[Igreja Matriz, 2007. Foto de JV]
Foi sede de priorado, tendo três igrejas curadas anexas, que foram Giões, Vaqueiros e Cachopo. (1)
É o templo do concelho sobre o qual, e em consequência do seu valor, mais se tem escrito, sendo o único considerado como Imóvel de Interesse Público (Decreto nº 47508, de 24 de Janeiro de 1967), o que é significativo.
É lamentável verificar que depois da publicação do diploma, sofreu acções que lhe limparam elementos de valor histórico e iconográfico.
Silva Lopes, (2) considera-a a mais antiga destes arredores e Correia de Azevedo (3) diz que não há como esta, outra em toda a área do concelho.
O douto Prof. Pinheiro e Rosa refere-a como antiquíssima, embora se encontre modernizada por partes. (4)
Desconhecendo-se a data da fundação, é construção de raiz gótica mas muito obliterada (5), conservando poucos elementos artísticos da primitiva construção. Exteriormente destacam-se as portas góticas, a principal de um só colunelo e a lateral mais simples (6) e os seus botaréus semicilíndricos, três em cada uma das paredes laterais, (7) de um tipo pouco comum na arte portuguesa.
Tem semelhanças com os da ermida de S. Brás, em Évora, dos finais do século XV, considerada protótipo de arte gótico-manuelina-mudéjar (8) e com as matrizes de Espírito Santo (Mértola) e Santa Cruz (Almodôvar). (9)
[IGreja Matriz, desenho de JV.]
As duas portas góticas e os contrafortes teriam (terão) talvez uma longa história para contar, segundo observa Victor Adragão. (10)
A fachada principal é muito estreita. Sobre a porta de pedraria e a que já nos referimos, uma janela de verga trabalhada, que ilumina e areja o templo. Este janelão teria sido feito em meados do século XVIII.
Sobre o bico da empena, uma interessante cruz de ferro forjado.
O portal situa-se a um nível bem abaixo ao da rua.
A torre sineira é saliente da fachada. A cúpula, sobre a qual é hábito nidificarem as cegonhas, apresenta dois fogaréus. É de seis olhais, dois em cada uma das faces anterior e posterior e um em cada uma das laterais.
Os dois sinos, antes de 1943, tinham as seguintes imagens e inscrições: (o maior) - imagem de Nª Sª da Conceição e uma cruz / Nossa Senhora da Conceição e Martim Longo / Manuel António da Silva filho Lxa Anno de 1865, (o menor) uma cruz, uma inscrição ilegível com a indicação da fábrica e esta INS Maria José Anno de 1787. Ambos estavam rachados e conta-se do menor uma curiosa lenda.
Tocou pela primeira vez no baptismo de uma criança que cresceu, se fez homem e viveu noventa anos. No dia em que estava dobrando pelo seu falecimento, rachou.
Em 1943, sendo pároco o Padre Júlio Alves de Oliveira, foram feitos novos sinos, dando-se em troca os dois velhos e mais 1.202$95, saldo de uma festa de 1942.
O maior, com 146 kg, apresenta uma cruz e uma custódia e chama-se de Nª Sª da Conceição. O menor, com 90 kg, é de São Marcelino. Foram fabricados na Fundição Nova Lusitânia, de H. S. Jerónimo - Ermesinde.
Ambos têm uma inscrição que diz:- Fundido e Sagrado em 1943. Foram padrinhos do sino grande, o Senhor Tenente - Coronel, João Cândido Figueiredo Valente e a Senhora D. Maria Isabel do Carmo Ricardo Ildefonso, do pequeno o Senhor Artur de Moura e a Senhora D. Isabel de Freitas.
[Igreja Matriz, 1990. Foto de JV]
Às dez e quinze do dia 5 de Setembro foi colocado na torre o sino grande pelos seguintes martim-longuenses:- Augusto Soares, Manuel António, António Luís, José Gomes, António Brás, Matias da Conceição e Manuel Brás. (11)
Em 1534 já aparece um campanário sobre a porta principal, só com um sino e que os moradores da aldeia mandaram fazer à sua custa. Trinta e um anos depois está aberto pelo meo e despegado (...) da parte da igreja, muito perigoso e situam-no da banda do norte pegado com a parede junto à porta principal. Tem nesta altura dois sinos, um de bom tamanho e outro pequeno, mas ambos bons.
É recomendado o seu arranjo por estar perigoso e para cair. (12)
Em 1518 a igreja tinha sido feita de novo pelos moradores da aldeia e seu limite e às suas custas. Já era de três naves, a única assim em todo o concelho. (13)
As naves são separadas por quatro arcos ogivais, de cada lado, assentes em colunas de pedra, muito baixas, com capitéis tronco-piramidais invertidos, muito sóbrios e simples, predominando os elementos geométricos. (14) São elementos dos primórdios da construção.
Os arcos são de tijolo e as colunas de pedraria.
As três naves dão ao templo um ar seguro e acolhedor. (15)
Em 1565 encontrava-se madeirada de castanho, forrada de canas e he toda a dita igreja bem ladrilhada. (16)
O pavimento em soalho já estava muito estragado em 1946. (17)
Há referência a um altar de alvenaria dedicado a São Luís, do lado do Evangelho e na banda da Epístola existe outro, de Nossa Senhora da Graça, com o Menino Jesus nos braços, isto em 1565.
Em 1712 tinha seis altares a saber: o mor, com o Santíssimo, dois colaterais, sendo um o de Nª Sª da Assunção e mais três laterais, São Luís e Almas, Santo António e São Brás, afinal os mesmos que tinha em 1946.
Os retábulos dos altares eram em estilo renascença, do século XVII ou anteriores. O de Nª Sª da Assunção tinha sido feito entre 1681 e 1684, sendo da mesma época os de São Luís e de Nª Sª do Rosário.
Em 1518 a igreja tem a capella (mor) deribada (...) a quall hade ser feyta aa custa do Bispo e Cabydo de Sylves e do comendador e em 1534 ainda assim se mantinha mas em 1565 já estava feita, de alvenaria, abobadada, com dois arcos de pedraria feitos em cruz com chave também de pedra. Altar também de alvenaria. Retábulo de cinco painéis e pintura a óleo.
Arco cruzeiro de pedra e nas paredes pinturas, entre elas representando Nª Senhora e S. João.
As paredes laterais da capela-mor foram azulejadas, painéis posteriormente colocados na fachada principal do desaparecido cemitério da freguesia. (18)
Há notícia de que o prior de Martim Longo, Nuno Rijo de Sousa, fundou um vínculo em capela na igreja, o qual por sua morte deixou a seu sobrinho, filho de sua irmã, Margarida Baptista de Sousa, de Portimão, o Dr. Diogo Mascarenhas de Figueiredo, cónego da Sé de Faro, arcediago de Lagos, e que foi vigário-geral do Bispado do Algarve em 1685 e também prior de Martim Longo por renúncia que nele fez o referido Nuno Rijo de Sousa.
Diogo de Mascarenhas era comissário do Santo Ofício em 1665 e morreu em Faro em 1696.
Mandou reconstruir à sua custa, segundo uma inscrição nela existente, a há muito profanada ermida de São Cristóvão, situada nos arredores de Faro. (19)
Era filho de Diogo Martins Mascarenhas, Senhor do Morgado de Quelfes, moço fidalgo, dizem que capitão - mor de Faro e da dita senhora. (20)
O templo, em meados do século XVI, tinha um bom púlpito de madeira de pinho.
A pia baptismal, ainda existente, é dos primórdios do templo e uma das suas peças mais valiosas, com o pial decorado de carrancas. Em 1518 diz-se que tem hum pyar de pedra muito boõ.
[Imagem de Nª Sª da Conceição]
Presentemente, na capela-mor encontra-se a imagem da padroeira, Nª Sª da Conceição. Na base, apresenta uma serpente mordendo uma maçã e os crescentes da Lua. Sobre a mão esquerda está o Menino de vulto perfeito. Nos dias festivos usa coroa de prata.
Imagem pintada, dourada e estofada, está em bom estado de conservação e é exemplar de muita qualidade, segundo os especialistas. Sofreu arranjos em 1607, 1661 e 1754.
Além desta imagem encontra-se a de Cristo Crucificado sobre cruz de madeira, cujas extremidades apresentam decoração em talha. Estando em bom estado de conservação, tem alguma qualidade. (9)
Segundo Álvaro Pais (pseudónimo do prof. Pinheiro e Rosa) onde a igreja é verdadeiramente rica é na indumentária e na ourivesaria.
Nas visitações de 1518, 1534 e 1565 aparecem referidas várias vestes sagradas e roupas de altar.
[Interior da igreja. Foto JV.]
Na Exposição de Arte Sacra realizada em Faro, em 1940, foi apresentada uma casula do século XVII. O fundo é de seda rosácea brochada com fio de prata e sedas de várias cores. O sebasto central tem ramos, frutos e pinhas estilizadas. Os laterais, ramagens, flores e escudetes. A forma da casula é muito análoga com as orlas quase direitas. Abertura para a cabeça muito pequena.
Possuía também duas dalmáticas de veludo carmesim e outras duas também de interesse e de damasco branco. Mais uma casula de damasco verde, possivelmente do século XVI e outra de seda branco, bordada a matiz que também figurou na referida Exposição.
Assim a descreve o prof. Pinheiro e Rosa: ”Ao fundo, um florão com uma cercadura de ramagens e flores, fechadas numa moldura circular. O resto do fundo é composto de folhagem verde, fina, com vários tipos de flores estilizadas. Tudo isto é envolvido por uma larga orla em que um tronco sustenta alternadamente palmetos amarelados e tufos de folhas verdes, donde saem rosas singelas e seus botões.
Nos lados mais curtos, estes ornatos, em vez de sobrepostos, ladeiam-se mutuamente. As sanefas dos lados maiores são de três tipos: ornato em leque com enrolamentos; cornucópia com flores; e flor com folhagem (três de cada). As dos lados menores são também de três tipos: rapaz com ramagens, cornucópia com flores e flores com folhagem.
Rectangular, é pálio para seis varas.” (4)
Uma cruz processional que igualmente figurou na Exposição de Arte Sacra. Tem 0,87 X 0,35 m. Foi comprada em 1753 e custou 124$720, tendo sido reparada em 1800.
De prata branca lavrada, eis como o Prof. Pinheiro e Rosa a descreve:- Uma coluna canelada, à qual se segue o nó ovalado, em que há, entre ornatos, diferentes ovais com símbolos da Paixão - coluna e esponja, bolsa de Judas, escada e lança, cruz e flagelos. A esta parte, segue-se uma truncatura de pirâmide fantasiada, tendo por ornatos cruzes de braços iguais e mais símbolos - dados, coroa de espinhos e cravos, martelo e torquês, escudo com as cinco chagas. Por cima, um ático donde parte a haste maior da cruz. Os ornatos geométricos são autênticos do século XVII. As hastes terminam em esferas. O Cristo tem coroa de espinhos separada e o resplendor é maciço.
Como utensílios de altar, dois cálices, um do século XVII, de prata dourada, com a altura de 0,24 m e outro também de prata dourada mais relevada, muito elegante. Tem o pé e a base recortados e divididos em três secções. Parece ter sido comprado em 1799, em Lisboa.
Uma custódia-cálix de prata dourada, do tipo templete, com ornatos do século XVII. Segundo Pinheiro e Rosa, já existia em 1620.
Também de referir é um cofre para guarda do Santíssimo - uma arqueta de prata branca lisa com cabeças de anjos nos pés e na base da cruz. Já existia em 1808.
Nas visitações de 1518, 1534 e 1565, da Ordem de Santiago, são referidas bastantes peças de ourivesaria, cálices, custódias, turíbulos, cruzes, etc. e paramentos que foram desaparecendo algumas vezes por troca com novos como se poderá verificar nos textos, mas nem sempre terá sido assim.
Em 1565 o prior era obrigado a dizer missa ao povo todos os domingos e festas de guarda do ano e administrar os Santos Sacramentos aos fregueses.
[Torre sineira. Foto JV.]
Tinha como “mantimento” em cada ano, um moio de trigo, quatro mil reais em dinheiro e ainda o pé de altar da matriz e das anexas que eram, como já se disse por várias vezes, Giões, Vaqueiros e Cachopo.
Existiam três confrarias: a do Santíssimo Sacramento, com bom rendimento, bastante para os seus encargos, a do Rosário e a das Almas que pouco tinham para se manter.
Como era hábito, no adro da igreja, enterravam-se os defuntos, tal como acontecia no seu interior para os mais endinheirados.
No primeiro quartel do século XVI, o mordomo recebia por cada sepultura nova trezentos reais e por vez que se abria para os herdeiros, mais trinta. (13)
Tinha a igreja, por estas alturas, mais 17,5 alqueires de trigo proveniente de foros de quatro herdades e umas casas junto dela em que se guardavam diversos utensílios.
Serão estas casas possivelmente as mesmas que possui no Largo da Igreja, um prédio com três divisões e de 60 m2 de área coberta, que se encontra inscrito na respectiva matriz sob o nº 260.
Sabe-se que por testamento de 2 de Janeiro de 1881 uma devota deixa a Nª Sª da Conceição, orago da matriz, uma cerca denominada do “moinho” cujo rendimento será aplicado no culto da mesma Senhora.
A matriz predial regista ainda hoje uma cerca no sítio do “montinho” em nome da Junta de Paróquia. Pensamos que se tratará da mesma cerca já que o topónimo se pode confundir.
Segundo as Memórias Paroquiais (1758) (12) A Igreja deste lugar que he o único e maior edifício que nelle há não padeceo ruina nem dano algum no terramoto de 1755.
Em 1862 a Junta de Paróquia requer à Câmara que lhe aprove por meio de Postura a derrama de 200 mil réis a lançar sobre os fregueses, para se fazer “hum telhado novo na Igreja Paroquial”, o que a Câmara veio a acordar. (21)
Pequena nota
O presente “post” é tirado totalmente da 2ª Edição (em preparação) de Alcoutim, Capital do Nordeste Algarvio (Subsídios para uma monografia) pelo que as notas aguardarão uma hipotética edição