terça-feira, 6 de outubro de 2009

Miradouros de Alcoutim

Pequena nota: Este pequeno artigo de opinião foi escrito há 36 anos. Era então um jovem.Hoje as coisas estão algo diferentes. Na altura não havia um tostão na Câmara, hoje existem muito e muitos milhares de euros. Lá fiz a minha crítica que como é óbvio, não deu qualquer resultado.Gostei de reler aquilo que escrevi pelo que o dou a conhecer aos visitantes/leitores do ALCOUTIM LIVRE.

(PUBLICADO NO JORNAL DO ALGARVE DE 4 DE AGOSTO DE 1973)

Abranger largos horizonte, subindo ao cume de um cerro, ao alto de uma torre, ao píncaro de um penedo ou a qualquer outro ponto proeminente, dá-nos uma sensação de conforto e ao mesmo tempo da nossa pequenez perante a imensidão que se alcança.

Desde sempre o homem procurou estes locais, ainda que as razões dessa procura tenham variantes, no decorrer dos tempos.

Inúmeros miradouros, desde o Minho ao Algarve, espalham-se pelo País, alguns até de renome europeu. Uns, desde sempre aproveitados, outros por várias razões ainda por descobrir. Alguns, constituem mesmo, pontos vitais de turismo, com passagem obrigatória.

[Miradouro dos Bancos da Capela. Des. de JV]
Como se compreende a existência de inúmeras vivendas, normalmente de estrangeiros, situadas nos contrafortes da serra algarvia, em pontos proeminentes? Além do sossego das zonas, onde a poluição ainda não chegou, é nossa modesta opinião que a possibilidade de desfrutar uma boa paisagem, teve a sua quota-parte para tal escolha. É evidente que existem outros factores de monta, mas não teria sido desprezado.

Existem variadíssimos aspectos paisagísticos: miradouros que têm como fundo principal uma grande cidade ou pequena vila, a imensidade de uma planície, sulcada pelo rio que a irriga e onde se admira a produtividade do solo; outros retêm por cenário a imensidão do oceano, onde se vislumbra aqui e ali uma embarcação na faina pesqueira ou em passeio turístico; e outros têm por base vales verdejantes, serranias descalvadas ou repletas de arvoredo.

A pequena e velhinha vila de Alcoutim, que não chega a ter três centenas de habitantes e onde as características algarvias são entrecortadas pelas alentejanas, para não falar na influência espanhola, não esquecendo que na maioria das famílias daqui oriundas, pulula sangue do país vizinho, cambem foi bafejada pela natureza com miradouros de interesse, que quaisquer olhos recebem com prazer.

Tem amendoeiras, cuja flor é a avidez de muitos turistas nacionais e estrangeiros. Dispõe mesmo de “quadros” que talvez façam inveja a muitos outros, neste aspecto, já que as amendoeiras, ainda que de menor porte do que no litoral, dispõem-se em terrenos acidentados e não em planícies.

Além do “nevão algarvio” que na visita no mês de Fevereiro, mostra o Guadiana ziguezagueante, ora de margens escarpadas, ora semiplanas, onde o alcoutenejo produz os mimos hortícolas. Em redor, espalham-se os montículos e os vales a que dão origem. Para lá do profundo rio, as terras da vizinha Espanha e, de onde em onde, os agregados populacionais.

A paisagem por vezes é agreste, predominando o mato. A brancura da flor da esteva e nos barrancos o cor-de-rosa da dos loendreiros, não significam menos beleza. Há anos, uma família de pintores dinamarqueses, ali se instalou durante alguns meses, reproduzindo na tela as paisagens e motivos locais.

Vários são os miradouros naturais: cerros da Mina, da Forca, do Alcaçarinho e da Castanha, para só falar nos que nos ocorrem de momento. Dos indicados, é este último que nos feriu mais a sensibilidade e o de mais fácil aproveitamento. Nele se instalou, em 1969, um posto retransmissor da R. T. P. que serve exclusivamente a vila e de que beneficia Sanlúcar do Guadiana.

Para lá se instalar, havia que construir uma pequena casa e via de acesso. A população, convidada a contribuir, foi generosa e os que o não fizeram monetariamente, ofereceram o seu trabalho braçal. Soube-se aproveitar as facilidades da R. T. P. e o precioso auxílio de um dilecto filho desta terra. Hoje funciona a telescola com bastante benefício para a população.

[Miradouro do Cerro da Castanha. Des. de JV]
É do cume deste cerro que se avista surpreendente panorama sobre a vila de Sanlúcar, distantes terras de Espanha, o Guadiana, cerros e vales circunvizinhos.

Não seria possível adquirir uns metros quadrados de terreno para lá instalar uma plataforma de cimento e xisto da região, salpicando-a de simples bancos e de adequados canteiros onde se colocassem variedades de cactos, plantas que além de serem muito decorativas suportam com facilidade a falta de água, que ali se faz sentir?
Desde que imperasse o bom gosto, conseguia-se, com pouco dispêndio, um retiro agradável. Com o alcatroamento do pequeno troço de acesso e a colocação de uma placa indicativa no entroncamento, os alcoutinenses podiam dizer que também tinham o seu miradouro, utilizando-o e oferecendo-o aos visitantes que por vezes aparecem e que abalam sem que os seus olhos “bebam” um panorama interessantíssimo, que reteriam na lembrança.

Não era muito para o que Alcoutim, a vila desprezada, necessita, mas era alguma coisa.

Aqui fica um alvitre, uma sugestão, uma impertinência ou … uma bazófia, se assim o quiserem considerar.