quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Azeitonas de sal



A Câmara Escura de hoje é diferente das anteriores, não na sua essência mas no que se apresenta que está ligado à gastronomia.

E foi ontem ao preparar este aperitivo que me saltou a ideia de o trazer aqui.

Peço desculpa aos visitantes pela sua apresentação em recipiente de vidro, quando o devia ser e neste caso, numa tigela daquelas que eram muito usadas para tudo em toda a serra e que efectivamente tenho mas não por estas paragens.

Tenho dito e escrito em várias ocasiões que conheci e provei azeitonas de sal em 1967, no monte de Alcaria Cova de Baixo, em casa do lavrador João Gomes Alves.

Sempre gostei muito de azeitonas: pisadas (em Alcoutim chamam-lhe britadas), retalhadas e de água, que eram os tipos que eu conhecia na minha região de origem. A farta mesa que nos foi posta (eu acompanhava o malogrado Dr. João Lopes Dias) era constituída por produtos artesanais de excelente qualidade:- pão feito no forno da casa, excelentes queijos, belíssimos enchidos com destaque para os palaios , presunto conservado em sal e … azeitonas. Isto do que me lembro.

Perguntaram-me se gostava de azeitonas de sal, respondi que não sabia, pois nunca tinha provado tal coisa que desconhecia totalmente.

Provei. Perguntaram-me que tal? Respondi evidentemente que eram boas, mas isto por uma questão de delicadeza, pareciam-me azeitonas podres. Para justificar a minha resposta, voltei a comer outra a custo mas, a verdade é que já não me soube tão mal e para o fim até me sabiam bem e foi então que tive oportunidade de comentar a situação com realismo.

A partir daí fiquei fã das azeitonas de sal e sempre que me é possível, confecciono-as.

É o que tentarei explicar a seguir para que as pessoas que as não conhecem, fiquem sabendo como se preparam.

Não há ninguém no concelho de Alcoutim e em toda a serra algarvia que as não conheça e de uma maneira geral todos as apreciam.


(Enxerto de três anos)

Na época da apanha e quando já se encontram maduras (roxas) escolhem-se as mais gradas. A melhor qualidade para o efeito é a maçanilha roxa, talvez por darem normalmente exemplares de maior dimensão e amadurecerem com mais facilidade.

Para as colocar, utilizam-se dois tipos de recipientes, um cesto de cana, já dos velhotes ou um cortiço.

No fundo do cesto colocam-se folhas de couve ou de figueira em alternativa e põe-se a primeira camada de azeitonas que depois é coberta com sal, de preferência sal grosso, daquele com que se salgavam os porcos e assim se vai continuando, uma camada de azeitonas, uma camada de sal.

Há quem prefira o cortiço e o sistema funciona da mesma maneira.

A água proveniente do sal e da azeitona vai escorrendo e o fruto engelhando, acontecendo o mesmo em relação ao cortiço, pois escorre pelas pequenas frestas que a colocação da tampa originou.

Cerca de um mês depois estarão em condições de se começarem a comer. Tiram-se as que necessitamos para a altura e escaldam-se com água bem quente. O sal sai completamente e com o calor da água, incham. Esmagam-se uns dentes de alho que numa tigela se juntam às azeitonas e depois temperam-se com azeite, isto é, faz-se passar um pequeno fio por elas. Com movimentos ritmados e envolventes consegue-se distribuir o alho e o azeite.

Ficam prontas a servir e não pensem que são salgadas, têm muito menos sal do que qualquer das outras que já referimos.

Nunca encontrei azeitonas destas em qualquer outra parte.

Os restaurantes, que eu saiba, não as apresentam.

É um verdadeiro produto regional que pode fazer a diferença, mas que está completamente esquecido.