quinta-feira, 5 de março de 2009

Recordar um amigo




Escreve
José Miguel Nunes




A minha filha, como qualquer miúdo da sua idade, adora que lhe leiam uma história, e como as que temos cá em casa já lhe foram lidas vezes sem conta, aqui há uns tempos tive de lhe renovar o “stock”, e foram histórias da “Moranguinho”, do “Noddy”, dos “Irmãos Koala”, eu sei lá…

Pensarão, mas o que é que isto tem a ver com Alcoutim? Provavelmente nada, depende de quem escreve, depende de quem lê.

Mas voltando às histórias da minha filha, no meio delas há uma em especial que ela adora que lhe leia, chama-se “O Capitão Nelo”, e é da colecção dos “Irmãos Koala”. O Nelo é um pequeno vombate que mora no interior da Austrália, que certo dia se depara com uma descoberta deveras interessante: uma pequena lancha em muito mau estado. Com a ajuda dos irmãos Koala, Franco e Beto, arranja a lancha, e realiza o seu sonho de ser um verdadeiro Capitão de Mar, com um chapéu à capitão e tudo.

Voltamos novamente ao mesmo, mas o que tem isto a ver com Alcoutim? Provavelmente nada, depende de quem escreve, depende de quem lê.

Cada vez que lhe leio aquela história, lembro-me de Alcoutim. Cada vez que lhe leio aquela história, lembro-me do Sr. Leonel, que morava na rua onde se situava a casa dos meus avós, era logo a primeira do lado direito, no sentido de quem sobe, mesmo junto às escadinhas que aí existiam e recentemente assassinadas.

O Sr. Leonel, homem alto, grande e de voz grossa, estava sempre pronto para uma brincadeira, alguns da minha idade ainda o recordarão com toda a certeza. Metia-se muito comigo, aliás como fazia com todos os outros miúdos, mas talvez por ser próximo da família, ou por eu ser “um pouco irrequieto”, raramente passava por mim sem me provocar de alguma maneira.

O Sr Leonel nunca me tratou pelo meu nome, sempre me chamou de “Capitão”, ou melhor, de “Captão”, sempre me lembro de assim ser. Não faço a mínima ideia porquê, a verdade é que também eu, como o pequeno Nelo da história dos Irmãos Koala tinha um chapéu de Capitão de Mar, é possível que tenha sido essa a razão.

A história do “Capitão Nelo” é uma história que eu gosto de lhe ler, e que ela gosta de ouvir. Até acho que gosta mais desta do que das outras, ou então sou eu que gosto mais desta do que das outras. Não sei, é possível que lha leia de um modo diferente do que lhe leio as outras, é que esta recorda-me Alcoutim, é capaz de ser isso.
Mas o que é que isto tem a ver com Alcoutim? Provavelmente nada, depende de quem escreve, depende de quem lê.


Recordar Leonel Mariani Lorador, falecido em 1994 e um verdadeiro amante de Alcoutim, é a simples homenagem que lhe posso prestar.