sábado, 31 de março de 2012
Notas sobre a desertificação em Portugal e em Alcoutim em particular
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Daniel Teixeira
Quando comecei a colaborar com o amigo José Varzeano e o seu exemplar Blogue Alcoutim Livre estava longe de supor que as coisas tomariam este bom caminho que desde cedo foram tomando.
Enquanto que o José Varzeano e os restantes outros colaboradores do seu blogue, de uma forma geral, referem factos concretos, cimentados em documentação escrita ou gráfica na sua maior parte, eu, sem ser pretensiosamente modesto, vou escrevendo sobre aquilo de que me lembro dos meus tempos passados num isolado Monte do Concelho - Alcaria Alta.
Por diversas vezes ao longo destes tempos tenho reparado que existe naquilo que sinto e leio, uma demarcação, entre a visão documental e a visão memorial (mesmo aquela que refere Alcoutim / Vila) quase semelhante ou pelo menos aproximada com a dualidade campo / cidade.
Esta minha percepção, minha e só minha, quer dizer sem contas feitas nem grandes análises, tem-me levado também a pensar por vezes, que existem dois Concelhos de Alcoutim: aquele que eu conheci na parte que conheci e aquele que rodeia a Vila e os interesses e vontades das suas gentes e daqueles que lá foram formados e / ou criados.
Claro será que este facto tem a ver mais com a dificuldade (e impossibilidade por vezes) que as pessoas dos Montes têm em expressar, sobretudo via Internet, aquilo que gostariam de dizer. Portanto o meu retrato das situações comparativas que refiro terá sempre de ter isso em conta: não se fala mais dos Montes porque as pessoas que poderiam falar deles ou não estão habilitadas para tal ou simplesmente porque não têm grande interesse nisso. E esta falta de interesse liga-se a muito daquilo que eu escrevo...uma prosa que eu mesmo já defini como sendo depressiva e que vem de forma indirecta de um meio rural deprimido. Mas não só...
Seria complicado ter de admitir isto mas poderia parecer que a solução para as gentes e os Montes do Concelho de Alcoutim tendo de passar por eles, conforme já disse em crónicas ou declarações anteriores, teria de ser encontradas fora deles, gentes e Montes e Aldeias e Vila e que daí, dessas soluções, poderia passar ou não o futuro do Concelho de Alcoutim e da sua Vila sede. Nada mais errado, na minha opinião e por aquilo que me parece é este o caminho que se segue de uma forma maioritária.
Reclama-se contra os poderes centrais, contra o esquecimento a que Alcoutim está votado, pede-se a construção de uma ponte que ligue Alcoutim a San Lucar que se facilite a implantação de empresas vindas não se sabe de onde nem para fazer o quê uma vez que matérias primas não há e mão de obra (mesmo pouco qualificada) muito menos.
Para estes casos e nesta situação as empresas que se implantem no Concelho acabam por custar mais em benefícios fiscais e outros do que aquilo que vierem a produzir de facto. Vejamos o caso dos eucaliptais e contemos (talvez com os dedos de uma só mão) o número de trabalhadores locais que a eles foram afectados. No entanto os dinheiros para a sua implantação foram obtidos por via da referência à desertificação alcouteneja e ao baixo preço dos terrenos.
Ainda não há muito tempo fiz um esboço de um pequeno trabalho sobre a dualidade campo / cidade e, não o tendo completado da forma que desejaria, ficaram no entanto as recolhas e as ilações que se puderam retirar.
Esse meu trabalho de pesquisa levou-me a encontrar um trabalho de tese «QU’EST-CE QUE LA LITTERATURE FRANÇAISE REGIONALE? - (DES ECRIVAINS DU SUD-OUEST DE LA FRANCE) - Lect. univ. dr. SILVIA MIHUT- Univ. 1 Decembrie 1918, Alba Iulia (Roménia) que não sendo exaustivo deixa bastantes pistas sobre as diferenças entre quase galáxias diferentes.
O Concelho de Alcoutim, que eu saiba (e acho que deveria saber se as coisas fossem difundidas de forma conveniente) não tem qualquer forma de incentivo à literatura rural ou de inspiração rural, por exemplo. Em certo sentido – e não me importo muito com as criticas negativas que possam aparecer – de uma forma geral as pessoas que estão ligadas aos Montes e Aldeias do Concelho e que adquiriram alguma cultura nas cidades e vilas para onde se deslocaram pelas razões de todos conhecidas, não são nem estão motivadas para escreverem sobre as suas origens e difundirem a sua memória.
Ora a memória, o estudo da história, ainda que vista de forma ficcional é essencial para aferição e correcção daquilo que foram e são os caminhos do presente. Lá onde a força cultural existente acaba por não existir, por falta de manifestação, as coisas acabam por ser mais complicadas e por vezes parecem-nos ciclópicas.
Sobre este tema veja um artigo do Engº Gaspar Santos no Blogue Alcoutim Livre.
Aliás é esse o mote (a memória) das declarações do Arqt.º Ribeiro Telles no texto que publicámos e sobre o qual fazemos em seguida alguns comentários também.
Dentro daquele espírito que se considera razoável parece-me evidente que o diagnóstico do Arq. Ribeiro Telles acaba por esclarecer muito ainda que se tenha em atenção que se trata acima de uma recolha jornalística, feita com o intuito de informar.
Já escrevi algures que o desenvolvimento (e a vida) dos concelhos e freguesias rurais depende do amparo que for dado à base que esteve na origem da sua constituição e ordenação. Mas não é só a vida dos concelhos e freguesias rurais...
Numa altura em que pretende ter lugar uma reforma administrativa com englobamento, fusão e extinção de Freguesias e mais tarde, provavelmente Concelhos é bom que se tenha presente uma coisa que me parece evidente: não há super-estrutura (mesmo micro) que se mantenha sem estrutura.
Debruçando-me exclusivamente sobre Alcoutim (Concelho, Vila, Aldeia e Montes) pode dizer-se uma evidência que nos parece ...evidente. As razões da sustentabilidade de umas depende das outras numa cadeia lógica que quase nem justifica desenvolver.
Com bastante pena vejo que esta verdade (para mim insofismável) tem dificuldade em impor-se junto de algumas mentes.
Primeiro a terra e o seu cultivo, isso é boa e coerente gestão: criou-se a ilusão de um emprego artificial com obras públicas (ainda que de relativamente pouco valor) e esqueceram-se as vertentes da sobrevida económica e social por arrasto. E a educação para o desenvolvimento...
Lembro aqui um resumo sobre Tomaz Cabreira em «O Algarve Económico» de 1918: «Uma escola móvel do ensino industrial, mas com uma secção comercial, deveria deslocar-se por toda esta região, dando esclarecimentos e fornecendo novas técnicas, quer aos rurais quer aos pequenos industriais, delas carentes. Tomaz Cabreira defende ainda para a região, a criação de escolas agrícolas e de pescas.»
E isto foi escrito em 1918 (e antes e depois por outros certamente) ou seja, há praticamente 100 anos que se fala nisto.
Não estamos no tempo das Escolas Móveis mas estamos no tempo das brigadas móveis e faltará saber o apoio técnico e tecnológico que foi dado à agricultura e à indústria no Concelho de Alcoutim. Se disser que foi zero não ando longe da realidade. Eu, pelo menos nem o vi passar...
Agora o que se quer? Inverter situações com dezenas de anos de ovulação com os mesmos meios que se usavam no início dessa ovulação?
Tenhamos pelo menos tento...já que a inteligência faltou.