terça-feira, 17 de abril de 2012

Afonso Vicente foi um grande monte da freguesia de Alcoutim [12]

A FARINAÇÃO

Numa zona onde a cerealicultura e a pastorícia foram o sustentáculo da economia, a farinação não podia deixar de ser uma actividade importante.

Tinha lugar através de moinhos de vento ou de água, azenhas que se situavam na ribeira do Vascão. Numa função de âmbito restrito podemos igualmente referir as mós manuais, segundo parece de origem romana e aqui designados por “molinetas” ou “molnetas”, que se destinavam a moer milho para confecção das tradicionais papas de milho ou xarém. Podiam também moer trigo para a confecção de papas de frangolho.

[Velha molineta afonso-vicentina. Foto JV]

[Moinho da Pateira ainda com capelo. Foto JV]

Existiu junto ao monte e a norte um moinho à vela que os mais idosos afonso-vicentinos, isto por volta de 1970, nunca viram de pé. O que todos conheceram e que os poucos habitantes ainda conhecem é o sítio onde se localizou e por isso, chamado “moinho de vento”.

A sul da pequena povoação, os designados moinhos da Pateira (três) e que o último deixou de trabalhar pela força do vento cerca de 1945, mas em 1950 já estava a funcionar através de motor.

Um destes moinhos estava relativamente bem conservado ou pelo menos tinha as paredes de pé e o capelo que há anos foi retirado, segundo informação recebida, para reparação mas que ainda estará por realizar, isto se o motivo da retirada foi esse.

Pertenceram em tempos a Ti Fastina de Afonso Vicente e que vivia numa casa que seus herdeiros venderam para ser a sede da Sociedade Recreativa local.

Nesta altura podia verificar-se que servia de degrau para a mesma parte de uma velha mó que tinha servido naqueles moinhos.

Depois o moinho passou para a posse da família Gomes das Cortes Pereiras e foi ela que introduziu o motor deixando de aproveitar a força eolólica.

Consta-nos que foi adquirido há vários anos pela Câmara Municipal, havendo o intuito, pelo menos na altura, de o restaurar e pô-lo a funcionar como atracção turística. Parece que foi nesse sentido que a cúpula foi retirada mas a verdade é que esta foi a única acção que conhecemos para esse fim.

Era a este moinho que recorria, naturalmente, a população de Afonso Vicente.

Além dos moinhos de vento procuravam em alternância os hidráulicos nos períodos chuvosos e que existiam relativamente perto ou seja na ribeira do Vascão.

Um dos mais procurados era o dos Clérigos, a que o povo chamava Cleros, na margem esquerda e por isso, no concelho de Mértola. Tinha dois rodízios e um açude muito bem construído. Pertencia à Herdade dos Colgadeiros propriedade de João Celorico Palma. Deixou de funcionar em meados dos anos 50 do século passado.

Próximo deste existia o moinho da Corte Miguel que nada deve ter com Miguel Angel de Leon, o espanhol que presidiu ao município de Alcoutim e que foi barbaramente assassinado em 1878. Já não funcionava nos primeiros anos do século passado.

Seguidamente existia o moinho de Dª Ana, na margem direita e consequentemente no concelho de Alcoutim que podia pôr a funcionar três moendas ao mesmo tempo. O seu açude era um dos mais altos e poderosos muros de pedra feitos na ribeira. Deixou de funcionar em 1966. Era também muito procurado.

[Moinho de Dª Ana, levada.]


Continuando em direcção à foz, encontramos o moinho Pedro, na margem esquerda e que pertencia a Manuel Silvestre, das Cortes Pereiras e a Ildefonso da Mesquita. Ainda existem vários vestígios, incluindo mós. Foi aqui moleiro António Inácio das Cortes Pereiras, bom mestre na arte e conhecido por Ti Glindim que ia alternando o seu trabalho neste moinho e no de vento das Cortes Pereiras do mesmo proprietário. Parou em 1961. (1)

Junto à foz, o moinho de D. Miguel ou do Melão pela sua configuração ovalada e este sim, parece ter sido mandado construir por Miguel Angel de Leon depois de 1860. É uma robusta construção que está quase coberta devido ao assoreamento. Quando o conhecemos, o nosso cicerone afirmava que as mós tinham ficado lá dentro e que pertencia à Herdade do Monte Novo de Santa Marta.

De uma maneira geral, os moleiros tanto sabiam trabalhar nos hidráulicos como nos eólicos, utilizando-os conforme se tornavam mais produtivos e isto conforme as estações do ano.

Está documentada a existência de moinhos no concelho de Alcoutim, pelo menos ,desde o século XV.

NOTA

(1) – Engenhos Hidráulicos Tradicionais, Parque natural do Vale do Guadiana, Rui Guita, Edição do Instituto de Conservação da Natureza / Parque Natural do Vale do Guadiana, 1999