sábado, 29 de janeiro de 2011

Festejando o S. Martinho em 2010

Faz parte das minhas tradições festejar o São Martinho com a abertura de água-pé, uma bebida que muito aprecio quando efectivamente é água-pé, com graduação à volta 6/7 graus e não vinho. Tem de constituir a água do pé mas que naturalmente tivesse sido mal espremido para assim conter algum mosto.

O lugar de fermentação deve ser fresco e não conter qualquer outro produto que não seja este a fim da fermentação não ser influenciada por cheiros e odores estranhos.

Apesar de um percalço ocorrido durante a fermentação, a que escapou estava como é habitual, bem cozida e com bom paladar.





A acompanhar-nos, tivemos o grande prazer de ter um casal Amigo, amizade que a escrita proporcionou.

A água-pé foi aberta no dia 11 de Novembro pelas 10 da noite, cozeram-se as castanhas e bebemos uns “canecos”. Um jarro deu para p três! Afinal bebemos pouco!

Esta postagem é dedicada àqueles dois bons amigos, entrados na idade (o que não parece) mas jovens de espírito, ou não se tratasse de um poeta!

Aqui lhe deixamos um grande abraço com votos de boa saúde.

Como pequena nota complementar dizemos que AGUA-PÉ ALCOUTIM LIVRE é das postagens mais visitadas neste blogue.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Recortilha




Estas duas peças não são originárias de Alcoutim. A de cima, em metal (amarelo) é largamente centenária e sofreu uma pequena reparação, pelo menos, há mais de sessenta anos. Hoje constitui para mim uma relíquia e é uma peça de museu. Ainda que o orifício onde gira a roda dentada esteja já um pouco largo devido ao uso, caso haja necessidade ainda está funcional.

O outro exemplar, em oposição, é dos nossos dias e um misto de madeira torneada (cabo) e metal branco.

Entre estes dois modelos existe outro que era o mais vulgar e todo em madeira trabalhada ao torno, incluindo a roda.

Eram vulgarmente designadas por “cartilhas” destinando-se ao corte da massa estendida, desenhando assim as peças para fritar.

Em tempos mais recuados, nem todas as casas tinham esta peça, que além de ser relativamente cara para muitas bolsas, também não se encontrava a vender com facilidade.

Quem não as tinha, não deixava de fazer filhós por causa disso ,pois cortava a massa com uma faca e tinha o problema resolvido.

O problema de hoje não se prende com a recortilha, ao alcance de qualquer bolsa, mas sim com o fazer a massa, que os jovens na grande maioria não deseja aprender, sendo mais fácil comprar as filhós na pastelaria da esquina.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Fernandilho, mais um antropónimo que deu origem ao topónimo



Já aparece referido nas Memórias Paroquiais de 1758 com 7 vizinhos, o que na altura constituía um número médio da freguesia.

Situa-se próximo da margem direita da Ribeira de Odeleite, passando-lhe a nova estrada entre o “monte” e a ribeira. Por sua vez a povoação que tem dois acessos, é atravessada por um barranco que vai desaguar à Ribeira de Odeleite.

Pertence à freguesia de Vaqueiros mas até à reforma administrativa (1836) pertencia ao termo de Tavira.

Situa-se a 40 km de Alcoutim, sede do concelho e a cerca de 10 da sede da freguesia a que pertence.(1) Quem estiver na aldeia de Vaqueiros tomará a E.M.- 506.

O ramal Bentos – Fernandilho, Taipas e outros foram postos a concurso em princípios de 1992.

A povoação recebeu a energia eléctrica em 12 de Dezembro de 1984 (2)

Em 1995 foi aberto um caminho rural com início nesta estrada, na distância de 3 km e que chegou à zona do Barranco da Laje. (3)

Este topónimo único no país é segundo José Pedro Machado um diminutivo de Fernando (4). Parece revelar influência castelhana local (5). Quem foi o tal Fernandilho ou Fernandinho que terá dado origem à pequena povoação é que não será fácil saber.

Fernandinho há vários espalhados pelo país, tal como Fernando e o patronímico Fernandes.

Em 1995 é instalado o telefone público (6) e um ano depois tem lugar o painel de caixas do correio (7).

Procedeu-se à reparação do lavadouro público com a colocação de novos tanques. (8)

[Outro aspecto do "monte" do Fernandilho. Foto JV, 2010]

A construção de um aqueduto para regularização das águas teve lugar em 2002. (9)

Em 2004 é colocada água ao domicílio, (10) ainda que não exista o indispensável saneamento básico.

A construção do parque de merendas tem lugar em 2005 tal como a recuperação do antigo poço público. (11) Os arruamentos são melhorados no ano seguinte. (12)

Foi inaugurada em 15 de Julho de 2006, nesta povoação, a Cooperativa Agrícola de Rega que abrange os “montes” de Fernandilho, Taipas, Alcarias e Bentos e que contava na altura com 40 associados e que tem como principal objectivo a construção de uma barragem, possibilitando assim a rega de terrenos agrícolas. (13) Entretanto está a construir-se um açude com uma capacidade de retenção de 1500 m3 de água.

Em 1991 o Censo Populacional atribui-lhe 46 habitantes e dez anos depois, são 41. Hoje, pouco passarão de trinta.
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NOTAS
(1) – Google Earth
(2) - Jornal do Algarve de 27 de Dezembro de 1984.
(3) – Alcoutim, Revista Municipal nº 1, Maio/Junho de 1995
(4) – Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, Horizonte/Confluência, II Vol. p. 634
(5) – Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Vol. 21, p. 160
(6) – Alcoutim, Revista Municipal nº 1, Maio/Junho de 1995
(7) – Alcoutim, Revista Municipal, nº 4 de Dezembro de 1996, p. 12.
(8) – Alcoutim Revista Municipal, nº 8 de Setembro de 2001, p. 13
(9) – Alcoutim, Revista Municipal nº 9 de Dezembro de 2002, p. 8
(10) – Alcoutim, Revista Municipal, nº 11 de Janeiro de 2005, p. 9
(11) – Alcoutim, Revista Municipal nº 12 de Dezembro de 2005, pp 15 e 16.
(12) – Alcoutim, Revista Municipal nº 13, de Dezembro de 2006, p. 13
(13) – Alcoutim, Revista Municipal, nº 15 de Julho de 2009, p. 16

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

D. Pedro de Meneses, 2º Conde de Alcoutim, homem culto e requintado

Pequena nota
O presente escrito é uma adaptação, com pequenas alterações, do artigo que publicámos no Jornal do Baixo Guadiana, nº 85, de Maio de 2007 e que tinha por título:-“ D. Pedro de Meneses, 2º Conde de Alcoutim – um bom patrono para a Escola Básica Integrada local” já que os dados que referimos sobre a figura, para mim são quase os mesmos que hoje possuo.
Certamente que os responsáveis entenderam que a hipótese apresentada não reunia condições para tal, continuando à espera que surja efectivamente um nome que mereça tal distinção, o que poderá não levar muito tempo a encontrar.
A título puramente informativo podemos dizer que desde Maio até hoje a postagem “D. Fernando de Meneses, 1º Conde de Alcoutim (3 de Abril de 2009)” é a grande distância de todas as outras, a mais procurada no ALCOUTIM LIVRE. Porquê, não sei.

JV

Dos seis fidalgos que usaram o título de Conde de Alcoutim, parece-nos ser este o que no âmbito nacional atingiu maior projecção, já que é considerado uma pessoa com boa formação em todos os aspectos que na época eram importantes e próprios de uma figura de prestígio.

Os genealogistas e historiadores dão-no como tendo nascido provavelmente em Ceuta em 1487 (em 16 de Abril a sua mãe encontrava-se em Alcoutim) e falecido em Santarém em 1543, por isso, com cerca de cinquenta e seis anos.

Além de 2º Conde de Alcoutim, era 5º de Vila Real, e 3º Marquês do mesmo título, 2º Conde de Valença, 5º Capitão de Ceuta e Alcaide-mor de Leiria.

À Casa de Vila Real pertencia a tença da Judiaria de Alcoutim.

Entre muitas outras, foi Senhor das vilas de Valença, Caminha, Valadares, Almeida, Alcoentre, Chão de Couce, Pousaflores, Maçãs de D. Maria, Vagos, Azurara e Pindelo.
Toma o título de Conde de Alcoutim em 1499 quando lhe falece o avô, por isso, com cerca de doze anos e é com essa idade que dá uma lição pública de Retórica na Universidade de Lisboa.

Aos dezassete e com a presença do Rei D. Manuel, pronunciou em latim a oração solene da abertura da Universidade de Lisboa.

Foi discípulo do humanista siciliano, Cataldo Parísio Sículo, que o exalta como modelo de fidalgo renascentista. Foi igualmente aluno de Simão Vaz.

É considerado um insigne latinista tanto em prosa com em verso.

De 1512 a 1527 foi capitão e governador de Ceuta, funções que desempenha com valor militar.
Casa em Dezembro de 1519 com a sua prima D. Brites de Lara, filha do Condestável de Portugal, D. Afonso, filho bastardo do Duque de Viseu, D. Diogo e da Marquesa de Vila Hermosa, sobrinho de D. Manuel I e de sua mulher D. Joana de Noronha.

Deste casamento nasceram cinco filhos, vindo a ser o primogénito o 3º Conde e o secundogénito, 4º , por falta de descendência do irmão. D. Joana de Lara veio a ser pelo casamento, Duquesa de Aveiro; D. Bárbara de Lara, Condessa de Castanheira e D. Maria de Lara foi freira no Convento de Santa Clara, de Santarém.

D. Pedro de Meneses é apresentado como destro e generoso para com os adversários no jogo das canas, toureiro hábil, matando de uma estocada certeira. Bom dançarino, cantor e tocador de harpa. É assim que o define Cataldo Sículo.

Em 1524 e devido ao falecimento de seu pai ocorrido em Almeirim, já possui o título de Marquês.



Em 1526, sai de Lisboa à frente da embaixada que irá entregar a Infanta D. Isabel, irmã do Rei D. João III, a seu marido o Imperador Carlos V da Alemanha ou Carlos I de Espanha.

Esperava receber o título de Duque, o que não veio a acontecer.

[Monumento na Cidade de Ceuta a D. Pedro de Meneses, ascendente dos Condes de Alcoutim]

Em 1534 já se encontrava restaurada a Ermida de Nª Sª da Conceição, na vila de Alcoutim, o que foi feito pelos moradores com o auxílio do 3º Marquês de Vila Real com a dádiva de sessenta e três mil reais. No interior do templo, lá estava a divisa “aleo”.

Igualmente não passa despercebida a mesma divisa em brasão que encima o portal da igreja matriz da vila de Alcoutim.

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BIBLIOGRAFIA

História Genealógica da Casa Real Portuguesa, António Caetano de Sousa, Vol. II, Edição QuidNovi/Público – Academia Portuguesa da História

Enciclopédia Verbo-Luso Brasileira de Cultura. – Edição Séc. XXI

Nobreza de Portugal e do Brasil, Edições Zarol

Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira

Estudos sobre o Século XVI, Américo da Costa Ramalho, 2ª Edição, IN-CM, 1982

História do Ensino em Portugal, Rómulo de Carvalho

Azurara, Subsídios para a sua monografia, Bertino Guimarães, Eugénio Freitas e Serafim Neves, Porto, 1948.

“Visitações” da Ordem de Santiago no Sotavento Algarvio, Hugo Cavaco, 1987

Dicionário Ilustrado da História de Portugal, Publicações Alfa, Vol. II, 1985.

Archivo Historico Portuguez, Anselmo Braamcamp Freire, Vol II, Lisboa, 1904.

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

O Ensino Primário nas Cortes Pereiras

Antes do ensino primário oficial chegar às Cortes Pereiras, apareciam os chamados mestres de escola que procuravam transmitir o pouco que sabiam a troco de alguns escudos ou de produtos agrícolas, conforme as possibilidades de cada um e o contrato formulado.

Um velho amigo, (1) nascido em 1917 nas Cortes Pereiras e que fez exame da 4ª classe, deslocava-se diariamente à vila, onde estava matriculado na escola, tendo sido aluno do prof. Trindade e Lima.

Segundo me informou outro amigo de Afonso Vicente e há muito falecido, (2) já havia escola oficial nas Cortes Pereiras em 1929, visto ele ter passado do posto de Sta. Marta, que frequentava, para a escola das Cortes que, entretanto, tinha sido criada.

[2ª lugar onde funcionou a escola, no Monte Longo. Foto JV, 2009]

Dizem-me que a escola teria começado a funcionar numas casas no Monte Longo que eram propriedade de António Gomes Alves e como este tivesse tido necessidade delas, cedeu uma divisão para a professora exercer o seu ministério, nas casas onde vivia e que recentemente foram restauradas, igualmente no Monte Longo. Exercia as funções a professora oficial, Maria José Correia.

Houve grandes confusões com esta nova mudança, pois tratando-se de uma casa agrícola havia movimento e os alunos não se concentravam, o lavrador António Gomes Alves resolveu oferecer o terreno necessário, se o povo assim quisesse, para construir uma escola onde o ensino pudesse ser praticado.

A população apoiou a ideia e com o dinheiro de uns e o trabalho de outros depressa puseram as quatro paredes de pé e que ficaram constituindo a escola por onde passaram gerações e gerações de cortes-pereirenses.

Na sua frente fizeram um pequeno pátio que constituía o recreio das crianças.

[Edifício construído pelo povo para funcionar a escola primária, hoje sede da Associação "Unidos do Monte". Foto JV, 2010]

Pelos elementos que me têm fornecido, esta escola deverá ter iniciado as suas funções em 1934 e nestes anos António Gomes Alves era vogal da comissão administrativa da Câmara Municipal de Alcoutim e foi-o por largos anos.

A professora Maria José Correia que exerceu o lugar por vários anos foi substituída pela professora Maria Celeste Martins que exercia essas funções pelo menos em 1954/1956. (3)

Em meados do século XX a população começa a descer com o abandono das terras e a procura de melhores condições de vida, primeiro com deslocações para a cintura industrial de Lisboa, principalmente na zona sul, depois para o litoral algarvio e mesmo para o estrangeiro, nomeadamente para a França e Alemanha.

As dezenas de crianças em idade escolar começam a descer a olhos vistos e é já numa situação de total declínio que se constrói o último edifício escolar. Este sim com um mínimo de condições para o efeito, até porque obedecia a um plano nacional.

Uma sala, casas de banho, uma cisterna,” hall” e amplo recreio, devidamente murado.

[O último edifício escolar, de modelo oficial e que funcionou nas Cortes Pereiras. Hoje foi adaptada a casa mortuária. Foto JV, 2010]

O número de alunos desceu tão consideravelmente que, cerca de 1980 a escola foi encerrada por falta de frequência. Os existentes começaram a ser transportados para a escola da aldeia do Pereiro, ajudando esta a manter-se por alguns anos ainda que poucos.



NOTAS
(1) – O nosso saudoso amigo, José Martins, vulgo José Coelho, que se fixou em Afonso Vicente.
(2) – António Patrício, vulgo António Pedro, que trabalhou muitos anos na extinta Junta Autónoma das Estradas, onde se aposentou.
(3) – Anuário Comercial.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Bom exemplar de galo



A Câmara Escura de hoje é em “homenagem” ao nosso colaborador e Amigo, Amílcar Felício, para lhe fazer crescer água na boca!

Nos anos 50/60 tal exemplar não teria escapado ao surripianço da malta e daria para grande trupe.

Foi criado num monte próximo da vila de Alcoutim e não em qualquer aviário, mas sim num galinheiro com condições sanitárias.

Ainda que no decorrer dos anos tivessem sido criados outros exemplares de tamanho aproximado, este que limpo ultrapassou os seis quilogramas, tinha, como a foto mostra, uma plumagem magnífica.

A sua alimentação foi constituída por farelos, trigo, folhas de couve e ervas da horta. Os caracóis constituíam um petisco especial e que motivava grande reboliço na capoeira.

Não o provei visto ter feito questão de ser destinado ao meu meeiro. Regalei-me com outro, um pouco mais pequeno e de cabidela, coisa que hoje raramente se come e quase ninguém conhece.

Amílcar, tenho muita pena, mas pelo meu lado, o galinheiro acabou por falta de assistência.

domingo, 23 de janeiro de 2011

Presente envenenado



O monte de Afonso Vicente tem recebido vários “presentes”, desde o asfaltamento do troço de 550 metros que liga à povoação, passando pelo fornecimento da puríssima água da barragem de Odeleite até ao “magníssimo” edifício de 1º andar do Centro Cultural, Social e Recreativo, que se a memória não me falha, teria custado em dinheiro antigo, para uma melhor noção, 30 mil contos!

No último Natal, a carente população do monte foi, segundo me foi informado, presenteada com singelas ofertas, pelo que ficou muito reconhecida.

A melhor oferta está para chegar, a LINHA DE ALTA TENSÃO 400 KV, já delineada conforme o traçado a vermelho representa na foto e que irá passar bem junto da povoação.

Eu não percebo nada do assunto, só sei o que os jornais têm dito em situações semelhantes e o que é verdade é que ninguém quer isto a passar junto das suas habitações pelos malefícios que pode causar à saúde. Não sou engenheiro nem médico.

Para mim já pouco irá significar pois estou no ocaso da vida. Para os vindouros é que será pior, mas a verdade é que já não haverá jovens que queiram, não digo lá viver, mas passar férias. Depois disto, ninguém lá porá os pés.

Sabe-se que estas coisas têm de passar por algum lado, mas consta-me que se fosse por baixo da terra os hipotéticos malefícios seriam muito mais reduzidos.

É claro que os técnicos vão dizer que não há qualquer problema para a saúde mas em contrapartida aparecerão outros a dizer precisamente o contrário. Quem diz a verdade?

E depois disto apetece-me fazer duas perguntas:- Que contrapartidas a população vai receber por estar sujeita a tais riscos?

- Quem já levantou a voz contra esta situação? Nunca a ouvi (televisões e rádio) nem a li (Jornal do Algarve ou Jornal do Baixo Guadiana).

Continuará Alcoutim a ser o Algarve Natural ?

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Os Paços do concelho de Alcoutim no Centenário da República



Este opúsculo de trinta e oito páginas de 20X20 cm em bom papel é edição da Câmara Municipal de Alcoutim em bom papel, está fortemente ilustrado e apresenta quatro assuntos distintos: “Os Paços do Concelho de Alcoutim – Apontamentos Históricos”, de autoria de Fernando Dias, Jorge Palma e Nelson Fernandes; “Remodelação do Edifício dos Paços do Concelho de Alcoutim” de Victor Brito; “A Implantação da República em Alcoutim”, de Aurélio Cabrita e Jorge Palma e finalmente “Os Presidentes da Câmara de Alcoutim, 1919 – 2010”, por Carlos Barão.

Sobre os Paços do Concelho publiquei no Jornal do Algarve/Magazine em 24 de Fevereiro de 1994 “Os Paços do Concelho – os actuais funcionam há 110 anos” e que já incluí neste blogue. Esta leitura trouxe-me algumas novidades principalmente as obtidas em fontes que não me foi possível consultar e que vieram enriquecer o meu conhecimento.

Sobre a “Remodelação do Edifício dos Paços do Concelho de Alcoutim”, é um assunto técnico, que me pôs a par das alterações a que vai ser sujeito.

Quanto à “Implantação da República em Alcoutim”, igualmente abordei o assunto nas páginas do Jornal do Algarve/Magazine, de 27 de Julho de 1995, sob o título “Coisas Alcoutenejas – A implantação da República”.

Por fim, tomei conhecimento que o painel dos Presidentes da Câmara (1919 – 2010) foi obra de Carlos Barão.

Agradeço a um dos autores a amabilidade que teve em oferecer-me um exemplar.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

A rifa das laranjas na aldeia do Pereiro



Tive conhecimento deste costume, hoje completamente caído em desuso e que só os mais velhos recordarão, num “monte” da freguesia de Alcoutim, não haverá muitos anos.

Mas afinal o que é a rifa das laranjas?

Aquilo a que vulgarmente se chama a fruta era e é pobre na freguesia do Pereiro. Figos, marmelos, algumas romãs e uvas provenientes de “parrões”, eram o que se podia produzir nos lugares de melhor terreno e normalmente situados junto de ribeiras e barrancos.

O fruto proveniente do enxerto de um pereiro bravo e o dado pelas tunas (opúncias) constituíam as alternativas.

O homem, procura, entretanto criar frutos mais apetecíveis, mais finos, mais atractivos, pelo que, nos locais mais propícios, planta a sua laranjeira. Com redobrados cuidados consegue que se vá desenvolvendo e algumas conseguiram portes assinaláveis.

E agora o que fazer aos apetecíveis frutos tornando o investimento rentável?

Nessas alturas não havia dinheiro disponível para comprar um quilo ou dois de laranjas! Mesmo quem o tivesse, faria um mau governo, para utilizar uma expressão local.

O que fazer então?

O proprietário, apanhando uma canastra de laranjas, promovia a sua “rifa”, isto é, fazia constar no povo que nesse dia haveria rifa de laranjas na sua casa ou na casa de fulano, muitas vezes numa casa comercial.

A notícia corria célere e à hora marcada juntavam-se os jogadores, que iam dos mais idosos aos adolescentes enviados por familiares.

O produtor de laranjas lá estava a um canto da casa, sentado na sua cadeira de tabua e tendo ao lado a canastra de laranjas.

Cada pretenso jogador comprava umas tantas. Ao iniciar-se a rifa, quem pretendesse entrar no jogo colocava no bolo a sua parte, isto é, uma laranja. Munido de um baralho de cartas, um dos jogadores, depois de previamente embaralhadas e partidas, dava três cartas a cada jogador e tirava o trunfo. Quem tivesse o maior trunfo, arrecadava a totalidade do bolo e nova jogatana se realizava, rodando naturalmente o jogador que dava as cartas. As laranjas iam desaparecendo e quem já não tinha, voltava a abastecer-se. Enquanto uns deixavam de jogar pois já tinham laranjas suficientes, outros iam aparecendo e tentando a sua sorte.

Com esta maneira simples, o produtor conseguia vender a produção, assegurando o seu rendimento.
Era assim a rifa das laranjas!

Nota
Extraído com adaptação de "A Freguesia do Pereiro (do concelho de Alcoutim) «do passado ao presente»", Edição da Junta de Freguesia do Pereiro, 2007, p. 191

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Passatempos radicais dos anos cinquenta e sessenta...

Pequena nota
Mais umas memórias do nosso colaborador Amílcar Felício, “contadas” no seu estilo característico apreciado por muitos dos nossos leitores.
Esta prática da juventude naquela época era comum a todos os meios rurais, afinal como Alcoutim era, apesar de ser sede de concelho.
Sempre temos ouvido contar “estórias” destas por onde passámos, muitas delas com pormenores picarescos.
Nunca nos calhou entrar numa de galinhas mas fomos autor, em terras da Beira de um surripianço de chouriças que estavam no varão a curar. Eram três e metemo-las no bolso da gabardina. Depois da crítica que o grupo fez ao proprietário por não nos ter convidado a prová-las, foi por um de nós convidado a irmos provar as dele à sua casa.
Primeiro vieram umas tiras de bacalhau cru e temperado à maneira portuguesa (todos nós sabemos do que se trata) e só depois apareceram as chouriças.

- Estas são boas, mas as minhas são melhores, comentou o roubado.

A gargalhada foi geral.

Ah malandros que já me enganaram!

Isto passou-se há cinquenta anos!

Amílcar, tanto em Alcoutim como nos montes vizinhos já não é fácil encontrar galinácios. A habilidade já não pode ser posta à prova!

Nem muge há, fará galinhas!

Com um abraço do


JV





Escreve


Amílcar Felício




Alcoutim dos anos 50/60 do século passado era uma comunidade fechada sobre si própria e que se debruçava quase exclusivamente ou para o rio ou para Sanlúcar, o que ajudava a cimentar o crescimento de fortes laços por vezes quase familiares entre os alcoutenejos. Do Alcoutim daquela época quase nada sobrevive e convenhamos que os tempos e os afectos também já não são os mesmos. Hoje em dia Alcoutim tem outros horizontes e naturalmente, nasceram-lhe outros amores também: Algarve, Allgarve ou All´garve já nem sei como o baptizaram, Televisão, Computador, Internet etc., etc., etc. Dizia-me a minha Tia Mariana há dias quando lhe desejava Um Próspero 2011 (!) e lhe perguntava se a festa tinha sido rija em Alcoutim: Oh filho, não houve nada, foram todos lá p´ró Algarve...

É verdade que não tínhamos belas canoas para deslizar céleres no Guadiana nem extraordinárias instalações de Clubes Náuticos como as que existem actualmente, nem campos de futebol com relva natural ou artificial, nem motas de água ou “catamarans” para passeios ou para fazer a travessia para Sanlúcar. Também não tínhamos praias com todos os requisitos que constituíssem um pólo de atracção para turistas, nem nos passeávamos em bicicletas de corrida e ainda estávamos muito longe dos computadores que nos levassem à aventura por esse mundo fora etc., etc., etc.

[Centro Náutico de Alcoutim. Foto J.V.]

Não tínhamos nada destas coisas, hoje em dia tão comezinhas... mas a verdade é que com a lancha do Xico Balbino e com a Fonte Primeira desenrascávamo-nos à grande, limpando-lhe os tojos e marcando-lhe com cal as linhas de campo quando havia uma jogatana mais a sério. Inventávamos quase tudo à nossa medida e até nos sentíamos uns felizardos. Fico sempre a pensar para os meus botões quando vejo a juventude dos nossos dias usufruir daquela panóplia de entretenimentos: devem pensar que já não lhes falta mais nada... mas nem lhes passa pela cabeça o que perderam! Efectivamente, naqueles tempos acontecia como se diz vulgarmente "deitávamos os foguetes, fazíamos a festa e íamos apanhar as canas". Mas em contrapartida nessa criação conjunta cresciam cumplicidades, afectos e amizades que perdurariam pela vida fora e que compensariam de que maneira todas estas modernices. E querem acreditar que me sinto um milionário por ter vivido aqueles tempos e enchido a carteira e os bolsos de afectos?

Longe de mim qualquer tentativa de branquear tempos de uma profunda pobreza que grassava no seio de algumas famílias alcoutenejas nos anos cinquenta ou sessenta. Deixem-me lá fazer de poeta pela boca da Tia Ana mulher do Ti Justo carteiro, pois ela melhor do que eu, sentindo a morte por perto caracterizava em contraponto para a filha aqueles tempos terríveis, falando dos belos tempos que entretanto estava a viver já nos anos setenta: Ai filha, agora que o mundo está a ficar tão bonito é que eu vou morrer! Mal sabia ela que o outro mundo tão bonito que ela conhecia igualmente, o mundo dos afectos, das amizades desinteressadas e da solidariedade começava irremediavelmente a desmoronar-se para dar lugar quase exclusivamente ao Mundo das Coisas, do individualismo ou do salve-se quem puder da sociedade de consumo que vinha a caminho. Morreu feliz certamente, convencida de que os dois mundos iriam melhorar cada vez mais, não assistindo à desgraça dos tempos que estamos a voltar a viver ...

[Rua Portas de Mértola. Foto JV, 2010]

O dinheiro era um bem escasso de uma maneira geral e assim era preciso inventar tudo. E imaginação era o que não nos faltava felizmente. Um dos passatempos preferidos era a confraternização entre o pessoal à volta de uma galinha bem confeccionada, que ainda se tornava mais saborosa se tivesse sido gamada. Era a aventura radical do planeamento da "apanha" e do transporte do galináceo à socapa, era o trabalho conjunto da confecção e finalmente o petisco meio às escondidas, a confraternização e tudo o mais que se lhe seguia.

E era barato sabem: só precisávamos de pagar o vinho! O estratagema era quase sempre o mesmo para não deixar rasto. Torcíamos o pipo ao bicho ainda dentro do galinheiro pela calada da noite e levávamo-lo para casa e ao longo do dia seguinte atirava-se discretamente da varanda da minha avó – a Tia Catarina das Portas – para a varanda do Ti Simões ou do Ti Pereira (ainda não existia entre as duas varandas aquele elefante branco que lá "mora" agora!) que estavam feitos com o pessoal. O desgraçado do bicho nunca entrava pela porta principal, pois poderia dar nas vistas. Durante a tarde íamos depois entrando separadamente na Taberna para o arranjo da mesma, até nos juntarmos todos ao fim do dia para a patuscada. E o facto é de que só de tempos a tempos, é que se ouvia alguém queixar-se de que lhe tinha "fugido" uma galinha... O método era perfeito e funcionava às mil maravilhas. Depois de bem comidos e bem regados, os cantares alentejanos até escorregavam mais cristalinos pelas gargantas dos mais desafinados.

[O chamado "elefante branco". Foto JV, 2010]

Mas não se pense que a coisa era feita sem critério, pois efectivamente tínhamos uma costela da filosofia de vida do Zé do Telhado. Só nos abastecíamos nos galinheiros dos mais abastados ou dos mais forretas. Lembro-me entre tantos outros, do maior galo que nos passou pelo estreito e que tinha sido criado com todo o carinho pela Tia Custódia Peres, para quando o filho chegasse da guerra de África. Aquilo era um galão enorme como nunca tinha sido visto em Alcoutim. Chegou-nos a notícia do dito e isso espicaçou-nos a vontade de lhe deitar a mão. E assim fizemos...

[Rua Trindade e Lima. Foto JV, 2010]
Mas houve uma galinha que me caiu no goto de tão gostosa que estava. Estávamos em 1963 ou 64 e íamos fazer o Peditório para as Festas nos Montes das Laranjeiras. Os tostões nos bolsos estavam sempre à justa. Como é que vamos resolver o problema do almoço, perguntávamos uns aos outros? Porque é que a gente não vai roubar uma galinha sugeriu alguém e pede-se ao dono de uma das Taberna das Laranjeiras que conhecíamos e de que não me recordo do nome, para a preparar enquanto fazemos o Peditório? Dito e feito, decisão tomada. Faltava definir a vítima. Rapidamente chegámos a uma decisão por unanimidade: a vítima desta vez seria o Mário Batista.

O Mairinho homem prudente e avisado, tinha o seu galinheiro junto ao eucalipto do Quartel da Guarda Fiscal, pois ali ao pé da Autoridade aonde ele passava a maior parte do seu tempo por ser Guarda-Fiscal, sempre existia maior segurança. Simplesmente à 1 ou 2 horas da manhã pela calada da noite, não há segurança que resista e lá fomos nós sorrateiramente ao galinheiro do Mário, apanhar a melhor das galinhas. No dia seguinte pelas 7 horas da manhã quando o nosso grupo descia pela rua da Escorregadiça em direcção ao rio, com a galinha dentro de uma saca de serapilheira debaixo do braço, o Mairinho sempre brincalhão atira-me da varanda da sua casa uma bacia com água, que me passou mesmo ao lado e diz: "Ah malandro, quase que te apanho"! Oh Mário não me apanhaste ontem, hoje também não vai ser fácil, respondi-lhe perante a risada geral. Ele também se riu ingenuamente, engrossando a gargalhada geral.

[O eucalipto da "Guarda-Fiscal" ou do Pinhão. Foto JV, 2009]

À noite o Mairinho, raposa velha e sabidona como era, depois de já ter dado pela falta do galináceo foi sentar-se songa-monga como quem não quer a coisa ao meu lado, na muralha do rio. E lá começa com a sua converseta mole de mula sabida: "então o Peditório nos Montes do Rio correu bem Amílcar? Então e mais isto e mais aquilo etc. e tal", até que lá chegou aonde queria: "e aonde é que almoçaram Amílcar"? Olha Mário, respondo-lhe eu indo direito ao assunto, o Ti Zé Não Sei Quantos fez-nos uma galinha lá na Taberna que estava divinal! Nem te passa pela cabeça Mário, que boa que estava o raio da galinha! "Essa galinha... essa galinha..." diz o Mairinho meio desconfiado entre dentes... e por ali ficámos dizendo mais umas balelas mas sem grandes aprofundamentos.

Meu querido Mário a estas horas certamente também já terás gasto uns tostões num computador e aderido à Internet. Compreende-se: é a fruta dos tempos, é natural! Se tal tiver acontecido e passares os olhos por esta crónica, ficas desde já convidado para um almoço de um bom frango no churrasco e assim pagar-te uma dívida com quase 50 anos. Poderá até ser nas Laranjeiras que tem um belíssimo restaurante. Mas lá que me deu muito gozo ferrar-te o calote naquele dia, lá isso é que deu sim senhor! A propósito, será que ainda há galinhas em Alcoutim sem ser congeladas no Supermercado? Se houver digam qualquer coisa... às vezes apetece-me matar saudades daqueles tempos!

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Liberais e absolutistas em Alcoutim

Os responsáveis de quatro das cinco paróquias que constituíam o concelho de Alcoutim, informa o Juiz de Fora que o “Sistema Constitucional” está a ser sabiamente explicado todos os dias em que há missa.

São lidos os decretos do “Soberano Congresso” que analisam com toda a clareza, fazendo ver os resultados que originam tais leis.

Têm-no feito o Prior de Alcoutim, José Joaquim Cavaco, o Pároco de Cachopo (então pertencente ao concelho de Alcoutim) Frei Joaquim de Lagos e igualmente os Párocos de Giões, José Rodrigues Teixeira, o de Vaqueiros, Frei António do Carmo e Azevedo e o de Pereiro, Francisco de Paula.

Os três últimos, no dia do aniversário da instalação das Cortes, juntaram-se nas suas igrejas e fizeram festas Constitucionais, pregando em todas elas o Padre Frei Francisco Bento, na altura coadjutor de Vaqueiros e em que mostrou o quanto está possuído do Sistema actual. (1)

Verifica-se assim que o pároco de Martim Longo não aparece referido mas pensamos que o lugar não estaria vago até porque teria coadjutor.

Nestas alturas a classe eclesiástica era numerosa e se existiam aderentes ao regime constitucional (liberal), a grande maioria era contrária alinhando a favor do absolutismo.

O Prior José Joaquim Cavaco, que era natural de Loulé, é nosso “conhecido” pelas posições que tomou a favor do liberalismo, vindo a ser Cónego na Sé de Faro. Foi pronunciado com muitos mais na devassa aberta no Algarve para conhecimento dos eclesiásticos envolvidos na rebelião (Maio de 1828). Foi acusado de reunir na sua residência, na vila, indivíduos conhecidos pelas suas ideias liberais e revolucionárias que procuravam a anulação da aclamação de D. Miguel. Por acórdão de 8 de Julho de 1831 foi condenado a dez anos de degredo para a ilha de S. Tomé e a 10 mil réis para as despesas da relação, o que julgo não teria cumprido devido ao desenvolvimento dos acontecimentos políticos. (2)

Também o Pároco de Giões, de onde era natural, ficou referido pelas posições firmes que tomou nesta área, acabando por ter fugido e morrido em Lisboa como já aqui referimos numa pequena nota biográfica que organizámos sobre ele. (3)



Com D. Miguel no poder naturalmente que em Alcoutim também aparecem os seus apoiantes. A nível de auxílio monetário para a luta a travar (donativos), a Gazeta de Lisboa de 15 de Janeiro de 1829 refere as seguintes contribuições em relação à freguesia de S. Mamede (4) de Alcoutim: [*]

Ver. Vigário, José Joaquim Soares de Barros, 2$400 réis
Cap. Manuel José Teixeira Rebelo, 248 réis
José António Marques, lavrador, 240 réis
José António do Pinhão, 480 réis
José Teixeira, lavrador, 240 réis
Cristóvão de Almeida Soares Gavião, 24 mil réis

O Vigário José Joaquim Soares de Barros também não o “conheço”nem o vejo referido em assentos de baptismo, casamento ou óbitos da época. Em assentos de baptismo de 1831 já aparece o Padre António Madeira de Freitas que admito o possa ter substituído.

O Cap. Manuel José Teixeira Rebelo já não aparece referido na listagem das Companhias de Ordenanças do Algarve de 1 de Março de 1831. (5). Possivelmente tem a ver com a numerosa família Teixeira ou hipoteticamente com os Rebelos da Revelada ou Rebolada.

José António do Pinhão, o Pinhão deve estar aqui como zona rústica que se seguia ao quartel da extinta Guarda-Fiscal

A verba subscrita por Cristóvão de Almeida Soares Gavião é muito elevada pelo menos em relação aos outros donativos. Estará relacionado familiarmente com o padre igualmente subscritor? Estará relacionado com a família Almeida, oriunda de Loulé e que se fixou em Alcoutim durante muito anos? Não sei mas a verdade é que não o “conheço” das lides alcoutenejas dessas épocas.

Mais tarde, em 1833, numa nova ronda, os participantes foram:

Capitão.Mor, Sebastião José Teixeira, 2$880 réis
Ver. Prior, Pedro Palma (?)
Afonso Guerreiro Drago e outros 19$870 réis (6)

Sebastião José Teixeira é figura “conhecida” ainda que se possam fazer confusões com outras figuras com o mesmo nome ou muito semelhante, sabe-se que em 1821 era Major Comandante das Ordenanças. (7)

Em 1823 aparece um Sebastião José Teixeira detido na cadeia devido a certas “alterações” por ele efectuadas nos livros da sisa e uma controversa eleição para a edilidade local realizada no ano anterior. (8)

Por sua vez, José de Brito Magro teve um filho chamado Sebastião José Teixeira, cujo avô materno, de Martim Longo, tinha o mesmo nome.

Em 1831 há um capitão-mor da Capitania – Mor de Ordenanças de Alcoutim com o mesmo nome, sendo a autoridade máxima nesta área no concelho que possuía 8 Capitanias.

Não é fácil desmanchar esta teia.


Afonso Guerreiro Drago deve estar relacionado com uma família que aqui possuiu pelo menos uma grande propriedade rústica.

Aqui fica algo para se juntar ao que já se conhecia sobre este assunto.
_________________________________________

NOTAS
(1) - Suplemento nº 30 do Diário do Governo de 3 de Junho de 1822
(2) – “O Reinado de D. Miguel e Alcoutim”, Jornal do Baixo Guadiana, nº 78, de Setembro de 2006, p. 16
(3) – José Rodrigues Teixeira (P.dre), “Postagem” de 11.06.2009, in Figuras do Baixo Guadiana
(4) – Não me consta que alguma das freguesias de Alcoutim tivesse por patrono tal Santo. Que a de Alcoutim tivesse sido de Santa Maria, sim, S. Mamede nunca encontrei tal.
(5) – Notas soltas de História do Algarve – http://algarveantigo.com
(6) – Gazeta de Lisboa de 18 de Maio de 1833.
(7) – Estudos de História do Algarve, José Carlos Vilhena Mesquita, AJEA Edições, 2002, p. 112.
(8) – Idem, ibidem, p. 105

[*] Foi-me chamado hoje a atenção 2013.11.10) pelo Sr. Cristiano Cardoso que a freguesia não é São Mamede de Alcoutim mas sim de Alentém (freguesia extinta pertencente ao antigo concelho de Unhão, e hoje incorporado na freguesia de Vilar do Torno e Alentém, concelho de Lousada onde os nomes são conhecidos na antroponímia local.
O erro tipográfico levou a isto.
Mais uma vez agradeço a informação.
JV

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Legião Portuguesa e Mocidade Portuguesa





Escreve

Gaspar Santos




A Legião Portuguesa em Alcoutim “sentiu-se” mais do que se viu. E, segundo penso, nem se chegou a institucionalizar. Sentiu-se através da arrogância dos seus “membros” e do receio que infundiam nos outros. Não andavam fardados, não faziam exercícios com armas, nem faziam marchas nem formaturas. Suponho até, que nem eram inscritos na instituição. Eram apenas simpatizantes. Se um ou outro se inscreveu foi na organização de outro concelho. Sentiam-se no final dos anos 30 e início dos anos 40 do Século passado, durante os tempos da Guerra Civil de Espanha e da II Guerra Mundial, podendo considerar-se dois períodos da sua aparente actividade.

No primeiro período até pouco depois do começo da II Guerra Mundial, revelavam alguma ideologia nazi ou simplesmente seguiam o chefe de quem tinham admiração, respeito ou medo. Este - confessadamente nazi – ouvia as emissões da Rádio Berlim, distribuía propaganda de guerra alemã e lia a correspondência destinada a alcoutenejos republicanos antes dos seus destinatários. Era Chefe da Secretaria da Câmara Municipal, Gerente da Delegação da Federação dos Trigos e, revelou-se mais tarde, Agente da PIDE. Na sequência das falcatruas que fez na Federação dos Trigos que o levaram a sentar-se no banco dos réus e embora conseguisse absolvição, o tenente Victor Manuel da Costa expulsou-o da Câmara Municipal e até do concelho. A legião ficou órfã, mas infundiu ainda algum receio até ao fim da guerra.

No segundo período, após o fim da II Guerra Mundial, algumas pessoas eram as mesmas, mas sem o chefe e com a derrota do nazismo a sua auto estima ficou reduzida. O recrutamento a partir de então fez-se entre jovens desempregados que almejavam ter acesso a funções públicas, ficando, no entanto, vinculados pela inscrição a outra localidade do Algarve. Em Alcoutim, como disse, nunca tivemosnotícia da sua institucionalização.

Pelo contrário, a Mocidade Portuguesa, de que fiz parte, teve o seu início em Alcoutim cerca de 1941, mostrava-se, alguns andávamos fardados quando aos sábados de manhã fazíamos exercícios de instrução militar.

[Rua Prof. Trindade e Lima. Foto JV]
Mais tarde cerca de 1943 tivemos uma casa da mocidade. Lá tínhamos jogos e desportos de salão e convivíamos. Foi lá que muitos de nós aprendemos a jogar pingue-pongue e um outro jogo do tipo “bilhar” a que chamávamos laranjinha. Essa casa pertencia ao brigadeiro Manuel Domingos e ainda hoje existe a meio da Rua Prof. Trindade e Lima. Quem tinha a chave e o encargo de zelar pela casa era o Manuel Veríssimo, filho do mestre João Ricardo, que mais tarde tirou o curso de Comandante de Castelo da M. P. e passou a instrutor.

Os treinos de instrução militar tinham lugar na esplanada do castelo e, uma vez por outra no campo de futebol da Fonte Primeira. No início foram ministrados por Rafael Madeira, um primeiro-cabo da tropa então recentemente desmobilizado, a quem deram um pequeno emprego (bem desempenhado aliás) até ele se empregar nas Finanças no Distrito de Beja como fiscal de impostos. Este homem, que mais tarde foi árbitro de futebol nas Distritais de Beja e Faro, gostava da participação em actividades físicas e gostava de se ver e ouvir em posições de comando. A dar instrução militar aos miúdos era um espectáculo. Ele mandava: “pela direita perfilar” e depois ia verificar o alinhamento, todo empertigado e cheio de si. Era bom homem mas sempre que apitava um jogo de futebol em que entrassem os de Alcoutim ele nos prejudicava sempre…para não ser acusado de parcialidade.

Recordo um jogo com Sanlúcar, em que mais uma vez ele prejudicou Alcoutim. Mesmo assim, a primeira parte correu mal a Sanlúcar. Então no começo da segunda parte, o padre de Sanlúrcar de sotaina vestida e apito na boca entrou em campo com a equipa de que era treinador, com o propósito de substituir o juiz da partida. Ao ver isso, Rafael Madeira que na primeira parte tinha apitado, cresceu junto ao centro do terreno e apitou ininterruptamente, apontando o caminho da rua ao padre, até que este saiu. Tranquilamente, a seguir, deu recomeço à partida, sendo muito aplaudido.

Quando a Mocidade Portuguesa acabou em Alcoutim e encerrou aquela casa, a juventude desse tempo ficou sem local de convívio. Uma razão mais que pesou na iniciativa dos jovens para criarem em 1948 o Grupo Desportivo de Alcoutim e na realização das primeiras Festas que são hoje, como dizem os jornais regionais, as mais antigas do Algarve. Penso que depois, algumas peças do mobiliário da M. P. ainda foram oferecidas ao G.D.A. nomeadamente cadeira e as mesas de pingue-pongue e do laranjinha. A Casa da Mocidade foi exclusiva dos rapazes e, só excepcionalmente, alguma jovem lá entrou.

É difícil para mim falar hoje da M. P. Feminina. Do que digo tive conhecimento na altura, embora sem vivência directa e hoje quase esvaído da minha memória. Valeram-me amigas, condiscípulas desses tempos, as irmãs Assunção, a quem saúdo e agradeço por me terem avivado recordações.

[Rua Dr. João Dias. Foto JV]
As actividades extra escolares que as jovens tinham, realizavam-se no 1º andar da casa do sargento Alfredo Lopes. Aí eram acompanhadas e estimuladas a fazer renda, bordados e outros lavores, sendo monitora D. Conceição Cunha. As peças que confeccionavam eram destinadas a pessoas pobres.

Finalmente devo dizer com satisfação que, ao contrário dos objectivos desejados pela Ditadura, em Alcoutim a Mocidade Portuguesa não ganhou os jovens para apoio ao fascismo. Mas ajudou muitos de nós no culto da amizade, do companheirismo, além da oportunidade de cultivarmos o exercício físico e o associativismo.

domingo, 16 de janeiro de 2011

Balurquinho, pequeno monte com ligações à herdade da Malhada?

[Vista do Sul da pequena povoação. Foto JV, 2010]

Este pequeno monte da freguesia de Vaqueiros era designado em 1839 por Balurco, visto assim o referir Silva Lopes quando apresenta em relação anexa à sua Corografia, os fogos daquele ano, cabendo a esta povoação 8, e igual número a Malfrade, monte relativamente próximo.

Não o encontramos nas Memórias Paroquias (1758) mas nelas se indica a Malhada com 4 vizinhos.

Pelo menos em 1850 já era designado em acta de sessão da Câmara por Balurquinho, certamente para se distinguir dos seus homónimos de Balurco de Cima e de Balurco de Baixo, situados na freguesia de Alcoutim. Optou-se pelo diminutivo por ser o de menor dimensão, tal como aconteceu com Alcobaça e Alcobacinha, (freguesia da Várzea, concelho de Santarém) Pombal e Pombalinho, (sede de freguesia do concelho de Santarém) entre outros.

Estes três topónimos do concelho de Alcoutim são únicos no país.

Quanto ao topónimo que o linguista José Pedro Machado não refere existem duas ou três explicações.

A 2ª edição do Dicionário do Falar Algarvio (1) traz-nos o significado de balurco, assim explicado: pau redondo e comprido que se introduz no olho da mó para a desmontar. A explicação ajusta-se bem à zona, onde aproveitando o vento se construíram vários moinhos de que resta o do Balurquinho ou das Preguiças por se situar entre estas duas povoações e ainda com as paredes em bom estado de conservação. Pensamos que esta explicação é a mais plausível.

Dizia-nos o Sr. Manuel Pinto, natural desta zona, que este monte ficava pegado à herdade da Malhada e tinha sido um lavrador que lhe tinha dado origem, segundo ouvia dizer aos velhos do seu tempo de criança.

Sabemos que em 1852, Domingos Rodrigues, aqui residente, era um dos maiores quarenta contribuintes do concelho.

[Moinho do Balurquinho ou das Preguiças. Foto JV, 2010]

Uma pequena placa de madeira indicava com uma seta a vereda pela qual encontrávamos a Herdade da Malhada, hoje pensamos que transformada em couto cinegético.

Em 1850 alguns habitantes lavradores dos montes de Balurquinho e Despreguiças (Preguiças), requereram à Câmara que fizesse coimeiro para o gado miúdo durante o Verão o restolho que fica entre os ditos montes e o Zambujal e Malfrade, para pastarem as reses e bestas. O requerimento veio a ser indeferido por informação contrária da Junta de Paróquia. (2)

A electrificação da pequena povoação é inaugurada em 4 de Dezembro de 1985, (3) e existe um furo vertical (582/6) (4).

Em princípios da década de 90 os arruamentos são pavimentados (5), enquanto em finais do mesmo período é construído um forno comunitário. (6)

No Censo de 1991 o número de seus habitantes está incluído nos “isolados” mas sabe-se que em finais de 1999 tinha três fogos e 5 habitantes, existindo uma casa de grandes dimensões e de recente construção, a par de outras degradadas.(7)

Situa-se entre as Preguiças e os Galachos e tem acesso por estradas asfaltadas. Distará cerca de 34 km da sede do concelho e 14 da da freguesia.
______________________________________

NOTAS
(1) – Eduardo Brazão Gonçalves, Algarve em Foco, 1996
(2) – Acta da Sessão da Câmara Municipal de 14 de Julho de 1850
(3) – Jornal do Algarve de 5 de Dezembro de 1985
(4) - Sistema Nacional de Informação de Recursos Hídricos – http://snirh.pt
(5) – Boletim Municipal nº 10 de Abril 1992, p. 5
(6) – Alcoutim, Revista Municipal nº 6, de Janeiro de 1999, p.11
(7) – Radix – Ministério da Cultura – http://radix.cultalg.pt

sábado, 15 de janeiro de 2011

Inverno vem... (Poema)

Pequena nota
Mais um poema do nosso colaborador que neste espaço vem oferecendo com a sua sensibilidade e em que os anos não pesam, ideias e frases com rima que nos fazem reflectir.
JV






Poeta

José Temudo







sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

A ferrajaria em Vaqueiros

[A aldeia de Vaqueiro. Foto JV, 2010]
Foi uma actividade que teve alguma expressão no concelho no século XIX.

No que se refere à freguesia de Vaqueiros sabemos que era Juiz do Ofício de Ferreiro, na Câmara de Alcoutim, em 1843, José Manuel, desta aldeia, havendo pelo menos mais outro ferreiro, de nome Joaquim José.

Depois de examinado pelo Juiz do ofício e achando-se hábil e com a necessária aptidão para o seu desempenho, é-lhes passada a competente carta de examinação a qual poderão usar em todas as terras deste Reino de Portugal e Algarves, devendo os zeladores da Câmara lhes não porem coima alguma por não tirar licença anual, servindo a carta de licença perpétua, com a qual se apresentarão quando lhes for determinado. (1)

As posturas locais determinavam que os indivíduos que exerciam ofícios, nos quais se incluía o de ferreiro, sem estarem examinados, deviam estar munidos da competente licença, sem a qual seriam acoimados. (2)

NOTAS
(1)- Registo da Carta d’Examinação do Ofício de Ferreiro passada a favor de Joaquim José da aldeia de Vaqueiros, pág. 16 verso in Livro de Registo de Mercês (...) nº 2.
(2)- Acta da sessão da C.M.A. de 21 de Abril de 1842.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Agulha de esteva



É bem simples o objecto que apresentamos hoje na rubrica Etnografia. Trata-se de uma agulha de esteva que tinha várias aplicações sendo talvez a principal a de ser com ela que os pescadores do Guadiana faziam as redes para a apanha do peixe.

O uso da madeira deste arbusto teve por base a experiência do homem da região que encontrou nela a dureza e a durabilidade que levaram à sua escolha para tal utilização.

Como a foto apresenta, tem uma forma fusiforme terminada em bico, encontrando-se um orifício na parte mais larga e oposta a este.

Era utilizada em vários tipos de cosedura principalmente relacionada com a actividade agrícola.

Foi-nos dito que nos tempos da Guarda-Fiscal muitos destes elementos se dedicavam a esta tarefa nas horas vagas, sendo depois vendidos sobretudo aos pescadores.

Só foi possível fotografar este exemplar pela amabilidade de D. Maria José Mestre, natural e residente no monte de Afonso Vicente.

Nota importante
Após a postagem foi-me chamada a atenção por um colaborador deste blogue que não estava correcta a minha informação pois a agulha de esteva para fazer a rede de pesca não é esta mas sim outra, de formato completamente diferente.
Retirando tudo o que se disse quanto à pesca o texto deve de ficar correcto.
Peço desculpa aos leitores pelo erro cometido que teve origem em informação errada ou mal interpretada por mim.
Iremos colocar uma postagem quando nos for possível sobre a agulha de fazer rede.


2011.01.17

JV

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

EFEMÉRIDE - Comemoram-se hoje 623 anos do Tratado de Alcoutim

Pequena nota
São passados quase 17 anos que escrevi este pequeno texto que como se indica foi publicado no Jornal do Algarve, de Vila Real de Santo António. Apesar disso e se passássemos os 623 para 640, o texto podia ser publicado integralmente no próximo dia 31 de Março, já que toda a situação, pelo que conhecemos, é a mesma.

JV

(PUBLICADO NO JORNAL DO ALGARVE DE 31 DE MARÇO DE 1994)

[Alcoutim visto por Duarte de Armas, Séc.XVI]

Saindo o jornal às quintas-feiras, acontece que o dia 31 de Março coincide com aquele dia da semana.

Algum alcoutenejo se lembrou do significado da data?

Não é fácil já que estes dias só são normalmente lembrados quando deles beneficiamos de alguma coisa. E Alcoutim até tem um feriado municipal sem data e sem qualquer significado!

Acontece que a pequena vila raiana é muitas vezes só conhecida da História, por este facto!

O prof. Doutor José Hermano Saraiva, conhecido historiador e homem de T.V., confessa que só conhecia Alcoutim da História, como refere no “Itinerário Português – O Tempo e a Alma”, pág. 372. Afinal, acontece o mesmo com muita gente na qual estivemos incluídos.

Alcoutim só ficou ligada ao resto do país, por estrada, nos meados deste século e mesmo assim constituía um beco sem saída.

Na esteira desta afirmação, dois pequenos episódios.

Quando fui colocado em Alcoutim, em 1967 e apresentei os meus cumprimentos de despedida ao dirigente máximo do distrito onde servia, afirmou-me que agora tinha sorte, pois ainda há pouco só se chegava a Alcoutim pela via fluvial. Ficámos admirados.

O outro episódio parece anedota, mas não é.

Na época invernal as enchentes do Guadiana provocavam algumas vezes a suspensão das carreiras fluviais. Então, o Presidente da Câmara para comparecer às reuniões que se realizavam em Faro, tinha que seguir via Espanha, isto é, atravessava o rio para Sanlúcar, seguindo dali para Aiamonte, apanhando o barco para Vila Real de Santo António! Depois era o normal.

Não vamos aqui esmiuçar a Paz de Alcoutim. Quem o quiser saber procurá-lo-á, na Crónica de D. Fernando, de Fernão Lopes. Lá encontrará a descrição histórica de que não consta… aqui encontraram-se no meio do rio, em engalanadas embarcações, os reis D. Fernando I de Portugal e D. Henrique II de Castela para celebrarem a Paz de Alcoutim em 1371, que veio pôr termo à guerra entre os dois países.Esta descrição encontrei-a em Um Pouco de História, texto englobado num folheto turístico emitido pela Região de Turismo do Algarve, em 1988.

Nem as conversações se teriam realizado no meio do rio e muito menos teriam aqui estado, pelo menos nessa altura, os monarcas em conflito. É o que deduzimos da leitura do capítulo LIII da referida crónica, que pensamos ser o mais fidedigno documento histórico do evento.

Se não vamos referir as cláusulas do Tratado, os seus intervenientes e os resultados obtidos, então porque pegámos na efeméride?

Como dissemos, há pessoas que só conhecem Alcoutim da História, mais propriamente por este Tratado (já várias vezes o ouvimos questionar em concursos televisivos). Todos os historiadores que escreveram Histórias de Portugal, não o ignoraram e referem-no sempre.

[Alcoutim visto de Espanha num desenho de Hilary Payton]

A “Paz de Alcoutim”, já o escrevemos, é certamente o facto histórico mais importante passado nesta vila, até aos nossos dias mas… nada na vila o faz lembrar ou conhecer aos forasteiros. E é por isso que aqui estamos. Se um dos caminhos apontados para o desenvolvimento local é o turismo, seria bom, no nosso modesto entender, que algo fosse feito para lembrar tal acontecimento.

Mas o quê? Como fazê-lo? São capazes de aparecer algumas ideias – é preciso debatê-las e optar por aquela que seja considerada mais positiva.

Preservar o núcleo histórico onde têm sido cometidos vários “crimes” e enriquecer o Alcoutim Novo, pensamos que seriam pontos de partida para o equilíbrio desejado.

Aqui deixamos o alvitre às Entidades responsáveis, na passagem de mais um aniversário da Paz de Alcoutim.

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Depósito de água



A Câmara Escura de hoje é representada por uma fotografia que tirámos em 1987. Representa, como o título indica, um depósito de água.

Até aqui tudo normal a não ser a forma desajeitada como o depósito foi construído.

Para nós a razão desta escolha tem a ver com o facto de ter sido o primeiro construído num monte do concelho de Alcoutim e naturalmente o primeiro que recebeu distribuição de água através de fontanários, neste caso seis espalhados pela povoação.

Não possuímos a data segura em que a rede foi instalada, mas teria acontecido por volta de 1980. Só depois a Câmara Municipal começou a fazê-lo por todo o concelho, o que veio a constituir um grande melhoramento para as populações.

Estamos a falar do monte de Afonso Vicente que beneficiou, após o 25 de Abril, de uma comissão de moradores, quase todos residindo na periferia de Lisboa que se mobilizou no sentido de obter benefícios para a sua terra natal e isto num período em que isso era muito importante.

Todo o processo foi conduzido por esta comissão com o natural apoio político da Câmara Municipal.

O processo de distribuição de água por fontanários em todos os montes do concelho e que foi decorrendo durante vários anos desenrolou-se, como já dissemos, posteriormente com algumas diferenças sendo talvez a mais notória a não existência de um depósito distribuidor. Enquanto aqui a bomba elevava a água primeiramente do poço do monte mas pouco depois de um furo aberto próximo deste para o depósito, nos outros montes era levada directamente sobre pressão para os fontanários.

Havia nisto uma grande vantagem para os afonso-vicentinos, pois enquanto nos outros montes quando faltava a energia eléctrica acabava-se imediatamente a água, aqui as pessoas iam-se governando com a que se encontrava no depósito.

Procurando a Câmara colocar tudo ao mesmo nível e por isso, eliminar o depósito, foi confrontada pela população que defendeu a sua existência, até que ao ser resolvido fornecer água ao domicílio (sem saneamento básico) o que aconteceu em 2004, o depósito foi eliminado, conservando-se ali até que o tempo o destrua.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

ALCOUTIM - Recordações

Pequena Nota

Temos hoje o gosto de apresentar um interessante artigo do nosso Amigo Daniel Teixeira, Director do Jornal RAIZONLINE, que o publicou no seu nº 101 (1º número de Janeiro de 2011) que, como o título indica, recorda tempos passados na sua juventude no concelho de Alcoutim, já que aqui tem algumas raízes que não o fazem esquecer este concelho.
É evidente que nós não poderíamos escrever um texto deste género já que nunca o vivemos como o Daniel o viveu mas pelo conhecimento que temos do concelho, as situações que tão bem descreve não podiam deixar de ser passadas nas serranias pobres e inóspitas do Caldeirão.
É esta diversidade de textos que chama o visitante/leitor e se muitos são alcoutenejos ou estão relacionados com este concelho com muitos outros isso não acontece.
O intercâmbio existente entre o RAIZONLINE e o ALCOUTIM LIVRE tem sido muito benéfico para o concelho de Alcoutim, já que o jornal conta com uma plêiade de colaboradores de vários pontos do Mundo Lusófono.
Pedimos desculpa ao autor por ilustrarmos o texto com novas fotografias, sem o seu consentimento prévio, mas pensamos que vai ficar satisfeito com isso e quem sabe se o ajudará e recordar alguma memória.
O meu abraço para o Daniel Teixeira.


JV








Por

Daniel Teixeira



Pedindo as minhas desculpas ao amigo José Varzeano por estar a retirar-lhe a integralidade da página / tema gostaria de recordar aqui algumas das minhas memórias recolhidas neste Monte da Mesquita referida por ele, terra da naturalidade do meu avô materno.

(ver texto do José Varzeano aqui)

Conforme referi no meu texto geral sobre esta região e nas minhas demasiado curtas memórias já escritas no Alcoutim Livre sobre estes locais onde passei vários meses todos os anos, devo agora à distância confessar que sei ter algumas memórias destes meus tempos de infância e juventude, mas...por estranho que eu mesmo acho ser, tenho uma recusa quase instintiva em aprofundar muita coisa.

A explicação que eu tenho encontrado vacila muito entre o desejo de guardar desse «meu» outro Monte (Alcaria Alta) uma boa memória e prende-se também com o facto de que agora, tudo visto à distância, os laços de afinidade, eclipsando-se com o tempo e com o desaparecimento das gentes - levei muito tempo a ir regularmente a Giões a funerais de familiares directos e indirectos e seus e meus amigos - acabam por fazer definhar esses laços, acabam por os fazer perecer, e a gente, estando por lá ou falando de lá, pergunta-se interiormente, mais vezes do que gostaria, por aquelas pessoas de quem gostava e gosta tanto...


[A Caminho do monte da Mesquita. Foto de JV, 2010]

Por onde andará o meu velho avô que nas minhas memórias ainda me aparece claramente, deitado, de chapéu tombado sobre a cara, no poial da pequena cerca da arramada, de cabeça encostada a uma albarda, de botas surradas e onça de tabaco espreitando no bolsinho do colete?

Que é feito do seu ar envergonhado pedindo-me ajuda para subir o para si já pesado arado para cima da albarda do burro? O que é feito do seu ar comprometido a bater com uma esteva as redondezas do nosso poiso nocturno em noites de dormir ao relento em folhas de terra mais distantes? Seria porque já fora picado por lacraus e ele mesmo tinha medo dessa dor horrível ou seria para que isso me não acontecesse a mim?
Que é feito de minha avó, por onde andará ela, a mulher que mais cedo se levantava em Alcaria Alta e que percorria ainda noite os caminhos para chegar ao romper da luz às hortas, regar e repartir para uma outra e outra e outra antes que o sol começasse a queimar?

«Sentindo passos atrás de si, não muito longe de si, na noite escura como breu, agarrou numa pedra maior que as suas mãos e gritou: - Quem quer que venha aí que passe para a minha frente e que mostre a cara! - Sou eu Ti Virgínia - o João!»
Este, coitado, esteve uma enormidade de anos na Alemanha, comendo o pão que o Diabo amassou, para vir morrer de ataque cardíaco não muitos anos depois do seu regresso...por isso, também, que é feito da vida que eu tive nesses sítios ? O meu amigo Juanito, morto no Ultramar, o Antonico igualmente já falecido, o seu irmão mais velho falecido há poucos anos aqui no Hospital de Faro e que na violência do seu mal nem sequer me reconheceu?

Eu, sem mal que me apoquente, não me reconheço nem reconheço a «minha» Alcaria Alta de hoje: para mim desde há alguns anos, desaparecido o laço que me mais fortemente me ligava a ela, a minha mãe, recuso-me a aceitar a Alcaria Alta de hoje.

[Mesquita. "Rua com pilheiras e poiais. Foto JV, 2010]

Há tempos, li num blogue de uma pessoa que penso ser a filha da Odília Guerreiro - filha do João Baltazar - que o senhor Zézinho Martins andava a pastar o seu próprio gado: um dos homens mais ricos de Alcaria Alta, um lavrador que enchia a cozinha ao almoço e ao jantar com pelo menos uma vintena de ganhões em tempo de arado, ele mesmo, a dar pasto ao seu próprio gado (duas ou três reses pelo que percebi).

Não é que lhe caiam os parentes na lama, não se trata disso, mas é porque não há gente para ajudar (trabalhar) e porque apesar de tudo é preciso fazer continuar a vida mesmo que ela nos escorra pelos quadradinhos do calendário. O Zé Lourenço, seu «criado» (por vezes zangava-se e ia trabalhar para a «concorrência» - o outro lavrador do Monte) que tinha medo das trovoadas e que largava tudo assim que começava a trovejar, estivesse onde estivesse: largava tudo menos as bestas, e lá vinha ele, de chapéu na mão, aterrorizado, arrastando as arreatas, sem outra reacção que não fosse rezar a Santa Bárbara...

[Mesquita. Casa abandonada com tranca na porta. Foto JV, 2010]

Zé Lourenço...o «pão de centeio», talvez o último serviçal, aquele que nas noites de trovoada dormia no quarto do patrão rezando até de manhã.

Pois eu, se bem me lembro daquilo que me lembro das deslocações com meu avô ao Monte da Mesquita, é de um facto cuja importância este texto do José Varzeano me fez afinal fundamentar sobre uma percepção esquisita que eu tinha desse Monte da Mesquita. Não se via vivalma...e havia ainda gente no Monte...

Habituado à franqueza daquelas casas portuguesas que conhecia pelos montes ao redor, com oferta insistente de cafezinho e pão com queijo e presunto, com as portas das cozinhas sempre abertas - chegávamos a tornear algumas passagens por termos a barriga a estourar - na Mesquita ali ficávamos os dois, recolhendo as azeitonas, as alfarrobas e comendo solitários do farnel: nem pessoa se aproximava e no entanto meu avô era de lá, quer dizer, tinha nascido lá: deveria haver alguém que pelo menos o conhecesse ou que ele conhecesse, mas não: acho que aquele Monte já estava moribundo mesmo, desabitado mesmo que estivesse habitado, sem alma, sem memória viva.

Acontece...os Montes são quase como algumas pessoas...podem eles também morrer muitos anos antes de morrerem de facto.

sábado, 8 de janeiro de 2011

Luís Cunha - 1º Centenário do seu Nascimento. Lembrando um Amigo



Passa hoje o 1º Centenário Natalício de Luís Cunha pois nasceu na pequena vila de Alcoutim, nas margens do Guadiana em 8 de Janeiro de 1911, tendo, por isso, cerca de três meses quando se deu a Implantação da República.

Não vamos hoje repetir a nota biográfica, mas sim algo de pessoal que a amizade fomentou.

Quando tomámos posse das nossas funções em Alcoutim, em 13 de Junho de 1967, Luís Cunha tinha sido há pouco investido nas funções de Presidente da Câmara Municipal.

Competia-nos nessa altura fazer um relatório no qual se devia fazer entre outras, alusão ao estado das instalações onde funcionava a repartição e propor a resolução de algum problema mais premente. Era feito em triplicado e um exemplar enviado ao Presidente da Câmara, entidade a quem competia fornecer as instalações.

Constituídas por uma única divisão e em que um balcão em macacaúba e de alçado de vidro martelado fazia a divisão de acesso ao público.

Entre as deficiências que encontrámos, a falta de instalações sanitárias e o desnível do chão (inclinado), considerámos absolutamente necessário o arranjo do tampo da nossa secretária que até era do modelo oficial, pois encontrava-se encarquilhado de tal maneira que não se podia colocar a máquina de escrever que fomos “obrigados” a adquirir pois os serviços não a forneciam.
[Paços do Concelho. Des. de JV]
Quando o Presidente da Câmara, que residia no concelho de Faro, veio a Alcoutim, o que fazia com frequência para dar despacho à correspondência e realizar as reuniões camarárias, tomou conhecimento do nosso relatório, teve a amabilidade de se deslocar à repartição para nos cumprimentar, o que possivelmente qualquer outro não teria feito, dizendo-nos que não ia ali para verificar as anomalias encontradas pois elas eram reais.

- Tem toda a razão. A Câmara não tem dinheiro para nada, só tem a porta aberta. Mas o dinheiro não é problema pois eu pago do meu bolso, o pior de tudo é que não há quem o faça.

Dias depois aparece-nos no nosso local de trabalho acompanhado de um senhor que apesar de já não trabalhar na profissão se tinha disponibilizado a reparar o tampo da secretária, justificando que não podia dizer não a um velho e bom amigo. Teve de haver, contudo, um compromisso da nossa parte para orientar o trabalho.

Quanto a nós, a única coisa que queríamos era ter o tampo direito para poder escrever tanto à mão como na máquina.

Sugerimos, por ser barato e fácil de aplicar, um tampo de madeira prensada, mas o homem nunca tinha trabalho em tal, pelo que o tranquilizámos dizendo que era tudo muito fácil, bastaria cortar à medida e colar, passando depois um pouco de lixa e vioscene para lhe dar a cor.

Nunca nos esquecemos daquele senhor já entrado na idade e que era dos montes do rio. Ainda sabemos onde morava, bem perto do rio.

Neste primeiro contacto, o Senhor Presidente da Câmara pediu-nos para o tratar pelo nome pois era assim que o tratavam e se sentia bem.
[Casa onde viveu a Família Cunha]
Quando estava em Alcoutim não dispensava o seu cafezinho depois do almoço no único café da terra, de J.B.Guerreiro o que igualmente acontecia connosco. Naturalmente sentávamo-nos na mesma mesa e estabelecia-se uma conversação natural que envolvia as condições da vila, que se encontrava completamente parada no tempo.

Lembramo-nos perfeitamente de lhe dizer que nunca nos tinha passado pela cabeça que existisse uma sede de concelho como Alcoutim e que estávamos arrependidíssimos de ter optado por ela, já que havia outra hipótese na altura, à escolha, que conhecíamos e que nada tinha a ver com Alcoutim.

Na conversa, ia-nos dizendo que efectivamente era assim como nós dizíamos pois as carências eram de toda a ordem mas que eu ainda não conhecia o outro lado das coisas pois havia outros encantos que naturalmente ainda não tínhamos descoberto mas que havíamos de chegar lá. Em contrapartida íamos-lhe dizendo que logo que passasse o tempo legal e nos fosse possível pediríamos a nossa transferência, como fizeram, pelo menos, os nossos dez últimos antecessores.

Usando a vasta cultura que possuía começou a explicar-nos primeiro a fundação de Alcoutim as características do seu povo, as razões por que eram assim, como era a vida, chamava-nos a atenção para esta e aquela pessoa onde via ainda características árabes e era muito fácil compreender as suas explicações tão claras se tornavam.

Frisava sempre a autodefesa como uma das consequências do isolamento e quando as estradas chegaram a Alcoutim, a sua posição privilegiada de entreposto comercial ruiu como um castelo de cartas.

Dizia-nos porque os ouvia, que os velhos da sua meninice, inteiramente passada em Alcoutim, ainda que analfabetos, sabiam explicar todas as vivências e até o aparecimento das povoações.

Os usos e as tradições locais, de que era grande respeitador, conhecia e explicava-os com razões plausíveis.

Foi a ele que ouvimos contar pela primeira vez os casamentos à moda antiga e que sabia interpretar com profundidade. Quando procurámos mais tarde falar no assunto com outras pessoas que o conheceram bem, foi uma completa desilusão, pois raras eram as que o queriam abordar, alteravam as coisas dizendo que isso já não se usava, era dos tempos antigos, etc. etc.

Também foi a ele que ouvimos pela primeira vez a lenda da moira do castelo velho.

Antes do diálogo, disputávamos o café no jogo do “trinta e um”. Era muito engraçado, pois quase sempre se perdia “à forçada”, visto que conhecíamos bem a maneira de jogar que nos ia denunciando os números. Quando chegávamos à forçada”, era uma alegria pois durante o jogo tínhamos descoberto os números um do outro. Foi jogo que só jogámos em Alcoutim e praticamente com ele.

Luís Cunha era um apreciador dos pratos regionais de que as irmãs eram exímias executantes.

Uma das distracções que tinha, era ir pescar para o cais velho, onde muitas vezes nos encontrávamos e a conversa se desenrolava. Se na maior parte das vezes se reportava às vivências alcoutenejas, outras transportavam-no a Moçambique, onde fez toda a sua carreira profissional. Contou-nos coisas que ainda hoje recordamos e que são bem elucidativas da sua maneira de ser. Dizia-nos, por vezes, se fosse agora, já não fazia isso o que eu contrapunha dizendo-lhe que voltaria a fazer o mesmo, pois o seu alto estofo moral e social levou-o sempre à prática do bem.

Recordou-nos as brincadeiras de criança e falava dos seus amigos e das características que já apresentavam.

Não vamos aqui referir nenhuma das altruístas atitudes que tomou na sua vida, aquelas que conhecemos e às quais nunca se referiu. Tomámos conhecimento delas através de outras pessoas que as conheciam e que no-las transmitiram.

[Alcoutim. Praça da República nos anos 60 do século passado]

Confessava-nos que não tinha nenhuma vocação para exercer o lugar de presidente da Câmara, funções que considerava de “verbo-de-encher”, visto não haver dinheiro para nada, a não ser para ter a porta aberta da Câmara. O pouco que se fazia, constituía uma dádiva do poder central que em muitas situações tinham de ser esmolados aqui e ali, funções que naturalmente Luís Cunha era incapaz de realizar.

Nunca nos falou nas condições em que tinha sido atirado para o exercício dessas funções.

Quem conheceu o ambiente foi fácil de concluir que Luís Cunha serviu apenas de elo de charneira no xadrez político local.

Já algumas vezes temos escrito que Luís Cunha foi o alcoutenejo mais culto que encontrámos.

Em sua memória não podíamos deixar de escrever estas palavras na passagem do 1º Centenário do seu Nascimento, terminando com a seguinte frase:

EM ALCOUTIM, LUÍS CUNHA FAZIA A DIFERENÇA.