[Um aspecto da povoação em 1992. Foto JV]
Quando as insónias aparecem e de uma maneira geral não sabemos porquê, mas que possivelmente, no fundo, existirão as suas razões, que não nos é possível descortinar, pela minha parte ligo o candeeiro, recosto-me na cama e puxo por um livro daqueles que tenho em pilha e próximo da cama.
Foi o que aconteceu às 3 da manhã do passado dia 28.
O livro que me veio à mão foi o volume II da História Genealógica da Casa Real Portuguesa de D. António Caetano de Sousa cuja 1ª Edição data de 1736.
É volume que por várias vezes já me passou pelas mãos e onde vou anotando aquilo que me interessa.
É sempre conveniente lerem-se novamente os textos de que se tomaram notas, porque nem sempre a nossa atenção e poder de concentração atingem os níveis mais desejados.
Na página 89 de Alcoutim, Capital do Nordeste Algarvio (Subsídios para uma monografia), 1985, escrevi: Uma herdade, perto da vila e que pertenceu aos Condes de Alcoutim e posteriormente à Casa do Infantado, denominava-se Diogo Lopes, designação que rusticamente ainda se mantém e que nos parece estar relacionada com o fidalgo citado (Diogo Lopes da Franca), a quem talvez tivesse pertencido.
O que então admiti invocando Diogo Lopes da Franca, fidalgo importante e donatário entre outras das saboarias de Alcoutim e que a queda de Franca seria normal, para mim caiu por terra como tentarei explicar.
A existência de duas herdades designadas por Primeira de Diogo Lopes e Segunda de Diogo Lopes é um facto e pertenceram aos Condes de Alcoutim. Passaram mais tarde a fazer parte da Casa do Infantado (1) quando o 6º e último Conde de Alcoutim foi degolado no Rossio em Lisboa, no dia 29 de Agosto de 1642.
Com o liberalismo e em meados do século XIX, os foros são remidos e passam para a posse da burguesia local, foros remidos por José Pereira e Maria Raimunda Pinto e hoje retalhadas por heranças ou vendas.
Estas duas herdades que deviam confinar ou estar muito próximas, pelo menos uma chegava à vila e desenvolvia-se muito para além do monte da Corte Tabelião. Os seus limites não os conheço mas ainda é possível que haja alguém que tenha alguma noção sobre o assunto.
A existência da pequena povoação da Corte Tabelião (corte do tabelião) tem de estar relacionada com um tabelião que exercia, a grosso modo, as funções que hoje executa um notário. Isto parece ser pacífico, o problema está em saber quem foi esse tabelião.
Na leitura que voltei a fazer do trabalho de D. António Caetano de Sousa a página 290, reli o contrato de casamento entre D. Afonso, filho de D. Diogo, infante de Portugal, 4º duque de Viseu, 3º duque de Beja e de D. Leonor de Sotomaior y Portugal, Duquesa de Vila Hermosa que se achava viúva e D. Joana de Noronha, filha de D. Pedro de Menezes, 1º marquês de Vila Real e de D. Beatriz de Bragança.
[D. Manuel I]
D. Afonso, reconhecido pelo Rei D. Manuel como seu sobrinho, fê-lo Condestável de Portugal.
O contrato realiza-se em Janeiro de 1501. Na circunstância, D. Joana de Noronha foi representada por D. Fernando de Meneses, já 2º Marquês de Vila Real pelo falecimento de seu pai ocorrido em 1499 e 1º Conde de Alcoutim, isto por procuração que esta lhe passou para o efeito, a irmã, a qual foi passado em Leiria, de que era alcaide-mor e tinha avultados bens em 2 de Junho de 1500.
Na procuração apresentada aparecem várias testemunhas, naturalmente, ligadas à Casa de Vila Real, entre as quais... Diogo Lopes e Diogo de Abreu, escudeiro, Tabaliaens, e...
Enquanto Diogo de Abreu seria escudeiro e tabelião, Diogo Lopes seria apenas tabelião. (2)
[Pequena habitação restaurada com equilíbrio, o que não é muito vulgar. Foto JV, 2011]
Não nos admira que este Diogo Lopes, tabelião, estivesse explorando ou viesse a explorar estas herdades pertencentes ao 1º Conde de Alcoutim, D. Fernando de Meneses, que lhe vieram por parte de sua mulher a 1ª Condessa, D. Maria Freire de Andrade, por deferência deste e dentro das regras então usuais.
Se assim for, o tabelião Diogo Lopes teria necessidade de juntar os seus gados em corte, sendo o local identificado na Herdade de Diogo Lopes como a Corte (do) Tabelião.
A corte sempre teria criados para tratar do gado e com o decorrer dos anos e as transformações operadas acabou por se fixar mais gente, dando origem ao monte de Corte Tabelião, que na sua tradição sempre teve vocação para o gado, nomeadamente para a pastorícia.
Esta “conclusão” que me parece muito mais plausível do que a primeira, necessita de ter mais sustentáculo histórico documental que poderá encontrar-se em documentação referente à Casa do Infantado e em relação a Alcoutim e que se encontra em vários arquivos.
Restará dizer que da união de D. Afonso com D. Joana de Noronha veio a nascer uma filha única, D. Brites de Lara, que veio a ser 2ª Condessa de Alcoutim, devido ao casamento realizado em Dezembro de 1519 com D. Pedro de Meneses de que era prima co-irmã.
D. Joana de Noronha era tia e sogra de D. Pedro de Meneses e única irmã de seu pai D. Fernando de Meneses, 1º Conde de Alcoutim.
NOTAS
(1) – Livro mod 1-A de Registo de rendas dos prédios e juros de capitais pertencentes à Fazenda Nacional, no concelho de Alcoutim - termo de abertura de 13 de Março de 1867. - Arquivo da Repartição de Finanças de Alcoutim.
(2) – História Genealógica da Casa Real Portuguesa, D. António Caetano de Sousa, Vol. II. Edição (fac-similada) QuidNovi/Público – Academia Portuguesa da História, pp 290 e 291.