terça-feira, 9 de abril de 2013

Alcoutim (Em O Século)


(PUBLICADO EM “O SÉCULO”NÚMERO EXTRAORDINÁRIO COMEMO-RATIVO DO DUPLO CENTENÁRIO DA FUNDAÇÃO E RESTAURAÇÃO DE PORTUGAL, LISBOA, JUNHO DE 1940)
Alcoutim é mo Algarve uma das mais lindas terras, pela sua excelente posição geográfica, e pela brancura do seu casario alegre, brancura esta, que é, aliás em todas as povoações algarvias, uma característica de beleza. E nem só beleza, mas também tradições tem a vila encantadora.

A 66 quilómetros de Faro, situada na montanha onde principia a serra de Monchique, na margem direita do Guadiana, Alcoutim foi uma das melhores fortalezas de Portugal. A praça de armas está rodeada de muralhas com três portas, que se chamam de Guadiana, de Mértola e de Tavira, existindo nesta última a seguinte inscrição: «Alphonsus VI Rex Portugaliae et Algarbiorum, 1661». O castelo em ruínas era quadrado.
Castelo de Alcoutim. Finais anos 60. Foto JV
Povoação muito antiga, que se supõe datar do princípio do domínio serraceno, o seu nome antigo era Alcoitinium, o que parece confirmar a sua existência no tempo dos romanos.

D. Sancho II a tomou aos mouros, em 1240 e D. Deniz mandou-a povoar, reedificar o castelo e deu-lhe foral, em 1304 com todos os privilégios de Évora, doando-a à Ordem de Santiago. D. José I elevou-a a vila. Pertenceu à Casa do Infantado.

Além do castelo, Alcoutim tem uma linda capela, fundada por D. João IV para comemorar a Restauração da Independência e dedicada a Nossa Senhora da Conceição. No castelo de Alcoutim se fizeram pazes entre dois reis Afonsos: o de Portugal e o de Castela. Junto do Cerro de Santa Bárbara, ao Norte da vila, há vestígios de fortificações antigas e ali, sobre um rochedo alto, se fez um reduto artilhado.

Na agricultura tem o concelho de Alcoutim, com as suas cinco freguesias, a base maior, quasi única, da sua economia. O terreno é fértil, como todo o do Algarve e produz especialmente trigo, do qual chegam a exportar-se 1.000 000 de quilos. E também se exportam carnes, lãs, queijos e amêndoas.

A indústria representa-se por duas espécies: cerâmica de barro (louças de uso) e foices.

O povo é laborioso e simples, acolhedor e amável, amando com excepcional e exemplar carinho a terra que é o fundamento da sua vida económica. A-pesar da fertilidade do solo, os homens do concelho de Alcoutim trabalham com exaustivo esforço, e só assim conseguem viver sem dificuldades.

Alcoutim e Sanlúcar. Finais anos 60. Foto JV

São lindos os panoramas que Alcoutim oferece aos visitantes. As montanhas, como os montes menores e as planícies formam um conjunto admirável, que encanta e seduz. Poucas terras do Algarve se lhe comparam ou excedem em beleza e atractivos naturais.

Em tempos recuados o favor de reis e de fidalgos lhe deu importância e a acrescentou em riqueza e esplendor. Depois, como sucedeu a grande parte do País, as lutas civis, a política e o desinteresse de muitos dos seus filhos permitiram que Alcoutim caísse no abandono absoluto. Até mesmo a política nova com dificuldade lá chegou. Nos últimos vinte anos nenhumas obras se fizeram no concelho. Apenas estão em construção as estradas 106 – 2ª e 108 – 2ª, que ligará o concelho ao resto do País, com o qual Alcoutim não tinha vias de comunicação indispensáveis ao seu progresso e desenvolvimento. À estrada 106 – 2ª faltam as pontes nas ribeiras de Beliche, Foupana, Odeleite e Vascão. A conclusão dessas obras é da maior importância e urgência. Só quem visita Alcoutim pode avaliar a falta que tão importante melhoramento tem para o nosso concelho.

E não só esta aspiração tem o concelho, mas muitas mais, entre elas a ligação telefónica com o País, o cais da vila, que está estudado desde 1936, mas para o qual não se deu mais um passo; uma estrada que ligasse Martinlongo e Vaqueiros, duas freguesias importantes que, no Inverno, ficam completamente isoladas do concelho, em especial a última.

É estranhável, de facto que Alcoutim, com tão poucas aspirações, não consiga vê-las realizadas, sobretudo se pensarmos que melhoramentos do mesmo género e até maiores têm obtido aldeias e freguesias de menor categoria.
Capela ou Igreja de Nª Sª da Conceição. Finais dos anos 60.
Foto JV
Os homens esforçados e inteligentes que se encontram à frente do Município, desajudados de qualquer auxílio do Estado, têm em projecto a construção de cemitérios em todas as freguesias, pois os que existem estão absolutamente condenados visto que ficam no centro das povoações; e, também para todas as aldeias, o abastecimento de água e a construção de caminhos. Este problema de caminhos é o mais premente, pois não os há no concelho. Resolver esse problema é um dever dos poderes públicos, pelos prejuízos que a falta de caminhos causa a populações que tanto trabalham pela valorização da riqueza pública.

Se o Estado, com o seu estímulo e ajuda material, não acode ao concelho de Alcoutim, outro largo período correrá sem que os seus habitantes vejam satisfeitas as suas tão legítimas aspirações.

Se o leitor alguma fez for ao Algarve, não deixe, a-pesar de tudo, de visitar Alcoutim, vila encantadora, e os panoramas admiráveis que dele se descobrem.

Pequena nota
Quem escreveu este texto não se identifica, admitindo que pudesse ter sido alguém que vivesse em Alcoutim e que ocupasse lugar político localmente importante.
As fotografias que apresento são dos anos 60 e de minha autoria, já que as constantes do texto não estão em condições de as transportar para este espaço. As que empregámos correspondem às apresentadas no original no que diz respeito ao local fotografado.

Na parte introdutória encontram-se como é fácil de perceber alguns erros sobre a história, aliás erros que se foram repetindo por muitos anos.

A análise das potencialidades de Alcoutim e seu concelho estão, quanto a nós, impregnadas de bairrismo. Procura o autor depois dar umas picadas no seu próprio partido político, lamentando a falta de auxílio e criticando o facto de “Até mesmo a política nova com dificuldade lá chegou”.

Apesar de tudo é possível verificar o atraso confrangedor em que o concelho se encontrava apesar de se viver há pelo menos 12 anos na Política Nova que alguns alcoutenejos e não só, abraçaram, como é natural.

As estradas, a electricidade e a água não chegavam mas havia União Nacional, Mocidade Portuguesa, Legionários e... bufos.

E ainda não acabaram!

JV