quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Tesouros do Artesanato Português


Este interessante volume, que tem por base trabalhos em Madeira, Fibras Materiais Afins, é uma edição com a reconhecida qualidade da Verbo de Novembro de 2001-

Os textos são de Teresa Perdigão e a fotografia de Nuno Calvet.

De formato 23X31 cm, tem 205 páginas de bom papel fortemente ilustradas e de encadernação industrial cartonada.

O concelho de Alcoutim está representado pela “Flor da Agulha” (Martim Longo), apresentando várias bonecas (págs. 134 a 137) e duas fotos de artesãs a trabalhar.

Mas não fica por aqui a participação do concelho de Alcoutim, visto a página 160 ser preenchida por várias peças de cana, de tamanhos e formatos diferentes e que são obra do cesteiro António Francisco Ramos de Alcaria Queimada , freguesia de Vaqueiros.

Adquiri o conjunto de volumes, quase a preço simbólico, numa Feira do Livro que teve lugar na cidade onde habito.

terça-feira, 29 de novembro de 2011

O Termo de Alcoutim em 1791




Escreve


Gonçalo Roiz Vilão



Ao pesquisar por livros e jornais do final do século XVII, mais concretamente no ano de 1795, deparei-me com um artigo do Jornal de Coimbra, escrito por José Feliciano Castilho, que descrevia o estudo da viagem ao Algarve feita em 1791 por Luís António de Oliveira Mendes, membro da Academia de Ciências de Lisboa, que percorreu o Algarve e visitou o concelho de Alcoutim. Descreve o estado das estradas, a ausência de pontes e a falta de máquinas no despontar da industrialização, as diferentes culturas da vinha, da oliveira. Faz-nos compreender as dificuldades da labuta árdua que os homens e mulheres do termo de Alcoutim viviam nestes tempos para levarem o pão á boca das suas famílias.

Surpreendeu-me por trazer aos dias de hoje alguns aspectos desta zona que embora pudéssemos imaginar, não tinha a ideia de ficarem registados. Uma época acontece e perde-se nos anais do tempo e da memória se não for registada e com este registo fica mais uma partilha sobre o nosso concelho:

[Alcoutim visto por Duarte de Armas. Livro das Fortalezas, séc.XVI]

“ No anno de 1791 em que viajei o Algarve tomei conhecimento, que os Espanhoes colhiaõ a Salicornia, e algumas especies de Salfola, que nascem espontaneamente nas vizinhanças de Faro, e depois de fazerem a combusttaó destas plantas levavaõ as cinzas para Espanha; porém como a sahida delas exigiaô alguns direitos na Alfandega da dita Cidade, ha mais de dez annos, que deixando de fazer semelhante colheita nesses sitios a praticaõ nos sapaes da Moita. O termo de Alcoutim abunda muito em Loendro (Nerium Oleander ), dele tiraô os Espanhoes as cinzas que levaõ para Espanha , e segundo as informações que tive no anno de 1790 levariaõ nesse anno 120 alqueires das ditas cinzas.”

As estradas em 1791:

“São de huma absoluta necessidade as Estradas no Algarve; porque à excepção da de Castro Marim até Tavira não observei em todo aqueile Reino no anno de 1790 huma só, que excedesse muito de tres palmos de largura.
A falta d' Estradas causa no Reino do Algarve males incalculáveis. (Como podem haver carros faltando os caminhos, por onde elles se possáo mover? Não havendo Estradas e carros difficulta-se muito o fabrico das casas, de que percisáo os lavradores para viver, e outros usos ruraes. Que despeza e trabalho náo terião para acarretar em bestas a pedra necessária para fazer hum edifício?

No anno de 1790 me informarão no Térmo dÁlcoutim que, quando querião levar a mó de algum moinho para o lugar do seu destino, era ella conduzida pela força de quarenta ou sessenta homens por subidas e descidas violentas consumindo muito tempo e despeza, e ordinariamente acontecendo graves perigos. A falta de Estradas difficulta, e até impossibilita o carreto dos estrumes, de que percisáo as terras, a importação e exportação das pròducções da Natureza, e Industria.”

As pontes:

“Não causa menos detrimento na Agricultura, e Commercto do Algarve a falta de Pontes, que n'elle se observa. Em todo este Reino desde o Cabo de S. Vicente até Villa-Real de Santo Antonio apenas se encontrão duas Pontes, huma em Loulé, e outra em Tavira sem embargo de elle ser cruzado com difFcrentes ribeiras e rios, que tem origem nas Serranias de Caldeirão e Monchique, que engrossão muito com as chuvas do Inverno. No anno 1790 me informarão no Têrmo d´Alcoutim, que por não haver Ponte na ribeira da Pouparia muitos Lavradores no tempo do Inverno percisavão dar huma volta de duas Iegoas e meia., para irem lavrar as suas terras.
Por falta de Pontes, primeiro morrem todos os annos muitos passageiros, e gado nas ribeiras de Vascão, Foupana, e do Deleite. Segunde, os Lavradores não podem nos tempos das enchentes lavrar as suas terras. Terceiro, difficulta-se o carreto dos fructos dentro do Reino, e a exportação dos supérfluos para outras Províncias. Quarto, sem Pontes e caminhos em bom estado mal se podem cultivar os muitos terrenos incultos, que se observa em todo o Reino do Algarve.”

Os carros:

“Os carros de cõnducção tão percisos para os usos Economicos, e Militares são mui poucos no Algarve. No annó de 1790 não se contava hum só em todo o Termo de Alcoutim que terá mais de trinta legoas quadradas, e então somente havião dons no de Castro Marim. No resto do Reino creio que n'esse tempo serrão muito raros. Eu desde o Cabo de S. Vicente até Villa Real de S. Antonio não encontrei hum só, em que podesse notar a sua descripçáo. Por falta de carros acarretavam os Lavradores para as suas eiras o trigo e centeio, depois de ceifado, em jumentos e outras bestas muares.”

As Máquinas:

“As Máquinas percisas para espremer o azeite e vinho erão pouco conhecidas no Algarve, quando eu lá estive, segundo as informações, que então me derão. Em Alcoutim mettião as uvas em saccos, que depois pisaváo com os pés para d*ellas tirar o mosto, e por falta de hum aparelho competente perdião huma boa parte d'elle, que se podia aproveitar espremendo o bagaço; a mesma rotina seguião a respeito das azeitonas, e já depois de estar meia adiantada a podridão d'ellas ; de maneira que os habitantes d'aquella Villa , e seu grande Termo, não sabião no anno de 179O o que era hum lagar de vinho e azeite, e os do resto d'este Reino pouco mais adiantados estavão n'aquelle tempo.”

Boas práticas rurais:

“Estas • boas práticas ruraes erão desconhecidas no Algarve no anno de 1790; e também em alguns lugares d'aquelle Reino os Algarvios estão tão aferrados a certo género de cultura, que se descuid.ío de procurar aquelles , que são mais acommodados á natureza do terreno , em que vivem , e circunstancias locaes» Sirva para exemplo 0 grande Termo da Villa de Alcoutim: todo o vinho, que aqui houve no anno 1790, apenas chegou a vinte e nove pipas, quando sendo todo elle hum Paiz montanhoso he muito acommodado para vinhatarias e olivaes ; devião também cuidar n.'estes gejieros de cultura, que lhes dariáo muito proveito ; porque a cultura dos grãos pelo modo , com que afazem, não lhes rende mais do que o quádruplo ou quintuplo da sua semente em annos abundantes ; e nos estéreis, como lhes falta o pão, são obrigadas as Famílias a desamparar seus lares, e procurar outra habitação,, como aconteceo no,anno de 1777, e outros mais antingos, de que ainda ha memoria; por isso he pequena a População d'aquelle vasto Termo, pois no anno de 1790 «era somente de 6:360 almas. “

O mel:

“Nos corgos , entre as serras , bastantes colmeias ha em cortiços de sovereiros ou azinheiras, que produzem excellente mel pela abundância de plantas aromáticas: exporta-se algum, assim como a cera; fabti* cando-se outra em varias terra*. Não ha porém maior abundância senão em as freguezias da serra de Tavira e Alcoutim. O de superior qualidade cresta-se há beíra-mar e barrocal.


Cultura das Oliveiras:

“A cultura das oliveiras pôde adiantar-se muito no Algarve e em Alcoutim todas as terras altas e baixas d"aquelle Reino são acommodadas para ellas : ainda mesmo na cordilheira de montes, que o sepárão da Província do Alem-tejo existem vargens' incultas aonde se podem criar muitos olivedos.
Contão-se differentes variedades d'oliveiras no Algarve, assim como na Província do Além-Téjo, e Traz-os-Montes; e sendo humas mais fructiferas do que outras, a enxertia he o único meio de as melhorar, e então terá o Proprietário com a mesma despeza. huma colhèita mais abundante. He para sentir que em todas as Províncias de Portugal seja quasi inteiramente despresado este modo de melhorar os olivaes.
Podem os habitantes do Algarve ainda com menos trabalho multiplicar os seus olivaes n'aquelle Reino: basta só enxertarem o quasi infinito numero de zambujeiros, que lá existem sem que d'elles fação caso algum. Eu observei muitos em Janeiro de 1791 nas margens occidentaes do Guadiana, que estando então por amanhar são bem próprias para vinhas e olivaes.
No anno 1790 me informarão, n'aquelle Reino, que costumavão arrancar as Oliveiras, que por doentes não daváo fructo. He abuso culpável! Quanto melhor he procurar remédios, que possão curar a doença, do que privarem-se d'aquellas arvores, que tantos annos custão a fazer.”

Cultura das Alfarrobeiras:

“As Alfarrobeiras são arvores, que somente tenho observado em grande quantidade no Algarve, conservão sempre a sua folha, como as oliveiras e laranjeiras , florecem no mez de Dezembro, gostão de hum clima o mais benigno, por isso eu não as vi em Alcoutim, e outras terras do alto Algarve , que ficão em huma maior altura a respeito do nivel do mar ; ainda mesmo no baixo Algarve a cultura d'ellas se pôde multiplicar nos-tefrenos incultos , que lá vi, e melhorar pela enxertia ; porque entre as variedades das Alfarrobeiras humas são mais fructiferas do que outras.” (*)

(*) Retirado de: Jornal de Coimbra 1790 Volume I, por José Feliciano de Castilho

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Visita da Imagem de Nª Sª da Conceição a Alcoutim


Já apresentámos nesta rubrica três fotografias da visita da Imagem de Nª Sª de Fátima a Alcoutim em 23 de Fevereiro de 1947.

Foram possíveis apresentar pela colaboração dos alcoutenejos Amílcar Felício, Carlos Barão e José Madeira Serafim.

A primeira que publicámos, registava a passagem da procissão na Rua da Misericórdia junto ao edifício da Santa Casa, a segunda a saída da Imagem da Capela de Nª Sª da Conceição e a terceira quando o cortejo se preparava para descer o escadório que dá acesso ao templo.

A foto de hoje, do mesmo evento religioso, é tirada na Praça da República, vendo-se ao fundo o edifício do Capitão-mor e onde funcionaram durante muitos anos os serviços de Finanças locais.

A Procissão dirige-se para o Cais Novo onde se irá realizar uma Missa Campal.

Foto cedida por José Madeira Serafim a quem agradecemos.

domingo, 27 de novembro de 2011

Montinho da Várzea, o último do concelho por este lado

Pequena nota
Concluímos hoje a volta que demos por todos os montes da freguesia serrana de Vaqueiros, a mais afastada da sede do concelho mas aquela onde se consegue ver algum aproveitamento dos terrenos e onde resta a pastorícia de pequenos ruminantes, gado ovino e principalmente caprino.
Referimos aqui no TEMA Montes do Concelho-Vaqueiros, 30 pequenas povoações, algumas completamente desabitadas e outras muito perto disso. Escrevemos o que nos foi possível.
Além disso incluímos no TEMA – Ecos da Imprensa na postagem de 2009.07.06, “A Capela de S. Bento e o monte de Alcaria Queimada que fizemos publicar no Magazine do Jornal do Algarve de 26 de Abril de 1990.
Todos os vaqueirenses podem, assim, encontrar neste espaço algo sobre as pequenas povoações onde nasceram, eles ou os seus antepassados.
É o nosso pequeno contributo. Até aqui, que eu saiba, ninguém o tinha feito.

JV


[Placa toponímica escrita por algum estrangeiro. Foto JV, 2011]

Quando visitámos pela primeira vez este pequeno monte e já lá vão uns bons anos, não conseguimos ver ninguém, ainda não estava electrificado e isso acontecia porque não estava habitado.

Hoje as coisas são um pouco diferentes, pelo menos, quanto às melhorias de condições de vida.

As várzeas ou vargens, a que foi buscar o nome, são terrenos planos situados em vales e que oferecem boas condições para cultivo, pois além da riqueza da constituição do seu solo têm normalmente água por perto.

Nestas condições não admira que esta zona fertilizada pelas águas da ribeira de Odeleite tenha sido sempre procurada pelo homem que nela via condições de sobrevivência.

As Memórias Paroquiais de 1758 já o indicam referindo Vargem e logo a seguir Montinho, possuindo ambos três vizinhos pelo que se equiparariam.

Ainda que pertencessem à freguesia de Vaqueiros, faziam parte do termo da cidade de Tavira como o pároco informa no questionário a que respondeu para dar satisfação ao pedido formulado em 1758.

Este sistema, que acabou em 1836 pela chamada reforma de Mouzinho da Silveira, tinha em conta as dificuldades que possuiam para se deslocar, nomeadamente o vencer os cursos de água e onde não existiam pontes. Aliás, por aqui as pontes só chegaram depois do 25 de Abril de 1974.

A construção da estrada nº 508 e a chamada ponte dos Galaxos sobre a Ribeira de Odeleite vieram tirar estas pequenas povoações do isolamento total em que se encontravam. Até então, as crianças dos Galaxos ainda que mais próximo da escola da Várzea, optavam pela do Zambujal, visto não terem necessidade de vencer a ribeira, principalmente no Inverno. Quando apareceu a ponte, desapareceram as crianças!

A estrada foi pavimentada em 1991. (1)

[Um aspecto da pequena povoação. Foto JV, 2011]

Em 1984 e quando se procedeu a um inquérito para a instalação da energia fotovoltaica, esta povoação foi uma das questionadas. Na altura, tinha treze habitantes em 4 fogos, havendo dois emigrantes. A opção acabou por ser Vale da Rosa e por pouco tempo.

Em 1998 segundo um bom conhecedor da freguesia devia ter três ou quatro habitantes. Hoje (2011), restarão dois.

Veio a receber energia eléctrica, procedendo-se à inauguração em Novembro de 1999 e ao mesmo tempo em que o foi o monte das Ferrarias. (2)

O abastecimento de água ao domicílio teve lugar em 2006.

Os arruamentos foram pavimentados em 2009.

O painel de caixas do correio tinha sido colocado em 1996. (5)

Está a 16 km de Vaqueiros, sede de freguesia e a 37 de Alcoutim, sede de concelho.
Ficam-lhe próximos Preguiça 3 km, Jardos 3,5 e Galaxos a 4,5.

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NOTAS

(1) – Boletim Municipal nº 8 de Abril de 1991.
(2) – Alcoutim, Revista Municipal nº 7 de Março de 2000, p. 15
(3) – Alcoutim, Revista Municipal nº 13, de Dezembro de 2006, p. 14
(4) – Alcoutim, Revista Municipal nº 15 de Julho de 2009, p. 17
(5) – Alcoutim, Revista Municipal, nº 4 de Dezembro de 1996, p. 12

sábado, 26 de novembro de 2011

Bolso de arame



Objecto feito pelos agricultores com arame de forma côncava que se adaptava ao focinho dos animais e que tinha por fim evitar que fizessem estragos, nomeadamente, comer o que não deviam.

Era muito utilizado quando se carregava o trigo para a eira, evitando assim que comessem o cereal.

Reparar que há argolas destinadas à prisão ao cabresto.

Esta peça, por motivos óbvios, está completamente fora de uso no concelho.

Para o mesmo fim igualmente se faziam bolsos de corda.

O exemplar fotografado foi-nos oferecido pelo Sr. Custódio do Curral da Arvela, Cortes Pereiras e a descrição que fazemos foi-nos na altura, transmitida por ele.

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Um grande agricultor - António Monteiro Robalo





Escreve

Gaspar Santos





Na Vila de Alcoutim, nos anos 30, 40 e 50 do século passado, o Senhor Robalo era o maior agricultor, entre várias dezenas. As terras que cultivava em dedicação exclusiva, não eram suas. Era rendeiro.

Tinha sucesso, embora fosse criticado por outros agricultores por usar técnicas de cultivo despachadas, consideradas pouco cuidadas. Eles sachavam e cavavam os milhos ou batateiras várias vezes para revolver a terra e matar a erva e assim aumentar produção. Robalo tinha mais que fazer e dedicava esse tempo a outras tarefas mais rentáveis, não estando a fazer muitas “festinhas” às plantas. Se a produção não era tão grande, a palha, o feno e as pastagens residuais também davam jeito para alimentar o gado.

Enquanto outros sachavam o milho, quando atingia alguns centímetros, ele gradeava o terreno semeado. A grade era uma estrutura rectangular em que dois dos lados eram barrotes de madeira com pontas de ferro pregueadas. Quando puxada pelas bestas servia para arranhar a terra e partir os torrões maiores. Destruía muita erva, é verdade, e também muitos pés, o que, porém, não prejudicava a seara, pois o semeador tivera a preocupação de semear o milho com maior densidade. Depois, era só regar o milho pelo pé com regueiras a partir da nora puxada por muares.

[Margens da Ribeira de Cadavais. Foto JV]

Havia anos em que na parte mais baixa da Hortinha, junto da casa, semeava trigo rijo e a cheia da ribeira ou do rio inundava a seara e as laranjeiras até à copa. Nessa altura para o prejuízo ser menor esperava que o terreno secasse, para então, em alternativa, semear milho. E não havia seguro para cobrir isto!

Ele era um homem alto e de desembaraço impressionante. Uma vez, ele ainda era vivo, vi num filme, uma cena que mo trouxe à lembrança: - um emigrante Inglês ou Irlandês toma posse duma terra no Texas. Enquanto a mulher, de saia muito comprida cozia uns feijões com carne seca, ele, com gestos largos, pregando as tábuas com um martelo, fazia uma vedação de madeira, limitando a propriedade, com uma incrível velocidade. Eu disse para comigo: é um “senhor Robalo”!

Recordo dois empregados seus: António Emílio já falecido e o Manuel Noronha, barbeiro actual em Alcoutim, dois exemplos de bons trabalhadores que ele ajudou a formar e que sem dificuldade transitaram para outros ofícios.

Atesta do seu êxito social, integrar em 1952 a Comissão de Festas de Alcoutim. Uma Comissão de Honra “dos engravatados” na feliz expressão de Amílcar Felício. Ele que nunca usava gravata (!), salvo em momentos muito especiais, foi um dos escolhidos por ser muito respeitado.

Este homem era natural da Região Oeste, com um falar peculiar que se distinguia do nosso; quando comprava um selo, não pedia um selo, pedia uma estampilha! Teve um percurso profissional muito específico. Começa por ser escriturário nas Minas de Aljustrel. Mas, como ele dizia, não “cabia” no acanhado espaço do escritório e necessitava de ar livre para se realizar. Torna-se agricultor!

Casou com Laura Brito, operadora de telégrafo de Morse dos CTT. E resolve acompanhar sua mulher à medida que ela vai sendo promovida e muda de local de trabalho. É assim que vai, com o filho Mário nascido em 1921 em Aljustrel, para o Pomarão onde nasceu a filha Ivone.

Instalam-se em Alcoutim no final dos anos 20 quando a mulher foi transferida para chefe dos CTT por morte do senhor Freitas. Aqui arrendou terras para cultivar, como já fizera no Pomarão. Moravam no antigo edifício dos CTT na Rua D. Sancho II, nas instalações destinadas a residência da chefe.

Não me lembro de ter visto a mulher do senhor Robalo, pois faleceu muito nova. Sei por ouvir dizer que, enquanto ele era magro ela era mais forte.

[Comandante Robalo ] O filho Mário de Brito Monteiro Robalo fez a instrução primária em Alcoutim. Mais tarde teve uma brilhante carreira militar. Foi um dos primeiros dois pára-quedistas, juntamente com o capitão Martins Videira. Em 1962, como major, foi nomeado comandante do Regimento de Caçadores Pára-quedistas, criado no ano anterior, e onde se manteve até 1971. Passou à reserva por doença no posto de coronel. Depois, ainda se licenciou em direito, tendo falecido em 1990.

A filha Ivone de Brito Monteiro Robalo também frequentou a escola em Alcoutim. Foi enfermeira no Hospital dos Capuchos, em Lisboa, atingindo o grau de enfermeira-chefe.

Quem tomava conta do governo da casa era uma empregada de nome Emília, natural do Baixo Alentejo. Ti Emília da “Horta” era uma figura típica, pessoa bem-disposta, que do seu posto atrás do muro da casa dava sempre o seu dedo de conversa e de saudação simpática a quem passava no caminho do Poço das Figueiras, aproveitando para pôr em dia as notícias. Sendo também aqui que vendia alguns produtos da terra.

Esta empregada no início dos anos 50 trouxe dois sobrinhos adolescentes, o Manuel Noronha e sua irmã Maria de Lurdes para colaborar nos trabalhos, o que fizeram com mérito. Estes constituíram famílias e ainda residem na freguesia de Alcoutim.

Dois terrenos eram a sua principal ocupação: a várzea entre o Poço Novo e o Poço das Figueiras, onde existia a casa onde passou a residir; e a Fonte da Serra, à direita do antigo caminho donde se avistam as passadeiras das Cortes (Pereiras) sobre a ribeira de Cadavais, onde tinha as suas instalações pecuárias, armazém de alfaias agrícolas, cereais e alimentos para o gado e a eira para debulha de cereais, favas, grão-de-bico e tremoços.

Além de trigo e milho cujos excedentes vendia à Federação de Trigos, colhia e vendia, azeitonas, amêndoas, figos, alfarrobas, batatas e produtos hortícolas e produzia bastante leite de vaca. Vendia ainda a produção pecuária de porcos, ovelhas e cabritos. Era também um grande produtor de laranjas e outros citrinos. Na sua residência a empregada vendia muitos produtos hortícolas, batatas, leite e até caixinhas com amoras.

Recordo-me de algumas vezes, por 10 centavos (um tostão) a empregada permitir que os miúdos fossemos “encher a barriga” de amoras subindo à amoreira para as colher e ficar todos pintados de azul.

Recordo outro episódio. As laranjas caídas serviam de alimento às vacas leiteiras. Um dia uma vaca enorme e que dava muito leite morreu engasgada com uma laranja mais pequena. O Senhor Robalo com um misto de raiva e desgosto não comeu nem deixou que comessem a carne. Aproveitar a carne não o consolava nada, e assim, respeitou normas sanitárias. Mandou fazer uma grande cova e enterrar os restos mortais do animal. No entanto, os “coveiros”, mal ele se afastou ainda conseguiram tirar uns bons bifes, que comeram no mais completo recato para ele não se inteirar.

Comprou ainda, para residir, uma casa enorme na Rua D. Sancho II que restaurou lentamente ao longo de vários anos. Creio até que foram os filhos a terminar a sua restauração. Serviu as instalações da Casa do Povo, sendo vendida mais tarde ao João Batista.

Hoje fala-se muito de crise. Será excesso de produção? De facto vêem-se muitos campos não cultivados por não ser rentável (?) explorar. Não faltam alimentos na Europa, mas eles faltam em muitas partes do mundo. Há jornais até que dizem que não há capacidade para alimentar hoje toda a população mundial. Outros referem um estudo da FAO que diz ter o mundo capacidade para alimentar 10 mil milhões de habitantes, que será a população em 2050; e que por falta de distribuição, há alimentos estragados sem serem consumidos, enquanto há zonas de escassez. É, por isso, muito vantajoso que haja produção local para garantir um pouco melhor essa distribuição.

Vale por isso recordar este homem e a sua produção local. Ele pode ainda hoje exemplificar como foi possível ter uma vida plena e economicamente desafogada, criar e educar bem os filhos; trabalhar muito e dar emprego a pessoas, praticar uma agricultura só com a força animal, sem ser subsidiada e sem seguros que cobrissem os riscos de cheia.

O que não faria hoje o Senhor Robalo com tractores?

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Papas com conquilhas


Apresentamos hoje nesta rubrica um prato que nunca provámos e que é muito típico do concelho de Alcoutim tendo apreciadores, nos quais não me incluo.

É um prato extremamente simples, trata-se apenas de farinha de milho cozida em água a que se junta como gordura a banha de porco e naturalmente, uma pitada de sal.

Quando a farinha começar a engrossar, juntam-se as conquilhas previamente depuradas.

A conquilha é um molusco bivalve muito frequente na costa algarvia e que era levada pelos “marujos” através do Guadiana para a serra juntamente com a sardinha, os charros e as cavalinhas.

Em tempos recuados, dos quais os mais idosos do concelho se lembram, a farinha de milho era obtida por intermédio das “molinetas” ou “molnetas”, duas pequenas mós accionadas manualmente e em que a de cima era a andadeira. A farinha saía um pouco grossa. Estas mós parecem ter sido introduzidas na região pelos romanos.

É um prato também usado no litoral algarvio, mas aí toma a designação de xarém, termo que era completamente desconhecido no concelho de Alcoutim, como nos informam os idosos da região.

O ideal é confeccioná-las num tacho de barro e se for ao lume de lenha, melhor.

Existem mais variedades de papas no que respeita ao acompanhamento.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Crónicas e Ficções Soltas - Alcoutim - Recordações - XVII

Pequena nota
Daniel Teixeira tem-nos presenteado com um conjunto de crónicas interessantíssimas que nos retratam a vida dos “montes” do concelho de Alcoutim na segunda metade do século passado. É o único que o faz em relação a esta área geográfica, já que os outros colaboradores que recorrem à memória o fazem com base na vila onde nasceram e tiveram as suas vivências.
É por estas e outras que o ALCOUTIM LIVRE se torna tão abrangente e é cada vez mais procurado por quem gosta de saber a verdade sobre Alcoutim e o seu concelho.
Obrigado Daniel Teixeira por este valioso contributo.


JV





Escreve


Daniel Teixeira




MEMÓRIAS DE BURROS E NÃO SÓ

Uma parte da minha vida foi passada com burros, com esses nem sempre simpáticos animais mas para os quais se guarda sempre um cantinho privilegiado nas nossas memórias. Dormia muitas vezes com o meu avô na arramada, na parte do palheiro próximo e salvo erro em dezenas de noites que lá passei em todos os anos só uma vez vi um burro «deitado» de joelhos porque sempre que acordava durante a noite os via de pé, sempre remoendo a palha na manjedoura, o que me levava a acreditar que os burros não dormiam.

O Jerico, esse meu paciente amigo suportava todas as minhas traquinices cavaleirescas com aquela paciência que só os burros têm. Queria eu à força que ele atingisse o galope e a velocidade de um cavalo no curto trajecto que nos levava da porta da casa da minha avó até a arramada. Sempre se recusou a fazer isso e ainda bem.

Quando montei uma égua pela primeira vez compreendi como era difícil ter mão nesses nervosos animais logo á primeira: em dias de trabalho usava-se até mesmo para os cavalos uma coisa que agora considero repreensível que eram as serrilhas nos cabrestos para funcionar como desmotivador do desabrochar nervoso do animal.

Umas vezes dava largas à arreata (rédeas era só terminologia para domingos e feriados) e ela entrava em trote; em resposta acabava por apertar demais e ela empinava. Mas nunca caí de cima de um animal o que por aqueles lados, com o pedregoso e o inclinado dos terrenos poderia ter sérias consequências.

O meu tio Afonso, já aqui referido numa crónica, GNR de cavalo, percorrendo montes e vales até à reforma, deu um tombo de uma mula espantada e ficou mesmo mal apesar de o terreno onde caiu ser um terreno de passagem constante e relativamente nivelado.

Contava-se por lá também, curiosamente nas proximidades do mesmo sitio em que o meu tio Afonso foi deitado abaixo pela mula, que o senhor Antonico, irmão da senhora Antonica, esposa do senhor V., tinha deixado cair dos seus braços e de cima do cavalo uma criança de colo que logo ali tinha ficado. Insistira com a mãe do bebé que queria pegar-lhe ao colo... Não se falaria nisso se não houvesse na história uma ponta de verdade embora o assunto não fosse muito falado: a capacidade daquela pobre gente em esquecer as coisas era de facto enorme.

[Cada vez se vê menos esta tarefa - ir pôr o burro a pastar. Foto JV. 2003]

Nunca me foi referido, por exemplo, por ninguém no monte, inclusivamente pelos familiares, a existência de um outro filho ou irmão naquela família que eu conhecia relativamente bem e com a qual me relacionava com relativa frequência. Só soube a história anos depois quando começámos a receber em Faro a visita de um simpático senhor que era de Alcaria Alta acompanhado da sua esposa. Trabalhava numa companhia aérea e tinha avião grátis pelo que desde a abertura do aeroporto e desde a sua reforma visitar-nos era um dos seus passatempos.

Tantos anos depois, e eu já com alguma capacidade de discernimento, fui somando, depois que me foi contada pela minha mãe a história, a ideia de que ele insistia daquela forma em mostrar que estava bem e que tudo estava ou deveria estar esquecido sem o referir embora não demonstrasse qualquer vontade de regressar à sua terra de origem nem em visita. Considerara -se morto para o Monte e o Monte morrera para ele.

Contada que me foi a história pela minha mãe, e tendo em conta que as minhas memórias têm um fio de curso que francamente desconheço acho que foi a parte do cavalo que referirei á frente que me fez relacionar este evento com o que foi dito atrás.

[Último burro de Afonso Vicente. Só pasta. Foto JV, 2005]

Aquele senhor simpático, uma jóia de pessoa, como se costuma dizer, com uma esposa igualmente humilde no trato e simpática, tinha, muitos, muitos anos antes, sido um género de terror do Monte. Aqui é preciso colocar as coisas em perspectiva: ele era miúdo, tinha alguma tendência para roubar e certamente que as coisas foram tratadas e vistas da forma a que estamos habituados também nos nossos tempos. Muita coisa lhe terá sido atribuída que ele não terá feito, certamente, e os empolamentos são sempre feitos pelo diz que disse.

Por aquilo que minha mãe contou ele foi «preso» no Monte porque foi apanhado a roubar um maço de tabaco, isto é claro depois de outras façanhas da mesma índole ou valor aproximado lhe terem sido atribuídas como será lógico. Aqui a importância do detalhe fez-me ficar a saber uma coisa que nem calculava sobre a polícia dos Montes: quem detinha a autoridade para a detenção era o habitante do Monte presente que mais recentemente tivesse acabado a tropa.

Era aquilo a que hoje se chama de detenção civil devidamente hierarquizada. Não sei até que ponto essa pessoa era responsável pela segurança do detido até chegada da GNR mas é de supor ter havido alguma violência e humilhação porque me lembro que a minha mãe referia com algum ênfase: «que ele, quando o montaram algemado na garupa do cavalo do GNR tinha levantado os dois braços no ar e tinha gritado que se viria vingar um dia e que os seus olhos tinham ficado raiados de sangue com uma vermelhidão luminosa.»

[Monte da Preguiça onde um "velho" agricultor não dispensa o precioso auxílio do burro. Foto JV, 2011]

Passada a parte com seguramente farta imaginação e bastante atavismo próprio da altura (talvez primeira metade do século XX) vim a saber também que ele utilizava uma cana com uma agulha de coser na ponta para picar e puxar os maços de tabaco pelo postigo do barbeiro, que vendia também tabaco, o que não deixa de ser imaginativo passe o humor perante circunstâncias que diabolizaram o então miúdo e o levaram a uma instituição em Lisboa que acabou por fazer dele um homem com mais recursos académicos e profissionais do que todos aqueles que o desprezaram um dia.

O facto de ele nos visitar deve ter começado por ser para ele uma acção custosa da primeira vez mas o grau de compreensão da minha mãe era suficientemente largo, embora eu notasse sempre que havia implícita nas conversas dele como que um pedido de desculpas pelo seu passado, quando na minha opinião quem lhe devia fortes desculpas era o próprio Monte, e que isso era coisa que parecia roer-lhe ainda a memória e que não conseguia esquecer. Havia ainda nele um desejo escondido e pouco manifesto de saber coisas do Monte e eu via-lhe o brilho nos olhos quando por aí se passava nas conversas.

Este, ao contrário do pessoal do Monte, que mais facilmente esquecia as coisas, as arquivava mesmo, não conseguia talvez 50/60 anos depois libertar-se dessa memória.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Miradouro em Alcoutim

(PUBLICADO NO JORNAL DO ALGARVE DE 19 DE AGOSTO DE 1977)





Escreve


Hilário Ventura



[Foto que acompanhou o artigo]

Miradouros são, salvo melhor opinião, pontos elevados que a natureza criou e em relação aos quais e pelos quais o homem tem predilecção especial.

São locais onde o ser humano pode entrar em êxtase e criar as condições interiores necessárias a uma aproximação mais íntima com Deus ou, se preferirem, com o obreiro das montanhas e dos vales, dos rios e dos oceanos, das nuvens e das estrelas, do sol e da lua.

São pontos de encontro que preparam ainda para voos mais altos. . São o elo de ligação entre a força bruta da matéria e a serenidade absoluta.

São ainda, e em última análise, pensões e hotéis onde se prepara e serve manjares que vão alimentar o ego psíquico ou espiritual.

O concelho de Alcoutim não possui homens que saibam e queiram alimentar-se destas iguarias tão benéficas contra certas doenças e, por isso, não compreendem nem sentem o seu significado. Falar deste pão, que é simultaneamente remédio eficaz contra alguns dos males que os afligem, é pregar no deserto ou, na melhor das hipóteses, ser tido por lunático, no sentido mais pejorativo do termo. Contudo, essa riqueza é real e altamente benéfica para os que dela se sabem. Podem e querem aproveitar.

Vivemos demasiado os problemas mesquinhos e anquilosantes da matéria para nos darmos conta dessa outra riqueza imensa que tanto bem-estar psico-somático nos traz. Somos um povo em letargia e fazemos questão de não nos divorciarmos deste estado cataléptico em que nos encontramos e no qual acabamos por nos sentir como peixe na água. Não concebemos tal despertar porque os músculos elevadores das nossas pálpebras, com que a natureza também nos dotou, de há muito se encontram em atrofia permanente.

O que conta hoje no homem envelhecido desta terra – que para as belezas do espírito, para as zonas elevadas do Belo e do Amor, não chegou a nascer – é a esperteza do macaco, a ferocidade do leão e a hediondice do porco.

Mesa e latrina, eis aquilo que fisiologicamente é imprescindível.

Fugir ou voluntariamente afastar-se desta dualidade orgânica, é ser visionista, lunático e imbecil , sem objectividade para os problemas concretos, e soluções concretas da vida real do homem, como matéria e enquanto matéria. Não ser terra-a-terra é ser anti-progressista e antidemocrático: é ser contra um Portugal rico e próspero. É, em suma, ser digno de todos os homens menos do de homem. Caduca ilusão!

Isto é, duma forma muito sucinta, aquilo que é e pensa o homem deste concelho, presentemente. Todavia, convém lembrar que o é põe herança radicada através de gerações e gerações.

Entrados que somos no último quartel do século XX, onde as viagens no espaço sideral são uma afirmação e uma realidade científica, onde o cérebro humano se dá ao luxo de descansar à sombra da bananeira só porque ligou o computador electrónico, é “quase” uma aberração da natureza, este contraste.

Nas “provetas” e “tubos de ensaio” do “laboratório” da Comissão Regional de Turismo do Algarve, onde os “reagentes” costumam ser eficazes nos processos de análise e de síntese do marco, do dólar, do franco e outros, poderia e deveria proceder-se, quanto antes a um aturado e sério exame de viabilidade de construção de um miradouro – e não só – em Alcoutim, onde existe local excelente e onde a tão propalada descentralização turística iria , por certo, encontrar ambiente propício para uma desejada e necessária expansão fiduciária.

Para os que andam sempre, ou quase sempre, em viagem alimentar, deixai-vos vir até aqui depois, descansar uns momentos. Deixai-os vir aqui bater as suas chapas e admirar este Guadiana tão esquecido e abandonado turisticamente. Deixai-os ser mensageiros de um abraço de etrna saudade para os seus irmãos Sena, Reno, Tamisa, Danúbio, Volga e tantos outros. Com certeza que eles irão ficar muito contentes por receber notícias deste seu irmão adormecido com o tesouro encantado.

E vós, senhores “analistas”, ireis dormir, descansados e ter sonhos cor-de-rosa. Sonhos maravilhosos que só são possíveis para quem se deita com a consciência do dever cumprido, depois de aturado exame de consciência, em relação a cada dia que passa.

Assim seja!!!

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Passeio pedestre - Quinta-feira, 8 de Dezembro de 2011



A Associação Amigos do Zambujal e Organizações Talefe vão organizar no próximo dia 8 de Dezembro, Feriado Nacional um passeio que tem por título “Por trilhos de outrora, passadas largas, na companhia das histórias do contrabandista e dos guardas-fiscais...”

Com encontro no Balurco de Baixo, EN 122, CAFÉ NIKO pelas 9 horas o percurso é de 15 km (com possibilidades variantes de 5 e 8). Estórias e Realidades. Locais emblemáticos. Um reviver o passado.

Almoço para associados – 5 €, não associados – 10 €.

Inscrições - aamigoszambujal@gmail.com ou TM 962194 394.

APROVEITE PARA CONHECER A REALIDADE DE OUTROS TEMPOS E PASSAR UM DIA INESQUECÍVEL.

domingo, 20 de novembro de 2011

O Outono - 2 (Poema)





Poeta


José Temudo





sábado, 19 de novembro de 2011

Algarve volta a mobilizar-se contra a fome

Pequena nota
É com todo o interesse que o ALCOUTIM LIVRE aceitou o pedido de divulgação do Banco Alimentar Contra a Fome (BACF).
Este pequeno espaço estará sempre ao dispor para divulgação da realização de actividades deste tipo.
Apesar das dificuldades que a grande maioria do povo português passa, é sempre possivel partilhar algo com alguém que mais precisa.


JV



A última recolha de alimentos deste ano do Banco Alimentar Contra a Fome (BACF) vai realizar-se nos próximos dias 26 e 27 de Novembro.

A fome é uma realidade que tem crescido um pouco por todo o nosso país e à qual os Portugueses não têm ficado indiferentes. O Banco Alimentar Contra a Fome é uma grande prova de que temos uma sociedade generosa e solidária que se supera mesmo nos momentos mais difíceis como aquele que agora atravessamos. Lembre-se que apenas na zona do Algarve foram mobilizados 2.000 voluntários e angariadas 189 toneladas de produtos alimentares na última campanha de recolha. Bens que foram distribuídos sob a forma de refeições e cabazes a cerca de 16.000 pessoas com carências alimentares comprovadas e através de 75 Instituições de Solidariedade Social previamente selecionadas para o efeito e supervisionadas pelo BACF.

“Graças à sua ajuda há cada vez mais sorrisos” é o lema e a mensagem da campanha nacional deste ano, que traduz, de uma forma simples, o sentido mais puro deste apelo à solidariedade dos Portugueses. Para participar nesta campanha, basta aceitar um saco do Banco Alimentar e nele colocar bens alimentares, essencialmente não perecíveis, tais como leite, conservas, azeite, açúcar, farinha, bolachas, massas e óleo e entregá-lo a um dos voluntários presentes nas cadeias de supermercados aderentes à recolha ou, em alternativa, efectuar uma doação online através do sítio: http://www.alimenteestaideia.net

Outra forma de estar presente nesta campanha é ajudando na recolha das contribuições feitas nos supermercados. Para ser voluntário poderá contactar o Banco pelo endereço ba.algarve@bancoalimentar.pt; voluntariosba@gmail.com ou pelos telm. 916526884 ou telf. 289 872 426.

Sobre a Atividade do Banco Alimentar Contra Fome

A atividade dos Bancos Alimentares Contra a Fome prolonga-se ao longo de todo o ano. Para além das campanhas de recolha em supermercados, organizadas duas vezes por ano, os Bancos Alimentares Contra a Fome recebem diariamente excedentes alimentares doados pela indústria agro-alimentar, agricultores, cadeias de distribuição e operadores dos mercados abastecedores. São assim recuperados produtos alimentares que, de outro modo, teriam como destino provável a destruição. Estes excedentes são recolhidos localmente e a nível nacional no estrito respeito pelas normas de higiene e de segurança alimentar. Deste modo, para além de combaterem de forma eficaz as carências alimentares, os Bancos Alimentares Contra a Fome lutam contra uma lógica de desperdício e de consumismo, apanágio das sociedades atuais.

Para mais informações contactar

Sede: escritório.ba@gmail.com
Urb. Stº António do Alto Lote 72 C/V 8005-101
Tel. 289 872426

Relações Públicas: Susana Guerreiro/email rpbacfalg@gmail.com / telm. 919574921

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

A Invasão de Junot no Algarve



Mais uma obra indispensável em qualquer biblioteca, pelo menos no Algarve. Que seja do meu conhecimento não existe na chamada biblioteca da Casa dos Condes, em Alcoutim, o que segundo o meu ponto de vista é uma falha.

A edição é de 1941 e há muito que se encontrava esgotada.

Consegui encontrá-la para uma consulta rápida em finais da década de 70 do século passado, numa biblioteca de Faro. Ainda que a leitura tivesse sido rápida e só de algumas páginas, por absoluta falta de tempo, mesmo assim fiz uma pequena citação a pág. 365 do meu livro, Alcoutim, Capital do Nordeste Algarvio (Subsídios para uma monografia), 1985.

A Invasão de Junot no Algarve (Subsídios para a História da Guerra Peninsular – 1808 – 1814) constituiu a tese de licenciatura de Alberto Iria em Ciências Histórico ou Filosóficas pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e foi editada pelo autor em Lisboa no ano de 1941 e segundo parece sem qualquer auxílio económico de qualquer entidade, já que não se alude a tal.

A edição que tive o gosto de adquirir é fac-similada da primeira edição, enriquecida com vários testemunhos sobre o autor, tendo uma tiragem de 500 exemplares e é da responsabilidade de Livro Aberto, Editores Livreiros Lda. 2700-193 – Amadora, 2004.

Adquiri-o na Livraria Letra Livre, Calçada do Combro 139, 1200-113-Lisboa.

O livro comporta 476 páginas de 17,5X24 e mais 70 de homenagem ao autor e que antecedem o trabalho.

Já o acabei de ler e agora fiquei com uma noção mais aproximada do que se passou no Algarve em tal período.

Encontrei mais umas tantas referências a Alcoutim, onde, o Juiz de Fora era partidário dos franceses.

Tive o prazer de conhecer e falar duas ou três vezes com o Dr. Alberto Iria que teve a amabilidade de me oferecer com dedicatória um dos seus trabalhos. Trocámos também alguma correspondência que guardo com todo o interesse. Era uma pessoa de grande simplicidade, tive ocasião de escrever sobre ele meia dúzia de palavras mo Jornal do Algarve quando faleceu e onde então eu colaborava.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Há 78 anos em Alcoutim !



Já se passaram 78 anos sobre a data em que esta fotografia foi tirada pois teve lugar em Agosto de 1933.

Quem conhece bem o local verifica que foi tirada na muralha do Castelo de Alcoutim, virada para Sanlúcar do Guadiana, apanhando como fundo aquela povoação do país vizinho.

Eu só vim a nascer cinco anos depois da foto ter sido tirada e desconheço o seu autor.

Confesso que só reconhecia a D. Clarisse Cunha. Por informação recebida, das três senhoras, a do meio é D. Berta Cunha e a que está ao seu lado a jovem Ricardina Temudo falecida na flor da vida.

O reguila do miúdo que se metia por todos os cantos, “segundo dizem as más línguas” é nem mais nem menos o decano dos nossos colaboradores, o poeta e prosador José Temudo, então com três ou quatro anos.

São fotografias como esta que ajudam a fazer a história ilustrada de Alcoutim.

A foto foi-me cedida pela minha Amiga alcouteneja Doutora Marina Themudo, a quem agradecemos.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

A matação do porco

Pequena nota
No nosso trabalho publicado há 26 anos sobre Alcoutim e o seu concelho incluímos na 3ª Parte – Notas Etnográficas e Folclóricas o tema “A “matação” do Porco que desenvolvemos nas páginas 307 a 309.

Em 1990 tínhamos preparada uma segunda edição e esse tema, naturalmente sofreu alguns ajustamentos. Ao ser lido agora para publicarmos no ALCOUTIM LIVRE verificámos que era necessário um novo ajustamento procurando manter o fundamental daquilo que então escrevemos. Estas coisas são mesmo assim, conforme o tempo vai passando vamos aclarando muitas situações e encontrando mais explicações para determinados procedimentos e adquirindo novos conhecimentos através de pesquisas e leituras adequadas ou novas ou que desconhecíamos.

JV



Trigo no celeiro, um palmo de hortejo e um porco na salgadeira, dizia-se que era condição suficiente para que um alcoutenejo se encontrasse “feliz” sem preocupações de maior.

Hoje a situação é naturalmente muito diferente - houve grandes modificações na vida. Como todos, este dito popular tem um sentido verdadeiro e está condicionado à vida exclusivamente agro-pastoril, que então pautava no concelho de Alcoutim.

O porco é um animal precioso, todas as partes do seu corpo, mesmo as entranhas, são comestíveis. Por outro lado, em salmoira, pelo fumo e com o auxílio da própria banha, conserva-se bem. Hoje, Alcoutim tem energia eléctrica em todo o concelho e nas últimas “matações” alguns destes processos foram substituídos. Deixaram de salgar para meter nas arcas congeladoras.

Criação fácil e rápida, com aproveitamento de resíduos de toda a espécie. Outrora, consumiam os excedentes agrícolas e o período especial de engorda era feito também com produtos criados pelo agricultor. Hoje, como se sabe, imperam as farinhas apropriadas. No campo, já pouco ou nada se colhe.

A carne de porco constituía uma pedra importante na alimentação do alcoutenense. Era assim que todos os que tinham uma vida virada para o campo, e não só estes, engordavam o seu porquito para matar.

No mês de Dezembro ou de Janeiro, por serem os mais frios do ano e isso evitar que as carnes se estragassem, depois de cevados, é a altura própria para o abate, a que o alcoutenejo chamava “MATAÇÃO” e não matança e que constituía um dia de festa.

Para o efeito, faziam-se adequados convites que englobavam familiares, compadres, vizinhos e pessoas a quem se deviam favores ou se pretendia demonstrar amizade.

Enquanto uns só lá iam para comer, outros eram “requisitados” fundamentalmente para prestarem a ajuda indispensável, vindo a pagar do mesmo modo.

No dia aprazado, logo pela manhã, os homens experientes iam buscar o suíno que agarravam e deitavam sobre uma banca ou um caixote bem seguro. Atadas as mandíbulas com uma corda, para o animal não morder, vinha o “matador” (1) que espetava a faca bem afiada com um golpe ágil e certeiro que atingia o coração. Da vítima jorrava o sangue apanhado num alguidar, tacho ou qualquer outra vasilha onde se tinha colocado sal e vinagre e que se ia mexendo para não coalhar. É tarefa destinada às mulheres.

Por perto havia uma pequena mesa onde estavam copos e uma garrafa de aguardente para os homens se servirem como “mata-bicho”.



Musgá-lo era a tarefa seguinte, isto é, queimá-lo com tojos apanhados nas redondezas e a que se lança com facilidade o fogo. Nos últimos tempos esta operação era feita com um maçarico.

Seguia-se o raspar do couro, trabalhosa operação feita com uma lata ou pedra, auxiliada por água bem quente oriunda das panelas, muitas vezes de zinco, que estavam ao “fogo”.

Procedia-se à extracção das unhas.

Em tempos antigos, o rabo era entregue aos moços que o comiam assado.

Tarefa para homem “especializado” era a abertura e desmancha do animal.



As tripas seguiam para o barranco mais próximo, que em tempo idos corriam bem, onde eram lavadas pelas mulheres. Viravam-nas com o auxílio de uma cana. Temperadas com rodelas de laranja para que tivessem melhor cheiro e paladar, iam servir para os enchidos.



Extraíam todas as vísceras a que se dava o destino adequado.

Uma balança de vara, tipo romano, era utilizada para determinar as arrobas e a que normalmente se seguiam alguns comentários relacionados com o peso.

Procedia-se à desmancha, carne magra para um lado, mantas de toucinho para o outro.

Os presuntos iam para a salgadeira, bem enterrados em sal grosso e sobre os quais se colocavam pedras suficientemente pesadas a fim de evitar que se estragassem. Meses depois, com a cura já feita, eram barrados com pimentão e pendurados.

Pelas duas ou três da tarde, chegava a hora da “fritada” ansiosamente esperada.

Nela entrava todo o tipo de carne, gorda ou magra, não esquecendo a cachola.

Temperava-se com alho pouco antes de estar concluída.



Depois deitava-se o sangue a que se tinha juntado vinagre e que se temperava agora é temperado com cominhos, louro e pimenta. Ficava assim preparado um outro tipo de comida a que chamam “moleja” e que é muito apreciada.

Havia quem deitasse algumas batatas na “fritada”.

Com a carne picada, faziam-se chouriços de carne, de sangue e belos “palaios” (paios).



Não faltava a “amassadura” de saboroso pão e o vinho “caseiro” regava o repasto contrabalançando o efeito da gordura, as gargantas sequiosas e os estômagos “agoniados”.

A “matação” do porco foi algo que começou a desaparecer mesmo antes das restrições impostas por lei.

Já serão bem poucos os porcos mortos anualmente no concelho. Primeiro, porque a vida agrícola está praticamente desapareci, segundo pelos que restam no concelho serem idosos e já não poderem desempenhar tais tarefas e terceiro os poucos novos existentes vão ao talho, compram e metem na arca.

NOTAS
(1) - Havia homens “especialistas” nesta arte que eram requisitados para o efeito, optando-se, obviamente pelos mais próximos.
(*) A reportagem fotográfica é de L.M.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

O rodo mineiro

O rodo é um utensílio que serve principalmente para juntar qualquer coisa que se pretende recolher e isto em situações muito variáveis.

As matérias de que é feito são diferentes dependendo do fim a que se destinam.

O primeiro rodo de que me apercebi era todo em ferro e destinava-se a retirar das sarjetas as pedras e outros objectos que iam lá parar e ficavam retidos. Parece que ainda estou a ver o funcionário municipal, um velhote já curvo com uma espécie de camisa de chita aos quadrados azul e branco que tinha bordado a vermelho CMS identificando a Câmara para quem trabalhava.

Além do rodo trazia um cântaro de folha zincada para fazer a recolha da água nas bocas-de-incêndio a fim de proceder à limpeza das sarjetas, o que era feito com muita regularidade.

Depois vim a conhecer o rodo de madeira que aqui já apresentei e se destina a puxar a cinza nos fornos de cozer pão. Há o rodo para o sal nas marinhas e também o havia para recolha dos cereais nas eiras assim como os há para recolher o dinheiro nas mesas de jogo.

O que apresento tem uma configuração muito própria, é robusto e encontrei vários muito semelhantes na freguesia de Alcoutim, desconhecendo se existem nas outras do concelho.

Interroguei-me sempre quanto à sua utilização e só recentemente alguém referiu ser um rodo usado pelos mineiros para juntar o mineral, o que pesquisas posteriores confirmaram.

O exemplar fotografado, com mais de um século de existência, era efectivamente propriedade de um antigo mineiro, nascido em 1842 e que trabalhou na mina de S. Domingos.

Como desta zona trabalhou muita gente naquela mina, está aqui explicada a sua existência na freguesia de Alcoutim.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Monte dos Gagos, um caso semelhante aos montes alentejanos



Foi dos últimos montes que conheci no concelho, o que aconteceu em 2010, pois só recentemente foi activado e teve acesso por veículo automóvel.

Tive conhecimento da existência deste monte por volta de 1970 quando ao consultar vários Anuários Comerciais dos princípios do século passado me apareceu GAGOS como povoação da freguesia de Martim Longo, o que, entretanto, veio a desaparecer em números mais recentes que consultei na altura e que penso, o último ser referente ao ano de 1966.

Julgo que isso aconteceu por ter deixado de ter moradores.

Quando comecei a pesquisar nos registos paroquiais de meados do século XIX do concelho de Alcoutim existentes no Arquivo Distrital de Faro, começo a encontrar movimento neste monte no que respeita a baptismos (nascimentos) e óbitos e mesmo casamentos.

Como exemplo direi que em 18 de Setembro de 1840 nasceu neste monte Mariana, filha de Domingos dos Santos e de Júlia da Conceição, aqui moradores, neta paterna de Joaquim dos Santos e de Joaquina Maria, dos Castelhanos e materna de Manuel Martins e Custódia Martins, dos Gagos.

Como a criança estivesse em riscos de vida, foi baptizada por Ana da Palma daquele monte que veio a ser sua madrinha quando se lavrou o assento na matriz de Martim Longo em 24 daquele mês.

Em 1758 (Memórias Paroquiais) aparece referido como Monte da dos Gagos mas o pároco de Martim Longo que respondeu ao questionário só indicou o número de vizinhos no seu conjunto e segundo os analistas tê-lo-ia feito de maneira incorrecta.

Gago que funciona para definir quem tem defeito na fala, depois de ter sido utilizado como alcunha acabou muitas vezes por ser anexado ao próprio nome tornando-se assim num antropónimo. Possivelmente foi o que aqui aconteceu. O “monte” que parece ter tido sempre a característica de monte alentejano teria pertencido à família dos Gagos e daí a designação.

Quem vem de Alcoutim ao aproximar-se de Martim Longo encontra à direita a indicação de Monte dos Gagos e no lado oposto, ou seja à esquerda, a indicação de Penteadeiros.


A Companhia das Ervas de Martim Longo explorou um terreno nas proximidades deste monte para a plantação de algumas das espécies. (1)

Sei que a sociedade recebeu 700 contos de prémio para apoio da actividade (2) mas que penso hoje já não existir, pelo menos nunca mais li qualquer referência à mesma.

O monte que tem um único fogo, e nem sempre habitado, nele funcionou um restaurante, presentemente fechado.

Tem energia eléctrica e furo artesiano da responsabilidade do proprietário.

_____________________________________

NOTAS
(1) – “Mulheres de Martinlongo cultivam plantas medicinais”, João dos Reis, Correio da Manhã de 12 de Março de 1994, p.12
(2) – “Entrega de Prémios de Jovens Agricultores do Concurso/92”, Correio do Ribatejo de 8 de Março de 1992.

domingo, 13 de novembro de 2011

Casamentos na Freguesia de Alcoutim em 1839

[Igreja Matrz - Des. JV]
Ainda só dispusemos de oportunidade para pesquisar os assentos de casamento da freguesia de Alcoutim e gostaríamos de os pôr em paralelo com o que se passou nas restantes freguesias, mas por agora não possuímos esses elementos.

Só se efectuaram 13, pouco mais de um por mês, em média. O maior número teve lugar no mês de Maio [4] seguido de Fevereiro com [3] e de Janeiro com [2]. Nos meses de Março, Julho, Outubro, Novembro e Dezembro não se realizou qualquer acto deste tipo e nos restantes meses apenas um teve lugar.

O que consideramos diminuto em relação ao ano de 1839, hoje e na mesma freguesia seria um número muito elevado. São os tempos...

Dos 26 nubentes 23 eram da freguesia, 1 da do Pereiro e dois de Sanlúcar do Guadiana. Pelos nomes deviam ser portugueses a residir naquela povoação e que quiseram vir casar ao seu país. Resta saber se por lá ficaram, como aconteceu a muitos ou se regressaram.

Dos nomes dos nubentes destacam-se 8 Marias, 5 Manueis, 4 Antónios, 2 Josés e duas Domingas, completando o leque com Francisco, Bárbara, Inês, Joaquim e Isabel.

Domingas e Bárbara, nomes não muito vulgares noutras zonas continuando a existir por estas bandas como os alcoutenejos sabem.

Outra curiosidade, que os números e os nomes apresentam, é que entre os nubentes não existe ninguém da vila! O maior número vai para Cortes Pereiras [8]. Balurcos com [5], Laranjeiras [3], Afonso Vicente [2], Sanlúcar [2] como já dissemos e [1] para cada uma das seguintes povoações, Palmeira, Corte da Seda, Vascão, Corte Tabelião e Tacões perfazem o número restante.

Pelos números apresentados já se verifica a importância populacional de dois pólos, Cortes Pereiras e Balurcos.

[D. Maria II]
Outra curiosidade que retirámos da pesquisa efectuada é o facto de no dia 1 de Maio se terem realizado dois casamentos. Manuel Dias do Balurco de Cima casou com Maria Henriques das Laranjeiras e um irmão desta, Manuel Henriques casou com Domingas Afonso, do Balurco de Cima e irmã de Manuel Dias.

Ainda hoje essas coisas acontecem mas não deixa de ser curioso.

Este período era politicamente muito instável no país com revoluções e contra revoluções permanentes. Governava então D. Maria II.

Todos estes nubentes deveriam ter ouvido falar de Remechido que passou por estes sítios com os seus homens o qual veio a ser executado na cidade de Faro em 1838.

Foi celebrante dos actos o Padre Encomendado António José de Freitas (tio) (1796-1872) que era natural de Alcoutim e sepultado no cemitério da vila.

sábado, 12 de novembro de 2011

Amigos de Alcoutim querem que o concelho progrida

Pequena nota
Deste grupo de alcoutenejos faziam parte entre outros os alcoutenejos Eng. Gaspar Santos, nosso Prezado Amigo e Colaborador e o Dr. Álvaro Fernandes, infelizmente já falecido e foram os dois que fizeram a entrega do documento no jornal.
JV


(O SÉCULO DE 14 DE OUTUBRO DE 1974)



(*)[Alcoutim e Sanlúcar vistos de Espanha]


Substituição do grémio da lavoura por outra entidade, com atribuições mais vastas; arborização de vasta área; emparcelamento de terras; criação de infraestruturais viárias, eléctricas, de águas, de esgotos e de turismo; abertura da fronteira com a Espanha na sede do concelho (como aconteceu até 1936) – eis os pontos de uma proposta para reestruturação do concelho de Alcoutim, elaborada por um grupo de naturais e amigos desta vila.

No documento, que nos foi entregue por uma delegação, lê-se:

"A população do concelho é actualmente pouco superior a 6 000 habitantes, quando era de 15 000 em 1950, antes do surto da emigração interna e externa. A base económica actual é o remanescente de uma agricultura e pecuária arcaicas, ajudada pela colheita de amêndoas, alfarrobas e laranjas. Há meio século teve uma pecuária e produção de ovos intensa, havendo mesmo um tipo de bovinos oriundo daqui. Até 1936, havia mercados, em que participavam criadores espanhóis. Os seus terrenos pauperizaram ou foram erodidos, vítimas da “Campanha do Trigo” lançada cerca de 1933, e para a qual lhe escasseavam as condições. A estrutura agrária é de pequenas explorações familiares, com as propriedades muito divididas e dispersas. Nem há grandes propriedades, nem há hoje um assalariato rural muito numeroso como já existiu: emigrou."

Os amigos de Alcoutim, aludem ao facto de se não tratar de "uma agricultura capitalizada", tendo-se atrasado, por esse motivo "tecnicamente e na iniciativa, que se poderia ter aproveitado arborizando". Acrescentam:

"As aptidões económicas, que não estão aproveitadas, mas que se sabe existirem, prendem-se naturalmente com a agricultura e a pastorícia, bem como ao turismo (a paisagem natural das margens do rio é surpreendente e óptima para a pesca e a caça).

Dentro das aptidões, sobressaem, como possíveis de desenvolvimento económico e criação de emprego, a arborização, com amendoeira e alfarrobeira, pereiras e outras espécies adaptáveis e a pecuária e indústrias que se lhes ligam, como os apreciados queijos. Mas para lançar algumas iniciativas, para que não progrida a desertificação de uma vasta zona, quer de espécies vegetais, quer de espécie humana, é necessário criar-se uma entidade dinamizadora "(...)

A terminar, diz-se serem as sugestões válidas para toda a serra algarvia e até para enorme área do Baixo-Alentejo.

Apela-se para o apoio dos poderes centrais dada a falta de capitais privados e da iniciativa e por outro lado, atendendo ao exíguo orçamento das câmaras municipais.


(*) - Era esta a zincogravura que o jornal possuía para ilustrar algo que se escrevesse sobre Alcoutim.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Chegámos às 60 000 !



Pelas 18 horas de ontem o ALCOUTIM LIVRE alcançou as 60 MIL VISITAS, número irrisório para alguns blogues, mas muito significativo para nós. DEFENDEMOS O NOSSO ESPAÇO E NÃO NOS PRETENDEMOS CONFUNDIR COM NINGUÉM.

O número foi alcançado após 3 Anos, 3 Meses e 18 Dias de existência.

Estas últimas 10 mil visitas foram as mais rápidas de alcançar pois só foram necessários 3 meses e 16 dias.

A média diária neste período de tempo foi de 94,34 tendo ultrapassado a anterior em 9,6 o que é um aumento considerável.

A média diária, desde o início, passou para 49,87.

O número de postagens, que já vai em 954, teve neste período 108, o que representa praticamente uma por dia.

O número de países que nos visitaram é de 84, por isso, mais quatro do que no balanço anterior.

É importante o contributo vindo do Brasil pertencendo-lhe 13,7 % das visitas expressas.

Os cinco TEMAS mais movimentados são:- Câmara Escura (90), Etnografia (89), Escaparate (74), Ecos da Imprensa (61) e Geral (50).

Continuamos a ter o precioso contributo dos nossos colaboradores que com os seus textos diversificados arejam o conteúdo deste espaço.

Alerto para a circunstância de alguns temas se aproximarem do fim como acontece com os montes do concelho, quase concluído.

NADA NOS FARÁ MUDAR DE RUMO, PROCURANDO DAR A CONHECER COM VERDADE ESTE CONCELHO DO NORDESTE ALGARVIO, RECEBENDO EM TROCA APENAS E SÓ A SENSAÇÃO DO DEVER CUMPRIDO.

Não podemos terminar sem ter uma palavra de agradecimento para os nossos visitantes / leitores que acabam por ser o suporte indispensável deste espaço. Sem eles isto já teria acabado há muito.

Juntamos como é habitual um gráfico explicativo.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

"Pecados" de antigamente...





Escreve

Amílcar Felício




[Rua Portas de Mértola. Foto JV]

Ia com ela ao poejo umas vezes ao Barranco da Amarela outras, ao Barranco do Poço das Figueiras. Às vezes até nos aventuravamos pela ribeira acima até quase ao Pego da Arvela, junto às velhas passadeiras das Cortes Pereiras.
Perguntava-me sempre antecipada e delicadamente, “então e quando é que queres ir com a vizinha ao poejo”? “Quando a vizinha Francelina quiser”, respondia-lhe eu quase sempre... E lá íamos nós de tempos a tempos apanhar aquela planta silvestre, tão apreciada pelo paladar alcoutenejo.

Esta prática de utilização de plantas silvestres na gastronomia alentejana e certamente por “contágio” na serra algarvia, remonta aos séculos XV e XVI aos tempos das grandes navegações, cujo principal produto de comercialização eram as especiarias. Claro que a imaginação popular como sempre, sem grandes posses para adquirir tais luxos só acessíveis às classes mais abastadas na altura, rapidamente se desenrascou inventando alternativas com a prata da casa que não lhe ficariam nada atrás, diga-se de passagem.

Esses condimentos populares inventados em tão boa hora, fazem nos nossos dias as delícias dos gostosos sabores da tradicional cozinha alentejana e da serra algarvia, à base das mais variadas plantas aromáticas tão abundantes no Alentejo.

Já agora por falar de imaginação, repare-se na quantidade de pratos tão diversificados que os alentejanos confeccionam só com o pão! São as migas, a açorda, o gaspacho, as sopas de tomate etc., é um nunca mais acabar de saborosos pratos tão diferenciados mas embrulhados com o mesmo produto. Lá diz o povo com razão que “a necessidade aguça o engenho” e que engenheiros que estes alentejanos me saíram!

[Rua da Misericórdia e o "monstro". Foto JV]
Ou então por curiosidade mencionemos a origem do prato típico alentejano -- a célebre “sopa de cação” -- numa zona de sequeiro já repararam? Tratava-se de facto nem mais nem menos de peixe sem valor comercial, que os pescadores no Algarve davam nos meados do séc. XX a quem ia vender peixe ao Alentejo e que estes distribuíam ou vendiam depois a baixo preço às famílias mais pobres. Assim nasceu mais um prato típico alentejano que ainda hoje constitui um cartão de visita!

A minha vizinha Francelina passava o dia em casa à janela a ver quem passava, pois não tinha amigas e era considerada uma “pecadora” inveterada vítima de censura popular implacável, apenas porque gostava de beber o seu copinho de vinho. E não se pense que exagerava por aí além, pois a garrafinha que usava para se abastecer teria os seus 250 ml quanto muito. O único passeio de que desfrutava era comigo, ou ao Barranco da Amarela ou ao Barranco do Poço das Figueiras, para apanharmos poejos.

Mas uma mulher gostar de vinho naqueles tempos era obra do Diabo, um pecado mortal que marginalizava automaticamente quem praticasse tal sacrilégio. Fazia-me confusão tanta má língua das pessoas, certamente uma falsa maneira de fazerem sobressair as suas virtudes... O ostracismo a que era votada levava-me naturalmente a acarinha-la e a estender-lhe a mão e era comigo que ela vinha ter quando as coisas se complicavam mais.

Os tostões lá em casa dizia-se, tinham todos o destino contado para não alimentar “vícios”. Assim e nas alturas de crise à socapa lá lhe enchia a garrafinha na taberna do meu avô, dando-lhe o simples prazer de beber um copo. E como ela ficava feliz com tão pouco! Foi um segredo que ficaria guardado entre nós para a vida, até hoje claro. Mas se ela ainda por cá andasse, perdoava-me com certeza esta escorregadela. Como a vida era difícil...

Contudo, certo dia a vigilância apertou de tal maneira que nem eu tinha qualquer possibilidade de fazer o que quer que fosse. Até que ela se lembrou: “olha lá Amílcar, arranjei cinco tostões e vais à Venda do Sr. Simões comprar cinco tostões de vinho para a vizinha, mas não digas para quem é”! E lá fui eu sorrateiro à Venda do Sr. Simões fazer o recado.

Claro que os “habitues” acharam aquilo estranho “em casa de ferreiro espeto de pau” e ver-me ir comprar vinho a outra Venda levava água no bico e claro toca de apertar comigo, tens que dizer para quem é o vinho etc. e tal se não o Sr. Simões não te avia. E o Sr. Simões que era danado para a brincadeira (andou anos e anos a tentar convencer-me de que tinha uma árvore que dava rebuçados!) depressa anuiu ao desafio e tanto apertaram comigo que na minha ingenuidade dos 4 ou 5 anos lhes respondi: “a minha vizinha Francelina não quer que eu diga...” Acho que foi a única vez que me descaí...

A Tia Albertina também era considerada uma “proscrita” porque gostava de fumar a sua cachimbada às escondidas claro, por causa das más línguas...
Se nos perguntarmos hoje quem é que ainda não viu uma menina ou uma senhora, beber um copo ou fumar uma cigarrada num café ou numa explanada, com certeza que não há ninguém que não tivesse assistido a uma banalidade destas! Mas quantas meninas ou senhoras saberão dar o valor a este simples gesto de liberdade individual, sem o peso da censura popular terrível que existia naqueles tempos?
A volta que isto levou culturalmente no curto espaço de uma só vida...