segunda-feira, 12 de março de 2012

O sismo de 1969 na Vila de Alcoutim

(PUBLICADO NO JORNAL DO BAIXO GUADIANA Nº 72 DE MARÇO DE 2006)

As recentes lembranças, através de jornais, livros, entrevistas e conferências da passagem dos dois séculos e meio sobre o Grande Terramoto de 1 de Novembro de 1755, fez-me lembrar do Sismo de 1969, pelo qual passei.

Como não me consta que algo tivesse sido descrito na imprensa, a não ser o facto de ele se ter feito sentir na pequena vila raiana, sem consequências de maior, talvez não seja descabido referir o que se passou na vila de Alcoutim no afastado dia 28 de Fevereiro de 1969.

Eu estava lá!

Dormia tranquilamente, como acontece a todos os jovens, no 1º andar da designada pensão Marreiros, situada na antiga residência do Padre António José Madeira de Freitas, por ele mandada construir em 1875 junto da igreja Matriz, no local onde esteve o passal e desaparecida por volta de 1977.

O tremer foi tanto que me fez acordar. Tive a noção do que estava a acontecer mas resolvi (!) olhar para o tecto e esperar que ele caísse! Dou entretanto pela saída espavorida de dois hóspedes acidentais e que desceram as escadas num ápice. Eram dois funcionários do Instituto Nacional de Estatística que procediam a um inquérito no concelho.

Como o tecto não caiu, voltei-me para o outro lado e adormeci.

No outro dia, lá fui para o meu posto de trabalho e é então que me dizem que a Praça da República se encheu de gente oriunda das ruas medievais da vila e que se encontrava, em trajes menores, cobertos por xailes, casacos e sobretudos enfiados à pressa e que iam comentando o acontecimento.

O guarda-fiscal que estava de serviço ao cais, informava da rápida e profunda alteração das águas do Guadiana, antecedida pela entrada espavorida dos roazes, que faziam ouvir o seu assoprar.

Os proprietários começaram a verificar o estado das suas casas, algumas das quais tinham ficado afectadas, como por exemplo aquela em que vivíamos e que apresentava algumas rachas.

Mais notório e que me lembre, por serem edifícios maiores e públicos, refiro fendas importantes na muralha do castelo, do lado esquerdo de quem entra pela porta principal. Um ano depois sofre reparação, na qual trabalhou o meu bom amigo, Sr. António Pedro Domingos (vulgo Brandão) que vive na vila e em cujo trabalho sofreu um acidente que o levou ao internamento no hospital da Santa Casa da Misericórdia de Loulé.

[Muralha do Castelo vista do Pinhão, 2009. Foto JV]

A Capela de Nª Sª da Conceição igualmente ficou danificada, merecendo algum reparo.

O velho edifício que foi residência do capitão-mor e onde funcionaram os serviços de Finanças e ainda funciona o posto da G.N.R., também ficou afectado, abrindo o canto livre do edifício, grande brecha. A quando da sua reparação, que foi demorada, desabou parte da parede junto ao telhado que só por sorte não causou vítimas. Os trabalhos obrigaram à mudança provisória das instalações.

Mais coisas de menor importância se teriam passado na vila e no concelho.
Existem muitas pessoas na vila que viveram este acontecimento como eu, ou por outra, cada um à sua maneira e que poderão recordar mais qualquer facto.
Aqui deixo este breve apontamento sobre um facto que já acaba por fazer parte da história da vila de Alcoutim.
Se não ficasse escrito, esboroava-se com o decorrer dos anos.