quinta-feira, 16 de abril de 2009

O Monte do Torneiro, subsidiário dos Balurcos

Para completarmos as pequenas notas monográficas das povoações da freguesia de Alcoutim, iremos hoje referir o monte do Torneiro que como o título indica é (era) subsidiário dos Balurcos.

Estes artigos têm sido publicados ao longo dos anos na imprensa regional e agora com mais intensidade neste blogue, LIVRE de tudo e principalmente de falta de ESPAÇO.

Situa-se a cerca de 9 km da sede do concelho. Saindo da vila pela estrada nº 122-1, às Quatro Estradas, tomamos à esquerda a estrada 122. Passamos pelo posto de abastecimento de combustíveis e pouco depois, novamente à esquerda, uma placa indica-nos Torneiro. Esta estrada, identificada com o nº 1057 (o mesmo da dos Balurcos), é uma obra efectuada antes do 25 de Abril, desconhecendo-se a razão dessa prioridade, certamente ligada ao Antigo Regime.

A estrada, após uma curva pronunciada, possibilita-nos ver ao fundo, numa pequena altura, a povoação.

Os terrenos da esquerda estavam limpos e nas proximidades do monte notava-se a existência de arvoredo, nomeadamente alfarrobeiras e amendoeiras, não faltando a vinha. Um tanque proporcionava a rega de uma horta.

A povoação que se situa nos antigos terrenos da Herdade do Bacelar, que pertenceu aos Condes de Alcoutim e mais tarde à Casa do Infantado e depois alienada no Liberalismo pela burguesia local, poderá ter origem em instalações deste latifúndio que a grosso modo iria desde as proximidades dos Guerreirinhos até ao rio.



É de tipo concentrado, desenvolvendo-se à volta do “terreiro”onde se encontrava o forno comunitário. Era ali que se armava o mastro em dia de festa.

A estação elevatória (1987) proporcionava o fornecimento de água a cinco fontanários.

Hoje, existirá fornecimento da mesma ao domicílio, com o natural pagamento a que se acresce uma taxa pela recolha do lixo, além claro, do pagamento do ramal. Estaria tudo certo se houvesse o resto, o esgoto, o que completaria o saneamento básico.

Ainda que eu seja leigo na matéria, a verdade é que o esgoto, feito para aquilo a que chamam fossas, causará vários problemas de salubridade.

No terreiro existia uma casa com interessante fachada, trabalhada a argamassa e que presumo ser do segundo quartel do século passado. Talvez seja isso que tivesse obrigado o Regulamento do Plano Director Municipal de Alcoutim a considerar a existência de construções de qualidade plástica. (1)

Em 1989 a Câmara Municipal em parceria com a Junta de Freguesia e por administração directa estava a proceder à pavimentação dos respectivos arruamentos. (2), para em 1996 ser concluída a repavimentação da estrada de acesso à povoação. (3)

Abordemos agora o topónimo, assunto que de uma maneira geral interessa às populações que muitas vezes o apresenta ligado a uma “estória” bem arquitectada e que nada tem a ver com a realidade.

A Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, na sua Adenda, pág. 892 diz:- Os topónimos mais dignos de nota são (...) Torneiro (...) do antigo “torno” (talvez nascente de água).

José Pedro Machado diz que Torno, donde derivou Torneiro, é topónimo frequente em Portugal e na Galiza, antigo substantivo masculino torno, “bolhão de água”, nascente abundante. (4), pelo que as opiniões manifestadas não são divergentes.

Encontrámos o registo em Portugal de treze topónimos referentes a povoações, sendo este o único ao sul do país. (5)

E porque o topónimo tem a ver com “água”dizemos que segundo a imprensa da época noticiou, (19 de Março de 2005) os habitantes perderam a confiança na água do furo. Houve uma altura em que aparecia negra com resíduos desagradáveis pelo que a população recorria a um poço situado a mais de cem metros da povoação.

A nível populacional a primeira notícia que temos é a que nos dá as Memórias Paroquiais (1758) que lhe atribui 7 vizinhos o que deve rondar cerca de vinte pessoas, os mesmos que o Vascão e mais um do que o Marmeleiro que lhe fica próximo.

Em 1839 os fogos eram dezassete, ao nível de Marmeleiro, Cerro dos Balurcos e Palmeira. (6)

Em 1976 e já em franco retrocesso populacional, segundo um mapa estatístico organizado no Centro de Saúde, tinha sessenta e nove habitantes.

No recenseamento populacional de 1991, os trinta e três habitantes constituíam quinze famílias e a povoação tinha quarenta e seis edifícios.

Presentemente, deverá rondar as duas dezenas, acompanhando a desertificação do concelho.

No século XVIII vários moradores desta pequena povoação desempenharam funções de tesoureiro da Irmandade de Nª Sª da Conceição, na vila. Assim, Manuel Dias em 1742 e 1755, Manuel Martins em 1758, Custódio Roiz em 1765 e José Dias em 1768.
(7).

Em 1771 fazia o manifesto de seus gados na Câmara Municipal, Mário Gonçalves, constituído por gado bovino, caprino e ovino.

A quando da criação de um novo cemitério que a lei impunha, realizou-se uma reunião da Capela de Nª Sª da Conceição no dia 22 de Dezembro de 1843 com a presença das forças políticas da vila e com representantes de todos os montes da freguesia. O Torneiro fez-se representar por Francisco Vicente.
Nesta reunião foi deliberado construir o novo cemitério que é aquele que ainda existe com as alterações que foi necessário introduzir, nomeadamente quanto ao espaço. (8)

Devido ao prejuízo causado pela cheia do Guadiana de 1876 são indemnizados Francisco Dias, Vª com 100 mil réis e António Rodrigues com 20 mil. (9)

[Machado de pedra polida (xisto), des.]
A presença da passagem do homem por esta zona está testemunhada pelo achado de um machado de fibriolite, quebrado na parte superior da extremidade oposta ao gume, um outro de pedra polida (xisto), de secção elíptica e ainda outro de pedra polida que deve ter sido primitivamente machado e que depois parece ter sido utilizado como polidor e martelo.

Estes objectos foram recolhidos por José Leite de Vasconcelos e encontram-se em Lisboa no Museu Etnológico. (10)

[Antiga Escola dos Balurcos]

Não me consta a existência de qualquer estabelecimento comercial, recorrendo os seus moradores ao longo dos tempos aos Balurcos. As crianças frequentavam igualmente a escola do Montinho do Cerro e assim se justifica o título dado ao escrito.

O Monte do Torneiro foi janela aberta no dia 29 de Maio de 2006 por tudo o que foi televisão, rádio e jornais, pois foi visitado pelo Senhor Presidente da República que aí avaliou a sua tensão arterial e viu cozer pão, o que naquele monte já não se devia fazer há muitos anos. É que foi aqui que se iniciou o” Roteiro para a Inclusão”.

NOTAS

(1)-Diário da República, I Série de 12 de Dezembro de 1995.
(2)-Boletim Municipal, nº 5 de Setembro de 1989, pág. 4)
(3)-Alcoutim, Revista Municipal, nº 4 de Dezembro de 196, pág. 8
(4)-Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, Horizonte/Confluência, Vol. III, pág. 1420.
(5)–Novo Dicionário Corográfico de Portugal, A.C.Amaral Frazão, Editorial Barreira, Porto, 1981.
(6)–Corografia (...) do Reino do Algarve, João Baptista da Silva Lopes, 1841.
(7)–Alcoutim, Capital do Nordeste Algarvio (Subsídios para uma monografia), António Miguel Ascensão Nunes, 1985, pág. 346
(8)–“O cemitério da Vila de Alcoutim – da origem aos nossos dias”, José Varzeano, in Jornal do Algarve de 10 e 17 de Março de 1988.
(9)–Acta da Secção da C.M.A., de 24 Abril de 1877
(10)–“Objectos arqueológicos de Alcoutim”, in O Archeologo Português. Pp 198 a 200.