[Praça da República, 1969]
O traçado medieval da vila organizava-se com base em dois espaços, o largo ou praça onde se situava o poder administrativo e adstritos (Paços do Concelho, Pelourinho, Cadeia, Casa do Capitão-Mor, Repartições Públicas, acompanhado naturalmente do comércio de maior impacto) e onde desembocavam as duas vias principais, a direita da Porta de Tavira e a direita da Porta de Mértola e a “ribeira”, o outro espaço junto ao Guadiana onde se efectuavam as trocas comerciais de mão a mão, onde se recebia o que se necessitava e expedia o que se produzia. Aí se encontrava o poder fiscal aduaneiro, a residência do grande Senhor (o Conde) e mesmo dois templos religiosos. É esta a estrutura geral da vila medieval cuja rede se teceu através de pequenas ruelas ligando os pontos já referidos.
[Rua da Misericórdia, 1988. Foto JV]
Nos meados do século XIX encontrámos referência às ruas Direita, onde D. Ana Xavier tem um lagar de azeite cujas águas sujas corriam pela rua e era preciso evitar, fazendo-as passar pelos Trases, a Rua do Quebra-Costas e a Rua da Corredoura, onde Vitoriano da Palma das Cortes Pereiras pede um bocadinho de terreno para fazer um quintal junto às casas que possui. (1)
O Largo do Pinhão, que ainda hoje pode ser identificado pelos moradores mais antigos, já era referido assim naquela altura.
Em 1867 (2) encontrámos referidas as seguintes ruas: Portas de Mértola, Portas de Tavira, Misericórdia, Direita, (?) Lagares e Sto. António.
Interessante é a designação da zona rústica do “jogo da bola” que como é óbvio nada tem com o actual futebol, mas sim com os jogos de então, que além deste incluía entre outros a pela e a conca. Em 1876 (3) informa-se que “o delinquente acha-se junto à horta do jogo da bola”. Em 1877, (4) num ofício dirigido ao Governador Civil, informa-se que a numeração de todas as casas de habitação e das susceptíveis de serem habitadas foi concluída (...) no prazo designado (...) e procedeu-se à cobrança dos números mas a maior parte só se prontificou a pagar o número correspondente à casa que habitavam, recusando-se a pagar os mais, porque dizem que foi assim feito no concelho de Castro Marim.
[Rua Dr. João Dias, antiga Rua Direita das Portas de Tavira. Foto cedida por A.F.]
No “Livro de Inventário dos Bens da Paróquia de Alcoutim - 1878”,encontrámos a Rua da Corredoura em substituição da Rua Portas de Mértola, além das de Nª Sª da Conceição, da Igreja, os Largos do Castelo e também da Igreja.
Em 1880 (5) as ruas e vielas da vila achavam-se imundas, principalmente a rua da Conceição e as vielas do Esteiro.
Na Sessão da Câmara de 23 de Novembro de 1882 o presidente, Manuel António Torres disse que na vila não existiam já os dísticos de nomes das ruas e mesmo alguns que existiam em que os nomes, com que antigamente se denominavam, deviam ser substituídos, como são os das ruas de Portas de Mértola e de Tavira, por não existirem já tais Portas.
Lembrou que a Câmara se encarregasse da revisão dos nomes das ruas pondo novos àquelas que entendesse conveniente. A Edilidade acabou por encarregá-lo de tal missão apresentando a sua proposta oportunamente.
[Rua 25 de Abril (antiga Rua Oliveira salazar). Foto JV, 1973]
Um mês depois (6) apresenta o seguinte quadro que veio a ser aprovado: A Rua de Sto. António passa para Rua Conselheiro José de Beires, (7) Rua Direita para Rua D. Luiz I, Rua Portas de Tavira para Rua D. Maria Pia, Rua das Portas de Mértola para Rua da Corredoura, Rua da Igreja para Rua D. Fernando e Rua dos Lagares para Rua do Guadiana.
A rua que corre da Praça Pública para a Praça de Sto. António passará a designar-se por 7 de Dezembro e a Travessa que corre para esta, Travessa Nova.
A Praça Pública denominar-se-á Praça D. Afonso IV.
Mantêm as designações as ruas da Conceição, Misericórdia e Olaria Velha e as Travessas da Igreja, Conceição e da Cadeia, Largos do Castelo e da Igreja e a Praça de Sto. António.
[Rua D. Sancho II, 2010. Foto JV]
Aparece também a designação rústica de Fonte Primeira hoje desaparecida com a praia fluvial.
Apesar das alterações oficiais sofridas é frequente o aparecimento em documentação diversa de nomes antigos e tradicionais, como acontece com a Rua do Quebra-Costas onde Joaquim José Delicioso está fazendo um prédio. (Sessão de 23.06.1883).
Em 1886 um Edital de 11 de Março faz público que a Câmara deliberou chamar à Rua do Quebra Costas, Rua Nova, à do Esteiro, Rua das Alegrias (?) e à da Olaria Velha, Rua do Sol.
Em 1894 continuam a aparecer as designações de Rua Direita e Rua do Poço dos Lagares.
Com a implantação da República procedeu-se à actualização toponímica (8). Assim, a Praça D. Afonso IV passou a denominar-se Praça da República o que ainda se mantém, a Rua D. Luiz I tomou o nome de Miguel Bombarda, a de D. Maria Pia, Marquês de Pombal e a Rua Conselheiro José de Beires, Rua Teófilo Braga.
[Rua de Nª Sª da Conceição. Foto JV, 2010]
Em 1928 a Rua de Sto. António passa a chamar-se de João de Deus por proposta de Guerreiro Gascon.
Além dos nomes já referidos, a matriz predial urbana (1934?) referia as ruas do Cemitério, do Poço Novo, Boa Vista, das Flores, do Quartel e do Esteiro.
A actualização toponímica volta a ser feita em 1950, aparecendo então e novamente Rua Portas de Mértola, substituindo assim a Rua da Corredoura, de D. Sancho II, das Portas do Rio, Oliveira Salazar, Av. Duarte Pacheco, do Município, D. Fernando, Pedro Nunes, Nuno Álvares Pereira, Marechal Carmona e Travessa Portas do Rio. Foi, naturalmente, a actualização feita pelos homens do Estado Novo que foram recuperar alguns nomes históricos e introduziram os dos seus ídolos, como Salazar, Carmona e não se esquecendo do algarvio Duarte Pacheco.
[Rua Nuno Álvares Pereira (antiga Rua do Quebra-Costas). Foto JV, 2010]
Após o falecimento do Dr. João Francisco Dias é dado o seu nome à que tinha de Miguel Bombarda e em 1984 é homenageado o Prof. Trindade e Lima figurando o seu nome numa das ruas da vila.
A placa toponímica que ostentava o nome de Oliveira Salazar foi substituída por 25 de Abril, logo após aquela Revolução.
NOTAS
(1) - Acta da Sessão da C.M.A. de 23 de Março de 1849.
(2) - Livro das Rendas dos Prédios e Juros Pertencentes à Fazenda Nacional, termo de abertura de 13 de Março de 1867.
[Rua Trindade e Lima. Foto JV]
(3) - Of. nº75 de 10 de Novembro de 1876.
(4) - Of. nº 148, de 12 de Setembro de 1877
(5) - Of. nº123 de 18 de Setembro de 1880.
(6) - Acta da Sessão da C.M.A. de 28 de Dezembro de 1882.
(7) - Foi por duas vezes Governador Civil do Distrito de Faro, de 1869-1870 e de 1871 a 1877.
(8) - "Coisas Alcoutenejas - A Implantação da República" ,José Varzeano, Magazine do Jornal do Algarve de 27 de Julho de 1995.
Pequena nota
Este texto foi extraído da 2ª Edição de Alcoutim, Capital do Nordeste Algarvio (subsídios para uma monografia), em preparação, não se encontrando actualizado com as últimas designações que comportam principalmente a parte nova da vila.
JV