quinta-feira, 31 de março de 2011

A menina e o cavalinho de papelão



A Câmara Escura de hoje volta às figuras humanas apesar de terem sido poucas as publicadas mas presentemente temos algumas muito interessantes para apresentar.

A que apresentamos foi-nos cedida por uma leitora assídua do ALCOUTIM LIVRE e que se encontra a residir num país da Europa.

A foto foi tirada em meados do século passado num retratista numa Feira de São Marcos, um dos grandes acontecimentos populares do concelho, havendo já uma Romaria ao São Marcos em 1758, que acabou por se transformar em feira, acompanhando a evolução dos tempos.

A presença do retratista era das poucas ocasiões que proporcionava a tiragem de um retrato que se pudesse pôr em casa e que marcasse uma época.

Não estava ao alcance de todos, pelo contrário, tirar um retrato, o pouco dinheiro existente era utilizado para as transacções comerciais consideradas indispensáveis para o governo do ano e a Feira de S. Marcos era a altura ideal para o fazer. Comprava-se o porquito para engordar, utensílios indispensáveis de barro, já se vê, cadeiras de junça ou tabua, alguma semente e pouco mais.

A aproximação da feira causava ansiedade nas pessoas, entre os quais os jovens, que tinham oportunidade de dançar a noite toda, pois não havia falta de pares e os pais estavam preocupados com as compras e o trabalho de levar os animais ao seu destino, caminhando por esses campos fora.

O retratista tinha a sua “barraca” armada, feita de pano suportada em estacas de madeira ou de ferro.

O interior dispunha de vários cenários conforme o “freguês”, gosto, sexo e idade. Neste sentido tinha dois ou três cenários de pintura naif, algum cadeirão de verga e algo para as crianças e no caso presente servia para ambos os sexos.

Ao ver a fotografia, fez-nos recuar aos nossos tempos de menino pois tal cavalinho de papelão era uma das grandes ambições dos miúdos do nosso tempo. “Cavalgámos” alguns mas nunca tivemos nenhum!

O cavalinho castanho com alguns pontos brancos, procurando uma imitação aceitável, estava fixo sobre um estrado que possuía quatro rodas de ferro e não deixava de estar “aparelhado”.

O “artista” teve a preocupação de mandar a menina pegar nas rédeas do animal para que a sua pose ficasse mais composta.

A menina certamente que levou o melhor vestido e parece-nos que além do branco terá uma cor garrida, está penteada ao uso da época, cabelo puxado para trás terminando em duas tranças que se unem formando um arco, um crucifixo caindo sobre o peito e certamente suportado por fio de oiro, meia branca, calçado afivelado.

O seu corpinho é bem proporcionado e as feições correctas, admitindo que tivesse uns olhos bonitos. Expressando um leve sorriso, está bem compenetrada do seu papel.

Este cavalinho só servia para o retrato, mas os outros, enquanto um se sentava, os companheiros empurravam, mas nem dava para virar!

Aqui tendes caros visitante / leitores, uma menina alcouteneja dos meados do século passado.