(PUBLICADO NO JORNAL DO BAIXO GUADIANA Nº 66 DE AGOSTO DE 2005, Pág. 19)
[A aldeia de Giões. Entrada sul. Foto JV, 2010]
A situação de seca que se vai vivendo no País, sugeriu-me a abordagem do tema em relação à aldeia de Giões.
Iremos por isso, dentro das nossas limitações, referir o que através dos tempos nos foi possível recolher.
Já o fizemos, com menos dados e que recordamos, por duas vezes, já lá vão uns anos. (1)
A água é elemento indispensável para a existência e consequentemente e consequente fixação do homem.
A ocupação da região vem de tempos imemoriais que não podemos precisar mas que vários achados arqueológicos o justificam.
Nas Memórias Paroquias – 1758, o cura que respondeu ao questionário, escreveu ao responder à pergunta número vinte e três: Há junto ao lugar uma fonte de que bebe o povo, a qual está entre pedras vivas e antes do terramoto de 1755 não dava água bastante para o dito povo, mas depois dele dá água em abundância para se beber, servir e se regar. Uma hora por esta causa se faz.
Depois, refere outra fonte com as seguintes palavras: Fora do lugar, em distância de um tiro de espingarda com bala, há outra fonte a que chamam a Fonte Santa e dizem que era uma boa lagoa onde vinha muita gente sã e enferma a lavar-se, com esperança de sararem os vários achaques e lhe chamavam a lagoa da Senhora da Assumpção, que é o orago desta Parochia e depois fizeram dela fonte, mas já não vem gente até ela como então e só algumas pessoas quando estão doentes mandam buscar a sua água, com fé de que não faz mal bebendo-a com febre e passada essa ocasião, não bebem mais dela porque a da outra fonte é mais saborosa e só bebiam dela antes do terramoto por haver falta de água na outra fonte.
Silva Lopes refere (2) que… tem a dous tiros de balla huma fonte abundante, e de que bebe o povo, e junto hum chafariz para os gados, e ainda vae regar huma horta; está entre penhascos, e antes do terramoto não bastava para uso da povoação, que sempre tem alguns poços, mas todos se seccão no verão.
No Portugal Antigo e Moderno, Pinho Leal diz que … a 500 metros da povoação, tem uma fonte abundante de boa água.
Em 1845, José Dias de Almeida, da cidade de Beja, requereu à Câmara, queixando-se do procedimento do Regedor de Giões por impedir a mulher do signatário, residente na aldeia, de continuar a tirar água da Fonte Santa para regar a sua horta, água que abunda na fonte. A Câmara, depois de ouvir a Junta de Paróquia, indeferiu o pedido. (3)
A Fonte Santa, cinco anos depois continua a originar problemas. O “bello e grande tanque onde vão beber todos os gados daquelle Povo e que por isso se deve conservar com asseio e limpeza”, é conspurcado por patos que lá propositadamente levam, “enlodando a água e enchendo-a de penas de tal modo que fica incapaz para os animais beberem”.
Reclamando o povo por tal situação junto do Regedor da Paróquia e este, para evitar semelhante abuso, mandou “deitar huma coima no dono dos patos”.
Consultou este um letrado (advogado) que lhe teria garantido a absolvição, uma vez que as Posturas só referem penas para os que sujarem águas de poços e não de tanques. Efectivamente e segundo se depreende da leitura do documento, o homem veio a ser absolvido pelo juiz.
Exposta à Câmara toda a situação, esta analisou-a e acabou por aprovar a seguinte postura, rectificando a anterior: Quem nos poços, fontes e tanques ditar qualquer cousa imunda ou limpa, terá de multa cem réis e sendo imunda pagará mil réis. (4)
[Edifício da Junta de freguesia de Giões. Foto JV, 2010]
Nessa altura (1850) é mandado abrir um novo poço na aldeia que dá água em abundância tendo a Câmara gasto na obra só treze mil réis, visto o restante ter sido suportado através de uma subscrição que se abriu na aldeia para o efeito. (5)
Em 1882 a Fonte Santa volta a merecer os cuidados da autarquia. O vereador, António Joaquim Teixeira, apresenta o orçamento das despesas a efectuar e relativas à construção de uma abóbada na dita fonte a fim de se conservar a água sempre limpa e não ser prejudicada a constante corrente de água para o tanque (ou chafariz) onde os gados bebem.
O orçamento apresentado referia uma despesa prevista entre doze e catorze mil réis e o vereador, que era natural da aldeia, foi encarregado de o mandar executar. (6)
Complementarmente a Câmara oficia ao regedor da freguesia no sentido deste avisar os “vizinhos” para concorrerem com um dia de trabalho, cujo dia lhe seria indicado por ele Regedor e em conformidade com as Posturas. (7)
Em 1975 realizaram-se a partir do poço canalizações que iam abastecer vários fontanários espalhados pela povoação. Também a Fonte Santa abastecia um lavadouro público, nesta altura.
O saneamento básico teve lugar em 1985. (8)
Perto da ponte sobre a Ribeira do Vascão (vulgo ponte das Relíquias) existe uma bica e três bancos de pedra, o que foi feito em 1983.
É tudo o que temos para dizer sobre o assunto, esperando enriquecer o conhecimento dos nossos leitores, se por ventura tal não conhecerem.
NOTAS
(1)-“Giões (Alcoutim) – Um pouco do passado e do presente”, em Jornal do Algarve de 22 e 29 de Julho de 1977 e Alcoutim, Capital do Nordeste Algarvio (Subsídios para uma monografia), Edição da Câmara Municipal de Alcoutim, Rio Maior, 1985.
(2)-Corografia do Algarve, 1841
(3)-Acta da Sessão da C.M.A. de 3 de Agosto de 1845
(4)-Acta da Sessão da C.M.A. de 6 de Agosto de 1850
(5)-Acta da Sessão da C.M.A. de 8 de Outubro de 1850
(6)-Acta da Sessão da C.M.A. de 14 de Setembro de 1882.
(7)-Ofício nº 94 de 21 de Setembro de 1882
(8)-Jornal do Algarve de 6 de Junho de 1985.