terça-feira, 7 de abril de 2009

A Capela de Santa Marta (a velha)


[As ruinas em 1990]

Referimo-nos a esta capela, primeiro e dentro dos poucos conhecimentos que tínhamos, no nosso trabalho, Alcoutim, Capital do Nordeste Algarvio (subsídios para uma monografia), 1985, pp 231, 232 e 351 e posteriormente, já com outros conhecimentos no artigo intitulado “A Capela de Santa Marta (a velha) e o “monte” do mesmo nome, na freguesia de Alcoutim, publicado no Jornal do Algarve de 26 de Abril de 1990.

Iremos primeiro ao nome da invocação. Santa Marta, irmã de Maria e de Lázaro. Uma antiga tradição diz que ela foi morrer na Provença (França). Curiosamente, perto da povoação de Santa Marta existiu uma herdade denominada das Provenças, onde em 1859 foi registada uma mina de cobre (1), zona rústica ainda hoje assim conhecida. Haverá alguma relação entre uma coisa e outra? Pensamos que sim.

O culto de Santa Marta foi especialmente estimado nos séculos XIII-XIV. (2)

No final do ano de 1565, a Ordem de Santiago, a quem D. Dinis declarou dar as igrejas que mandasse fazer em Alcoutim, veio a ser cabeça de Comenda e dependia do Mestrado de Cacela, na “visitação”, espécie de inspecção, que efectuou entre outros templos foi à Hermida de Santa Marta, situada numa pequena elevação, perto do monte do mesmo nome, freguesia de Alcoutim, a qual he muito antiga e repaira se a conta de pessoas devotas.
É então descrita nos seguintes termos: A capella he de duas agoas madeirada dàguieiros, emcaniçada; as paredes são de pedra e barro; tem hum altar dàlvenaria cubertos com humas toalhas da terra e nelle a imagem de Santa Marta de vulto já muito velha; o arco da capella está armado sobre aguieiros de madeira; he pequeno e não como deve ser; as paredes do corpo da igreja são de pedra e barro desguarnecidas por dentro e por fora; he madeirada de castanho, emcaniçada por cima; o portal da porta principal he d` alvenaria redondo fechado com suas portas. (3)

Esta descrição do pequeno templo, feita há mais de quatrocentos e quarenta anos, ainda hoje se ajusta em grande parte ao que ainda resta das suas ruínas. A porta é que deixou de ser em arco redondo para passar a rectangular. Notavam-se igualmente pequenas transformações, nomeadamente quanto ao espaço.

De planta rectangular, tem cerca de 12m X 6 m e uma das paredes laterais é suportada por três gigantes. Construída de xisto e grauvaque da região com auxílio de barro. O local da porta apresentava uma abertura com cerca de dois metros.

Como obra posterior, as ruínas apresentam a indicação de dois pequenos compartimentos, um destinado à sacristia e outro possivelmente à Confraria que a dirigisse.

Por cima do altar, de que nada resta, situava-se um nicho. Podia ainda ver-se também na frontaria parte da beira-telha e por cima da porta notava-se igualmente uma fresta que arejava e iluminava o templo.

O visitador recomenda aos devotos que arranjem a capela, guarneçam a ermida e façam outra imagem nova porque a que ora têm, não é como deve ser.
Certamente que não é esta a imagem que chegou aos nossos dias pois Francisco Lameira (4) refere-a em razoável estado de conservação, considerando-a como exemplar de boa qualidade, imagem pintada, dourada e estofada, datando-a do século XVIII.

Nas Memórias Paroquiais de 1758, na resposta ao quesito 14 refere-se: Em alguns dias do ano vão algumas pessoas, desta freguesia, como de fora (…) a Santa Marta, sendo que no dia da sua festa sempre concorre mais gente; fora do dia da sua festa, não tem dias determinados, nem há sempre as tais romarias. (5)


A devoção por esta Santa era e é grande, sendo, como acabamos de dizer, local de romaria.

Constavam de missa solene e procissão. Nas imediações a juventude cantava e dançava modas de roda.

Na ermidinha tinham lugar frequentemente casamentos e baptismos. Tenho conhecimento de alguns, que os próprios me referiram.

Os festejos no seu dia (29 de Julho) tinham repercussão nas redondezas, sendo muito concorridos. O último teve lugar em 1939, segundo nos informou a Sr. Catarina Maria Guerreiro, do Monte de Baixo que nos adiantou no seu saber que a Santa do seu lugar avistava os sete irmãos que eram S. Martinho (Cortes Pereiras), Nª Sª das Neves (Mesquita), Nª Sª do Amparo (?), São Barão (Alcaria Ruiva) Senhora de Aracelis (Vale de Açor), Senhora de Aguada de Lupos (?) (Serpa) e Virgem de La Penha (Alcaria Puebla-Espanha).

A estória de se avistarem sete irmãos repete-se por imensos sítios desconhecendo eu a sua origem que possivelmente estará relacionada com alguma lenda.

A aceleração da ruína da capela foi contínua e em meados dos anos setenta do século passado houve mesmo uma tentativa de roubo a que o povo pôs cobro, levando a imagem e os castiçais para a escola primária que se encontrava ainda em funcionamento.

Com o fecho desta, passou para o salão do Centro Cultural Recreativo e Desportivo local, fundado em 1981.


[A nova capela no dia da inauguração, 4.8.1991]

Gerou-se depois um movimento no sentido de dar lugar compatível a Santa Marta, pensando-se proceder ao restauro do velho templo, o que acabou por ser posto de parte e construído um novo, agora à entrada do Monte de Cima.

Para o efeito, a Câmara Municipal cedeu à Diocese do Algarve 480 m2 de terreno (6) e em 1986 já se encontrava de pé.

De planta pentagonal e com um pequeno alpendre, foi inaugurada no dia 4 de Agosto de 1991.

Assim, Santa Marta ficou com nova residência.



NOTAS

(1) – Registo de 2 de Outubro de 1859.
(2) – Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira (Adenda), entrada Alcoutim.
(3) –“Visitações” da Ordem de Santiago no Sotavento Algarvio (subsídios para o estudo da História da Arte no Algarve) Hugo Cavaco, Vila Real de Santo António, MCMLXXXVII, pp 346 e 347.
(4) – A Escultura de Madeira no concelho de Alcoutim do séc.XVI ao séc. XIX, Francisco Lameira e Manuel Rodrigues, Faro, 1985.
(5) – Vol. 2, nº 12, ANTT.
(6) – Jornal do Algarve de 13 de Junho de 1985.