras de remodelação e ampliação do edifício sede o que resultou no edifício que a fotografia apresenta.

O edifício ficou concluído em 2008, apresentando dois pisos.

Ainda que não o conheça muito bem, posso dizer que no rés-do-chão além de uma sala espaçosa com mesas e cadeiras, o bar tem uma cozinha de apoio e uma arrecadação.

Uma televisão e um fogão a lenha. Um jogo de futebol de mesa, propriedade da associação.

Duas casas de banho.

O primeiro andar é constituído por amplo salão.

Esta obra foi comparticipada em 75% pelo Programa Leader + (117.891,09 €) e 25% pela Câmara Municipal (29.473,13 €) o que soma mais de 30 mil contos em dinheiro antigo, para uma mais fácil avaliação.

Na nossa modesta opinião, a volumetria do edifício encontra-se completamente desfasada do ambiente que a rodeia.

A título de curiosidade, podemos dizer que em números redondos, o primeiro edifício serviu cerca de 60 habitantes, o segundo 30 e o actual 15.

Estas novas instalações são hoje inauguradas pelo Senhor Presidente da Câmara, às 10 e 30 h.

Pelas 11 00 h. terá lugar um beberete.

Pelas 16.00 h realizar-se-á uma Assembleia-Geral de cuja ordem de trabalhos faz parte a eleição dos corpos gerentes.

Música popular e baile completam os festejos.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Castelhanos, um "monte" com nome especial


[Monte dos Castelhanos, vista geral. Foto JV, 2009]

Neste roteiro que há décadas temos vindo a efectuar pelos montes do concelho, leva-nos hoje a este monte da freguesia de Martim Longo que pela sua amplitude e tenacidade de suas gentes teve sempre um papel importante na freguesia.

Situa-se a 4 km da aldeia de Martim Longo a que está ligado por estrada asfaltada, sem grandes desníveis, correndo a caminho da Ribeira do Vascão, limite por este lado com o concelho de Mértola, havendo por isso a transição do Algarve para o Alentejo.

Em 1992, quando foram tiradas estas notas, o planalto onde se situa ainda era utilizado para a cerealicultura e num ou noutro sítio mais alto apareciam algumas amendoeiras. Na altura, os terrenos encontravam-se quase todos limpos de mato.

A pavimentação da estrada teve lugar em 1991, tal como os arruamentos do monte. (1)

O piso desta estrada foi substancialmente melhorado em 2000. (2)

O Centro Recreativo situava-se no lado esquerdo da estrada no sentido Martim Longo – Ribeira do Vascão. Era o local de convívio dos seus moradores e em 1988, na missão que lhe cabe, a Câmara Municipal mandou instalar uma máquina de café. (3)

É possível que uma herdade então existente e propriedade dos Condes de Alcoutim, designada por Carrascal ou Castelhanos, património que já vem do Senhor e Alcaide de Alcoutim, João Freire de Andrade, tivesse dado origem à povoação.

Sem meios de comunicação para explorar a herdade teria que haver fixação de gentes, hipoteticamente começada pelo responsável da mesma (a que se veio a chamar feitor) e mais criadagem, não esquecendo os escravos de que há registos no concelho de Alcoutim.

Ficou o nome de Castelhanos como poderia ter ficado Carrascal, de origem vegetal e de que há exemplos, além de Portugal, na Galiza e no Brasil.

Com o confisco dos bens do 6º Conde de Alcoutim, degolado no Rossio em Lisboa em 1641, por conjura contra D. João IV, os bens passaram à Casa do Infantado, criada a favor dos segundos filhos do rei. Mais tarde, com as lutas liberais, personificadas por D. Pedro e D. Miguel, o liberalismo vencedor acabou por alienar todo esse património de que ficaram leves resquícios a nível nacional como por exemplo o Palácio de Queluz.

Neste caso o foro foi remido em 1859 por 224.640 réis a favor de António Pereira. (4)

Em 1848 tem-se conhecimento que vivia neste monte um Manuel Pereira que exercia o lugar de vogal efectivo do Conselho Municipal e que um ano antes era o Juiz Eleito da freguesia. (5)

Recuando no tempo há notícias (Séc. XVII) de um lavrador local, de nome Afonso Guerreiro, que foi capitão de ordenanças e Juiz do geral, de Alcoutim.


[Castelhanos. Vista parcial com placa toponímica. Foto JV, 2009]
A nível de topónimo, a minha habitual fonte de consulta (6) indica-me além desta outra povoação na freguesia e concelho de Castro Marim, havendo outras no singular feminino e no plural, tendo todas uma origem semelhante ainda que os motivos sejam ou possam ser diferentes e não fáceis de determinar. Quase todas se situam a sul do Tejo e próximas ou não muito distantes da fronteira.

Como se sabe castelhano é o natural de Castela e o designativo já andava pelo menos no século XV ligado aos nomes próprios (antropónimos).(7)

O intercâmbio fronteiriço na zona de Alcoutim existiu sempre e pelos mais variados motivos, nomeadamente de trabalho, de contrabando e políticos.

Os castelhanos é que teriam dado origem ao topónimo, o que se desconhece é a razão que o motivou.

Não esquecer que por vezes a permanência prolongada num país ou numa região dá origem à aglutinação desses nomes sendo por demais conhecido que os portugueses depois de muitos anos no Brasil, onde angariaram alguns meios de fortuna, ao regressarem às suas terras de origem começaram a ser conhecidos por “Brasileiros”.

Eu conheci na freguesia de Alcoutim um indivíduo que por ter estado em Espanha alguns anos e ao regressar à sua terra natal ficou sendo conhecido por Joaquim Espanhol o que nunca foi. Transmitiu ao filho, nascido nas Cortes Pereiras, esse epíteto.

O que se teria passado em relação ao nome do monte de Castelhanos? Não sabemos, demos só algumas pistas.

Ainda que as Memórias Paroquiais (1758) indiquem o Monte dos Castelhanos como fazendo parte da freguesia de Martim Longo, não indica a sua população.

Em 1839 Silva Lopes (8) indica como tendo 29 fogos, número na altura só suplantado na freguesia por Santa Justa e Pessegueiro.

O censo de 1911 indica 103 habitantes, passando para 155 em 1940. Vinte anos depois perde 30, passando por isso a contar com 125. Muito mais pronunciada é a descida na década seguinte pois desce para 77. Entre esta data e 1991, ainda que continue a verificar-se uma descida, existe uma maior estabilidade. Em 1981 são 68 os habitantes e em 1991 passam a ser 62, sendo apesar disso dos mais populosos da freguesia. A partir daqui não tenho elementos mas atendendo ao que se passa em todo o concelho o decréscimo populacional teria continuado.

A Associação de Caçadores de Castelhanos e Laborato tem a seu cargo uma zona de caça associativa e foi contemplada em 1995 com um subsídio de 500 contos conferido pela Câmara Municipal. (9)


[Ponte sobre a Ribeira do Vascão. Foto JV, 2009]

O caminho entre esta povoação e o Laborato, que lhe fica próximo, foi arranjado em 1995, tal como o rústico que nos leva à Ribeira do Vascão. (10)

A pavimentação dos seus arruamentos estava concluída em 1991 (11) e o fornecimento de água ao domicílio foi realizado dez anos depois. (12)

A construção de uma ponte sobre a Ribeira do Vascão, que liga os concelho de Alcoutim e de Mértola, tendo como povoações mais próximas Castelhanos (Alcoutim) e Penedos (Mértola) começou a ser equacionada em 1992 (13) e o início dos trabalhos está previsto para 1995/96.

Em 1997 os trabalhos já estão em curso indo a estrutura ter 60 metros de comprimento e 8,5 de largura. (14). Com as grandes chuvadas de Novembro desse ano, o leito da ribeira chegou a uma altura de 7 metros e a enxurrada destruiu a estrutura que estava pronta a receber o betão. (15)

Em Dezembro de 1999 a ponte já está aberta ao público segundo noticia a imprensa regional (16), existindo, contudo, na ponte, por baixo do brasão do município de Alcoutim, a data de 1998.

Vestígios arqueológicos nos “Palheirinhos do Cavalo” onde a tradição diz ter existido uma grande pedra com a pata de um cavalo, daí o micro topónimo.

Numa pequena elevação situada próximo da estrada, foram encontradas telhas decoradas e vários fragmentos, incluindo de ânforas, possivelmente do período tardo-romano.

Sabe-se também que no sítio da “Casa da Canela” foi registada em 1883 uma mina de cobre e outros minérios. (17)

Foi até agora o que conseguimos reunir sobre esta povoação, da freguesia de Martim Longo, concelho de Alcoutim.

NOTAS:
(1) – Boletim Municipal, nº 8, de Abril de 1991.
(2) – Alcoutim, Revista Municipal, nº 3, Março de 2000, pág.13.
(3) - Boletim Municipal, nº 3, de Setembro de 1988.
(4) – Livro de Registo de Rendas dos Prédios e Juros de Capitais Pertencentes à Fazenda Nacional no concelho de Alcoutim – termo de abertura de 13 de Março de 1867. in Arquivo da então Repartição de Finanças de Alcoutim.
(5) – Acta da Sessão da C.M. de Alcoutim de 9 de Dezembro de 1847.
(6) – Novo Dicionário Corográfico de Portugal, A.C.Amaral Frazão, Editorial Barreira, Porto, 1981.
(7) – Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, José Pedro Machado, Horizonte/Confluência, 1993, I vol. Pág.370.
(8) - Corografia ou Memória Económica, Estatística e Topográfica do Reino do Algarve, Algarve em Foco, Editora, 1988.
(9) – Alcoutim, Revista Municipal, nº 2 de Dezembro de 1995, pág. 21
(10) – Alcoutim, Revista Municipal nº 1, de Maio/Junho de 1995, pág. 24.
(11) – Boletim Municipal nº 9 de Dezembro de 1991, pág. 2
(12) – Alcoutim, Revista Municipal nº 8, de Setembro de 2001, pág.2.
(13) – Boletim Municipal nº 10 de Abril de 1992, pág. 7
(14) “Mértola com nova ponte”, Correio da Manhã de 5 de Maio de 1997.
(15) – Jornal do Algarve de 6 de Novembro de 1997.
(16) – Postal do Algarve de 16 de Dezembro de 1999.
(17) – “O Algarve Oriental durante a ocupação islâmica”, Helena Catarino, in Revista do Arquivo Histórico Municipal de Loulé, nº 6, 1997/98, I Vol., pág. 201 e 287.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Suas Exas os Senhores Presidente de Junta de Freguesia


A Câmara Escura de hoje vem no seguimento de outras que aqui temos publicado.

A foto, da minha autoria, foi tirada em Alcoutim, como quem conhece depreende, em Agosto de 1967. Já se passaram 42 anos!

Os jovens estão sentados no muro do cais e foram nesse ano os grandes impulsionadores das FESTAS DE ALCOUTIM, iniciando todo o trabalho sem um centavo!

Outros tempos, outras gentes!

A chuva era a grande preocupação.

Se não chovesse, daria sempre para as despesas, se ela viesse era uma carga de trabalhos!

Ainda era o tempo em que se pedia trigo pelos montes e onde uma circular enviada aos alcoutenenses originava a aquisição de uns tostões para as primeiras despesas, nomeadamente correio e telefone.

Estes “moços” de então já revelavam capacidade empreendedora em sentido comunitário.

Quem diria que 40 anos depois seriam presidentes de Junta eleitos democraticamente!

Nem eles!

Quem se lembra?

Eles que nos desculpem esta lembrança.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

As chocolateiras


Chocolateira, como todos compreendem, é um substantivo derivado de chocolate que significa vasilha em que se prepara ou serve aquela bebida.

No Sul do país, mais concretamente no Algarve, essa designação estendeu-se aos recipientes de metal de forma bojuda, com uma pega ou aos de barro de formato semelhante e com uma asa.

Nas de metal, nunca vi nenhuma com bico, enquanto nas de barro aparecem ora com, ora sem ele.

Estes utensílios destinam-se principalmente ao aquecimento de água para as mais variadas utilizações, incluindo a feitura de café e chás.

Às de barro, vidradas por dentro e que também eram muito vulgares na região da minha origem, chamavam-lhes cafeteiras; o café aqui substituiu o chocolate.

Chocolateira porque possivelmente o chocolate teria tido pela proximidade do norte de África, um maior consumo e o formato da vasilha igualmente terá a ver com a influência do continente africano.

As fotos apresentadas provam bem o uso destes exemplares.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

3º Convívio - Festa, 2009. Tacões, Alcoutim


Acompanhado de amável convite chegou-nos via e-mail o programa referente ao corrente ano e que tem lugar no próximo dia 15, comportando acontecimentos diversificados desde cerimónias religiosas às desportivas mas onde a confraternização é uma palavra-chave.

Tendo sido dos montes mais populosos da freguesia do Pereiro a que pertence, os seus habitantes viviam fundamentalmente da pastorícia.

Manteve durante alguns anos um posto escolar, depois transformado em Escola, edifício hoje adaptado a casa mortuária.

Presentemente encontra-se quase numa situação de desertificação mas que os seus filhos, embora longe, não querem que seja um facto.

São fundamentalmente eles que se esforçam por esta realização e se juntam no monte para confraternizar com conterrâneos e amigos.

Conheci o monte dos Tacões em 1975, foi lá que minha mulher iniciou a sua vida profissional e o meu filho efectuou o primeiro ano de escolaridade.

Já tive oportunidade de num jornal regional publicar um artigo sobre este monte, que igualmente refiro no meu último trabalho em livro, intitulado A Freguesia do Pereiro (do concelho de Alcoutim) «do passado ao presente», numa edição da Junta de Freguesia do Pereiro, 2007.

Atendendo a que não prevejo estar em Alcoutim nesse dia, não me é possível aceitar o convite para estar presente.

Daqui torno pública a minha gratidão pelo convite, a que os meus familiares se associam.

Que a pequena Festa-Convívio decorra como desejam e se vá repetindo pelos anos fora.


[O "monte" dos Tacões visto da EN 124. Foto JV, 2009]

domingo, 9 de agosto de 2009

Alcoutim em 277º lugar entre os 278 concelhos do continente!


Quando hoje (dia 6) de manhã abri o meu e-mail tinha várias entradas com valores diferenciados.

Alguém, conhecendo bem as minhas motivações, teve a amabilidade de me enviar um trabalho científico elaborado na Universidade da Beira Interior pelo Observatório para o Desenvolvimento Económico e Social.

O estudo permite aferir o nível de desenvolvimento económico e social ou de bem-estar de cada um dos 278 concelho do continente.

Um estudo é sempre um estudo e sabe-se que as metodologias podem ser diferentes e apresentar outros resultados, mas é este o conhecido.

Qualquer outro que apareça e se dele tiver conhecimento não o deixarei de referir aqui.

Como não podia deixar de ser são abrangidas diferentes áreas tais como equipamentos de comunicação, culturais, de saúde, educativos (...) eu sei lá, um sem número de parâmetros por onde já dei uma vista de olhos e que qualquer interessado no assunto pode fazer.

Não sou ninguém para me pronunciar sobre o trabalho que naturalmente me chamou a atenção quanto aos resultados obtidos.

Vamos ver o que se passou nos quatro concelhos que constituem o Baixo Guadiana, esperando que no próximo número do Jornal do Baixo Guadiana eles venham a ser convenientemente tratados por quem estiver habilitado a fazê-lo.


23 – VILA REAL DE STO. ANTÓNIO

61 – CASTRO MARIM

262 – MÉRTOLA

277 – ALCOUTIM

Estes resultados foram obtidos em 2009 com dados de 2006.

Postos em confronto com os de 2007, com dados de 2004, verificaram-se as seguintes alterações:

VILA REAL DE STO. ANTÓNIO desceu 6 lugares

CASTRO MARIM subiu 32,

MÉRTOLA desceu 7 e

ALCOUTIM desceu 8. Só podia ter descido mais um.

Chama naturalmente a atenção a subida espectacular de Castro Marim onde possivelmente se estará a sentir a orientação política tomada. Aqui deixo as minhas felicitações ao executivo municipal.

Isto são dados reais tratados tecnicamente.

Não se trata de dizer que as coisas estão a mudar para melhor, já lá vão uns anos, quando os estudos científicos dizem precisamente o contrário, estão a piorar.

Pior do que isto só em 1965 quando a Vila de Alcoutim foi a última sede de concelho a receber o saneamento básico!

Isto não tira valor às VIRTUDES que Alcoutim tem, mas para mim, a VERDADE ACIMA DE TUDO.

Estejam atentos porque os jornais regionais e as televisões vão fazer, como é hábito, eco destas situações, para chamar a atenção de leitores e ouvintes.

sábado, 8 de agosto de 2009

Há um século a grande cheia do Guadiana provocou tragédia em Alcoutim

(PUBLICADO NO JORNAL DO ALGARVE DE 3 DE DEZEMBRO DE 1976)

Um centenário é tradicional e habitualmente uma data a assinalar, tanto no que se refere a acontecimentos que nos apraz registar, como a outros que, pelo seu significado, nos obrigam a meditar.

Estamos habituados, assim, a comemorar centenários do mais variado jaez, desde a descoberta científica humanitária, passado pela data de nascimento de figura célebre, até ao fim de uma calamidade local, regional ou mundial

A velha, pequena e histórica vila de Alcoutim, pagou caro, há um século, aquilo que outrora lhe deu vida e importância, fazendo-a ombrear com as principais vilas algarvias de então: a sua posição na margem direita do Guadiana (Ana Flumen dos romanos e a que os árabes chamaram Uádi Ana), no preciso lugar onde a navegação à vela, condicionada pelo regime fluvial e dos ventos, fazia ponto (paragem forçada de seis horas aguardando o virar da maré).

A razão principal da sua existência e da importância e que desempenhou, fez passar, há um século, aquela a quem os árabes chamaram Alcatiã, por dias de verdadeira preocupação e angústia. É a esse acontecimento que nos vamos referir, baseado em documentos vários e na tradição oral.

Na época invernosa, os rios engrossam os caudais e muitas vezes transbordam, inundando os terrenos marginais. Nas regiões planas, chuvadas e degelos originam inundações que atingem grandes superfícies. Quando correm junto a terrenos montanhosos, possuem leito mais profundo e consequentemente suportam maiores volumes de água; contudo ainda que com menor frequência, também saltam para os terrenos marginais, fertilizando-os mas causando pânico e prejuízos.

Alcoutim, na margem direita do caudaloso Guadiana, que por aqui corre entre cerros, servindo de linha divisória dos dois países ibéricos, definitivamente acordada em 1297, no Tratado de Alcanises, e na confluência da ribeira de Cadavais, sempre sofreu o efeito das cheias, recentemente insignificantes e mais espaçadas, para o que tem contribuído a construção de barragens no país vizinho.

[O Guadiana. Óleo de J.V., 1988]
De todas, uma alcançou nível bastante elevado, a tal ponto que a sua altura ficou gravada em duas placas de mármore: uma na fachada principal da Igreja da Misericórdia e que tem a inscrição: A esta altura chegou a enchente do Guadiana no dia 7 de Dezembro de 1876. E a outra no edifício que serviu de cadeia, conhecido por Cadeia Velha e que diz: C. M. A. – 1876. Placas da mesma natureza encontrámos na vila de Mértola e em Vila Real de Santo António.

Ficou esta enchente conhecida entre a população por Cheia Grande.

É com frequência que os visitantes, principalmente estrangeiros, prendem o seu olhar nesses marcos indicativos de tão grande e nefasto acontecimento, admirando e chegando mesmo a pôr em dúvida a veracidade do facto.

Se ficou gravado na pedra, muito mais ficou na memória por quem passou por dias tão preocupantes.

Transmitiram-no aos filhos, em noites frias de Inverno, junto das lareiras local aproveitado então para dissertações de carácter educativo e prática de vida, pondo em relevo os maus e bons momentos e reacções consequentes. Alguns desses dados estarão deturpados pelo decorrer dos anos e pela fragilidade da memória de quem já ronda as oito décadas.

O “Portugal Antigo e Moderno”, refere-se ao facto, da seguinte maneira: O Guadiana subiu a uma altura de que não há memória. Em Espanha destruiu as pontes de Mérida e de Badajoz, datando a primeira do tempo dos romanos; em Mértola entrou no andar nobre dos Paços do Concelho a uma prodigiosa altura e, até ao mar, causou grandes prejuízos, nomeadamente no Pomarão, onde arrasou todo o povoado que ali tinha feito a empresa da Mina de S. Domingos.
No “Diária da Manhã” de 17 de Dezembro daquele ano, lê-se o seguinte: Foi medonha a cheia do Guadiana. Alcoutim está quase submergida, abatendo muitas casas. Ficou destruída a Alfândega e muitas repartições públicas.


[Cheia de 1976. Foto JV]
O correspondente de Alcoutim para a “Gazeta do Algarve”, expressa-se da seguinte maneira: O Pomarão desapareceu. Todas as casas foram arrasadas e nem se conhece o lugar onde existiam. Apenas ficaram algumas no ponto mais elevado daquela povoação. Em Alcoutim houve perdas consideráveis; em S. Lucar, aldeia espanhola na margem esquerda do Guadiana, também houve enormes perdas. Os campos de Alcoutim estão debaixo de água que entra na vila em muitas casa e quintais. As carreiras do vapor foram interrompidas. Em Vila Real de Santo António há desgraças a lamentar. Morreram onze homens, três que foram buscar madeira e viram-se perdidos na volta e oito que lhes foram acudir. As ribeiras da serra correm caudalosas e consta que têm morrido dois ou três homens e muitos outros têm escapado com grande dificuldade e perigo. Desde Mértola até Castro Marim, ambas as margens do Guadiana estavam orladas e revestidas de formoso arvoredo, nomeadamente figueiras e romanzeiras espontâneas, silvestres que, pendendo sobre o rio, não só o embelezavam, mas davam abrigo aos barcos, no Verão, e aos marinheiros, passageiros e pescadores. Tudo a cheia derrubou, deixando ambas as margens escalvadas e nuas.

[Cheia de 1976. Ribeira de Cadavais. Foto JV]
Por muitos dias se conservou a região do Guadiana coberta de água.


Depois destes dados, de carácter geral e lidos na Imprensa da época, viramo-nos concretamente para Alcoutim. Terão as actas das sessões camarárias, algo para nos dizer? Certamente que sim.

Em 21 de Dezembro e em sessão extraordinária realizada na casa onde provisoriamente devido à cheia, passaram a efectuar-se, o presidente da edilidade, José Joaquim Madeira, abrindo a sessão, relatou os tristes acontecimentos ocorridos pela extraordinária cheia do Guadiana nos dias 6 e 7, que fez desabar mais de sessenta prédios nesta vila e “montes do rio”, tornando também infrutíferas todas as fazendas marginais, por lhes haver arrebatado o arvoredo, não deixando mais do que montes de areia. E continua: Neste aflito estado, é de toda a urgência empregar todos os meios ao nosso alcance para que sejam minorados tão tristes efeitos sendo esta a razão porque convocou a vereação, a fim de deliberar o melhor convenha em assunto de tanta magnitude.

Sendo por todos reconhecida a necessidade de levar brado ante o Favor de Sua Majestade, fazendo-lhe sentir os nossos infortúnios e pedindo lenitivo às nossas desgraças, unanimemente se acordou: 1º - Pedir ao Governo um empréstimo para poderem levantar os prédios que abateram pelam inundação; 2º - Pedir o dinheiro existente no cofre de Viação Municipal e o que a ele possa pertencer durante os dez anos seguintes para a edificação dos novos Paços do Concelho, em lugar dos que caíram, 3º - Finalmente, que não sendo conveniente a edificação no local em que se achavam por estarem sujeitos às cheias do rio, se peça o castelo, onde, sem receio se pode construir, não só aqueles Paços, mas também casas para a delegação da Alfândega e outras.

[Cheia de 1997.11.06.Foto de Dr. Luís Menezes]
Destas deliberações algo foi conseguido. Os subsídios concedidos atingiram 9 926$000, cabendo à Câmara, para reconstrução dos Paços do Concelho, 1 800$000. Também foram contemplados cento e quarenta e sete agricultores que perderam sementes e cujas fazendas foram arrasadas. Neste aspecto e consequentemente no que respeita a propriedades rústicas, foi D. Ana Xavier de Brito Teixeira, a maior contemplada, visto ter sido a que sofreu maiores danos.

Foram também concedidos 500$000 para matar a fome e o frio aos inundados. A distribuição desta verba levantou forte polémica movida pelo cidadão espanhol, Miguel Angel de Lion, que mais tarde foi assassinado em circunstâncias trágicas na sua residência junto do monte do Vascão.


Veremos agora o que se passou na reunião da Irmandade da Santa Casa da Misericórdia. Também se realizou fora do lugar habitual, na sacristia da Real Capela de Nossa Senhora da Conceição, a mandato do provedor, Justo António Torres, no dia 24 de Dezembro, que expõe aos irmãos o seguinte:.. "visto os parcos fundos que a Santa Casa dispõe para os gastos a fazer na mesma em vista dos distúrbios causados pela cheia, nos dias 6, 7 e 8 do corrente, achava muito justo que se dirigissem a todas as Santas Casas do Reino, solicitando das mesmas uma esmola a fim de minorar os males que sofreu, o que foi aprovado por todos."

Os auxílios solicitados tiveram eco e, juntando o valioso contributo do Visconde de S. Domingos, a Irmandade conseguiu reedificar a igreja que reabriu ao culto no dia 18 de Janeiro de 1880, com solenidades pomposas.

Nas reconstruções, considerou que as paredes não deviam ser construídas em taipa, pois foi devido a essa maneira de construir que ruíram maior número de edificações.

[Cheia de 1997. Foto Dr. Luís Menezes]
A igreja matriz também sentiu o efeito da inundação, pois em 4 de Abril de 1878, reúne a Irmandade da santa Casa da Misericórdia que se nega a contribuir com qualquer quotização à Administração do Concelho e Junta de Paróquia desta freguesia, para as despesas da Fábrica da Igreja, visto não ter fundos que chegassem para as suas própria necessidades.

Em 1 de Março de 1877 e devido aos efeitos da cheia, resolve a Câmara acudir ao reparo da muralha que defende e resguarda a igreja matriz.

O encarregado da barca de passagem para S. Lucar, António Marques, apresentou-se na sessão camarária, pedindo abatimento na renda devido à inundação não lhe permitir fazer serviço de Dezembro a Janeiro, continuando a passagem a ser muito diminuta, pelo estado em que se achavam as margens do rio, que dificultava o embarque e desembarque. A Câmara acordou e fez abatimento (1 de Setembro de 1877).

Deixemos porém as actas que nos ajudaram a compilar os factos que descrevemos, e recorramos à boca do povo, à tradição.

O nível das águas alcançou a cruz de alvenaria da fachada da capela de Santo António; as águas corriam da Rua do Quebra-Costas (actual Dr. João Dias), para a da Misericórdia (que mantém a designação), pela Rua da Parada. Entrando pelo barranco do cemitério, chegavam ao largo da Rua Portas de Tavira (actual D. Sancho II).
Os barcos, numa tentativa de resguardo, eram amarrados às grades da cadeia e a força da enxurrada era tão grande que as cordas cediam e as embarcações lá iam, rio abaixo, sem destino.

É também tradição que a população desalojada acolheu-se à Capela da senhora da Conceição que, situada no ponto mais elevado da vila, os acolhia com maior segurança. Junto da imagem da Padroeira de Portugal oravam pedindo para que interferisse, minorando os seus males.

De tudo aparecia boiando, havendo mesmo quem se dedicasse à recolha de “despojos”, avultando sacos cheios de farinha. Flutuavam cadáveres de animais domésticos que os donos não puderam salvar pois, por vezes, até a sua própria vida esteve em perigo.

Já vimos que os “montes do rio” também foram muito martirizados. Entre o Montinho e as Laranjeiras, apareceu um cadáver humano boiando, o qual, avistado por uma mulher, foi motivo para alarme e terror das populações.

São repassadas de angústia, tristeza e terror as palavras insertas nas actas de reunião da Santa Casa e da Câmara Municipal.

[Cheia de 1997. Foto Dr. Luís Menezes]
Quero terminar este apontamento com uma referência em que episodicamente participei e que se enquadra na Cheia Grande.

Quando o então presidente do município tentou a construção da ponte sobre a Ribeira de Cadavais, velha aspiração da população das Cortes Pereiras e montes vizinhos, e para o efeito se deslocou ao local o técnico dos serviços competentes e quando tudo parecia estar bem encaminhado, ou qualquer coisa do género, reparou na placa indicativa da altura da cheia de 1876 e deu o assunto por terminado, não havendo viabilidade em tal construção.

Dias depois, cavaqueando num passeio higiénico com o nosso bom amigo relatava-me o acontecido, desabafando assim: Se tenho sabido, tinha mandado arrancar a fulano a placa.
Parece, mas não é anedota.

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Etnografia Portuguesa


ETNOGRAFIA PORTUGUESA, Tentame de sistematização pelo D.or J. Leite de Vasconcellos, Vol V, organizado por M.Viegas Guerreiro com a colaboração de Alda da Silva Soromenho e Paulo Caratão Soromenho, é da responsabilidade da Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1982, onde o adquiri em 1990.

O Grande Mestre (1858-1941) visitou a Vila de Alcoutim de onde levou algumas peças arqueológicas oferecidas por Pedro José Lopes, pai de D. Belmira Lopes Teixeira, que me prestou a informação.

Criou alguma amizade com Manuel António Torres que foi seu informador epistolar e a quem ofereceu, em 1909, uma cópia da vista de Alcoutim tirada do norte e constante do livro de Duarte de Armas, então pouco divulgado.

O volume tem várias referências a Alcoutim (rifão que fala de perdizes.pág.332; lavadeiras, lajes estendidas sobre os muros, pág. 536;cabos de sachos feitos de loendro, pág.546 e dedeira, galapo, dedilo e caleira protecções para a mão, nas ceifas, pág.550).

De formato de 21X28,5 cm é constituído por 708 páginas.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Os "Trases"


A qualidade da fotografia é má e praticamente imperceptível, mas o seu interesse histórico é na nossa perspectiva, grande.

Datada de 1935, é das fotografias mais antigas que conheço de Alcoutim.

Os visitantes que conhecem a vila, já descobriram qual é a parte fotografada?

Não é difícil descobrir, no cimo do cerro, a Igreja de Nª Sª da Conceição. Não está nítido, mas percebe-se.

A fotografia é tirada do prédio que pertenceu e onde residiu, Pedro José Lopes, filho de Paulo José Lopes que foi Presidente da Câmara e Administrador do Concelho e pai de D.Cristina e D. Belmira Lopes Teixeira.

As casas que se distinguem, com alguma dificuldade são as que ainda constituem as traseiras das ruas da Misericórdia e das Portas de Mértola, daí a designação popular de “Trases”.

O declive, que é notório, vendo-se alguma arborização, levava-nos à ribeira de Cadavais.

Por este local passou a muralha da vila que se foi desmoronando com o decorrer dos tempos e onde se veio a construir, por intermédio de expropriação, na década de cinquenta do século passado, o muro de suporte e a estrada para possibilitar um novo acesso à Praça da República, tomando em conta as camionetas de transportes públicos que já não podiam passar pela ruelas medievais da Rua de Portas de Mértola e da Misericórdia.

Tem má qualidade, mas é histórica!

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Referências ao "ALCOUTIM LIVRE"

Ultimamente tivemos conhecimento de duas referências ao ALCOUTIM LIVRE.

O companheiro de percurso, Um monte no interior algarvio, (http://alcariaalta.blogspot.com)

escreveu:

REFERÊNCIA A ALCARIA ALTA


Não podia deixar de fazer referência a uma entrada, blog Alcoutim Livre, sobre Alcaria Alta, de seu título “Alcaria Alta foi o mais importante monte da freguesia de Giões”, no qual o sr. José Varzeano descreve informações muito interessantes, algumas para mim desconhecidas, acerca do monte que dá nome a este blog. E até tem uma foto da “Casa do Monte”.

Por outro lado

Picachouriços-Guarda Fiscal(http://picachoricosgf. blogspot.com), associou o nosso artigo, “A Guarda-Fiscal em Alcoutim” e destacou as ilustrações que o acompanharam, o que teve o cuidado de nos informar através de e-mail.

A ambos agradecemos a gentileza.

terça-feira, 4 de agosto de 2009

O último carcereiro ou a morte do Senhor Jerónimo

Pequena Nota

O artigo que irão ler do nosso Amigo e colaborador, Gaspar Santos, é mais um da série que tem vindo a publicar neste blogue e com o mesmo interesse dos anteriores.
É claro que há assuntos que se prestam a uma análise mais profunda devido ao seu desenvolvimento e ao próprio conhecimento que se tem das coisas, mas o interesse é patente em todos.
No meu trabalho que vulgarmente é conhecido por Monografia de Alcoutim (1985), apresento a pág. 23 um desenho da cadeia e refiro-me esporadicamente a ela no decurso do livro.
Na altura, o conhecimento sobre o assunto era quase nulo, mas nunca foi esquecido.
Em 30 de Novembro de 1993 publiquei no Jornal do Algarve um estudo sobre a mesma e a que dei o título “A desaparecida cadeia”, inserido no Magazine que já nos dá uma panorâmica sobre ela, abordando vários aspectos que vão desde a construção em si, até às funções que teria tido, passando por alguns dos presos que albergou, funcionários que teve, indo até à função da sineta.
Os crimes mais hediondos costumam ficar na memória do povo e vão passando de geração em geração e ainda hoje se fala de alguns.
Em 2006 tive conhecimento de um crime de canibalismo passado “nos campos de Alcoutim” e praticado em 24 de Dezembro de 1909 de que nunca ouvi falar e já perguntei a várias pessoas idosas que nada me souberam dizer.
Só a ida da documentação da Conservatória para o Arquivo Distrital de Faro irá, segundo penso, possibilitar a quem o desejar, recolher mais elementos.

“O Último carcereiro ou a morte do Senhor Jerónimo “ é um assunto que desconhecia totalmente e enriqueceu o meu conhecimento sobre a temática.
Obrigado, Eng. Gaspar por mais este importante contributo.


JV






Escreve
Gaspar Santos





Morreu o Senhor Jerónimo! Morreu o Senhor Jerónimo! Foi assim de boca em boca que o triste acontecimento se transmitiu entre a miudagem que tinha por amigo este homem.

O Senhor Jerónimo, após a morte de sua mulher, vivia sozinho no primeiro andar da Cadeia. Era o Carcereiro. E foi o último. Mais tarde esta residência ainda foi ocupada pelo Marciano, um antigo pescador de Castro Marim que veio com a mulher viver para Alcoutim e também aqui faleceu. Só uma vez subi ao primeiro andar deste edifício, já no tempo do Marciano, tendo observado de perto e de cima o alçapão que dava acesso à cadeia.

O Senhor Jerónimo tivera um talho, de cuja prática lhe ficara a marca na última falange do dedo polegar esquerdo. A última falange e a unha eram bífidas. Quando o conhecemos e com ele privámos era uma pessoa simpática e disponível devido á sua pouca ocupação. Vestia sempre um fato de macaco azul e passava as tardes a pescar à linha, em geral com pescas de fundo de fio de pesca (ainda não aparecera o fio de nylon) à sombra da muralha entre os dois cais. E era aqui que a miudagem lhe fazia todas as perguntas e ele ensinava tudo sobre aquele tipo de pesca e sobre os utensílios que ele manufacturava: empatar anzóis, fazer bóias de cortiça, guizos para ampliar o sinal de peixe a picar, manobra de ajudar o peixe ferrar, etc.


Gostávamos dele. Constou que a sua morte se dera por tuberculose. O corpo do Senhor Jerónimo foi metido em caixão e colocado na Igreja de Santo António. A miudagem curiosa e por sentir já saudades do seu amigo Jerónimo teria gosto em lhe fazer uma última companhia. Mas as mães, atentas perante o pavor da tuberculose para a qual não havia remédio nesse tempo, fizeram esta séria recomendação:

Nada de irem acompanhar o Senhor Jerónimo! Os micróbios abandonam o morto e tratam de se instalar nos vivos!

[Desaparecida Cadeia. Desenho de J.V.]
E por este motivo, cheios de receio, nós só assomávamos à porta da Igreja, porque o nosso corpo ficava convenientemente entrincheirado no seu umbral. E foi assim que o Senhor Jerónimo esteve só, na morte, como tinha estado nos últimos anos de vida se não fossem os miúdos!

Quando hoje por causa da gripe H1N1 ou gripe A vemos todos os dias na televisão responsáveis sanitários e até a Ministra da Saúde a falar de uma coisa que ainda não existe ou se existe é em termos pouco significativos (mas parece que a desejam como uma espiação) a preocupação das nossas mães que pouco conheciam de epidemiologia são largamente justificadas.

Felizmente, os presos que vimos nesta cadeia, foram poucos. Podem contar-se pelos dedos. A cadeia não se destinava ao cumprimento de penas. Era uma cadeia para detenção de pequena duração de pessoa que cometera algum delito e apenas até transitar para a Judiciária ou Tribunais.

Os dois ou três casos de delitos simples que conheci deram para perceber como funcionava a cadeia. As autoridades entregavam o detido ao Senhor Jerónimo que lhe indicava uma escada de madeira para descer através do alçapão para o rés-do-chão que tinha umas grades e onde o homem ficava publicamente exposto. Depois a escada era removida e o detido não tinha por onde fugir. Essa escada por onde o detido iria sair um ou dois dias depois, não era o único elo de ligação que tinha com os outros, já que através das grades era possível passar um copo de água, um refresco ou simplesmente conversar – aspecto que suavizava o outro menos simpático da exposição pública.

Mas houve um detido por delito mais grave, o Romão, de Soudes freguesia do Pereiro, tocador de acordeão, que depois de constituir um grande problema para vários homens o conseguirem fazer descer pela escada, teve artes de fugir pelas grades. Com as unhas conseguiu arrancar uma pedra da parede e com essa pedra bateu tantas vezes nas grades que rebentou o mármore onde as grades estavam encastradas. Saiu depois pelo gradeamento que parcialmente removeu.
Ainda não fora possível dominá-lo nem impedir os danos no gradeamento, apesar das espectaculares e perigosas tentativas feitas. Homens em número e coragem suficientes para o dominar, tentaram descer por cordas e pela escada que a breve trecho se partiu. Mas antes de chegarem ao solo eram ameaçados pelo homem furioso com os restos esquirolados da escada. Era um doente mental, e só na rua, foi possível dominá-lo.

Depois desta detenção, não tenho conhecimento de que tenham procedido a outra, para este espaço.