segunda-feira, 17 de junho de 2013

Caça à multa




Escreve

Gaspar Santos



Já publicamos neste blogue artigos falando de caça: às raposas, ao coelho com pau e às perdizes com armadilhas e, falámos de alguns caçadores que se notabilizaram. Hoje chegou a vez de falar de outro tipo de “caça” : à multa.

Chefiou a Conservação de Estradas de Alcoutim em meados do século um jovem cujo nome já não recordo, que por vezes utilizava a máquina de escrever do Grémio da Lavoura em que eu trabalhava para tratar do seu expediente. Ele tinha um curioso sistema de apanhar os agricultores em contravenção para depois os multar. Praticava uma espécie de caça, que nós apelidamos de caça à multa.

Os burros, cavalos e muares, e não sei se também as vacas, pagavam um imposto por circularem nas estradas nacionais. Era como que uma versão mais rústica do IUA (imposto único automóvel), o selo do carro que hoje nós pagamos anualmente.

Estes animais podiam trabalhar nos campos, deslocar-se através de caminhos rurais ou estradas municipais. O imposto só era devido quando pisavam estradas nacionais. O que acontecia quando iam aos mercados do Pereiro, Odeleite ou Azinhal.

Quando se dirigiam das freguesias de Pereiro ou de Alcoutim para as feiras do Azinhal ou de Odeleite tinham que passar obrigatoriamente pela ponte da Foupana.

Ponte da Foupana que liga o concelho de Alcoutim ao de Castro Marim,
 após o restauro de 2001 motivado pelo mau tempo.
Era na ponte da Foupana que, enquanto aguardava a oportunidade de passar uma multa, o Chefe de Conservação de Estradas se defendia do calor intenso do verão, sentado ou recostado à sombra da ponte a ler um livro ou jornal, deixando em cima da ponte um cabo e um cantoneiro na vigilância.

Quando se aproximava um ou mais homens com animais para o mercado, o cabo de cantoneiros chamava: Chefe vem aí um lavrador com um burro e uma muar! Então o chefe vinha para cima da ponte e pedia as licenças e lavrava o respectivo boletim da multa se era caso disso.

Bem, se era cínica a maneira de aguardar pelas infracções, e era, ainda assim pode reclamar para si o mérito de não se esconder atrás dos subordinados delegando o odioso para cima deles.