quinta-feira, 9 de abril de 2009

A Guarda Fiscal em Alcoutim


[Antigo Quartel da Guarda Fiscal em Alcoutim, 1988. Foto JV]

As zonas raianas tiveram sempre propensão para duas actividades antagónicas: - o contrabando e a “guarda-fiscal”, ou seja, o serviço de fiscalização dos impostos cuja arrecadação está confiada às Alfândegas.

Alcoutim não podia fugir à regra e o concelho forneceu dos maiores contingentes para aquele corpo militarizado. (1)

A Guarda Fiscal foi criada pelo Decreto nº 4 de 17 de Setembro de 1885. Este corpo paramilitar devia defender o Estado no que respeita aos direitos e rendimentos que pelo comércio externo cabiam à Fazenda Nacional. Devia por isso a Guarda Fiscal descobrir e reprimir o contrabando, assim como as transgressões dos preceitos fiscais. (2)

A Guarda Fiscal veio substituir os Guardas da Alfândega então existentes.

A partir daqui os mancebos alcoutinenses começaram a ver nela uma actividade que podiam desempenhar, fugindo ao trabalho árduo e pouco rendoso da vida do campo, obtendo mais tarde a almejada reforma, então regalia de poucos, podendo olhar pelas suas courelas ou do futuro cônjuge que os proventos, ainda que pequenos, sempre auxiliavam o magro mas seguro vencimento de soldado.

Durante muitos anos os moços de Alcoutim, de uma maneira geral, após completarem a instrução primária, dificilmente se livravam da actividade agro-pastoril até ao cumprimento do serviço militar, devido a vários factores económico-sociais.

A inspecção militar era vista com preocupação e o apuramento causava alegria. Depois vinha o cumprimento do serviço que se procurava fazer a todo o custo com a “caderneta limpa”.

Aparecia a prova de admissão e lá estavam disciplinados e trabalhadores, não lhes era difícil obter o que pretendiam. Colocados por vezes em lugares distantes da sua região, acabavam por se aproximar alguns já como cabos ou sargentos e outros alcançavam o oficialato.

Podemos dizer que será difícil encontrar uma família de Alcoutim que não tivesse tido elementos na Guarda Fiscal.

Era sede de uma Secção. Teve de si dependentes, entre outros, os seguintes postos:- Abrigo Segundo, Alcaçarinho, Barranco do Álamo, Barranco do Carrascal, Barranco das Pereiras, Canavial, Enxoval, Foz de Odeleite, Grandacinha, Guerreiros, Laranjeiras, Lourinhã, Pontal, Premedeiros e Vascão. (3)

Sabemos que os postos de Vascão, Premedeiros, Lourinhã, Barranco das Pereiras, Abrigo Segundo, Alcaçarinho e Grandacinha foram construídos pelo Ministério da Fazenda em 1890. (4)

Pertencia à Companhia de Faro e ao Batalhão nº 2, com comando em Évora.

Na Sessão da Câmara Municipal de 7 de Maio de 1888, “apresentou-se o 2º Sargento da G. F. Tomaz do Couto Corrêa fazendo verbalmente uma petição em nome do seu chefe, Victor Manuel Quintino Travassos Lopes, encarregado de mandar proceder à reparação do antigo quartel da fiscalização, para rebaixar um metro pouco mais ou menos à rua chamada da Porta Nova, que se acha junto ao mesmo, obrigando-se a deixá-la se não melhor, ao menos como está”. Foi deliberado aceder ao pedido feito.

Em várias ocasiões aparecem referências a autos levantados nos quais estão envolvidos elementos da Guarda Fiscal. Assim, pai e filho espancam um 1º cabo daquela corporação (5) e cinco meses depois é o Chefe da Secção Fiscal que espanca um cidadão pelo que lhe é levantado pelo Administrador do Concelho o competente auto remetido ao Delegado do Procurador Régio da Comarca de Tavira.

Em 1913 o Comandante da Secção da Guarda Fiscal é provocado na Praça da República pelo Administrador do Concelho que de cavalo marinho em punho tem atitudes agressivas por gestos e palavras na presença de muitas pessoas.

O Comandante participa o assunto ao seu superior hierárquico solicitando providências e nomeadamente a competente participação ao Governador Civil. (6)

Em 15 de Fevereiro de 1950 o 2º Comandante Geral da Guarda Fiscal visita a Secção de Alcoutim.

Nos princípios dos anos setenta, a grande maioria dos postos estavam activados, mas a pouco e pouco começaram a ser extintos e mesmo os edifícios postos em hasta pública.

As pensões pagas pela C.G.Aposentações. no concelho não nos enganávamos se disséssemos que 90 % pertenciam a elementos da Guarda Fiscal.

[Antiga guarita da Guarda Fiscal em Alcoutim, 1988]
Esta corrente de actividade decaiu com a chegada do turismo e com a emigração.

No dia 20 de Fevereiro de 1990, são apreendidos 1068 kg. de haxixe que se encontravam a bordo de um iate holandês, de nome Inexplorato,(7) constituindo até à altura a terceira maior apreensão de sempre no Algarve. Pensamos que foi a última efectuada pela G. F. de Alcoutim, já que devido principalmente à integração de Portugal na Comunidade Europeia, a Guarda Fiscal é extinta pelo decreto-lei nº 230/93, de 26 de Junho e criada a Brigada Fiscal, integrada na G.N.R.

Do preâmbulo do diploma, consta:- A Guarda Fiscal assegura, há mais de um século, a actividade de controlo e trânsito de pessoas e bens, contribuindo, com dignidade e prestigiante brio no desempenho da sua elevada função, para a solidificação de Estado de direito em Portugal, actuando empenhada e conscientemente na prevenção de actos ilícitos, na fiscalização e na repressão das infracções às leis do Estado.

Pequena Nota

Este artigo constitui uma cópia integral do que consta sobre o tema na 2ª Edição (em preparação) de Alcoutim, Capital do Nordeste Algarvio (subsídios para uma monografia).
As notas ficarão para uma hipotética publicação.