Hoje escolhemos para escrever o monte de Santa Justa desde sempre um dos mais importantes do concelho e que se situa na freguesia de Martim Longo.
Se estivermos na sede de freguesia e se o pretendermos alcançar, tomando a direcção de Vaqueiros e logo à saída da aldeia, cortarmos à esquerda seguindo a orientação viária tomando a estrada municipal nº 1040, asfaltada e na altura com bom piso, cerca de 6 km andados, encontrar-nos-emos neste monte.
Quem vier de Alcoutim a caminho de Martim Longo pela estrada 124, encontrará um cruzamento à esquerda que igualmente levará a esta povoação.
O topónimo tem origem num nome de santo, sendo por isso designado por um hagiotopónimo (a toponímia hagionímica é um dos mais profundos processos de formação)
Tudo indica que a devoção a Santa Justa deu origem ao topónimo, devoção que originou à erecção de um templo ainda hoje existente.
Santa Justa e a sua irmã Rufina, vendiam na feira as louças que o pai fabricava. Festejam-se a 19 de Julho e são igualmente padroeiras de Burgos e de Sevilha. (1)
Estará isto relacionado com a arte de olaria que existia na sede da freguesia? Pensamos que sim mas faltam as provas. A olaria teria tido origem neste monte e depois passado para Martim Longo? Não sabemos, estamos só formulando conjecturas.
Sabe-se contudo que no sítio dos Telheiros, numa pequena elevação, próximo do caminho para Santa Justa, existiram fornos de olaria, de que restam ruínas onde a Professora Doutora Helena Catarino recolheu fragmentos de cerâmica de época tardo-medieval e moderna. (2)
Um dos filões a explorar, seria a consulta de assentos de baptismo, óbito ou casamento que nos poderiam indicar essa profissão.
Em 1839 era o monte que tinha maior número de fogos na freguesia (36) (3), situação que se mantinha em 1991 com 110 e a grande distância dos outros.
De 1911 a 1981 foi sempre o mais populoso da freguesia, (4) só sendo ultrapassado no censo de 1991 pelo do Pessegueiro mas por uma diferença insignificante.
Em 1911 eram 267 os habitantes, subindo para 315 em 1940. A partir daqui começa o decréscimo pois em 1960 já tinha passado para 264, em 1970, 241 e 1981, 150 e igual número dez anos depois.
Nesta altura o número de habitantes é superior ao de duas freguesias do concelho, mais concretamente Pereiro e Vaqueiros.(5)
Era o único monte da freguesia que possuía capela, o que confirmava a notoriedade que desfrutava. Recentemente, o monte que com ele ombreava construiu um pequeno templo. Estamo-nos a referir ao monte do Pessegueiro.
A Capela de Santa Justa já se diz no século XVI que he huma capella muito antiga que não há memória do tempo que se edifiquou.
Na altura, tinha paredes de pedra e barro, telhado de telha vã, sendo mais larga que comprida. Um altar pequeno de alvenaria coberto com umas toalhas e nele a imagem esculpida de Santa Justa, já muito velha.
Tinha madeira para fazer um alpendre e era reparada à custa de esmolas dos devotos. (6)
O retábulo foi colocado no altar em 1682/83 e em 1744 foi repintado.
Além da imagem mais antiga, tem outra que foi “renovada e encarnada” em 1687/88 e novamente em 1746. Tem uma coroa simples. (7)
A Ermida de Santa Justa é referida nas Memórias Paroquiais de 1758, afirmando-se que fica a uma “légua pequena” de distância, não tem romagem (romaria) e só por acaso lá vai alguma pessoa fora dos dias das suas festas.
Em 1878 o Administrador do Concelho oficia ao Prior Presidente da Junta de Paróquia no sentido deste lhe enviar com a brevidade possível o orçamento dado por peritos para as obras a fazer na Ermida de Santa Justa, obras já contempladas no orçamento da Junta. (8)
Quando visitámos a ermida, já lá vão uns bons anos, lembramo-nos que estava chovendo. Anotámos um botaréu na parede da retaguarda e outro na do lado esquerdo.
De empena de bico, telhado de duas águas e telha de canudo. Porta de duas folhas com trabalhos de argamassa semelhantes por exemplo aos existentes na chamada Casa dos Condes e aos que existiam no edifício que serviu os serviços fiscais do concelho e na desaparecida casa nobre do Padre António, no local onde se encontra hoje a farmácia Caimoto, igualmente na vila.
(A Capela de Santa Justa, 1990)
As suas linhas e estruturas assemelham-se muito às das capelas do Espírito Santo e S. Sebastião, na aldeia.
Por cima da porta, uma cruz de pedra em relevo e no bico da empena, uma simples cruz de ferro forjado.
Pequena janela gradeada.
O prédio foi inscrito na competente matriz predial sob o nº 1524.
Há anos que lhe fazem uma festa, no mês de Agosto. Existe um palco e uma casa de apoio e a Câmara Municipal em 1989 apoiou a população na feitura do recinto das festas. (9)
Quanto ao ensino escolar sabemos que em 1935, por diligência do presidente da Comissão Administrativa da Câmara Municipal, prof. Trindade e Lima, junto do Ministro da Instrução, são criados vários postos de ensino escolar no concelho, entre os quais o de Santa Justa. (10)
Com a supressão dos postos escolares no governo de Marcelo Caetano, o posto transformou-se em escola tendo sido construído um edifício para o efeito.
Em 1991 já a escola não funcionava por falta de alunos que o justificasse e procura-se elaborar um projecto visando o aproveitamento do edifício e espaço envolvente. (11)
Alguma criança em idade escolar era encaminhada para a sede de freguesia.
Em 1992 abre-se concurso público para a execução da empreitada de pavimentação de arruamentos em muitas localidades do concelho, no qual se incluía esta. (12) Os pavimentos encontravam-se concluídos no ano seguinte.
Entretanto é concluída a estrada de ligação entre o monte e a E.N. 124. (13)
Em 1996 são partidos os arruamentos a fim de instalar o fornecimento de água ao domicílio sem o indispensável sistema de esgoto o que veio provocar problemas de vária ordem só resolvidos, a partir de 2006 após a execução da empreitada de rede de abastecimento e saneamento. (14)
(O Monte de Santa Justa, 1990)
Nos Alcariais de Santa Justa ou Barreiros, os árabes deixaram vestígios da sua presença num pequeno povoado que ali funcionou. (15)
Quando se fala ou escreve sobre a Pré-História, mais concretamente no período entre a idade da pedra e a do bronze (calcolítico), durante o qual as comunidades iniciam a produção, ou utilização de objectos de cobre, o Cerro do Castelo de Santa Justa, próximo do monte, é sempre referido como povoado importante dessa época, guarnecido por fortificações com muralhas, bastiões e torres circulares.
A identificação é relativamente recente pois teve lugar em 1978 por uma equipa chefiada pelo Professor Doutor, Vitor S. Gonçalves.
O povoado fortificado possuía pelo menos nove torres, umas ocas, outras maciças e de dimensões diversas e consolidavam os muros internos, constituindo um importante ponto de defesa.
Uma porta em cotovelo tornava-se mais eficaz em possíveis assaltos.
As cabanas onde viviam eram circulares e as bases constituíam um soco de pedra.
Grande parte do povoado, de uma configuração elíptica, foi destruída por um incêndio.
A sua vida deve datar à volta do 3º milénio A.C.
O sítio devia ter tido intensa vida agrícola e sendo os solos de má qualidade, os povoadores contrabalançavam tal situação com a metalurgia do cobre.
Muitos objectos foram encontrados representativos de várias épocas, entre os quais lâminas de sílex e de xisto, furadores, pontas de setas e enxós de pedra lascada, percutores de quartzo e como objectos de adorno, contas de colar, em xisto.
Pesos de tear que se contam às centenas de um único tipo e variadíssimos recipientes cerâmicos, constituem outros dos achados. (16)
NOTAS
(1) – Dicionário de Santos, Jorge Campos Tavares, Porto, 1990, p. 89
(2) –“ O Algarve Oriental durante a ocupação Islâmica”, Helena Catarino, in Al `-Ulyã, Revista do Arquivo Histórico Municipal de Loulé, nº 6, 1997/98, págs. 196 e 712.
(3) - Corografia ou Memória Económica, Estatística e Topográfica do Reino do Algarve, Algarve em Foco Editora (edição facsimilada), 1988
(4) – Os Montes do Nordeste Algarvio, Cristiana Bastos, Ed. Cosmos, Lisboa, 1993, p. 74
(5) – Censo Populacional de 1991-
(6) - “Visitações” da Ordem de Santiago no Sotavento Algarvio, Hugo Cavaco
(7) - A Escultura de Madeira no concelho de Alcoutim do Séc. XVI ao séc. XIX., -Francisco Lameira e Manuel Rodrigues, 1985
(8) - - Of. nº 178 de 28 de Julho do Presidente da Junta de Paróquia
(9) - Boletim Municipal, nº 5 de Setembro de 1989.
(10) - Acta da Sessão da C.M.A. de 28 de Fevereiro
(11) – “Antiga Escola Primária vai ser aproveitada”, in Jornal do Algarve de 11 de Julho de 1991
(12) – Jornal do Algarve de 11 de Junho de 1992.
(13) – Jornal do Algarve de 16 de Setembro de 1993.
(14) – Edital publicado no Jornal do Algarve de 14 de Julho de 2005.
(15) - –“ O Algarve Oriental durante a ocupação Islâmica”, Helena Catarino, in Al `-Ulyã, Revista do Arquivo Histórico Municipal de Loulé, nº 6, 1997/98, pág. 147.
(16) – “Cerro do Castelo de Santa Justa”, Vítor S. Gonçalves, in História de Portugal, Vol. I, Dir. de João Medina, pág. 215