domingo, 30 de novembro de 2008

Ginásio Clube de Tavira

80 Anos ao Serviço do Desporto Tavirense
(1928 – 2008)




Mais um importante trabalho histórico de Ofir Chagas que dedica ao Clube do seu coração.

Numa edição do Ginásio Clube de Tavira, as 243 páginas retratam toda uma vida de 80 anos ao serviço do desporto e em variadíssimas modalidades mas possivelmente a que lhe deu mais nome foi o ciclismo onde as suas camisolas correram o país de lés-a-lés.

O trabalho é profusamente ilustrado a preto e brando e a cores não faltando igualmente muitos quadros explicativos.

Edição de Julho de 2008.

Adquiri-o numa livraria da cidade de Tavira.

sábado, 29 de novembro de 2008

Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários


A existência de bombeiros em Portugal, que eu saiba, vem dos fins do século XIX, mas à vila de Alcoutim só chegaram em 1984, sendo 20 de Agosto a data da sua fundação.

Tendo por lema, “Vida por Vida”, os soldados da paz, como são conhecidos, defendem o cidadão em situações de emergência, como incêndios, acidentes de todo o tipo e no transporte de doentes, pelo que o povo lhe dispensa gratidão.

A primeira notícia que conhecemos sobre os Bombeiros de Alcoutim foi publicada na imprensa regional (1) em 30 de Agosto de 1984 em que se informa que se aguarda a publicação dos estatutos no Diário da República a fim de se solicitarem subsídios às entidades oficiais. Logo nessa notícia se refere o apoio dado pela Câmara Municipal que está a negociar a compra de um terreno situado próximo do Rossio, destinado à construção do futuro quartel. A nova associação conta com o apoio de associações congéneres.

O efectivo é constituído por trinta e cinco elementos em 1986 que vão recebendo regularmente instrução no quartel dos Bombeiros de Vila Real de Sto. António, juntamente com os seus elementos.

A localização do quartel em Alcoutim é dada agora para junto da estrada marginal do Guadiana, na parte alta da vila, em terreno de que está a ser feita a terraplanagem.

A corporação dos Bombeiros de Monchique ofereceu aos de Alcoutim uma viatura de combate a incêndios e procura-se adquirir um pronto-socorro e ambulância. (2)

Entretanto a Câmara Municipal doou a ambulância que possuía aos Bombeiros, continuando contudo a suportar os encargos do motorista. (3)

Em 1987 já se dispõe do anteprojecto do futuro quartel que ocupará uma área de seis mil metros quadrados e custará cerca de oitenta e quatro mil contos.

O edifício terá dois pisos que ocuparão uma área de 2.400 m2 Nesta altura existem três ambulâncias e dois carros de combate a incêndio. Em 1986 registaram-se sete incêndios no concelho. (4)

Para o quartel, prevê-se, além de capacidade para oito viaturas, camaratas, casa-escola para treino e exercício, sala para reuniões, biblioteca, arquivo e um pavilhão polivalente com uma área de 600 m2 para desporto, cultura e recreio. (5)

O inspector regional de Bombeiros do Algarve, visitou Alcoutim em 1989 em serviço de inspecção. Já existia um auto-pronto-socorro médio indispensável ao combate dos incêndios e uma viatura vinda de França que custou cerca de catorze mil contos. (6)

Atendendo a uma maior procura do rio e consequentemente poder haver com maior frequência necessidade de prestar socorros, os Bombeiros adquiriram um barco para o que foram subsidiados pela Câmara em 500 contos. Além disso e a fim de proporcionar melhores condições de saúde aos munícipes, a Câmara Municipal comprou uma nova ambulância para os Bombeiros. (7)

Em 1996 concluíram com aproveitamento as provas para bombeiro de 3ª classe, dezassete elementos. O restante efectivo vem recebendo igualmente instrução para oportunamente serem sujeitos a provas. (8)

O comandante da corporação, João Manuel Rita Baptista, declara ao conhecido e desaparecido semanário Tal & Qual: “Neste momento, o meu maior desejo é ver realizada a obra que ainda nem sequer teve início, o quartel dos bombeiros. A Câmara cedeu os terrenos e fez as escavações, agora é tempo de se esperar pelo PIDAC e que a obra seja posta a concurso público”

Os cinco carros antifogo e as cinco ambulâncias da corporação, encontram-se à chuva e ao sol, degradando-se aceleradamente. (9)



O projecto da construção do Quartel só veio a avançar anos depois e em 7 de Dezembro de 1998 foi colocada a primeira pedra, tendo sido assinado um protocolo entre a autarquia alcouteneja e o Ministério da Administração Interna que irá garantir o financiamento da obra. (10)

A Corporação entretanto tinha sido contemplada com uma ambulância de emergência. (11)

Em 17 de Julho de 2001, um jornal regional noticia:- Bombeiros de Alcoutim já têm quartel, acrescentando que tinha entrado em funcionamento e cuja construção orçou em 100 mil contos.(12)

Os Bombeiros Voluntários de Alcoutim, além da sua missão base, dedicaram-se à organização das Festas da Vila e, têm a seu cargo o Lar de Idosos, um estabelecimento que no seu tipo, muito honra a vila e o concelho.

O Corpo activo comporta presentemente 50 elementos e dois funcionários administrativos.

O quartel situa-se na Avenida dos Bombeiros Voluntários.

Foi das últimas sedes de concelho a possuir Bombeiros e que eu saiba, ainda há no País pelo menos uma que não os tem e é precisamente do Algarve.

NOTAS

(1) - Jornal do Algarve - Vila Real de Santo António
(2) - Prevenir - nº 10 - Junho 86.
(3) - Jornal do Algarve de 27 de Novembro de 1986
(4) - Jornal do Algarve de 20 de Agosto de 1987.
(5) - Boletim Municipal C.M.A. nº 1 de Outubro de 1987.
(6) - Prevenir nº 24, de Dezembro de 1989.
(7) - Boletim Municipal da C.M.A. nº12 de Abril de 1993
(8) - Prevenir - nº 11 de Setembro de 1996
(9) – Nº de 20 de Setembro de 1996
(10) – “Alcoutim vai ter Quartel de Bombeiros dentro de um ano, in Jornal do Algarve de 17 de Dezembro de 1998.
(11) – “Bombeiros de Loulé e Alcoutim recebem novas viaturas”, in Jornal do Algarve de 9 de Março de 2000.
(12) – Diário do Sul (Algarve)

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

António Aleixo



A 11ª FIGURA, que iremos referir neste tema do blogue que temos vindo a abordar, é bastante conhecida, principalmente depois do 25 de Abril de 1974, em que o seu conhecimento foi explosivo de Norte a Sul do País.

Filho de louletanos, nasceu em Vila Real de Santo António em 18 de Fevereiro de 1899, mas cedo se radicou na terra de seus pais.

Conheceu uma vida difícil e exerceu actividades muito diversificadas. Foi tecelão, pastor, polícia, servente de pedreiro em França onde esteve emigrado, mas principalmente cauteleiro pois foi a actividade que mais o ocupou.

Assíduo frequentador de feiras, onde além das cautelas que vendia, por vezes tocava e cantava e espicaçado pelos amigos ia dizendo quadras de improviso alusivas à sociedade que bem conhecia pela sua experiência amarga da vida.

Cultivador de quadras e sextilhas, com palavras simples conseguia ser incisivo, justo e preciso.

Usava a ironia com mestria e tinha presente o conceito da moralidade.

Semianalfabeto, sabia ler mas tinha dificuldade em escrever.

Esteve internado no Sanatório dos Covões em Coimbra devido à doença que o veio a vitimar em Loulé, no dia 16 de Novembro de 1949, aos cinquenta anos de idade.

Em Coimbra contactou com nomes grandes da cultura portuguesa, como foram os casos de Miguel Torga e do artista Tóssan.

O Dr. Joaquim Magalhães, professor do liceu de Faro, que era seu amigo e muito o admirava como poeta, ajudou-o na organização dos livros publicados: - “Este Livro que vos deixo” (1949), “O Auto do Curandeiro”, “O Auto da Vida e da Morte, “O Auto do Ti Jaquim –(incompleto) e “Inéditos”.

Depois do 25 de Abril as homenagens ao poeta tiveram lugar em todo o país, nomeadamente no Algarve, a região onde nasceu e viveu.

No parque da cidade de Loulé foi levantado um monumento, do qual foi feita uma réplica e colocada em frente ao “Café Calcinha”, local que o poeta frequentava. A sua terra natal igualmente o homenageou com um monumento.

A cidade de Portimão, ao antigo liceu, deu o nome de Escola Secundária Poeta António Aleixo.

Por todo o país, muitas vilas e cidades deram o seu nome a novas artérias, prestando assim homenagem ao “maior poeta popular português”.

Foi instituída a Fundação António Aleixo que tem desenvolvido uma obra social assinalável.

Chamou-se António Fernandes Aleixo, de seu nome completo, e a sua veia poética começou a revelar-se aos nove anos.
__________________________________

António Aleixo – O poeta do povo, António de Sousa Duarte, Âncora Editora 1999

Dicionário de História do Estado Novo, Vol.I, Bertrand Editora, 1996, pág, 32 (Wanda Ramos)

LELLO UNIVERSAL, Dicionário Enciclopédico Luso-Brasileiro, Porto, 1975

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Pedras trabalhadas


A Câmara Escura de hoje traz-nos uma fotografia que tirei com o meu “caixote” há trinta e oito anos! Não são dois dias.

Apesar de ser um jovem, já então a minha atenção se prendia a estas coisas. Não sei se alguém, além de mim tirou fotografias semelhantes – é possível.

As duas pedras trabalhadas foram aproveitadas para ajudar a construir um muro ou uma parede, a esta distância no tempo penso que é a primeira das hipóteses, em local próximo da Igreja Matriz de Giões.

Há algumas dezenas de anos que por lá não passo pelo que desconheço se ainda aí se encontram.

As pedras aparelhadas nalgumas das suas faces, chamaram-me a atenção por esse motivo, pelo seu volume e destoando completamente das outras. Além disso, e afinal o mais importante, tinha a inscrição de uma era, 1744, ao meio, entre o 17 e o 44, uma simples ilustração dentro da qual se encontrava gravada a seguinte sigla, I H S, isto se a minha leitura estiver correcta. Por cima do H, uma cruz.

Atendendo a que me pareceu algo com ligações religiosas e admitindo que tivesse vindo de algum templo desaparecido, indaguei junto de alguém que está dentro dessa área, procurando uma explicação.

De seguro nada me foi dito, pensa-se contudo que pode ter uma possível ligação à Companhia de Jesus.

Não me parece que as peças tenham origem em qualquer templo das redondezas e isto pelas características apresentadas.

Admitimos igualmente que possa ter vindo de alguma casa “nobre” como aqui eram designadas as casas apalaçadas, que tivesse entrado em ruína e a aldeia de Giões foi terra de gente importante no contexto concelhio, nomeadamente as famílias Teixeira e Delgado.

Num “monte”da freguesia de Alcoutim encontrámos três inscrições da mesma época, mas com características diferentes.

É o pouco que se me oferece dizer sobre o assunto.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Guisado de favas

Favas descascadas guisadas com toucinho, chouriço preto e vermelho, tendo como ervas aromáticas coentros, folhas de cebola, alho, hortelã e sal, poderá ser considerado um prático gastronómico típico da serra do Caldeirão, nomeadamente do concelho de Alcoutim? Talvez, mas favas “aporcalhadas” como sempre lhe tenho ouvido chamar, tenho-as comido em qualquer parte do país e sem o rótulo de serem típicas da serra algarvia.

A diferença estará nas carnes fumadas que como se sabe são diferentes de região para região, no seu tempero e na confecção e a utilização das ervas aromáticas também não é uniforme. Mas isto constituem apenas, pequenas diferenças.

Pensamos que este prato poderá ter a sua origem no Alentejo onde a carne de porco tem grande tradição gastronómica tal como o uso das ervas aromáticas.

No litoral e principalmente no oeste, a fava é confeccionada de preferência cozida e juntamente com batata acompanha peixe cozido ou frito, como facilmente se compreende.

Sempre gostei muito de favas e em casa de meus pais comiam-se principalmente aporcalhadas, utilizando-se os coentros e a folha de alho, mas não a hortelã e a folha da cebola.


(Faval em Alcoutim, Fevereiro de 2001. Foto J.V.)

Quando cheguei a Alcoutim, há mais de quarenta anos e me perguntaram se gostava de favas, imediatamente disse que sim.

Quando no dia seguinte me puseram à frente favas guisadas com a casca, fiquei meio desorientado pois nunca tinha visto tal e considerava aquilo comida própria para …

Ainda que com alguma relutância, comecei a depenicar, colocando de lado as cascas da vagem e comendo só os miolos. Como não me estava a saber mal, experimentei provar as cascas e para meu espanto, sabiam-me melhor do que os miolos.

Então não é que ainda repeti!

Acompanhava-se com muge frito e a indispensável salada de alface, feita à montanheira

Como é evidente este prato só se pode fazer com as vagens ainda tenras. Cortam-se à volta e são guisadas (estufadas) em azeite, em lume brando e polvilhadas com um pouco de sal. Quatro ramos, atados com linha branca, cada um da sua espécie ou seja, coentros, hortelã, folha de cebola e folha de alhos. Dão-lhe um toque fantástico. A indispensável salada e o peixe frito, de preferência muge ou barbo.

Na época própria, gosto de confeccionar o prato e oferecê-lo a visitas que hipoteticamente possa ter e até hoje, todos gostaram, repetem em suas casas mas dizem sempre que não souberam tão bem, o que é normalíssimo em tais circunstâncias.

Não encontrei este prato em mais parte nenhuma, nem em livros de culinária, que por aqui tenho, e que não uso.

Este é para mim o verdadeiro prato típico de favas à maneira da serra, mais propriamente do concelho de Alcoutim, mas nunca o encontrei em qualquer restaurante.

Não sou comentador gastronómico, no entanto como cidadão e cozinheiro amador tenho naturalmente direito a opinião, que é minimamente sustentada.

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Uma jóia que desfalece em Alcoutim

Pequena Nota
Vamos republicar hoje, na nossa rubrica Ecos da Imprensa um escrito que fizemos publicar num semanário regional, há mais de trinta e cinco anos, por isso, antes do 25 de Abril!
Tal como acontece hoje, naquela altura, muito poucos vinham para a imprensa denunciar e chamar a atenção das “misérias” verificadas, como aquelas que se relatam no texto.
O poder democrático eleito há muito que resolveu a situação, deixando o castelo num brinco em relação ao que era. Lamento que os turistas tenham de pagar uma taxa para o visitar




(Publicado no Jornal do Algarve de 12 de Maio de 1973)

Alcoutim, antiga praça forte e histórica vila, também conhecida e indicada por Alcoitim e a que os romanos chamaram Alcoutinium e os árabes, Alcatiã, situa-se na margem direita do Guadiana, para ele debruçada e no ponto de confluência deste rio com a ribeira de Cadavais, na encosta de um serro, onde principia a serra algarvia.

Foi terra importante, ponto fulcral do Guadiana, atalaia vigilante, elo de ligação entre o Alentejo e o Algarve. Por isso, os reis da primeira dinastia, por ela se interessaram. D. Sancho conquistou-a aos mouros em 1240, D. Dinis outorgou-lhe foral a 9 de Janeiro de 1304, mandando reedificar o castelo e as muralhas que a cercavam, D. Afonso IV a fez vila, concedendo-lhe outros privilégios e D. Fernando escolheu-a como “palco” para firmar com Henrique II de Castela, em 31 de Março de 1371, um tratado de paz, que ficou conhecido por “Paz de Alcoutim” e pelo qual terminou a primeira guerra que aquele nosso rei teve com Castela.

O que nos resta que prove a importância outrora desempenhada? – o antiquíssimo castelo. Crê-se que seja de fundação anterior ao domínio árabe, acompanhando a criação do povo, por isso, de eras remotas. Teve uma configuração quadrada, tal como o demonstra um desenho existente na Torre do Tombo e que representa a vila e a vizinha Sanlúcar, no século XVI.

Foi reforçado no século XVII, certamente por iniciativa de Álvaro Gomes de Gouveia que na altura das Guerras da Restauração da Independência ocupou o posto de sargento-mor deste castelo e foi encarregado de várias obras de defesa, saindo-se airosamente dessa missão.



No Algarve foi em Alcoutim que estas campanhas mais se fizeram sentir, principalmente a de 1642, devido ao constante duelo de artilharia com o castelo de Sanlúcar do Guadiana.

Teve armazéns para apetrechos de guerra e tem cisterna, há muitos anos entulhada. Do interior, resta o paiol da pólvora, de abóbada de berço e parte do cano de um velho canhão constitui o espólio daqueles apetrechos.

Os fortes muros, de xisto da região, ainda mantêm várias ameias com seteiras e pelo terramoto de 1755 “sofreram umas rachaduras”.

A porta principal é ogival, tal como outra virada para o rio e toscamente entaipada. O recinto amuralhado ocupa uma área de cerca de 2700 m2. No interior e redondezas, têm aparecido várias moedas antigas.

Em Alcoutim, segundo a lenda, uma bela agarena chora o cristão seu namorado, morto pelo guerreiro mouro, seu pai.

Da parte reforçada no século XVII, plataforma que se teria artilhado e está virada para Sanlúcar, desfruta-se surpreendente panorama sobre aquele “ayuntamiento” e distantes terras de Espanha e avista-se o majestoso Guadiana para além da Lourinhã e do Alcaçarinho, antigos postos vigilantes da Guarda Fiscal e que recentemente foram adquiridos por particulares.

A “jóia” de Alcoutim pode dizer-se que está completamente desprezada. Diga-se contudo que nos últimos anos tem sido beneficiada com pequenas reparações, que cremos serem obras dos Monumentos Nacionais, mas são muito insignificantes para aquilo de que necessita.

O paiol da pólvora, que serve de arrecadação aos mais variados objectos (madeiras, ferros, pneus e traquitanas) quase não tem uma telha inteira e a abóbada, com a infiltração das águas, muito tem resistido mas se não lhe acodem, em breve ruirá.

O pasto que lá se cria, na época própria atinge tal altura que dificilmente se entra e percorre. Valem na circunstância aos visitantes as cabeças de gado que ali encerram, pois fazem a “limpeza”. Quantas vezes aparecem nos píncaros das muralhas as nostálgicas ovelhinhas que, com os seus balidos, atordoam a pacata vila!?

O hortejo também lá murou e naqueles terrenos pisados por bravos soldados e regados com o seu sangue, têm vicejado favais e couvais!

Em 1972 alguns veraneantes, vindos em passeio fluvial, escolheram-no para “sala de almoço”. Sem dúvida que o local é excelente mas a “limpeza” tê-los-ia desiludido e nunca mais voltaram.



Quantas vilas e cidades desejariam possuir esta relíquia, para a conservar, amimar e desfrutar as vantagens que a sua presença oferece? Quantas pousadas têm sido construídas em idênticos monumentos? Quantos museus se têm organizado, neles se recolhendo os achados regionais? E por estas paragens tanta coisa tem sido encontrada que enriquece vários museus espalhados pelo País.

O castelo de Alcoutim é um manancial de sugestões. Não será um “crime” deixá-lo ser curral, hortejo ou arrecadação, para não falar no vazadouro público que já foi, não há muitos anos?

Quem olha para ti, glória do passado, relíquia do presente?

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

A Lenda da Horta da Fonte dos Mouros


(Ataíde de Oliveira)
A freguesia de Vaqueiros, situada no interior do concelho de Alcoutim e nas faldas da Serra do Caldeirão, dominadora daquelas paragens e onde naturalmente os mouros se fixaram até à sua expulsão concluída por D. Afonso III, deixaram vários vestígios, alguns que ainda hoje se podem verificar, por exemplo na toponímia, como é o caso de alcaria (a aldeia) representado nos montes de Alcaria, Alcarias e Alcaria Queimada.

Muitas são as palavras que a nossa língua aglutinou e transmitiram-nos técnicas agrícolas ainda hoje conhecidas e mesmo utilizadas nas quais se incluem o enxerto de zambujeiros em oliveiras. Deixaram-nos igualmente a técnica de construção em taipa, hoje posta em desuso mas que foi muito utilizada em casas e mesmo em muros protectores de terrenos como ainda actualmente se pode verificar.

As lendas de mouras encantadas também ficaram e continuam a perdurar na memória do povo.

Estas lendas, que aparecem do norte ao sul do país, talvez com mais intensidade no sul, pois foi por estes sítios que permaneceram mais tempo, baseiam-se fundamentalmente na tríade: “beleza feminina”, “riqueza representada por barras de oiro” e a “luta desumana a travar para obter o prémio”, muitas vezes representado pelo conjunto da bela agarena e do tesouro.

Para além disto, aparecem naturalmente outras circunstâncias como os amores entre as princesas árabes e os cavaleiros cristãos, castelos, covas, grutas e poços e outras acrescentadas pelos seus contadores no decorrer dos séculos.

Bem, mas vamos ao que nos propusemos contar: A LENDA DA HORTA DA FONTE DOS MOUROS.


(Vaqueiros, vista do sul, 1989.Foto J.V.)
Nas proximidades do Monte do Zambujal, a cerca de trezentos metros, existe uma fonte aberta em rocha, onde há uma figueira, sobre a qual tem aparecido uma bela moura, chamada a princesa, admiravelmente vestida, que pede às pessoas, às quais aparece, a desencantem a troco de muitos tesouros, guardados por um mouro gigantesco, cuja habitação está escondida em uma cova logo abaixo da referida Horta. Esta cova é ainda hoje designada pela Cova da Moura. Um pouco mais abaixo existe um pego, chamado o Pego do Mouro, onde muitos afirmam estar depositado o tesouro prometido pela moura.

Para ser desencantada a moura, é mister que o sujeito trave luta com o mouro gigantesco e o vença. É aqui que está toda a dificuldade. Ninguém se atreve a lutar com o mouro pelo receio de ser vencido ou morto.
Ainda que não se conheça a data do encantamento, pensa-se que este aconteceu quando os mouros foram expulsos da região.

É nestes termos que Francisco Xavier Ataíde de Oliveira descreve esta lenda no seu trabalho “As Mouras Encantadas e os Encantamentos do Algarve”, Tavira, 1898 com edição recente de 1994. A informação devia ter sido obtida através do colaborador local, P. João de Sousa Valente.

Esta lenda é referida igualmente em Mitos e Lendas de Vaqueiros, Edição Alcance, 2003.
Também eu a referi no meu trabalho, Alcoutim, capital do nordeste algarvio (subsídios para uma monografia), 1985, pág. 391.

domingo, 23 de novembro de 2008

Uma Etnomusicologia do ALGARVE Rural


Uma Etnomusicologia do ALGARVE Rural é um livro de 114 páginas de formato 16X24, editado pela Fundação Pedro Ruivo com texto de Francisco Parrot Morato e de Luís Miguel Clemente que igualmente realizou a transcrição musical, enquanto a pesquisa foi realizada por Francisco Parrot Morato, Maria do Céu Figueira e Nuno Filipe Martins.

Os cantes recolhidos englobam os realizados em “bailes de roda”,” cantigas ao despique”, “bailes de mastro” e “orações e cantos religiosos”, entre outros.

O concelho de Alcoutim está representado com Velhinha, Laurinda, Fui passear ao jardim, Se não fosses morena, Olha o meu Cardoso, Vivá Republica, Pombinha branca, Venho da ribeira nova, em “Cantigas de Baile” e Marcela, Romã, Antonico Tiroliro, Ó pombinha chora, chora, Eu hei-de morrer, Ó águia que vais tão alta, Vila nova de Ferreira, As cobrinhas d´água, Comboio, Entrudo, Rosa branca, Rama da oliveira, Tira o cravo, tira a rosa, Debaixo da laranjeira, Caiadeira, Minha Mãe, Lírio Roxo do Campo, Laurindinha e Meu coração, em “Cantigas com Moda”. As Cantigas Religiosas estão representadas por Oração das Almas, Senhora da Conceição e Nossa Senhora.
A nível de localidades, estão representados Balurcos, Pessegueiro, Alcoutim, Castelhanos, Laborato, Clarines, Vaqueiros e Azinhal.

O exemplar foi-me oferecido por um dos autores, o Dr.Francisco Parrot Morato, a quem agradecemos.

sábado, 22 de novembro de 2008

Os Bancos da Capela



Habituei-me a ouvir chamar-lhe os “Bancos da Capela”, o que sempre me intrigou.
Deles se desfrutava, ao cair da tarde, boas imagens sobre a quietude do Guadiana, correndo mansamente.

Procurado por idosos para uma situação de descanso ou por alguns moços para as suas traquinices, quando não por um romântico casal de namorados procurando um beijo furtivo!

Tudo isso acabou!

Durante vários anos fez-me confusão chamarem-lhe Bancos da Capela, quando se situavam junto da Igreja Matriz. Aparentemente teria mais lógica chamar-lhe Bancos da Igreja, mas assim não acontecia.

Só muito depois vim a saber que a primitiva matriz foi aquela a que hoje se chama Capela ou Igreja de Nª Sª da Conceição e no local onde se encontra a actual matriz teria existido uma capela que depois de várias transformações deu origem à nova matriz.

A existência da capela perdeu-se na memória dos tempos mas a designação nos bancos, manteve-se ainda que as pessoas desconheçam a razão.

Foto J.V. - 1968

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

José Joaquim Mestre

Acaba de nos chegar a notícia do falecimento deste amigo, ocorrido no dia 19.

Nascido e residente no monte de Afonso Vicente, da freguesia e concelho de Alcoutim, tinha 69 anos e deixa viúva Maria José (Romão), dois filhos, a Ana e o José e quatro netos, além de vários irmãos.

José Mestre que foi há muitos anos emigrante em França, onde lhe nasceu a filha, era homem muito trabalhador, tendo um fraco pela pastorícia que praticou até ao seu falecimento.

Trabalhou nos últimos anos para a Junta de Freguesia de Alcoutim.

Ficou sepultado no cemitério da sua freguesia natal.

Aqui deixo expresso as minhas condolências aos seus familiares, especialmente à esposa e filhos.

Manuel Aleixo Duarte Machado

Nasceu esporadicamente na Vila de Castro Marim a 4 de Setembro de 1769 e foi baptizado na igreja paroquial da mesma vila uns dias depois.

O seu pai, Aleixo Duarte Machado era negociante de gado e natural de S. Bartolomeu de Messines, onde vivia, aliás como os seus ascendentes.

Tendo sido acusado pela prática de contrabando, é processado mas entretanto foge para Espanha, fixando residência com a mulher em Aiamonte.

Foi numa ida a Castro Marim que a mulher deu à luz o Manuel Aleixo e aí recebeu o sacramento do baptismo. O pai, depois de livre do processo voltou a Portugal com a mulher e o filho voltando à sua terra natal onde veio a falecer.

Manuel Aleixo Duarte Machado, de seu nome completo, veio a ser Presbítero Secular e Doutor em Cânones pela Universidade de Coimbra, tendo sido graduado em 3 de Julho de 1796.

(Castro Marim, vista parcial)
Destinando-se ao magistério foi por algum tempo Opositor na referida Faculdade, acabando por ser nomeado cónego da Igreja Catedral de Faro, onde impugnou a eleição de um Deão para Vigário Capitular (1817).

Foi deputado às Cortes Ordinárias de 1822.

O Dr. Manuel Aleixo era considerado pelas pessoas que o conheciam de perto, como homem de muito saber, mas deixou impressos poucos trabalhos, como são os que se seguem e são conhecidos: Sermão pregado nas exéquias pelos portugueses que morreram na última guerra, celebradas na Catedral de Faro, em 23 de Maio de 1814, Tradução dos Diálogos Socráticos, feita do idioma francês, em Português, Lisboa, 1823 e Resposta a uma censura do Desembargo do Paço sobre direitos da sucessão ab intestato, etc, Lisboa, 1823.

Calcula-se que tivesse falecido no Algarve em 1833 ou pouco depois.
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http://radix.cultalg.pt, em 05.10.2008.
Dicionário Bibliográfico Português, Inocêncio, Francisco da Silva, Tomos V e XVI, respectivamente de 1860 e 1893.
A Catedral do Algarve e o Seu Cabido – Sé em Faro, José António Pinheiro e Rosa, Separata dos “Anais do Município de Faro – Nº XII”, Vol.I, Faro, 1983.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

A pesca à colher, arte extinta no Guadiana


(Barco armado de colher, do falecido pescador Raimundo, no cais de Alcoutim, 1968)
A primeira vez que abordei este assunto foi no já distante ano de 1977, no número de 30 de Setembro do Jornal do Algarve, quando era seu modesto colaborador, publiquei “A pesca no Guadiana em Alcoutim”.

Anos depois, voltei a abordar o assunto no meu trabalho, Alcoutim, Capital do Nordeste Algarvio (Subsídios para uma monografia), 1985.

Trabalhando para uma hipotética 2ª Edição daquele livro, acrescentei naturalmente aquilo que fui recolhendo com o andar dos anos, já que nestes assuntos existe sempre algo mais para dizer pois nunca se consegue dizer tudo.

Como o título do artigo indica, esta arte encontra-se completamente extinta no Guadiana e consequentemente em Portugal pois não consta que se tivesse praticado em qualquer outra parte do país.

A referência mais antiga que conheço é a que nos fornece Baldaque da Silva (1) afirmando que (este tipo de pesca) é pouco usado pelo insignificante lucro que dá.

Bastava um homem para praticar tal arte.


(Barco armada de colher na 3ª Feira de Artesanato)
A lancha, apetrechada com a colher que consistia em duas varas bastante compridas que formam entre si um ângulo agudo, coberto por uma rede de malha de 10 mm, onde se colocam chumbadas, dirige-se para a margem, indo fazer aquilo a que o homem do rio chamava “pescar contra a terra”.

A colher, colocada à ré, afunda-se pelo manejo do pescador que vai remando em direcção à margem. Próximo dela, atira pedras, ora para a direita, ora para a esquerda, ora para a frente, tentando a junção do peixe sobre a rede que, quando muito próximo da margem, é levantada. Na rede, formando saco, encontrava-se o peixe saltitando.

Quando se fala na pesca do Guadiana, é sempre referida esta arte, não pelo interesse económico que tivesse tido, mas sim e segundo pensamos, pelo seu ineditismo.

Em 1986, num programa de televisão da bióloga, Clara Pinto Correia, ouvimos dizer-lhe que esta arte foi trazida de Espanha, onde era utilizada antes de ser descoberta pelos pescadores portugueses, mas não indica a proveniência.

Mais concreto é José Manuel Fernandes que em Rios de Portugal, 1990 (2), escreveu:- "A pesca que utiliza a arte de colher, praticada apenas no Guadiana e no Guadalquivir, está a cair em desuso devido ao grande esforço que requer a manobra da rede."

Noutro trabalho diz-se que é curioso ver em Guerreiros do Rio, entre Alcoutim e Odeleite, velhas artes de pesca artesanal, redes de colher que descem nas águas e regressam cheias de pequenos e saborosos peixes. (3)

Mário Ventura, em trabalho jornalístico (4), escreveu:- "À margem encosta uma pequena embarcação, com uma estranha arte de pesca: é a colher, explicam-me que só se encontram no Guadiana. Talvez restem, quando muito, duas ou três artes deste tipo."

Também nós, em 1967, quando vimos pela primeira vez acostar, ao velho cais da vila aquela aventesma, ficámos embasbacados.

Tudo isto faz parte do passado, só num cortejo histórico poderemos voltar a ver uma embarcação armada de colher.

As outras artes estão em declínio, mas não é a altura de falar nelas. Ficará para uma próxima oportunidade.
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NOTAS
(1)-Estado Actual da Pesca em Portugal, 1891, pág. 322
(2)-Edições Gradiva.
(3)-ALGARVE, Novos Guias de Portugal, José Victor Adragão, Editorial Presença.
(4)-"Guadiana - Um rio desconhecido no sul (II)", in Diário de Notícias, 22 de Julho de 1985.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

PÃO DURO, pequena povoação da freguesia de Vaqueiros

Logo ao sairmos da aldeia de Vaqueiros, tomando a direcção de Martim Longo, cortamos à esquerda para irmos ao encontro deste “monte”, o mais próximo da sede da freguesia de Vaqueiros, a que pertence.

Ficará a uns três quilómetros. A estrada municipal nº 1047, asfaltada, construída na década de oitenta, apresenta muitas curvas e vários declives. Nas ravinas, um ou outro pequeno hortejo e nas encostas, o mato é rei com predomínio da esteva.

Poucos metros andados, à direita, as ruínas de um moinho. Quando aparece algum terreno limpo, é o chaparreiro que domina, sendo diminuto o número de amendoeiras.

Os traçados telefónico e de energia eléctrica acompanham a estrada que é estreita mas suficiente para o movimento. À esquerda viam-se alguns cortiços que indicam a produção de mel que ainda hoje se verifica.

(Vista Geral, 1989)
É a vez de se atravessar um pequeno barranco, que dá pelo nome de Ribeirão, o que fizemos através de um pontão. Voltamos a subir e o betuminoso encontrava-se em mau estado. Um pouco mais à frente e onde o xisto mostra as suas entranhas, a indicação à esquerda, de uma barragem de terra batida a 1 km e avista-se, pela primeira vez a povoação que procuramos. Situa-se numa elevação e era notório o número relativamente elevado de antenas de televisão.

Uma curva pronunciada à esquerda, leva-nos a ponte de seis vãos pela qual atravessamos a ribeira da Foupanilha, afluente da Foupana. Daqui até ao monte, é sempre a subir.

A água era distribuída por fontanários espalhados pela povoação de tipo concentrado e os arruamentos foram asfaltados em 1989. Em 2003 a água foi levada aos domicílios (1) mas não existe sistema de esgoto, cada um resolve o problema como pode.

A par das construções típicas, existe uma ou outra moderna, mesmo tipo de vivenda e de dois pisos, proveniente do trabalho de emigrantes.


Duas fornalhas chamavam a atenção e existia um forno comunitário.

Já tem alguns anos de existência uma pequena associação, Centro Cultural e Recreativo que na altura em que o conhecemos tinha cerca de cinquenta sócios e local de encontro para beber um copo, tomar um café, dar dois dedos de conversa, jogar uma partida de três setes ou ver televisão.
(Rua Principal, 1989)

De formação mais recente é uma associação de Caçadores e Pescadores que exploram uma ZCA (Zona de Caça Associativa).

Uma cooperativa agrícola, a COOPDURO, fundada pouco depois do 25 de Abril, produzia espécies hortícolas, de carácter biológico e medronho (1.300 litros em 1997), foi visitada em 26 de Janeiro de 1990 pelo então Subsecretário de Estado da Agricultura, como atesta uma placa colocada na sua sede.

Nas Memórias Paroquiais de 1758, o pároco ao responder ao questionário, atribui ao Pamduro, oito vizinhos. Silva Lopes (2) ainda que o refira a pág. 402, não lhe atribui qualquer vizinho no quadro geral que apresenta, possivelmente por lapso.

No censo de 1991 são indicados 50 habitantes em 33 edifícios.

Em 1881 a população com o auxílio da Câmara Municipal procede à abertura de um poço pois estava bebendo da ribeira da Foupana.

Em 1934 a Câmara subsidia a abertura de um novo poço com 700$00, sendo encarregado de organizar o trabalho, José Catarino. (3)

Por esta altura inaugurou-se um posto escolar com a presença do Presidente da Comissão Administrativa da Câmara Municipal, o Prof. Trindade e Lima, que por aqui andou dois ou três dias, já que então a deslocação a estas paragens só se podia fazer de burro ou a pé!

Há várias estórias para justificar o topónimo, ainda que todas se baseiem na mesma coisa.

(Casa típica, 1989)
Diz-se que o nome do monte terá vindo de uma velha avarenta que pagava aos homens que trazia na lavoura com pão já de vários dias. Quando iam trabalhar para ali, já sabiam ir trabalhar para o Pão Duro. (4)

O povo tem sempre estórias como esta para contar.

Os topónimos de origem antroponímica têm grande representação no nosso país. Aqui poderá estar uma alcunha que veio a ser aglutinada pelo antropónimo e este poderia ter dado origem ao topónimo.

Pão aparece em numerosos topónimos compostos, como por exemplo: Pão Bolorento (Évora), Pão Branco (Faro), Pão e Água (Mértola), Pão Ralo (Elvas) e Malhapão (Tondela).(3)

Depois do encerramento do posto, as crianças iam à escola a Vaqueiros, hoje, se existir alguma terá que ir a Martim Longo.

A estrada continua para Monte Argil e Corte Serranos, ambos “montes” da freguesia de Martim Longo,

Para possibilitar a ligação entre esta povoação e a de Pêro Dias foi construída uma passagem submersível sobre a ribeira da Foupana. (6)

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NOTAS

(1)- Alcoutim, Revista Municipal, nº 10, de Dezembro de 2003, pág.6
(2)- Corografia do Algarve, João Baptista da Silva Lopes, 1841, pág.402
(3)- Actas das Sessões da Câmara Municipal de 8 de Março e 29 de Novembro de 1934
(4)- Elucidário Algarvio, Fernando Cabrita, 1991, pág.83
(5)- Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, José Pedro Machado, Horizonte/Confluência, III Vol.
(6)- Alcoutim, Revista Municipal, nº 5, de Novembro/1997, pág.6

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Algumas curiosidades politico-administrativas do concelho de Alcoutim

Até à reforma administrativa preconizada pelo regime liberal, o termo de Alcoutim abrangia as actuais cinco freguesias, mais a de Cachopo que por Decreto de 6 de Novembro de 1836 passa a fazer parte do concelho de Tavira.

Com a publicação do 1º Código Administrativo (Governo de Passos Manuel), em 31 de Dezembro de 1836, as até aí chamadas províncias e comarcas foram substituídas por distritos e o designado “Termo” por concelho. Por outro lado as freguesias que por vezes eram repartidas por dois ou mais termos, passaram a pertencer exclusivamente a um concelho.

As Memórias Paroquiais de 1758 dão-nos a conhecer situações próprias da época e que entretanto foram banidas como já referimos.

À distância de 250 anos, será interessante conhecer o que se passava em relação ao concelho de Alcoutim.

As indicações por vezes não são muito precisas e quando as pomos em comparação tomando em consideração as respostas dadas pelos párocos das respectivas freguesias aos questionários formulados, encontramos diferenças que penso residiram no melhor ou pior conhecimento que tinham das paróquias pelas quais eram responsáveis.

Da vizinha freguesia de Odeleite, termo de Castro Marim, o importante monte das Furnazinhas, com 50 vizinhos, as Cortes de Antomé (São Tomé), actuais Corte Velha e Corte Nova, Monte Novo e Zambujeiros pertenciam ao termo de Alcoutim. Em contrapartida e segundo o pároco de Alcoutim, esta freguesia tinha junto ao rio os sítios de Laranjeiras, com 20 vizinhos, Guerreiros com17 e o do Álimo (Álamo) com 15 que faziam parte do termo de Castro Marim

Em relação a Tavira, Alcoutim “cedia” da sua freguesia de Cachopo, a parte que ficava a sul da ribeira de Odeleite e que englobava entre outros os “montes” da Cortelha, Ceroles, Garrobo, Mercador, Cabeça Gorda, Azinhosa, Mealha e Peralva. (1)

Da sua freguesia de Cachopo, Alcoutim cedia ao termo de Faro o monte de Pêro Chumaço e parte do lugar da Feteira. (2)

A freguesia do Ameixial pertencente ao termo de Loulé fazia cedências a Faro e a Alcoutim. Eram doze os montes que estavam afectos a este termo e de uma maneira geral de poucos fogos. Penso que alguns teriam desaparecido completamente.

Eram eles, indicando-se o número de fogos que na altura possuíam : Colmeias do Boi (1), Corte de Ouro de Cima (8), Corte do Meio (14), Corte de Baixo (7), Corte de João Marques (18), Vale da Moita (4), Almarginho (3), Revezes (15), Pereirinha (3), Boloteira (3), Mestras (1) e Lourencinho (2).

Treze anos depois das informações prestadas pelos párocos, temos conhecimento que alguns dos habitantes dessas pequenas povoações manifestaram o seu gado na Câmara de Alcoutim a que pertenciam ou fizeram-no por meio de interposta pessoa, muitas vezes com residência na vila.

É o que faz Manuel Afonso das Furnazinhas e Gaspar Vaz do Zambujeiro.

O maior número é registado na freguesia de Ameixial, vindo da Corte João Marques, o Capitão (de Ordenanças) André Roiz (Rodrigues) Contreiras, António Estevens, João Roiz (Rodrigues) e João Manuel, enquanto da Corte do Ouro o fizeram José Fernandes, Gregório e Domingos da Costa e Amaro Pereira. Do monte de Revezes manifestaram gado, António Pereira e António Afonso.
Do pequeno monte da Pereirinha veio José Fernandes e do Vale da Moita, dos primeiros a fazê-lo, João Alves.

(Ass, do Cap. André R. Contreiras)
Quase todos os manifestos comportaram reses, mas nunca ultrapassando a dezena, que eram acompanhados de poucas dezenas de gado miúdo representado por ovelhas e cabras, aparecendo algumas vezes as designações de borregos e chibatos. Os porcos apareciam em menor número. (4)

Tudo indica que se tratavam de pequenos proprietários que tinham na criação do gado um meio de realizar o indispensável para despesas prementes.

Pensamos que a divisão das freguesias por mais de um termo tinha a ver além das distâncias verificadas e postas em confronto com as dificuldades em vencer os acidentes naturais, nomeadamente as ribeiras que nalguns meses do ano, mais invernosos, não davam passagem a pessoas e a animais. Se as estradas eram uma miragem, o que dizer de pontes, problema só resolvido depois do 25 de Abril de 1974.

Referimos alguns aspectos politico-administrativos antes de 1836. Numa próxima abordagem, referiremos outro período.


NOTAS
(1) – Tavira e o seu Termo – Memorando Histórico, Arnaldo Casimiro Anica, Tavira, 1993, pág. 43.
(2) – “A Freguesia de Cachopo em 1758, Leitura da Memória Paroquial”Arnaldo Casimiro Anica in Jornal do Algarve de 16 de Dezembro de 1993.
(3) - Dicionário Portugal, Esteves Pereira e Guilherme Rodrigues, Edição Romano Torres, pág. 175, Iº Volume
(4) – Tomo de Manifeztos e Arolam toz da Camera doz gâdoz, iniciado em 1771 (faltam folhas)

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Alcoutim - Sanlúcar de Guadiana - o saber e o sabor



Esta brochura gastronómica bilingue, constitui um livrinho de 90 páginas de bom papel e profusamente ilustrado. Com prefácio do antropólogo, Francisco Parrot Morato, da Associação Alcance , apresenta o enquadramento geográfico e a caracterização histórica das regiões lideradas por Alcoutim e Sanlúcar de Guadiana.

São abordadas seguidamente a gastronomia tradicional do nordeste algarvio e do andévalo (província de Huelva), sendo apresentadas as tradições gastronómicas das duas regiões e várias receitas de peixe e carne, passando pelos doces e licores.

É uma Edição da Associação Terras do Baixo Guadiana, textos de Anabela Silva e coordenação de Alcance, Associação para o desenvolvimento do Nordeste Algarvio.
Publicado em Abril de 2008.

Oferta da Associação Alcance.

domingo, 16 de novembro de 2008

ALCANCE

ASSOCIAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE ALGARVIO



Esta associação cívica nasceu no dia 21 de Abril de 1990, por iniciativa de um conjunto de quadros técnicos, representantes de instituições locais e outras pessoas com uma intervenção social relevante, unidas por uma preocupação comum: o processo de desertificação no concelho de Alcoutim (1), sendo então designada por ALCANCE, Associação para o desenvolvimento do concelho de Alcoutim.

Estimular uma rede de comunicações e cooperação intra-concelhia e entre o concelho e as Entidades que do exterior podem apoiar acções de desenvolvimento, são objectivos da associação. (2) A impotência das instituições oficiais para responder ao desafio da desertificação da serra algarvia foi uma das razões que levaram ao nascimento desta associação.

A associação abriu a sua sede na Travessa de Nª Sª da Conceição, nº 1, na vila de Alcoutim, em instalações cedidas pela Santa Casa da Misericórdia.

Foi depois instalado um posto de informação sobre programas de apoio à criação de emprego, financiado pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional e organizaram-se dois cursos de formação profissional, no âmbito do programa para a Conservação do Património Cultural do I E F P, curso de gastronomia regional e curso de arte de ferro. (3)

Correspondendo às orientações propostas pela Comissão Europeia, o Campus de Alcoutim, organizado pela ALCANCE, teve como objectivo a restauração, conservação e divulgação desse património. (4)

Entretanto, em colaboração com a Câmara Municipal, participa no estudo de investigação e execução do projecto de instalação do Museu do Rio, no projecto e execução do Parque de Merendas de Guerreiros do Rio, na implantação da Casa do Artesanato, espaço de exposição e venda de artesanato e produtos do concelho, a funcionar no Castelo da Vila, entre outras acções. (5)

Desde a sua fundação a Associação teve os seguintes secretários coordenadores: Dr. Henrique Gregório, sucedendo-lhe Abílio da Encarnação, sendo o lugar depois desempenhado pela Dra. Vitória Cassinello.

Passou por um período muito difícil, encontrando-se agora numa situação de estabilidade.

Os Estatutos foram alterados em 16 de Março de 2005, operando-se o alargamento da acção, demonstrado na mudança do complemento da designação. Por outro lado desapareceu o lugar de secretário-coordenador, passando a Associação a ser dirigida por cinco elementos: presidente, vice-presidente, secretário, tesoureiro e um vogal, havendo dois suplentes, para em caso de necessidade substituírem algum dos elementos efectivos.

A Presidência foi ocupada pela Dra. Vitória Cassinello até 1 de Agosto de 2008, altura em que a assume, José Manuel Simão.

Tem cerca de sessenta sócios e a sua sede está situada na Rua de Timor, s/n, 8970 – 064 – Alcoutim.

Notas:
(1) - Alcoutim - Revista Municipal, nº 2, Dezembro/95
(2) - "Alcoutim tem nova associação", in Correio da Manhã de 14 de Novembro de 1990
(3) - Informação aos associados de 14 de Novembro de 1990.
(4) - Jornal do Algarve de 7 de Setembro de 1995.
(5) - Alcoutim - Revista Municipal, nº 2, de Dezembro/95.

sábado, 15 de novembro de 2008

Dr. José Pedro Cunha

ACHEGAS PARA MELHOR CONHECER ESTE MÉDICO DE ALCOUTIM

Escreve
Gaspar Santos





Lembro-me perfeitamente do dia da morte do Dr. Cunha. Tinha então 9 anos. Os meus amigos e eu ficamos muito tristes quando soubemos do desenlace fatal, que as crianças não compreendem nem aceitam. Nessa tarde estivemos na rua a aguardar notícias pacientemente, preocupados mas esperançados na sua cura.

Embora este médico já estivesse reformado havia vários anos, era muito estimado pelo seu bom trato e pelas actividades culturais e de entretenimento que vinha criando e proporcionando sobretudo no teatro. Nesta arte “tocava” quase todos os “instrumentos”: escrevia os textos, encenava, desenhava magistralmente os cenários etc. Muitos ditos das suas récitas teatrais perduraram muito para além da sua morte e, alguns foram mesmo utilizados em récitas levadas à cena depois do seu falecimento.

Fora sempre uma pessoa muito calma, até na sua fala arrastada com grande sotaque madeirense, amável e disponível.

Sobre as suas competências como clínico, dada então a minha tenra idade, pouco posso testemunhar. Somente por ouvir dizer. Foi muito hábil na ajuda a parturientes. A maior parte do seu exercício clínico ocorreu quando ainda não se tinha dado a “revolução” química na medicina. Recorria com competência a medicina com base em ervas e chás; um ou outro medicamento manipulado, revulsivos, banhos e pensos quentes e frios, e outros agentes físicos, sangrias, purgantes, dieta, etc.

Constou alguns anos depois, que a farmácia não encarou muito bem o processo de sucessão do Dr. Cunha devido à radical alteração de receituário, com alguns medicamentos a ficarem como monos de armazém.

A minha família mais próxima está muito ligada à vida e obra do Dr. Cunha. Gratos como seus pacientes, mas também por estima e amizade e, sobretudo, por apreciarmos a grandeza de alma deste médico na ultrapassagem de uma situação dramática que nos atingiu. Meu Pai viu-se em 1930 envolvido sem querer no “conflito” entre o Dr. Cunha quase a atingir o limite de idade e um novo médico, recém formado que na Corte Velha, concelho de Castro Marim já dava consultas e fazia tratamentos gratuitos subsidiado pelo Pai. Este médico até tinha sido já abordado por gente influente de Alcoutim para vir para aqui trabalhar.

Meu Pai adoeceu com uma situação muito grave de apendicite complicada. O Dr. Cunha tratou-o o melhor que pode e, após ter esgotado o saber e os meios de que dispunha, disse: vão lá chamar o meu colega; ele saiu agora da Universidade e é capaz de trazer outros conhecimentos e métodos. E de facto, assim foi o primeiro doente grave que o Dr. Dias tratou e curou na Vila de Alcoutim.

O Dr. Dias, seria nomeado em 1932 para um segundo partido médico municipal e viria mais tarde a ser o sucessor do Dr. Cunha como único médico (municipal e subdelegado de saúde) de Alcoutim em 1934 após a reforma deste. Tenho conhecimento de que os dois médicos colaboraram e foram amigos até ao fim da vida do Dr. Cunha.

Já depois de reformado o Dr. Cunha desenhou e orientou o meu Pai na construção do meu cavalo de madeira com um estrado/balancé que ao cavalgá-lo fez a minha delícia e a de muitos dos meus amigos e até dos meus filhos.


(O "cavalo" montado por mim com 4 anos)

Também não me esqueço de ter visto no princípio dos anos 40, os dois médicos Dr. Cunha e Dr. Dias, no meu quintal a orientarem o tratamento e o penso que o meu Pai fazia a uma égua doente com um tumor ou quisto (era uma chaga profunda entre as patas da frente) de que se curou.

Mas a nossa amizade e estima não se ficou apenas pelo Dr. Cunha. Estendeu-se também à sua família. Todos os anos na época dos “figos de tuneira” a minha Mãe mandava um presente deles à Senhora D. Domingas Cunha a viúva do Dr. Cunha. Além de gostar muito destes figos, eles representavam também muito de afectivo, pois provinham do Areeiro, uma propriedade que fora sua e que o Dr. Cunha vendeu ao meu tio Gaspar quando voltou para a Madeira em 1925.

Nessa altura vendeu também aos meus Pais umas peças de mobiliário das quais algumas ainda existem: uma secretária de madeira que está em poder da minha irmã Cremilde e um guarda loiças que eu conservo com todo o carinho.

Com cerca dos meus 12 anos as filhas do Dr. Cunha, a professora Clarisse e sua irmã Conceição entregaram-me um enorme e espesso volume para eu ler. Esse livro era nada mais nada menos que os Lusíadas em papel muito encorpado e com a ortografia que o Camões usara. Eu fiz questão de o ler até ao fim com toda a atenção. A D. Clarisse Cunha era Regente Escolar muito conceituada na Escola Feminina de Alcoutim. Assisti a algumas aulas suas sempre que havia impedimento do Prof. Mendes Amaral.

Dos outros filhos do Dr. Cunha conheci bem o Luís Cunha de quem fui muito amigo. Na sua juventude proporcionou-me muitos passeios no quadro da bicicleta e, ofereceu-me um triciclo de madeira que ele próprio construiu. Voltei a privar com ele após o seu regresso de Moçambique, onde tinha exercido serviço na Administração Colonial.

Aceitou então ser Presidente da Câmara de Alcoutim, cargo que não suportou durante muito tempo e demitiu-se por falta de condições para trabalhar. Quando regressou de África Luís Cunha comprou o Areeiro que assim voltou à posse da família.

Também privei de perto com a filha Berta, esposa do senhor Leopoldo o encarregado do Grémio da Lavoura onde eu iniciei a minha vida profissional.

Não tenho nenhuma recordação de ter visto os seus filhos Artur Cunha e José Cunha, que sendo dos mais velhos cedo saíram de Alcoutim. Sei que o Artur Cunha era Técnico de Engenharia em Aveiro. E que era dirigente do Clube Galitos de Aveiro quando os seus remadores atingiram brilhantemente as meias-finais nos Jogos Olímpicos: de Londres (1948) e Helsínquia (1952) na modalidade de Shell 8+ (oito com timoneiro). Ficamos muito satisfeitos como é natural e o Grupo Desportivo de Alcoutim enviou telegramas de felicitações a este nosso conterrâneo.
Aqui fica a minha homenagem a um homem a quem Alcoutim muito ficou a dever e a sua magnífica família de Alcoutenejos de verdade.

G. S.
2008-11-04

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Dois calvários nas Cortes Pereiras

O Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, Academia das Ciências de Lisboa – Verbo, 2001, na entrada CALVÁRIO, tem como quinta explicação Region. (Alg.) Pequeno cruzeiro de pedra ou de ferro que assinala no campo o lugar onde morreu alguém.O Dicionário do Falar Algarvio, de Eduardo Brazão Gonçalves, 2ª Edição aumentada, 1996, não deixa igualmente de o incluir, como próprio do falar algarvio.

Eu penso que estes singelos cruzeiros se espalham por todo o país com designações diferentes havendo naturalmente zonas onde o número é maior e hipoteticamente outras em que não existirão.

Não conheço a existência de algum na nossa freguesia natal e nos trabalhos que conheço nunca vi o assunto tratado com amplidão.

Julgo que a primeira pessoa que me falou num calvário, neste sentido, foi há cerca de quarenta anos na vila de Alcoutim e isto ao tentar explicar-me a origem da casa que habitava e em que se incluía na estória o assassinato de um capitão (de ordenanças), facto atestado com a elevação de um calvário nas proximidades de Afonso Vicente.

O contacto mais directo com a zona norte da freguesia de Alcoutim, nestes últimos vinte anos, foi-me trazendo a existência de mais casos, todos ou quase todos com uma estória, mais ou menos sucinta a acompanhá-los.

De alguns, de material, nada resta, a voragem do tempo e dos homens tudo levou, ficou a estória que já poucos conhecem e naturalmente deturpada com o decorrer dos anos; outros, ainda existem, ou por serem mais novos, por terem sido conservados durante alguns anos, ou porque não foram vandalizados, ainda que hoje, a grande maioria, para não dizer a totalidade, das gentes da zona os respeitem.
A erecção de um calvário tinha a ver com as circunstâncias consideradas não normais da morte e que tinha causado impacto entre a população. Daí, todos terem uma estória mais ou menos dramática atrás deles e hoje muito pouco conhecida.

Só conhecemos a tradição oral e o mais que poderíamos obter, pensamos, seria o assento de óbito que poderia indicar a causa da morte, obtendo-se assim outros dados importantes como o nome ou sua confirmação, a idade, o estado, a residência, a filiação e outros.



Iremos agora referir o que obtivemos sobre o desaparecido Calvário do Poço da Pia.

Situava-se nas proximidades deste poço público, localizado no Monte do Poço, o maior aglomerado populacional das Cortes Pereiras.

Em meados do século XIX vivia uma jovem, no Monte de Cima que se enamorou de um moço, namoro que os pais dela muito contestavam, de tal maneira que, pretendendo com ele juntar-se, uma tia a chamou para sua casa a fim de lhe organizar o casamento, como veio a acontecer.

Nem assim os pais mudaram de posição, pelo contrário, as represálias continuaram com mais vigor. Estava em causa como era próprio da época, os teres e haveres, além, segundo dizem, do comportamento do rapaz, um pouco leviano.
Dizia-se então das Cortes Pereiras, comentando o facto:

Mana Maria Francisca
Das Cortes é o raminho
Teve que sair de casa
Para casar com o Fidalguinho (1)

Do casal vieram a nascer cinco filhos, quatro raparigas e um rapaz.

As dificuldades económicas do casal agravaram-se, o relacionamento entre os cônjuges não seria o melhor pelo que, Maria Francisca resolveu pôr termo à vida afogando-se no poço da pia. (2)

Foi esta morte que deu origem ao hoje desaparecido calvário, encimado por cruz de ferro e que se situava perto deste poço, como não podia deixar de ser já que eles se destinam a marcar o lugar onde alguém morreu.

Consta que Maria Francisca era neta de um Manuel Francisco Rosa. (3)

Calvário da Godinha

Outro cruzeiro erigido nos princípios do século passado e que ainda se encontra de pé, situa-se no sítio rústico denominado Godinha que se situa entre as Cortes Pereiras e a Lourinhã. Quem tomar o caminho que passa junto ao Monte do Sol, encontrá-lo-á à direita, pouco afastado do mesmo. (4)

Tem este a circunstância de assinalar a morte do único filho de Maria Francisca, falecida por afogamento no poço da pia e que acabámos de referir.

A vítima, de que não me souberam dizer o nome, tinha ido pastar uns bois para as margens do rio, onde havia bons pastos e por lá permaneceu alguns dias. Levava consigo entre outras coisas uma almotolia de folha que lhe permitia o tempero de alguma comida.

Regressando a casa, com os bois, é apanhado por forte e inesperada trovoada e fulminado por um raio que igualmente “furou” a almotolia.

A vítima, que teria cerca de trinta anos, era solteira.

A família levantou em sua memória um calvário, com cruz de ferro e que enquanto a sua irmã Luísa foi viva e pode, cuidava da sua conservação, caiando-o principalmente.
A almotolia, símbolo funesto do acontecido foi guardada durante muitos anos pela irmã Luísa que ao ouvir uma trovoada, metia-se na cama e tapava-se com quantas mantas podia. Sofreu por isso um trauma com o acontecimento.
Aqui fica a singela estória deste calvário. (5)

NOTAS

(1) A designação “fidalguinho” tem a ver com o nome próprio e com a maneira de ser.
(2) O fundamental da estória foi-nos contado por uma bisneta da Maria Francisca, das Cortes Pereiras, hoje com oitenta e dois anos e que sempre ouviu contar todo este enredo, que acabou em tragédia, a sua mãe e a outros familiares.
(3) Tive igualmente informações de Manuel Joaquim dos Santos, residente em Afonso Vicente.

(4) Foi Manuel Joaquim dos Santos, de Afonso Vicente que nos deu a conhecer a existência deste calvário e que nos contou a razão da sua existência.
(5) A identificação familiar da vítima foi-nos dada por uma sobrinha-neta, neta de sua irmã Luísa, hoje com oitenta e dois anos.

(Publicado no Jornal do Baixo Guadiana, nº 101, de Setembro de 2008)

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Posto retransmissor da RTP


Em 1967 via-se pessimamente televisão na vila de Alcoutim numa casa que pertencia ao Sr. Leopoldo Vicente Martins e pagava-se, se a memória não me falha, 1$00. A receita destinava-se à Santa Casa da Misericórdia. Em qualquer outra casa, nada se via.

Entrei lá uma ou duas vezes, uma foi para ver o programa ZIP ZIP ainda hoje muito falado.

O retransmissor que a foto apresenta foi instalado em 1969 (Vide Vamos Falar de Televisão, Livros RTP, nº 29, Lopes da Silva e Vasco Hogan Teves, 1971, pág.185) e isso deve-se fundamentalmente à acção de um filho desta terra, que muito a amava, o Tenente da Marinha, Virgílio Rosa, que através dos bons relacionamentos que tinha com a RTP consegue que isso viesse a acontecer.

Reparar que nesse ano foram instalados apenas cinco retransmissores (Lisboa-Graça, Sintra, Valença, Alcoutim e Elvas). Por aqui se vê que qualquer das outras instalações tinha um potencial nada comparável ao de Alcoutim.

Era então necessário arranjar o local, dar-lhe o mínimo de condições de acesso, construir o casinhoto indispensável e naturalmente vedá-lo.

E o dinheiro para tudo isto, onde se ia buscar? Na Câmara não havia dinheiro para nada, só existia para ter a porta aberta e promover A ou B.

Teve que ser a população a quotizar-se, os que tinham mais uns tostões, através de dinheiro para a compra de materiais e os outros, com o seu trabalho, deram a ajuda indispensável, sem a qual não teria sido possível tal melhoramento.

Houve gente que apesar de não viver na terra, não deixou de prestar a sua colaboração.

A vida, em Alcoutim, passou a ser menos difícil.

Uma coisa é certa, se não fosse o Tenente Virgílio António Rosa só se teria visto televisão em Alcoutim depois do 25 de Abril!

Aqui fica este pequeno apontamento que serve para RECORDAR UM HOMEM QUE AMAVA A SUA TERRA COMO POUCOS e que o poder político tem simplesmente ignorado.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

A Capela do Espírito Santo na aldeia de Martim Longo

Situa-se sensivelmente a meio da povoação esta capelinha de 64 m2 de superfície coberta. (1)

A fachada é muito idêntica à de São Sebastião, situada na extremidade da aldeia. Sobre a porta, trabalho de argamassa com sentido decorativo e por cima deste foi aberto depois de 1975 um óculo circular.

No topo da fachada, situa-se um pedestal encimado por cruz simples de ferro forjado.

Telha de canudo. Pequeno adro empedrado com xisto da região.



Não aparece referida nas “Visitações” da Ordem de Santiago de 1518 a 1566, ainda que o culto do Espírito Santo seja dos mais enraizados no concelho estendendo-se também a concelhos vizinhos, como ao de Mértola.

Sabe-se que o retábulo foi consertado em 1695 e em 1782. O pintor tavirense, Diogo Mangina, recebe 4$800 réis pela pintura que nele faz, mas não se sabe se se trata do mesmo retábulo. (2) Notar que o pároco da freguesia ao responder à pergunta 13 do questionário (Memórias Paroquiais - 1758), informa que a freguesia tem duas “Irmidas”, a de S. Sebastião, um pouco distante do lugar e a de Sta. Justa, distante dele uma légua pequena, pelo que na altura esta não devia existir, ou se existisse estaria completamente em ruína e isto tomando em consideração que era assunto forçosamente conhecido do eclesiástico.

Em 13 de Janeiro de 1843 a Câmara, em correição (toda a vereação), percorre a aldeia e entre outras deliberações, determina que não se consintam estrumeiras junto da Igreja do Espírito Santo. (3) pelo que nesta altura já existia.

Em 1870, na toponímia local existe a Rua do Espírito Santo, certamente aquela que lhe dá acesso e que na actualização toponímica, efectuada recentemente, foi mantida.

No altar encontra-se uma imagem de Santo António (sobre a sua mão esquerda está o menino) pintada e decorada. Pertenceu à Confraria de Santo António, da Igreja Matriz, onde esteve colocado. (5)

Já há muito que serve de capela mortuária e encontra-se bem cuidada.

NOTAS

(1)Art. 1529 da Matriz Predial, freguesia de Martim Longo, concelho de Alcoutim.
(2) A Escultura de Madeira no concelho de Alcoutim do século XVI ao Século XIX, Francisco Lameira e P. Manuel Oliveira Rodrigues, Faro, 1985.
(3) Acta da Sessão da Câmara Municipal de Alcoutim de 13 de Janeiro de 1843, realizada em Martim Longo.
(4) Ofício da Junta de Paróquia datado de 27 de Agosto de 1878.
(5) A Escultura de Madeira no concelho de Alcoutim do século XVI ao Século XIX, Francisco Lameira e P. Manuel Oliveira Rodrigues, Faro, 1985.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

A Pneumónica no Algarve


A PNEUMÓNICA NO ALGARVE - Numa Edição da Caleidoscópio, constitui um interessante estudo, proveniente de aturado trabalho de investigação de Paulo Girão, licenciado em História e na altura docente na Escola EB 2, 3 de Monchique.

É um livro indispensável para o conhecimento da história do Algarve e onde obtive alguns dados sobre Alcoutim e tive oportunidade de aclarar situações que conhecia só através da transmissão oral que naturalmente vai deturpando com o decorrer dos tempos.

De formato 17X24 tem 183 páginas.

Adquiri-o numa livraria de Vila Real de Santo António.

sábado, 8 de novembro de 2008

O Pezinho de Nª Senhora

Não foram só as ímpias agarenas, dotadas de beleza sem par, filhas de grandes senhores e ligadas a príncipes e cavaleiros cristãos, que ficaram no lendário alcoutenejo.

Nossa Senhora, segundo os crédulos, teria passado por terras alcoutinenses, abençoando-as.

O povo, em razão da sua imaginação, ainda por volta de 1972 mostrava o local por onde teria passado Nossa Senhora e o Menino, no velho caminho vicinal da Lourinhã, que passava próximo do castelo velho, sobranceiro ao Guadiana.

Ao contornar o Cerro da Mina, encontrava-se junto ao caminho uma rocha de xisto na qual estava gravado o “pezinho de Nossa Senhora”” e perto, na mesma rocha, uma concavidade que indicava o “berço”, segundo uns ou a “banheira”, segundo outros, do Menino Jesus.

Um pouco mais afastado, os agentes da natureza formaram aquilo a que chamavam “o cu do diabo” que, escorregando ali, nas suas viagens tentadoras e maléficas, deixou testemunho desse facto.
(Cerro da Mina)
A nossa curiosidade leva-nos ao local (1970), onde observámos as “inscrições”, sendo a do pezinho muito perfeita, uma miniatura de pé humano, notando-se nitidamente os cinco dedos e a planta do pé.

A natureza reserva-nos situações destas, que os povos aproveitam para arquitectar as suas “estórias”.

Sempre que passávamos por aqueles sítios, encontrávamos raminhos de rosmano e de alecrim no berço (ou banheira) e no pezinho, mas no “traseiro do diabo”, só tojo, para que se por ali voltasse, fugisse de rabo alçado!

Todos ou alcoutinenses idosos falam no “Pezinho de Nossa Senhora” e há décadas, aos domingos, grupos de jovens lá se deslocavam, em romaria, cumprindo o ritual do alecrim e do tojo.

Quando por volta de 1972/73 e na primeira tentativa de exploração frutícola da zona, máquinas procedendo ao alargamento do caminho, destruíram a “rocha santa”, o local do pezinho lascou de tal maneira que a inscrição ficou intacta, o que foi logo atribuído a “milagre”.

Quis um dos trabalhadores levá-la para casa onde era guardada com muita “devoção”.
Tempos depois e em conversa com o proprietário dos terrenos, falámos no assunto, lamentando o facto. Pesaroso ficou, criticando por não o terem avisado, pois o pezinho e seu conjunto teriam sido preservados e a tradição mantida. (1)

Foi pena.

As gerações de agora já não podem colher alecrim e tojo, enaltecendo o Bem e castigando o Mal. Dos jovens, poucos conhecerão a “Lenda do Pezinho de Nossa Senhora”.

NOTA
(1) – O Senhor Barata, já falecido e que foi proprietário do Monte do Sol (Cortes Pereiras).

(Publicado no Jornal do Algarve de 17 de Março de 1987)

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Frederico Cabreira Drago Valente

Das quatro sedes de concelho que consideramos neste trabalho, Mértola, Alcoutim, Castro Marim e Vila Real de Sto. António, é esta a de mais recente fundação, a uma distância muito considerável de todas as outras cuja fundação se perde no recuar dos tempos.

Frederico Leão Cabreira de Brito Alvelos Drago Valente, de seu nome completo, nasceu em Vila Real de Sto. António em 5 de Julho de 1800.

Era filho de Severo Leão Cabreira de Brito e Alvelos Drago Valente e de D. Maria Isabel Fabrigos Viñez. (1)

Inicia a sua carreira militar aos dezasseis anos, assentando praça de cadete no Regimento nº 2, de Artilharia, em Faro. Concluindo os estudos da arma, era 2º tenente em 1823.

Herdou da família, o foro de Fidalgo Cavaleiro da Casa Real. Em 1845 e devido aos serviços prestado na Índia e em Timor, foi-lhe conferida a Comenda de São Bento de Avis e a Comenda da Ordem de Isabel a Católica pelo governo de Espanha, em 1847 pelos serviços que prestou na luta que findou com a Convenção de Gramido. Por decreto de D. Luís, de 16 de Agosto de 1870 é agraciado com o título de Visconde de Faro, (2) distinção que tinha pertencido a seu irmão, Dioclesiano Leão Cabreira.

Foi lente e director da Academia Militar de Goa, comandante da Artilharia da mesma província, ajudante general do exército da Índia, director de todas as praças e fortalezas, governador das ilhas de Timor e Solor (1839/1844), governador do Castelo de S. Jorge de Lisboa (1846/1847), Comandante da Subdivisão Militar da ilha de S. Miguel, governador militar da Praça de Valença, deputado por várias vezes às Cortes, Comandante da Divisão Militar do Algarve, membro do Supremo Conselho de Justiça Militar, etc. etc.

Além da acção político-militar, Frederico Drago Valente que foi promovido ao posto de General de Divisão, deixou algumas obras impressas de que destacamos: “Instrução dada pelo Vice-rei, Marquez de Alorna ao seu sucessor Marquez de Távora, precedida de uma notícia histórica acerca do primeiro, e com várias notas ilustrativas”. Imprimiu-se em Goa em 1836;” Memória resultante do Inquérito industrial nas ilhas de Timor e Solor”, a que fez proceder, sendo governador das mesmas ilhas; “Memória ou Resumo histórico da vida e serviços do último Vice-Rei da Índia, D. Manuel de Portugal e Castro,” 1860 e “A gruta de Camões em Macau”.

Colaborou em jornais e revistas sendo igualmente considerado como poeta.
Deixou inédito “Notícias das Ilhas de Timor e Solor (…) (3)

Faleceu em Lisboa a 30 de Novembro de 1880.
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NOTAS
(1)–http://genealogia.netopia.pt em 10.08.2008
(2) História Genealógica da Casa Real Portuguesa, Vol, XV,(complementar) Coord. de Manuela Mendonça, 2007
(3)“Dicionário Bibliográfico Português”, Inocêncio Francisco da Silva, Tomo Nono, MDCCCLXX.

sábado, 1 de novembro de 2008

Mês de Novembro

EFEMÉRIDES ALCOUTENEJAS

Dia 3
1836 – Em Sessão de Câmara realizada em Martim Longo, foi aprovado que na vila de Alcoutim fosse permitido os porcos andarem pelas ruas.

Dia 7
1588 – É presa em Portimão pelo Tribunal do Santo Ofício, a alcouteneja, cristã-nova, Grácia Gonçalves, de cerca de 45 anos, acusada de judaísmo, heresia e apostasia.

Dia 12
1595 – É preso pelo Tribunal do Santo Ofício, João Lourenço, cristão-velho, sacristão na igreja de Alcoutim, natural de Alcoutim, de 25 anos, casado com Grimanesa d`Horta e acusado de sodomia.

Dia 15
1496 – É criado por D. Manuel o título de Conde de Alcoutim na pessoa dos primogénitos do Marquês de Vila Real.

Dia 21
1941 – Deliberado em Sessão de Câmara e por unanimidade, criar um segundo partido médico e com sede em Martim Longo.

Dia 25
1496 – D. Manuel I fez Fronteiro-Mor do Algarve, D. Fernando de Meneses.

Dia 29
1985 – É inaugurada a luz eléctrica nas povoações de Alcaria Cova (Pereiro), Velhas e Marim (Giões).