Escreve
Daniel Teixeira
AS CAMPANHAS
CAMPANHA DO TRIGO
O Estado Português lançou a Campanha do Trigo, em 1929, para incentivar o cultivo do trigo, através da atribuição de uma série de regalias a quem o cultivasse.
Esta Campanha consistiu em demonstrações técnicas de uso de
adubos, assistência de agricultores e escolha de sementes.
A Campanha do Trigo tinha como objectivos: alargar as áreas destinadas ao cultivo de cereais; possibilitar o aumento da produção; contribuir para a auto-suficiência alimentar.
Embora se tenha conseguido aumentos da produção e até
excedentes, no ano de 1932,
a Campanha do Trigo foi responsável pela acentuada
erosão de muitos solos.
Esta campanha levou a um intenso aproveitamento agrícola dos
terrenos pobres. Abandonou-se quase por completo o tradicional sistema de
rotação de culturas, deixando de se cumprir os prazos mínimos de pousio. Isto
provocou um esgotamento dos solos.
Quando escrevo estas minhas crónicas fico por vezes a pensar
que se não fosse o prazer que me dá recordar tempos que para mim foram bons nem
valeria a pena estar com isso que seria então um trabalho.
Falo aqui do trabalho naquele sentido em que eu, e o Marx,
já agora, para não ficar sozinho entende (mos) o trabalho como algo pelo menos
pouco agradável, que custa e que se realiza na sua esmagadora maioria por força
da remuneração que se recebe em troca.
O Marx, e não só, há dezenas senão centenas de teóricos e
não teóricos mais conhecidos ou menos conhecidos que sabem perfeitamente que
hoje já não se trabalha de borla, por aquilo que poderia chamar-se amor à arte,
senão a nível da carolice. E mesmo esta tem por vezes algumas compensações que
não sendo desde logo monetarizáveis o são contudo no sentido da auto-premiação.
Têm valor, em suma, que o próprio «carola» arrecada para sua satisfação ou
reforço do seu prestígio pessoal real ou imaginado.
Ou seja e para ir mais directo ao assunto eu mesmo quando
escrevo estas crónicas não sinto que esteja a contribuir para um reforço de
qualquer coisa: exercito a memória, certo, fico com mais umas folhas
preenchidas nos meus cadernos e recebo de quando em vez um ou outro comentário
sobretudo elogioso, porque contra aquilo que escrevo nunca ninguém se
pronunciou.
E tenho falado por vezes de forma não muito politicamente
correcta de algumas coisas: sobre a figueira da índia, por exemplo, disse que
não estava de acordo em que se explorassem as capacidades curativas da planta e
sim que se fizesse um apanhado das suas capacidades como produto «grosso», quer
dizer, tenho talvez infelizmente alguma experiência sobre a efemeridade das
coisas que não têm substância suficiente por baixo em seu apoio.
Vivemos uma época em que uma minoria, bastante activa
diga-se, envereda pelos alimentos e pelas curas chamadas de biológicas. Ora,
por aquilo que sei - e acho que isso se vê a olhos vistos e sem necessidade de
lupa - o mercado do biológico, neste sentido, é um mercado estagnado desde há
longo tempo. Tem «vipes» de ressurgimento, é um facto, sobretudo quando se
consegue que algo faça uma episódica (é sempre episódico, diga-se) entrada de
rompante nos tecidos do consumo.
Quase todo o mundo corre a comprar o produto, criam-se redes
de venda tipo pirâmide e passados tempos uma parte substancial das pessoas
ficam com o produto / bebé nos braços. Ou consomem-no eles mesmos ou têm de o
jogar fora passada que seja a tradicional fase dos «saldos» e passado o
razoável período de validade.
A máquina - aliás há duas máquinas nesta coisa - acaba por
trucidar as possibilidades de alguma perenidade. A primeira máquina, a da
concorrência alternativa, tem centenas de anos de vida, trabalha em série ou de
forma produtivamente sofisticada e o biológico traz a alcofinha para vender nas
feirinhas ou em locais de passagem ou aos amigos.
A segunda máquina é aquela dos outsiders das produções,
aquela que promove o produto biológico, e que em muitos casos entra na venda
agressiva (para ser simpático) através de piramidais mecanismos, criando vendas
artificias e dando lugar à chamada bolha que todos conhecem. Quando essa mama
acaba «descobrem» outra mama e assim sucessivamente. A desconfiança vai-se
instalando serena e o já de si pequeno nicho de mercado restringe-se cada vez
mais apesar das constantes entradas de novos potenciais consumidores.
Ora feito este reparo declaro solenemente se necessário for
que apoio, embora isso não valha grande coisa - o meu apoio, - à produção e
reformulação de produtos derivados da Figueira da India. Li algures um texto,
bastante interessante e bem construído, diga-se, da Apodif onde se fala nas
potencialidades que podem ser criadas através do cultivo da tuna, com efeitos
benéficos nos rendimentos zero actuais dos agricultores, na apicultura e mais
coisas.
Na verdade e falando só deste aspecto a figueira da índia
tem grandes possibilidades de marcar passo se não for acompanhada de outras
motivações. A região de Valinhos, no Estado de S. Paulo, no Brasil, não tem só
figos de tuna: é uma das regiões com maior variedade de frutas e tem ao seu
lado uma metrópole de 20 a
30 milhões de efectivos e potenciais consumidores. Aconselha-se pelo menos a
associação com outras regiões frutíferas para começar.
O Concelho de Alcoutim, como tantos outros pelo menos
parcelarmente foi uma vítima da Campanha do trigo de 1929. A «febre» da
plantação de trigo e da autosufiência alimentar nacional arrasou com o arvoredo
que fazia parte do conjunto sistemático da zona e colocou plantações de trigo
lá onde os terrenos nem eram próprios nem previam naturalmente tal tipo de
plantação. As políticas compensatórias da PAC fizeram o resto. Tudo aquilo que
seja feito no Concelho e que não tenha em consideração este elemento de
recomposição está, na minha opinião, condenado ao fracasso.
Só como aparte e porque parece haver também alguma confusão
neste plano que está ainda que indirectamente relacionado: o facto de
construírem lares e se darem empregos públicos não conta nas estatísticas reais
do desemprego produtivo assim como não conta como repovoamento efectivo. O
repovoamento é feito através da entrada no circuito (local neste caso) de
população em idade activa ou potencialmente activa (caso dos nascimentos ou da
população jovem)
A chamada economia dos serviços (sejam eles sociais ou
empresariais) dependem das produções e de uma coisa a que se chama de Valor
Acrescentado Bruto que vem destes. Ou seja da diferença entre aquilo que se
«semeia» e aquilo que colhe e não dos impostos cobrados sobre esse VAB. Ora
depender das prestações da Segurança Social (por muito meritória que seja a
actividade e é) ou do Orçamento Local ou do Estado no caso do emprego nas
Autarquias não serve mesmo como argumento embora possa parecer interessante em
períodos de campanhas eleitorais ou pré-eleitorais.