domingo, 30 de setembro de 2012

Mais uma noite difícil! (Poema)




Poetisa

M Dias



Fevereiro de 1985


No silêncio envolvente

De uma noite, molhada e fria,

Sucumbiu de madrugada,

O Sr. Manuel Maria


Há pouco, ainda dizia

Sinto-me tão cansado!

Afaguei-lhe o rosto e disse-lhe,

Agora, vamos dormir!

Durma Sr. Manuel

Vai sentir-se aliviado.


Mas a morte, raposa matreira,

Como ogre de manto imundo,

Pela porta das traseiras,

De rompante, leva a melhor,

Cortando o último fio

Que o ligava a este mundo.


Meses em “cama ardente”

Com a vida a se esvair,

O Sr. Manuel dizia:

Confio no vosso saber, estou tranquilo.

As malvadas bactérias,

Não se vão ficar a rir!


Sr. Manuel desculpe

Esse malvado mostrengo,

Não conseguimos travar,

Esteja em paz, nesse outro mundo.

Os seus filhotes, de olhitos tristes,

Aos poucos vão aceitar!


A vida é o dia de hoje, a vida é ai que mal soa,

A vida é sombra que foge, a vida é nuvem que voa...

sábado, 29 de setembro de 2012

Cama de ferro de "bancos"


Este é o tipo de cama de ferro cujo exemplar é o mais antigo que conheço no concelho de Alcoutim e designa-se por “cama de bancos”.

Confesso que é o único que conheço e é propriedade minha pois adquiri-o na vila de Alcoutim por volta de 1973, tendo-me custado 150$00.

Nunca tinha visto tal modelo e encontrei-o encostado a uma parede. Quando estava a observá-lo, chegou a proprietária que por graça me perguntou se queria comprar pois tinha notado o meu interesse. Perguntei-lhe quanto queria, respondeu-me 150$00 e o negócio ficou fechado.

"Cabeceira"

Bem poucos alcoutenejos de hoje conhecerão este tipo rudimentar de cama de ferro.

Quando fiz a aquisição e já lá vão cerca de quarenta anos, procurei saber junto da anterior proprietária, já falecida há muito, como é que aquelas duas peças funcionavam.

Arrumei-as numa arrecadação e anos depois pintei-as como ainda estão.

Atendendo a que na nossa rubrica de Etnografia tenho abordado, ultimamente, alguns tipos de camas de ferro antigas, este veio-me logo à memória. Só recentemente tive oportunidade de o fotografar para esta publicação.

Para esclarecimento de várias dúvidas contactei a minha informadora habitual, alguém que nasceu e viveu a maior parte da sua vida no concelho de Alcoutim, que já ultrapassou as oito décadas, teve uma vida de pleno contacto com a ruralidade e possui ainda uma excelente memória.

Este género de cama trata-se de uma evolução de uma primitiva cama de bancos, menos elaborada e feita pelo homem comum, por isso, sem ser especialista na arte.

"Pés"
Quando tinha essa necessidade, procurava encontrar, principalmente, em azinheiras ou em qualquer outra árvore de madeira resistente um tronco mais ou menos direito com cerca de 80 / 90 cm que cortava. Com uma enxó ou ferramenta que fizesse o mesmo trabalho, facetáva-o num dos lados, naquele que considerava com melhores condições.

Nos ramos provenientes da limpeza das árvores os seus olhos procuravam encontrar dois ramos robustos, parecidos e que possuíssem uma forca.

Cortava-os de um tamanho semelhante, perfurava a parte oposta à facetada com um trado ou então utilizando um formão, numa das extremidades, de maneira que a parte que não tinha forca pudesse encaixar com alguma profundidade e justeza. No outro extremo procedia da mesma maneira tendo em conta o equilíbrio do suporte, aqui designado por banco.

Pelo modo indicado, construía os dois bancos à mesma altura. Colava-os à distância adequada e sobre eles assentavam paus de comprimento igual e outros da largura dos bancos e em sentido contrário, cruzando-se.

Sobre essa espécie de estrado colocavam um colchão de palha de aveia.

A cama de bancos em ferro é baseada no mesmo princípio, sendo neste caso, os bancos feitos desta matéria e onde já aparece a diferença entre a “cabeceira” mais elaborada e os “pés”.

A forca para equilíbrio dos bancos também existe mas com uma sustentação mais eficiente. De resto, tudo funcionava da mesma maneira.
 
 

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Não são alcoutenejos mas têm lá raízes


 
Tirada na vila de Alcoutim, num pátio já desaparecido, vendo-se ao fundo a fazenda do “Rossio”.

A fotografia foi tirada vai para 40 anos e os meninos de então, que são 3ºs primos, hoje homens maduros, em que até a cabeleira já desapareceu completamente.

Os barbeiros com estas gerações não se governam!

O mais novinho não está a gostar nada da situação como demonstra a expressão.

O mais velhinho com modos proteccionistas tenta resolver a situação para que o improvisado fotógrafo dispare.

Como o título indica, ambos têm raízes em Alcoutim. No mais pequenino elas são todas alcoutenejas, no mais velhinho já assim não acontece.

Enquanto um deles nunca deixou de pisar as ruelas do “seu” monte e da vila, o outro esteve afastado bastantes anos.

Têm a particularidade de continuarem amigos e o nome próprio ter um dos elementos comuns, além, naturalmente do de família.

Para quem não os descobriu, diremos que o mais velhinho é o nosso colaborador José Miguel Nunes.

Deste modo o outro é fácil de saber quem é.

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Alcoutenejos confraternizam


(PUBLICADO NO JORNAL DO ALGARVE DE 3 DE JULHO DE 1986)

Realizou-se em 15 de Junho, no Parque Desportivo da Verdizela, cedido pela Câmara Municipal de Setúbal, o VI Convívio dos Naturais do Concelho de Alcoutim.

Depois de um início titubeante, como é natural, os “Convívios” têm vindo a aumentar de ano para ano, tanto no número de convivas como no seu programa, constituindo uma assinalável manifestação de bairrismo.

Provas de atletismo, campeonato de malhas, corridas de sacos e futebol de salão, no aspecto desportivo, uma exposição fotográfica sobre o concelho, de autoria do alcoutinense, Dr. João Dias e uma palestra sobre o livro “Alcoutim, Capital do Nordeste Algarvio”, pelo autor, Ascensão Nunes, constituíram a parte cultural.

Sardinhas e febras assadas na brasa, além de merendas do concelho e das redondezas da capital, originaram o tradicional convívio a que se seguiram as “variedades”.

Foi calculada a presença de mil e duzentas pessoas, com algumas centenas vindas do concelho.

Presente, a convite, Duarte Moura, autor de um recente livro de contos intitulado “Guadiana” e onde alguns retratam a vila e arredores e os seus costumes.

Duarte Moura exerceu a actividade em Alcoutim, por volta da década de trinta.

Presença indispensável e habitual foi a do Presidente da Câmara, Manuel Cavaco Afonso e de outros autarcas.

Fez-se venda do livro “Alcoutim, Capital do Nordeste Algarvio”, autografado pelo autor, cujo produto reverteu a favor da novel Associação de Bombeiros de Alcoutim.

Pequena nota

Estive presente neste convívio a convite do agora colaborador do AL, Eng. Gaspar Santos que teve a amabilidade de me conduzir ao mesmo.

Tive então oportunidade de conhecer o trocar impressões com Duarte Mouro e lembro-me de também ter sido nesse local que estive pela última vez com João Baltazar Guerreiro que tinha ido ao “Convívio” com o Dr. João Lopes Dias.
JV

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Crónicas e Ficções soltas - Alcoutim - Recordações - XXXVI


 
 
Escreve
 
Daniel Teixeira 




DENOMINAÇÕES, POÇOS E BOLOTAS

Tínhamos (e temos em princípio) uma cerca que se chama do «Touril» que fica logo à entrada do Monte para quem vem pela estrada, é claro, do lado direito e antes de chegar ao poço da horta do senhor Manuel Tomás. Chamo-lhe de poço da horta para o distinguir do outro poço que agora é comum e que já foi pertença dos Tomazes, tal como consta já no Blogue Alcoutim Livre sobre a história da abertura de um poço comum. Se bem me lembro o que se disse na altura é que não se encontrava pessoal para aprofundar o dito poço aos valores que a autarquia pagava, pelo que consta em acta o reforço da verba.

Diga-se em abono da verdade que todo o dinheiro que fosse pedido para aprofundar um poço não seria seguramente demais naquela altura com as condições de segurança que devia haver, passe a possível grande experiência dos «técnicos» que na sua grande parte seriam meros curiosos com habilitação de experiência.

Já volto à cerca do Touril para dizer em que me baseio para dizer que aprofundar um poço não é petisco nenhum dado o risco que se corre. Fui testemunha ainda moço e devo dizer que fiquei tão frustrado e tive tanto medo como os restantes: punham-se as barras de dinamite, metia-se o rastilho e dava-se fogo. Depois era subir as escadas o mais depressa possível não fossem os tempos de rebentamento não serem respeitados por razões das mais diversas.

Essa possibilidade não era assim tão remota e devo dizer que no caso que presenciei nenhum rebentamento houve e tivemos que desistir depois de uma tarde inteira a subir e a descer escadas com mais umas corridas para tão longe quanto possível : eu e mais uns quantos como observadores e um outro, o mais velho e logo mais responsável, a meter o rastilho e a dar fogo ao mesmo. Este apagou-se sempre por mais que se limpasse a água no local, mas mesmo aí, passado o tempo normal de rebentamento mais uma margem larga, tínhamos de esperar um bom bocado, não fosse o rastilho reatar. Depois ia um espreitar cuidadosamente e só quando se estava certo que o rastilho estava a zeros é que se recomeçava, mesmo assim sempre com a suspeita de que poderia não se estar a ver bem.

Ora a cerca do Touril não tinha qualquer poço mas estava rodeada de poços por todos os lados menos nela: ao lado o senhor José Pereira tinha o tal poço que andava sempre a tentar aprofundar e que nunca correspondia às suas expectativas, logo atrás estava a zona da Valedégua de cima (com água relativamente abundante) e abaixo o tal poço da horta dos Tomázes. Numa área de cem metros sensivelmente havia pelo menos quatro poços. No Touril não!

A nossa parte do Touril (estava dividida em duas faixas) era a que mais merecia ter água segundo a lógica mas não tinha. A faixa de cima também não tinha água mas essa era mesmo seca e exposta pelo que dificilmente seria de calcular abrir ali um poço, pelo menos pela lógica. Essa parte era de um primo nosso que «abalou» para Espanha, que durante uns anos ainda vinha de lá com o seu carro de mulas apanhar as azeitonas e as alfarrobas e que depois deixou simplesmente de vir: ficámos com os frutos a seu mandado e com a azinheira que dava bolotas em dose industrial. Como não tínhamos porcos de pasto (tínhamos um pocilgo com um porco de engorda e que já tivera dois anos antes) apanhávamos as bolotas na medida das necessidades e lá se ia fazendo a vida.

Ora o Touril a ter água dava uma das melhores hortas que poderíamos ter: tinha uma base de aluvião em superfície plana extensa (na proporção local) e tinha outra vantagem que era estar próxima do Monte. Mas não tinha água e mesmo quando começou a haver condições técnicas de broca a preço razoável e se começaram a abrir poços pelo Monte em cada esquina, praticamente, já o nosso último sobrevivente da «batalha» pela vida por lá, o meu avô, tinha falecido e já não lhe servia de nada ter mais um poço e uma horta.

http://www.raizonline.com/cinquentaecinco.htm
 

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Cais Novo - Primeiras cargas e descargas




Escreve

Gaspar Santos



Já aqui nos referimos à construção deste cais, obra a que assistimos de dentro da escola primária que frequentávamos nesse tempo.

No ano a seguir à inauguração do cais teve início a minha vida profissional no Grémio da Lavoura, que foi desde sempre a entidade mais utilizadora dos serviços deste cais.

Hoje vamos referir as primeiras descargas, curiosamente de palha e aveia vinda de fora, contrariamente aquilo para que fora previsto que seria carregar para a saída desses e de outros produtos da terra.
Alcoutim nos anos 60'
 
O Engenheiro Duarte Pacheco, o grande ministro das obras públicas, quando pensou neste cais destinava-o ao embarque para saída de produtos agrícolas do Alentejo. E o primeiro uso do cais foi precisamente o contrário daquilo para que tinha sido construído: - descarregar esses produtos de outra proveniência.

Para o serviço do que era o seu objetivo – escoar produtos do Alentejo - nunca o vimos utilizar. É que os grandes transportes por camioneta já tinham ganho na concorrência com os outros meios. Em primeiro lugar com o domínio atingido pela tecnologia dos seus motores e em segundo lugar por puderem ir a qualquer parte carregar e descarregar esses produtos.

Quando este cais foi inaugurado em 1944 já o engenheiro Duarte Pacheco tinha falecido no ano anterior. Dizia-se então no Algarve que este Ministro da Obras Públicas nada ou pouco fizera pelo Algarve, para não parecer um ministro ao serviço do Algarve mas do País. O cais de Alcoutim teria sido uma das exceções.

No verão de 1944 as primeiras descargas foram de palha e aveia encomendadas pelo Grémio da Lavoura para minorar a sua escassez no nosso concelho, consequência do ano hidrologicamente seco, caso contrário muitos animais teriam morrido de fome.

Nos anos seguintes o grosso da utilização do cais foi a descarga de adubo, super fosfato de cálcio comprado à CUF do Barreiro pelo Grémio da Lavoura.
O Cais Novo com novas funções. Foto JV, 2012

Eram navios da Sociedade Geral de Transportes do Grupo CUF que vinham ao Pomarão carregar pirites e enxofre. E nessa vinda sem carga podiam aceitar o transporte de adubo fabricado pelo mesmo grupo, por um preço pequeno, uma receita marginal e não que não era esperada.

O Grémio pagava dois fretes a partir do Barreiro: um marítimo efectuado pela Sociedade Geral; outro à C.P., de comboio que esta embora não o efectuasse (!), se destinava pura e simplesmente à protecção dessa empresa já nesse tempo deficitária.

A descarga do adubo fazia-se do porão do navio para cima do cais em “lingadas” içadas por grua do próprio navio. A grua a vapor era manobrada pelo José Altura (que mais tarde morou em Alcoutim e se ocupou na ligação a Sanlúcar por barco a remos) ou por outro trabalhador do Pomarão.

Depois um verdadeiro exército de trabalhadores precários, recrutados dentre os jovens agricultores ou pessoas sem emprego, transportava os sacos às costas para a esplanada do cais onde ficavam empilhados e com uns toldos de proteção por cima. Era daqui que eram distribuídos de camioneta pelo concelho já consignados a quem os adquirira ao Grémio.

Para as tarefas de coordenação destas entregas o Grémio da Lavoura, em geral, reforçava os meios humanos que tinha em Alcoutim com um funcionário que nestas primeiras descargas começou por ser o José Bento vindo de Vila Real de Santo António.

Ele começava por montar “escritório” de manhã junto das pilhas dos produtos (palha, aveia ou adubo). Depois para se proteger do sol intenso acompanhava a sombra ao longo do dia até se fixar na sombra da Casa dos Condes onde morava uma senhora solteira de nome Nascimento.

As falas nesses intervalos do trabalho tiveram o mérito de juntar pelo casamento este casal, que durou até ao falecimento dela. Esta senhora era tia do brigadeiro Trindade e Lima e do irmão engenheiro Rogério Lima.


Durante muitos anos, por falta atempada do seu pagamento, ouvi falar e tratei de muita papelada que referente a “Palha e Aveia Antiga”. Suponho que foi um mau negócio para o Grémio, inclusivamente por litígio entre o Grémio e uma seguradora que ganhou com razão por falta da previsão dos responsáveis do Grémio.

Conta-se em duas linhas e talvez sirva de lição para muitos de nós quando contratarmos um seguro. Num transporte por barco o grande risco era a palha estragar-se por inundação por água do mar ou afundamento do barco. E o seguro foi efetuado prevendo esse risco.

Porém não foi isto que aconteceu. Alguma estragou-se devido a uma forte chuvada que atingiu a palha por viajar no barco ao ar livre.

A seguradora para não pagar os danos, alegou que o seguro apenas cobria danos provocados por água salgada. E era verdade.

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

A osga, réptil muito vulgar no concelho de Alcoutim


Na minha recente estada no concelho de Alcoutim fui alertado para a circunstância de este ano quase não haver osgas, o que muito me admirou. Teria havido circunstâncias adversas para a sua reprodução.

Era “bichinho” que não conhecia e que me tinha passado despercebido, tendo chegado a Alcoutim no mês de Junho, foi fácil reparar nele e perguntar como se chamava. Verdade seja que conhecia o nome, mas não o ligava àquele animal.

Com a minha permanência no concelho, habituei-me a tal réptil que tem uma forte associação ao homem, utilizando, frequentemente, as suas construções como refúgio e as paredes das casas que percorrem bem, apesar da sua verticalidade, pois as patas estão adaptadas a essa situação.

Gostam de ficar perto de lâmpadas acesas dado que a luz atrai insectos que constituem a sua principal alimentação.

Este pequeno sáurio, de que existem várias espécies, habita as regiões quentes do globo.

A osga-comum pode atingir 8,5 cm de comprimento, tem a cabeça grande, bem diferenciada do corpo e olhos com pupila vertical. Os quatro membros possuem cinco dedos que estão apetrechados de lamelas e unhas em dois deles.

A cor tem a ver com o seu estado fisiológico.

A osga, quando se sente em perigo, perde a cauda mas tem a capacidade de a readquirir novamente ainda que sem as característica anteriores.

A osga comum existe no norte de África de Marrocos ao Egipto, na zona mediterrânica e na península Ibérica.

Alimenta-se principalmente de insectos, ainda que possa consumir vegetais. Identifica as presas pelos movimentos.

A reprodução tem lugar duas vezes por ano, Março / Abril e Junho / Julho. Cada postura é constituída em média por dois ovos que são depositados em buracos ou debaixo de pedras e em grupo.

Pode viver até aos quatro anos, mas em zonas protegidas pode chegar aos nove.

Hibernam de Dezembro a Março.

Entre os predadores contam-se o sardão, várias cobras, os gatos e as corujas.

Entre o povo, este réptil tem a fama de ser venenoso e até ouvi contar várias estórias sobre isto. Não existe qualquer fundamento para tal afirmação, pelo contrário, pois tornam-se muito benéficas, alimentando-se de vários insectos, esses sim, podem ser prejudiciais à saúde, nomeadamente as aranhas.

A sua existência proporciona o equilíbrio da natureza sobre este aspecto.

Ainda que sinta alguma repulsa pelo seu aspecto não me incomoda a sua presença.

Os alcoutenejos, quando as pretendem eliminar, molham-nas, tornando-as quase inertes.

domingo, 23 de setembro de 2012

Montinho das Laranjeiras, dos "montes do rio", o mais próximo da vila


Pequena nota

O primeiro artigo que publicámos no ALCOUTIM LIVRE teve por título “Os Montes do Rio, recanto aprazível do concelho de Alcoutim”e que como o título indica engloba os quatro montes do concelho sempre conhecidos e designados por” Montes do Rio”.

Recentemente foi colocada uma placa toponímica com essa indicação e que bem se justifica.

Entendemos agora desdobrar esse escrito pelos quatro montes, aproveitando o que então escrevemos e acrescentando o que nos for possível.

JV

A velha e ainda actual designação “Montes do Rio”engloba como várias vezes temos escrito o conjunto de pequenas povoações na margem direita do Guadiana situadas entre a foz da Ribeira de Cadavais e a foz da Ribeira de Odeleite. Quatro desses montes pertencem ao concelho de Alcoutim e um ao de Castro Marim ou seja a Foz de Odeleite, antigamente Odeleite-a-Menor.

Saindo de Alcoutim e seguindo o relativamente recente troço da estrada 507, vulgo estrada marginal, velha ambição dos alcoutenejos, só tornada realidade em finais da década de 80 do século passado, vamos percorrendo a via umas vezes sinuosa, outras nem tanto, mas tendo sempre por fundo o majestoso Guadiana, o grande rio do Sul, de águas profundas.

Passamos pela Cochoa, topónimo curioso e zona baixa com algum aproveitamento agrícola, pelo menos na primeira metade do século passado, o que ainda se nota pela arborização dos terrenos.

A sua origem não é clara. Segundo José Pedro Machado (1) existem os topónimos Casal da Cochoa e Quinta da Cachoa no centro do país e que será feminino de Cochom,  um apelido antigo (séc. XIII) que significa comissário, cozinheiro, vendedor ambulante e que terá a ver com o francês cochon, leitão, porca. Por outro lado, os cochões e as cochoas eram as pessoas que iam na retaguarda dos exércitos peninsulares, no séc. XIII. Não terá a ver, perguntamos nós, com a existência no local de porcos selvagens (javalis)?
 

Zona agrícola da Cochoa. Foto JV

Mais à frente, passamos no sopé da elevação onde se encontra o antigo posto da Guarda Fiscal designado por “Alcaçarinho”, hoje transformado em residência, tendo sido o primeiro adquirido na década de sessenta do século passado à Fazenda Nacional. Nas proximidades uma das maiores e melhores várzeas do Guadiana, conhecida por várzea do Alcaçarinho e que foi propriedade de José Dionísio, do Balurco de Baixo e que depois foi adquirida por um cidadão alemão. Alcácer, castelo em árabe.

Acesso à Casa do Alcaçarinho, antigo posto da GF. Foto JV

O rio corre à nossa esquerda oferecendo-nos excelentes paisagens que a vista não se cansa de observar.

A margem, que fica entre a estrada e o rio, ainda que praticamente abandonada em muitos locais, é das zonas com maior potencial agrícola do concelho. Ainda bem que a lei não permite a sua destruição em proveito do capital.

Passamos depois pela zona do Abrigo, topónimo relacionado com a possibilidade de protecção ao trânsito fluvial e um pouco mais à frente, passamos uma ponte sobre o barranco do Vale de Condes, topónimo que tem a ver com o título Condal da vila.

Construção da ponte de Vale de Condes. Foto JV, 1986

Do lado direito da estrada, uma necrópole identificada em 1987 e que aparece devido aos trabalhos da mesma. Está mesmo junto ao caminho velho, possivelmente local da via romana. Entretanto, numa intervenção arqueológica, as sepulturas foram classificadas de origem Tardo-Romana, cuja idade remonta, provavelmente, aos séculos V/VI. (2)

Seguidamente, alcançamos a zona do Vinagre cujo barranco é atravessado por ponte. Lá está o antigo posto da Guarda-Fiscal, adquirido por particular para fins agrícolas, segundo pensamos. Velhas oliveiras, algumas virão do tempo dos árabes. É zona fortemente taxada fiscalmente, facto que vem de tempos recuados.

Existe nas proximidades um poço público coberto e apetrechado de bomba elevatória, antigamente muito utilizado e que hoje raramente servirá.

Passámos depois pelo sítio do Pontal (pontal significa ponta de terra ou de penedia que entra um tanto pelo mar, no caso concreto rio), local que proporciona boas vistas sobre o rio, tanto a jusante como a montante. Foram criadas infra-estruturas de acesso, mesas e bancos de pedra e onde notámos a falta de sombra que podia ser proporcionada por uma simples armação onde se desenvolvesse uma trepadeira. Há muita pedra e pouco “verde”.

Do lado de Espanha, o Puerto Carbon e meia dúzia de casas rurais. É aqui que se encontra uma das maiores profundidades do rio, de cerca de 24 metros e que tem origem na escavação provocada pela força das águas para tornear o obstáculo a vencer. (3)

Já Silva Lopes refere esta circunstância chamando-lhe Forno (torno) da Pinta, curva do rio que as águas para a vencer provocam redemoinhos causadores de naufrágios. (4)

Depois de passarmos pelo sítio do Pontal e antes de chagarmos ao monte que procuramos, vêem-se à direita velhas construções, hoje em ruínas e conhecidas por Casa Velha, mas onde no século XIX se nascia e morria, como se pode verificar nos respectivos assentos de baptismo e óbito.

Antes de chegarmos à povoação, do lado esquerdo e próximo da margem, a zona explorada parcialmente pelo arqueólogo algarvio Estácio da Veiga em 1877, que revelou muitos vestígios romanos. Uma “villa” romana mostra grande construção com vários compartimentos. Piscina rectangular aberta num pavimento de mosaicos pintados. Foi recolhida cerâmica, entre ela um vaso muito curioso, intacto, tipo biberão. Tem no bojo uma eminência mamilar perfurada e destinada a dar saída a líquidos.

Montinho das Laranjeiras. Ruínas romanas. Foto JV, 2012
 
Vasilhas de barro, pesos de rede, um tijolo e uma telha com ornatos são outros achados.

A ocupação romana é atribuída aos começos do século I d. C. (5)

Que saibamos, só em 1991, cento e tantos anos depois, o local volta a ser objecto de escavações por intermédio do Professor Doutor Justino Maciel.

Em 2005, o Mestre em História da Arte de Antiguidade, Hélder Manuel Ribeiro Coutinho como arqueólogo responsável pelas escavações nas ruínas do Montinho das Laranjeiras dá a público um trabalho sobre estas ruínas. (6)

A musealização das ruínas da Villa Romana do Montinho das Laranjeiras foi inaugurada no dia 9 de Setembro de 2005. (7)

Chegados à pequena povoação, verificámos que desde que saímos da vila percorremos 9,5 km.

Sabe-se que, desde Outubro de 1804, fazendo patrulhas e rondas, um destacamento do Regimento de Infantaria 14, comandado pelo tenente de caçadores, Francisco Paula de Brito Cabreira, permanecia vigilante na região compreendida entre o Montinho das Laranjeiras e a vila por ocasião da peste que deflagrava. (8)

A “Cheia Grande” de 1876 / 77, como é de calcular, fez-se sentir aqui e nas restantes povoação ribeirinhas de uma maneira muito pronunciada.

Entre o Montinho e as Laranjeiras, segundo é tradição e nos foi transmitido oralmente, apareceu um cadáver boiando, o qual, ao ser avistado por uma mulher, foi motivo de pavor entre a população. (9)

Montinho das Laranjeiras. Vista do norte. Foto JV, 2012
No Montinho das Laranjeiras caíram sete prédios, entre os quais os de Manuel Braz, António Afonso, Manuel do Ó, José Botelho e Antónia Luísa e apresentaram pedidos de indemnização pelos estragos causados nas suas propriedades nas margens do rio, Bento Afonso, António Joaquim, José Dias Henriques e João Lourenço Melo. (10). Bento Afonso, lavrador, era em 1852 um dos 40 maiores contribuintes do concelho.
 
A pequena povoação apresentava uma arquitectura preservada, destacando-se os poiais onde os aldeões se sentavam a olhar o rio. (11)

Depois de ter sido abastecido por um poço público, que servia também as Laranjeiras e a Casa Velha, passou a ser servido por cinco fontanários através de um furo artesiano. Hoje a povoação, tal como todos os montes do rio, incluindo a Corte das Donas, já possui saneamento básico que entrou em funcionamento no dia 14 de Maio de 2010,ainda que a obra estivesse concluída desde o Verão de 2009, esperando pela construção da respectiva ETAR. Para contornar a situação existente foi construída uma fossa sendo limpa e esvaziada regularmente através de limpa-fossas e tratamento primário do efluente.

O empreendimento implicou um investimento de cerca de dois milhões e quatrocentos mil euros, que comportou, igualmente, a melhoria dos acessos, como não podia deixar de ser. (12)

As Memórias Paroquiais de 1758 indicam o sítio das Laranjeiras como tendo 20 vizinhos, o dos Guerreiros (do Rio) com 17 e o Álimo (Álamo) com 15, informando que estes três sítios estão Rio abaixo, na margem do Guadiana.

Parece-nos que o Montinho é considerado, na altura, agregado às Laranjeiras, que dos três é o que terá maior população tomando em consideração os vizinhos existentes.

Silva Lopes apresenta-nos em anexo à sua Corografia um quadro do número de fogos de 1839 e o Montinho, igualmente, fazendo parte das Laranjeiras apresenta 20. (13)

Devemos ter em conta que em 1758 estas pequenas povoações pertenciam à freguesia de Alcoutim mas ao termo (concelho) de Castro Marim.

Em contrapartida, os sítios de Fornanzinhas com 50 vizinhos, Cortes de S. Tomé (Corte Velha e Corte Nova) 20 cada, Monte Novo 10 e Zambujeiro pertenciam à freguesia de Odeleite mas ao termo de Alcoutim.

No Censo de 1991 apresentava 37 habitantes e tinha 21 edifícios.

Atendendo à grande taxa de desertificação ocorrida nos últimos anos no concelho, a actual população será muito menor.

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NOTAS

(1) – Dicionário Onomástico da Língua Portuguesa, Horizonte / Confluência, I Vol. 1993

(2) - Alcoutim, Revista da C.M.A. nº 4 de Dezembro de 1996, p. 26

(3) – Maravilhoso Guadiana, Francisco Dias da Costa, 1991.

(4) – Corografia do Algarve, 1841 (edição fac-similada em 1988), p 396

(5) – A Arqueologia Romana do Algarve, Maria Luísa Estácio da Veiga Affonso Santos, 1971.

(6) – As ruínas do Montinho das Laranjeiras, Alcoutim, edição da Câmara Municipal de Alcoutim / Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional – Algarve.

(7) – “Alcoutim Inaugura Estação Arqueológica” Alcoutim – Revista Municipal nº 12 de Dezembro de 2005. p. 19.

(8) – A Invasão de Junot no Algarve, Alberto Iria, Lisboa 2004 (edição fac-similada), p. 234.

(9) – Informação prestada pelo Sr. António Patrocínio dos Santos por volta de 1970.

(10) – Acta da Sessão da Câmara Municipal de Alcoutim de 15 de Abril de 1877, presidida por José Joaquim Madeira.

(11) - Guadiana - Rio Abaixo, Rio Acima - Folheto Turístico Editado pela C.M.A.


(13) – Corografia do Algarve, 1841, edição fac similada em 1988.

 

sábado, 22 de setembro de 2012

A Escultura de Madeira no Concelho de Alcoutim no séc. XVI ao séc. XIX


Dos primeiros trabalhos que conheço e o primeiro na temática abordada dedicado ao concelho de Alcoutim.

De formato A/5 (15X 21 cm) está dividido em três partes que abordam O ambiente artístico no concelho de Alcoutim do séc. XVI ao séc. XIX, A escultura de madeira e Conclusões.

Importante o Apêndice (Arquivo Paroquial de Martinlongo) que  apresenta o catálogo dos livros manuscritos, inventário organizado dentro da técnica que oferece grande ajuda a quem pesquisa e permite um controlo sobre as existências.

Está classificado em cinco partes correspondendo à letra A - Rol de Confessados de Martinlongo, B – Livros de visitas e decretos da igreja matriz de Martinlongo, C – Livros de distribuição da igreja matriz de Martinlongo, D – Livro da Receita e da Despesa da Fábrica da igreja matriz de Martinlongo, incluindo as suas confrarias e E – Livros de crismados, casamentos, testamentos e outros actos importantes na vida religiosa da freguesia de Martim Longo.

Segue-se um Inventário da escultura de madeira no concelho de Alcoutim, que engloba 12 RETÁBULOS e 72 IMAGENS identificados e tecnicamente classificados, completado com as respectivas fotografias a preto e branco.

Editado pela Comissão de Coordenação da Região do Algarve, Faro, 1985, são seus autores Francisco Lameira e Manuel Rodrigues.

O trabalho foi-me oferecido com dedicatória pelo primeiro dos autores, o que muito agradeci.

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

A rubrica "Condes" e o seu movimento


Iremos hoje abordar o movimento verificado no TEMA acima referido que viemos a criar neste espaço e que pensamos se justifica, ainda que o seu desenvolvimento esteja, naturalmente, limitado.

O certo é que já publicámos 26 mensagens sobre este assunto, umas mais próximas, outras mais afastadas, mas que acabámos por incluir no mesmo lugar.

Se é verdade que só houve seis condes de Alcoutim, as “postagens” já vão em 26, o que significa que tivemos que procurar outras personalidades ligadas com esta família que tinha a jurisdição civil e criminal da vila e do castelo de Alcoutim.

Assim, vamos apresentar as cinco mensagens mais procuradas especificamente e por ordem decrescente:

1º - D. FERNANDO DE MENESES, 1º CONDE DE ALCOUTIM (2009.04.03)

2º - D. LUÍS DE NORONHA E MENESES, 6º E ÚLTIMO CONDE... (2009.08.18)

3º - D. MARIA FREIRE DE ANDRADE, 1ª CONDESSA DE ALCOUTIM (2009.04.03)

4º - D. BRISTES DE LARA (E MENESES) (2010.11.29)

5º - JOÃO FREIRE DE ANDRADE, SENHOR DE ALCOUTIM (2009.03.09)

A 1ª posição é ocupada e a grande distância da 2ª pela nota biográfica do 1º Conde de Alcoutim. É, entre todas até agora publicadas, uma das mais procuradas. Curiosamente, o 6º e último Conde de Alcoutim aparece na posição seguinte.

A procura verificada parece-nos ter alguma justificação, se nestes assuntos se pode ter opinião.

D. Maria Freire de Andrade, 1ª Condessa de Alcoutim, que com a sua beleza e segundo consta, conquistou do seu “castelo” o 1º Conde, aparece compreensivelmente na 3ª posição muito próximo da 2ª.

D.Brites de Lara (e Meneses) filha do 4º Conde de Alcoutim e neta dos 1ºs. ocupa a posição seguinte.

Muito ligada à cidade de Aveiro onde fundou o Mosteiro de Jesus e onde ficou sepultada, viveu cerca de 40 anos na cidade.

O quinteto fecha com João Freire de Andrade, Senhor de Alcoutim e que foi genro do 1º Conde, D. Fernando de Meneses.

No seu primeiro consórcio ligou-se a D. Isabel de Meneses, filha de D. Pedro de Meneses, 1º Capitão de Ceuta, o do ALEO. Consequentemente, o seu genro era descendente colateral desta Senhora.

Para terminar esta pequena análise, diremos que a mensagem menos procurada, apenas 4 vezes, foi a de D. Miguel de Meneses, o único Conde de Alcoutim que não foi a Ceuta!

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

A gorpelha


Não foi fácil encontrar tal utensílio para fotografar, mas tivemos a sorte daquele que localizamos ser novo, por estrear. Neste caso, a economia resistiu mais do que a evolução dos tempos.

Gorpelha, golpelha são palavras que alguns dicionários trazem, mas nem todos os que consultámos e são considerados sinónimos. O povo, por vezes pronuncia goropelha e guarpelha.

O termo é de origem latina, de corbicula significando alcofa grande ou a quantidade contida ou trasportada pelo mesmo objecto. (Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea – Academia das Ciências de Lisboa – Verbo, 2001).

A gorpelha é um recipiente feito de empreita em forma rectangular, tipo sobrescrito, sendo a largura, sensivelmente, o dobro da altura. Uma das larguras é aberta e ao meio da qual leva duas pegas (asas), uma de cada lado que auxiliam a sua colocação. A união das duas partes rectangulares é reforçada para uma maior consistência e durabilidade.

Havia-as de vários tamanhos, conforme fosse a sua utilização em burros, mulas ou machos, pois são de alturas diferentes. Eram feitas por mulheres que trabalhavam a palma, mas informaram-nos que também existiam homens a trabalhar nesta arte que foi bem conhecida no Algarve, nomeadamente no Barrocal. Vendia-se em feiras e mercados, onde até meados do século passado eram muito procuradas.

A gorpelha era colocada sobre a albarda, ficando a formar uma bolsa para cada lado.

Era utilizada para transportar de tudo um pouco. Indispensáveis para o transporte do estrume para adubação das terras, da areia trazida dos barrancos e o barro para trabalhos de construção.

Havia também exemplares para o transporte de coisas mais finas como abóboras, cestos de figos, marmelos ou romãs.

Tinha de haver o cuidado de equilibrar a carga para a distribuição do peso.

É mais um dos utensílios indispensáveis na vida rural alcouteneja, que se encontra em extinção.
 

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Quadros da vida rural alcouteneja [4]



Escreve

M Dias




ALGARVIADA!

Desde criança que oiço falar: mas que algarviada vai para aí! A dada altura comecei a relacionar com a diversidade enorme de termos e expressões algarvias!

Pensando melhor comecei a achar que o termo algarviada será entendido também por palavras e expressões utilizadas exclusivamente no Algarve, incluindo termos serrenhos, da beira-mar e das pescas, e na maioria dos casos por desconhecimento da escrita correcta devido a iletracia reinante até meados de 1900.

Também há muitos outros de infuência espanhola, especialmente junto à fronteira, como o termo conho! almancém por aproximação a almacene (armanzém em português), conquinas , (conquilhas), quem te arregalou referência a quem te ofereceu, enfim , muitos outros que poderia referir. Os usados em todo o Algarve, como o termo xarengado ou xaringado, quando alguém quer dizer: não sei o que faça contigo, o pode apanhar quando se quer dizer pode tirar, o , muito monte-gordino e vila-realense, enfim.

Sabemos que regionalismos e palavras pronunciadas incorrectamente existem também nas outras regiões do país. O alentejo é também rico de termos locais, muitos deles comuns às duas regiões, lembro por exemplo, talego para saco de pano, pão referente a trigo, corcho para (cucharro de cortiça) usado no Algarve também por aproximação a cucharra (colher).

Mas, não ouvi nunca – alentejanada, transmontanada, etc.

Como algarvia, gosto de ter um termo, só nosso.

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Dr. Tito de Bourbon e Noronha


Este médico formado pela escola Médica do Porto e que exerceu a sua actividade clínica durante um mês no concelho de Alcoutim em 1885 e onde, no seu dizer, tudo faltava, deixou escritos alguns textos que ilustram bem como era Alcoutim naquele tempo.

Já aqui reproduzimos um desses textos que constitui uma verdadeira relíquia literária sobre os típicos casamentos de Alcoutim, nessas alturas.

Além da descrição do casamento, lembramo-nos de memória da descrição da viagem que efectuou até chegar a Alcoutim, da recepção que teve, da acção do Juiz de Paz com treinos diários para poder assinar a documentação, do pormenor da água do poço, da descrição da moura encantada que constituía a bela irmã do Presidente da Câmara, da refeição típica que lhe serviram (pensamos que foi um jantar de grão que naturalmente não gostou por falta de hábito), o calor da primeira noite, a consulta da rapariga e muitas mais situações.

Grande poder de observação, uma enorme riqueza de vocabulário, espírito realista e sarcástico proporcionaram-lhe escrever desta forma.

Vem este ligeiro apontamento a propósito da descoberta feita, pelo menos, por dois descendentes, um bisneto residente em França desde 1961 e um filho deste, consequentemente trineto, que teve a amabilidade de me enviar um e-mail em francês, agradecendo o que o ALCOUTIM LIVRE publicou sobre o seu antepassado.

O bisneto teve a mesma amabilidade, escrevendo, contudo, em Português.

Ainda que não seja a primeira vez que nos surgem situações destas, várias têm acontecido, congratulamo-nos com o facto que comprova um dos princípios que nos nortearam quando criámos este espaço. – LEVAR O VERDADEIRO ALCOUTIM AOS QUATRO CANTOS DO MUNDO!

Esta é a nossa recompensa.

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Crónicas e Ficções Soltas - Alcoutim - Recordações - XXXV




Escreve

Daniel Teixeira




ESTATÍSTICAS À PARTE

Quando escrevo estas crónicas que normalmente relatam maioritariamente tristezas e muito poucas alegrias, faço-o sempre com aquele prazer que será próprio a quem tem a ideia de que está a contribuir, na sua medida, para que a memória não se perca, seja essa memória feita de coisas boas ou de coisas más ou menos boas. Vou em 35 crónicas aqui, contando com esta, o José Varzeano aponta 38 colaborações no Blogue Alcoutim Livre, o que quer dizer que há 4 colaborações minhas que não são crónicas ou que não foram numeradas como tal.

Ora vendo as coisas em termos de tempo, isto quer dizer que contando com esta crónica, e entendendo que elas por princípio são quinzenais, haverá portanto 39 quinzenas que escrevo sobre Alcoutim, ou seja, há 78 semanas que ando nisto e como cada ano tem 52 semanas há, nesta data mais ou menos precisa um ano e meio que vou recordando aquilo que me vem à mente sobre o «meu» Monte de Alcaria Alta e sobre a envolvência geográfica e humana que o compõe e compunha. 550 dias mais ou menos, é obra!!

Pois bem, é com alegria que vejo o Blogue Alcoutim Livre aumentar o seu número de colaboradores. A semana passada publicámos aqui no Jornal um texto de uma senhora que eu não tinha ainda visto publicada (o tempo não dá para tudo) no Alcoutim Livre mas que já vai na sua 3ª publicação (ver aqui) e que a meu ver se enquadra muito bem dentro daquele contexto que eu quase sempre sonhei para a literatura de raiz rural portuguesa. Não conto nem com o Almeida Garrett nem com o Eça de Queirós e conto mais com o Fernando Namora ainda que em todos eles haja uma visão «externa» sobre a vida campesina ou a vida de aldeia.

Os implantados, ou pára-quedistas, como lhes chamam em Alcoutim, têm seguramente o seu valor e servem de uma forma excelente como factores de despoletamento das energias locais viradas para estas coisas, mas como em tudo, não há nada como o original, aquilo que é mesmo de raiz, que sai do sentimento e do coração do vivido. Entre esses pelo menos «meio - implantados» incluo-me eu porque tenho a consciência plena que ir passar férias a Alcaria Alta não é mesmo nada comparável a viver lá, por exemplo.

Não viria muito a propósito contar aqui uma história um pouco cómica (e violenta) mas aqui há uns anos, um amigo meu (um pouco «passado» - diga-se - e entretanto já falecido - rip) para surpresa de todos os restantes componentes na mesa, onde se festejava mais uma «vitória» do PREC, acabou literalmente com o ambiente festivo ao dar um soco num alemão que tinha aparecido na leva revolucionária e se juntara ao dito processo revolucionário: «Então este gajo diz-me que compreende muito bem o povo português!? Eu ando aqui há 25 anos e ainda não o compreendi em nada...». Pois...acalmou-se o ambiente mas a verdade seja dita que sem soco ele teria toda a razão...na verdade o que compreendemos nós de nós mesmos? Nada, absolutamente nada!! E o que compreendemos nós da vida no campo, da vida na Serra. Nada, absolutamente nada!

Por isso o historial, por vezes excessivamente simples como é o meu caso, quase insignificante em termos de valor histórico, tem quanto a mim a vantagem (embora possa parecer suspeita a minha análise) de inserir quem me lê (e não são muitos por aquilo que sei - estatísticas do Alcoutim Livre dixit) dentro de uma perspectiva de...inserção. Como digo sempre não ando por aqui a ver passar os barcos e sei que as coisas por vezes se ganham e por vezes se perdem, mas que num caso ou noutro alguma coisa fica sempre.

Dito isto tudo esta semana o meu irmão mais novo foi ao Monte: uma prima nossa deu por finda a sua participação nas partilhas por falecimento da sua mãe (viúva de longa data) e arranjou um camião para ir buscar as coisas que eram suas. O meu irmão foi convidado para ir ajudar e aproveitar a boleia e ver o pessoal.

Quando lhe perguntei como estava tudo por lá disse-me que o primo Manuel Guerreiro (da idade da minha falecida mãe) estava muito bom mesmo, que o achou porreiro e que a prima Felismina (irmã dele) se tinha fartado de chorar. «E a casa – a nossa? – perguntei eu... «Não fui lá, sequer»!

Mantém-se assim a tradição familiar, há cerca de 20 anos, mais ou menos que nenhum de nós vai ver a casa ou as suas ruínas. A última vez que fui para aqueles lados foi para responder às reivindicações da vizinha Etelvina (que ficou com a 2ª casa do João Baltazar, perto do eucalipto) porque o muro de uma nossa pequena cerca tinha derrocado e incomodava o acesso ao largo fronteiro à casa dela. Coisa que o Manuel Guerreiro tomou logo em mãos resolver: «Eu falo com o Vereador e como estamos perto das eleições eles vêm logo arranjar de borla.» Felizmente que ainda há eleições.

http://www.raizonline.net/centoeoitentaeseis/cinquentaecinco.htm

 

domingo, 16 de setembro de 2012

A caixa do correio


O badalado encerramento dos “CORREIOS” ou semiencerramento na vila de Alcoutim, tanto nos órgãos de informação como oralmente, sugeriu-nos esta foto para apresentarmos na nossa rubrica Câmara Escura, uma das mais procuradas pelos nossos visitantes / leitores.

Parece que decorrem conversações numa tentativa de resolver o problema com menores prejuízos para ambas as partes.

Quando se privatiza tem que se ter a noção que os investidores procuram a todo o custo rentabilizar o seu capital, o que de outra maneira não se compreenderia. É por isso que ao entrarmos em determinadas estações dos CORREIOS encontramo-las transformadas em “livrarias”, vendedoras de jogos e bonecada para as crianças, quando chega a vez de sermos atendidos somos aliciados para a compra de jogo de lotaria.

Não deixam de aparecer as camisolas das “estrelas”das mais variadas áreas, etc, etc.

Enquanto uns pretendem tudo privatizar, outros com sinal contrário tudo querem estatizar.

Mesmo quando os correios não tinham concorrência e o serviço, nesta região, era extremamente deficiente, a parte dos telefones ia tapando os prejuízos.

Nos anos 60 do século passado, a Estação funcionava com uma única funcionária, muito mal paga, diga-se de passagem e que fazia todo o serviço de expediente (venda de selos, despacho de encomendas, emissão de vales do correio, telefone público, etc), dois guarda-fios e um carteiro, só mais tarde quando o giro foi alargado, apareceu outro.

Em relação aos “montes” havia então os condutores de malas do correio, serviço que periodicamente era posto a concurso e entregue a quem o fizesse por menor quantia. Simultaneamente, existia um posto de recepção e distribuição de correspondência situado normalmente num estabelecimento comercial que para tal se tinha habilitado e onde funcionava, igualmente, um posto de telefone público, quando era possível o telefone chegar lá.

Este serviço era remunerado com uma pequena percentagem sobre o produto dos telefonemas efectuados.

Que nos lembremos, nas redondezas, havia um posto destes no então populoso monte das Cortes Pereiras, no estabelecimento comercial do Sr. João Bento (carpinteiro) que possuía na Casa da Amêndoa e era misto, mercearia e taberna. Por outro lado, fazia os caixões para quase toda a zona.

As pessoas dirigiam-se aqui para saber se tinham correspondência e levantá-la.

Lembramo-nos muito bem das crianças da Corte Tabelião, – há quantos anos não existe lá uma criança! - quando vinham à escola à vila, passarem pela Estação local indagando se havia correspondência para levarem para o monte.

Tudo isto foi ultrapassado com o 25 de Abril de 1974, estando agora numa fase plena de retrocesso, já que a desertificação é um facto. Por outro lado, a correspondência hoje diminuiu bastante sendo sustentada praticamente com a expedida pelo Estado, Autarquias, EDP e instituições Bancárias.

O retrocesso está à vista, mas o sistema não pode ser o mesmo e nisto tem a palavra o poder autárquico, aliás, já há Juntas de Freguesia a fazerem parte deste trabalho.

Com o decorrer dos tempos várias instituições foram desaparecendo com o decorrer dos tempos da vila e do concelho. O êxodo vai continuar, pois até o Estado procura rentabilizar serviços lançando mão das novas tecnologias.

Só o poder autárquico aumentou desmesuradamente os seus quadros e agora defronta-se com este dilema.

Há outras áreas mais apelativas para a “compra” dos votos, como todos sabemos.