[Troviscosa, vista parcial. Foto de JV em Janeiro de 2010]
Tomei conhecimento da existência deste monte, aliás, como de todos os outros, através da minha actividade profissional.
Solicitei junto de alguém que por dever profissional o devia conhecer, foi-me dito que ficava lá para o fundo do concelho, que já lá tinha pernoitado e que era o “monte” dos cadeireiros, actividade que na altura desconhecia completamente.
Esta pequena conversa passou-se por volta de 1967/68, por isso, já lá vão uns anos.
Nessa altura só lá se chegava, a esse e a todos os outros, a pé ou de burro pelas veredas que o homem, escolhendo o terreno que lhe oferecia mais facilidade em vencer, ia marcando nas suas deslocações aos montes vizinhos e às propriedades que lhe proporcionavam o sustento, muitas delas cercadas por muros de pedra solta, que construíam, para proporcionar o transplante de zambujeiros enxertados na mão a fim de originar boas oliveiras, o que conseguiam, pois estavam protegidos dos gados. Juntavam-lhe figueiras, alfarrobeiras e outras árvores de interesse.
Após o arrotear dos terrenos procedeu-se ao cultivo dos cereais, nomeadamente trigo e centeio.
Em 1931 ultimavam-se os trabalhos numa “carreteira” entre Martim Longo e Vaqueiros a qual vai pôr em ligação esta última aldeia, até agora completamente isolada do resto do concelho. (1)
Em 1940 pedia-se que esta ligação viesse a ser substituída por uma estrada (2) o que veio a acontecer anos depois.
[Cadeireiros na 1ª Feira de Artesanato de Alcoutim, 1986. Foto de JV]
A primeira vez que me foi dado avistar o monte devia ter sido em 1976 por ter acompanhado o Presidente da Comissão Administrativa da Câmara Municipal, Júlio António Rosa, num jipe que conseguiu vencer a carreteira que tinha sido aberta por intermédio de máquinas retroescavadoras.
Em 1985 noticiava-se (3) o arranque das obras de terraplenagem e respectivas obras de arte na estrada municipal nº 506 entre Casas e Fortim.
A notícia mais antiga que possuímos do “monte” é a que nos fornece as Memórias Paroquiais de 1758 que lhe atribui 7 vizinhos (fogos), tantos como o vizinho Cabaços e mais dois que Fortim, que lhe fica bem próximo.
Nesta altura Traviscosa, tal como todos os montes a sul de Ribeira de Odeleite que pertenciam à freguesia de Vaqueiros, estavam contudo afectos, devido aos problemas da passagem da ribeira, ao termo de Tavira, o que aconteceu até 1836.
Em 1839 Silva Lopes não indica o número de fogos nem à Traviscosa nem aos montes vizinhos.(4)
Situa-se numa pequena elevação, próximo da estrada municipal nº 506 e do lado direito no sentido Norte/Sul.
Energia eléctrica inaugurada em 19 de Dezembro de 1984, tal como aconteceu aos “montes” vizinhos. (5)
Notam-se construções relativamente novas e até de dois pisos.
Ruas pavimentadas e distribuição de água por fontanários. Painel de treze caixas de correio. No censo de 1991 possuía 51 habitantes (H-23, M-28), sendo na altura o quarto mais populoso a nível de freguesia.
No Censo seguinte, 2001, já tinha caído para 32 (H-16, M-16) e hoje será certamente menor.
Local protegido para recolha de passageiros.
Notava-se na altura (1989) alguma vida agrícola, principalmente de horticultura, existindo estufas de consideráveis dimensões, por isso, uma horticultura com alguma evolução e diferente da praticada no resto do concelho.
Um bonito pomar de citrinos. Tudo isto apesar de nos encontrarmos num local relativamente alto.
[A antiga escola recentemente recuperada(2006)]
A escola que serviu as redondezas e que pensamos ter sido construída nos finais da década de sessenta do século passado, foi encerrada em 1991 (6) por falta de alunos, o que aconteceu pelo menos a mais quatro no concelho.
Esta escola teve origem num posto escolar possivelmente criado nos anos trinta do século passado. Neste posto leccionou D. Clarisse Cunha que nos contava os martírios sofridos para lá chegar. Já tinha camioneta até Vaqueiros, mas no dia combinada tinha que lá estar alguém com uma besta para o transporte da senhora que ficava alojada no Monte do Fortim. Só vinha para a sua casa em Alcoutim quando terminava o ano escolar.
Vimos o edifício completamente degradado tendo sido recentemente recuperado e entregue à Fábrica da Igreja Paroquial, através de um protocolo assinado com a Câmara Municipal e com vista ao bem-estar social e cultural da população. (7)
Por administração directa da Câmara os arruamentos foram melhorados em 1998, colocaram-se sinais de trânsito e reparou-se um pontão. (8)
A colocação de água ao domicílio fez-se em 2002, (9) ainda que não possua sistema de esgoto.
Antes de terminar com a explicação da origem do topónimo, iremos referir um caso aqui passado.
[Traviscosa, placa toponímica. Foto JV, 1991]
Em 1884 o Regedor da Freguesia comunica ao Administrador do Concelho que um indivíduo deste “monte” enganou com palavras de casamento uma moça de um “monte” próximo (Fortim) e agora ameaça-a se ela se vier queixar.
Em resposta, informa o Administrador que quanto ao engano e caso a queixosa seja menor, é assunto para ser resolvido em tribunal, mas quanto às ameaças deve intimar o prevaricador para imediatamente se apresentar nesta Administração a fim de ser admoestado e lavrar-se o competente termo de responsabilidade para segurança da visada. (10)
Traviscosa é um topónimo de origem vegetal, derivado de travisco ou trovisco, o mesmo que trovisqueira e planta arbustiva, venenosa, vulgar no sul do País.
Amaral Frazão (11) apresenta-o erradamente no masculino e único, ainda que no Minho apareçam dois “Troviscoso”, havendo por todo o país vários “Troviscal” e “Troviscais”.
NOTAS
(1)–Acta da Sessão da C.M.A. de 19 de Fevereiro.
(2)–O Século, nº extraordinário das Comemorações do duplo Centenário, Lisboa, Junho de 1940.
(3)–Jornal do Algarve de 4 de Julho de 1985.
(4)–Corografia do Reino do Algarve (mapa anexo), 1841.
(5)–Jornal do Algarve de 27 de Dezembro de 1984.
(6)–Boletim Municipal nº 9 de Dezembro de 1991, p. 10
(7)–Alcoutim, Revista Municipal, nº 13, Dezembro de 2006, p. 11
(8)–Alcoutim, Revista Municipal, nº 6, de Janeiro de 1999, p11
(9)–Alcoutim, Revista Municipal, nº 9 de Dezembro de 2002, p. 7
(10)-Of. Nº 178 de 23 de Setembro de 1884 do Administrador do Concelho ao Regedor da Freguesia de Vaqueiros.
(11)-Novo Dicionário Corográfico de Portugal, Porto, 1981