domingo, 22 de abril de 2012

Uma versalhada dos anos 30 do século passado

Pequena nota

Sou por vezes interrogado por leitores do AL como é possível manter uma escrita quase diária sobre ALCOUTIM e o seu CONCELHO visto tratar-se de uma pequena vila lá para os lados da Serra do Caldeirão e junto ao Guadiana.

Além da consulta em bibliotecas e arquivos, não tanto como desejávamos e que já se desenrola há mais de quarenta anos, procurei sempre olhar para as coisas com olhos de ver e não despercebidamente. Talvez esteja aqui a razão de ter sempre algo para dizer e escrever.

Ainda que tivesse recolhido informação, muita deixei desaparecer mas a verdade é que eu só vivi onze anos em Alcoutim e o meu trabalho não era este. Além da execução da minha profissão era obrigado por lei a trabalhar para duas entidades das quais recebia uma importância mensal quase simbólica!

Numa conversa telefónica habitual com o nosso Amigo e Colaborador Gaspar Santos recordei a existência de estes versos reproduzidos por uma alcouteneja que os ouviu em criança e que nunca mais esqueceu.

Tive oportunidade há muitos anos de os transmitir a um dos netos do autor que os desconhecia completamente e que muito agradeceu dizendo que representavam bem a ideia com que tinha ficado do seu avô.

A versalhada traduz bem as vivências de Alcoutim na época e vários têm sido os “Quaresmas” que têm passado pela Vila, uns de lá, outros de fora e com roupagens diferentes, ora de oiro, ora de pechisbeque. E continuarão a passar...

O autor que se identifica foi cabo da Guarda Fiscal, nasceu 1855 e faleceu em 1936.

Foi pai, entre outros do professor Manuel José da Trindade e Lima que foi presidente da Comissão Administrativa da Câmara Municipal de Alcoutim e professor na vila.

A alcouteneja que me transmitiu os versos faleceu não há muito e de provecta idade.

Chamava-se Lucília Pereira, vulgo Pimenta.

Esta publicação acaba por ser uma maneira de a recordar.

JV




Venho a meu povo contar

Uma cena muito engraçada

O Quaresma foi ao cemitério

Entrou com o coveiro à cabeçada



O homem quando o viu pela frente

Em camisa e sem chapéu

Aterrorizado bradou

Valha-me aqui Deus do Céu.



Senhor Quaresma tenha tino.

Porte-se como um homem sério

Olhe que está praticando um crime

Dentro de um cemitério.



E é o Senhor Quaresma

Chefe de uma secretaria

Que vem ao cemitério

Praticar tal selvajaria!



Um homem que assim procede

Não devia ser nada

Devia de estar internado

No manicómio Bombarda.



Sei que o Senhor que diz

Que me tem um ódio fatal

Nada lhe levo por isso

Visto que o meu é igual.



Visto que o meu é igual

Ou talvez muito superior

É como o outro que diz

Amor paga-se com amor.



Quem estes versos fez

É velho mas não covarde

Nome, sobrenome e alcunha

JOSÉ FRANCISCO DA TRINDADE