domingo, 3 de janeiro de 2010

Igreja Matriz de Alcoutim


[Cristo Salvador]

Tem por invocação O Salvador.

Situa-se na parte baixa da vila, perto do Guadiana, tendo-lhe passado junto, recolhendo-a, a muralha que cercava a vila.

Data o templo da primeira metade do século XVI, do reinado de D. João III, tendo-se aproveitado para capela lateral, hoje a do Santíssimo, a anterior igreja de uma só nave, que existia em 1518. (1)

Admite-se que o trabalho possa ser de André Pilarte, mestre pedreiro de Tavira ou de seus colaboradores. (2)

Existem elementos arquitectónicos semelhantes na Misericórdia de Tavira e na capela dos Falcões no cemitério de S. Francisco de Tavira. (3)

A primitiva igreja de Alcoutim tinha em 1320 por invocação, Santa Maria. (4)

A actual matriz da vila tem merecido, no decorrer dos tempos, várias obras de restauro, algumas tirando-a da ruína, como aconteceu com a última ocorrida nos fins da década de quarenta princípios da seguinte e que a deixou com o aspecto actual.

[Pórtico renascença]

O portal, que constitui talvez a peça de arquitectura de maior valor, está virado para o sul. Simples mas elegante, é em estilo renascença.

De arco perfeito e estreitas colunas, é trabalhado em baixo relevo de finos pormenores, utilizando-se a lei da simetria. De cada lado nota-se esculpido um cálix. No friso cimeiro que os une, predominam linhas curvas e outros elementos decorativos como aves estioladas, aparecendo com relevância as asas e patas.

Sobre o friso, uma faixa. Dois ornatos laterais e outro maior e central, esculpidos com maior relevo e em forma de facho, ladeiam na verga um escudo de tipo francês com a divisa ALLEO entre ramos de azinheira entrelaçados, estando assim representada a Casa de Vila Real, tronco do Condado de Alcoutim que na qualidade de donatários da vila, teriam sido patrocinadores da obra.

[Brasão da Casa-Vila Real]

A mesma inscrição ALLEO e pelos mesmos motivos, encontrámo-la na Capela de Nª Sª da Conceição fazendo parte do brasão de armas da vila.

A porta é de duas folhas e dá-lhe acesso escadaria recente, composta por dez lanços a que se chega pela Rua Eng. Duarte Pacheco.

Na fachada, de empena de bico, sobre o portal abre-se um óculo redondo que areja e ilumina a igreja. É protegido por grade de ferro forjado onde as rectas se misturam com curvas e contracurvas. É obra proveniente do restauro.

Torre sineira de secção quadrangular e três olhais de arco perfeito. Cúpula piramidal da mesma secção em cujo vértice se situa cata-vento de ferro representando o tradicional galo.

Nos vértices da torre existem pináculos de argamassa e de adorno que condizem com a cúpula.
São dois os sinos. O maior, com uma grande cruz em relevo, mede 0,52 m de altura por 0,52 de diâmetro. O seu peso é de cerca de 130 kg.

Dá nota sol 4. As legendas dizem:

Em cima: - Ave Maria Gratia de S. Salvador Mundi
Em baixo: - Anno DE 1?18

Não se consegue ver se é 1718 ou 1818, porque o segundo algarismo está desgastado.

O menor, com a altura de 0,40 m, diâmetro de 0,44 m e peso aproximado de 60 kg., dá nota lá 4.

A inscrição é assim: I H S Maria Jose ano 1779

Estes sinos, segundo o autor de Vozes de Bronze, são a voz de Portugal mais fácil de se fazer ouvir em Espanha. (5)

[Capitel coríntio. Foto J.V. 2008]
Entremos no templo considerado amplo e de boa construção. É de três naves um pouco desproporcionadas e quatro tramos. A nave central assenta em oito fortes colunas de fustes cilíndricos rematados por belos capitais de vários ornatos, predominando elementos florais, mas de estilo pouco definido, constituindo peças de valor arquitectónico.

Dá nas vistas uma pia tetralobada e que envolve uma das colunas. (6)
Pedra sepulcral com a seguinte inscrição:-Aqui jaz Gaspar Gomes na era de 1648.

Foi sargento-mor e Familiar do Santo Ofício.


O baptistério situa-se sob a torre sineira e é defendido por largo portão de ferro forjado no qual se vê o ano de 1905.

A pia baptismal tem cerca de um metro de diâmetro e nada de interesse.

[Baixo-relevo no Baptistério]

Na parede, e como alusão ao acto, um baixo-relevo colorido, de interesse, representando o Baptismo de Jesus. É cercado por uma orla onde se lê a enigmática legenda:- “1653 - CAPITULUM SACROANTAE LATERANENSIS ECCLESIAE”. Que poderia ter o Cabido da Igreja de Latrão com Alcoutim? - pergunta o Prof. Pinheiro e Rosa. (7)

A capela-mor é dividida do corpo da igreja por arco triunfal perfeito, sem ornatos, e que no fecho ou chave tem a era de 1902, certamente indicativa de alguma reconstrução ou reparação.

O retábulo, que foi restaurado, é de madeira trabalhada e forma um conjunto harmonioso.

A abóbada é de berço sem qualquer decoração.
No altar da nave do Evangelho, existiram telas muito estragadas: Cristo Crucificado, S. Miguel Purgatório e mais três pequenas com imagens de santos, mas cobrindo pinturas em tábua de muito melhore qualidade.(7)

O retábulo da capela colateral esquerda classificado como do século XVI princípios do XVII, foi restaurado, mas com desvirtuamento das suas características. (7)

[Interior do templo]

Além dos painéis indicados, havia na igreja mais três de pintura não boa:- um Nascimento, uma Entrega do Escapulário do Carmo e uma Visitação. Estas peças mesmo que não tivessem grande valor artístico, tinham-no iconográfico e histórico e nunca se deviam destruir nem alienar. (7)

O tecto da nave central é de madeira, tal como o púlpito de secção hexagonal e a escada em caracol, circundando uma coluna da nave e que lhe dá acesso.

Tem coro.

O corpo da igreja possui uma porta lateral, de arco perfeito, mas sem qualquer interesse.

A sacristia tem porta e janela para o exterior. Recebe também luz por três frestas de arcos ogivais.

Do outro lado do templo, a confraria. Um lanço exterior de dez degraus de ladrilhos, protegidos por muro, leva-nos a uma porta de acesso. Janela quadrangular guarnecida por grade de ferro forjado.

A nível de alfaias, guarda um cofre eucarístico de prata e madrepérola e uma custódia templete do século XVII, rematada por uma imagem de Nª Sª da Conceição. (8)

Dois cálices de prata, um liso, outro cinzelado, do século XVII. (7)

No inventário dos Bens da Paróquia de 1878, (9) consta um cálix de prata dourado por dentro e bordado por fora, com os Martírios do Senhor.

De paramentos são apontados: uma casula francesa, do século XVI, com sebastos de veludo, panos laterais de seda lavrada e guarnições de brocatel, e uma casula verde, também do século XVI, em damasco com sebastos de brocatel. (7)

Como se disse, o estado actual deve-se ao restauro iniciado em 1948 e que a tirou da ruína. Em 14 de Janeiro de 1951, dizendo-se missa, reabria-se ao culto, considerando o correspondente local do Diário de Lisboa, uma obra do Estado Novo.

Por testamento de 20 de Setembro de 1852, Joaquim Madeira disse que irão para a igreja matriz, onde se conservarão, as imagens de Santo António e de Nª Sª do Carmo, que tem em sua casa. Estas imagens não aparecem referenciadas no inventário de 1878 nem são conhecidas na igreja.
Enquanto esteve em ruína, serviu de matriz a Igreja da Misericórdia.

Ocupa uma área de 417 m2 e pertence à Diocese de Faro. (10)

A Igreja de S. Salvador é considerada um dos melhores exemplares do primeiro renascimento no Algarve. (11)



N.B.Este texto foi retirado da 2ª Edição de Alcoutim, Capital do Nordeste Algarvio (Subsídios para uma monografia), em preparação, guardando-se as notas para uma hipotética publicação.