sexta-feira, 19 de abril de 2013

Perspectivas de futuro não passam pelo Pereiro


(Publicado no Correio da Manhã de 26 de Janeiro de 1994, texto de João dos Reis e fotos de Luís Forra)

Faro, da nossa Delegação

Se há terras do Algarve onde as crianças não nascem, os idosos estão mais velhos, onde não existe nada de nada, uma delas é a freguesia do Pereiro, uma povoação bem encravada no interior do concelho de Alcoutim, onde até para se urinar, é necessário recorrer à via pública, porque nem mictórios públicos existem.

O Pereiro é uma dessas muitas aldeias espalhadas por esta região onde o Algarve é diferente do outro Algarve, do litoral, onde, apesar de tudo, se tem de tudo um pouco. O que não acontece nesta nordestina aldeia por onde passaram os romanos e o Príncipe D. Carlos onde antes de ser rei, caçou.

A aldeia do Pereiro é sede de uma das cinco freguesias que constituem o concelho de Alcoutim, sendo seu presidente, João Custódio Marques da Palma, que já vai no seu terceiro mandato à frente dos destinos da Junta de Freguesia.

Para este autarca, o nordeste é uma zona que os algarvios desprezam porque não há nada, excepto a solidão de se ver todos os dias apenas o sol, o vento ou a chuva a fustigar os campos xistosos desta freguesia de onde os jovens desde há muito abalaram para nunca mais regressarem.

Situada a cerca de 15 quilómetros da vila de Alcoutim, no caminho para Martim Longo, o Pereiro é uma freguesia onde, como refere João Custódio Marques da Palma, ainda se calçam as bestas como no antigamente e os pequenos povoados que lhe pertencem têm todos água, luz eléctrica e caminhos alcatroados.

“Isto tem-se desenvolvido mais ou menos. Não temos postos de trabalho, que é coisa que não há nem se prevê a curto ou médio prazo. Indústrias também não existem. Não vejo nada assim que possa incentivar as pessoas a ficarem, a desenvolverem a própria terra onde nasceram”, disse-nos.

No Pereiro todos os caminhos estão alcatroados. O saneamento básico funciona bem. A freguesia não possui nenhuma equipa de futebol apesar de ter campo construído para o efeito.
“Não temos pessoal para jogar. Apenas temos dois rapazes com 18 anos e um deles é meu filho. Temos um clube com estatutos e tudo, mas falta o essencial, “os jovens”, adianta o Presidente da Junta de Freguesia do Pereiro.

João Marques da Palma tem em vista a construção de um pequeno parque de campismo, mas a sua construção depende, como nos afirmou, da “In Loco”, através do seu programa Leader. Mesmo junto ao Pereiro existe uma reserva de caça, que o Presidente da Junta severamente criticou pelas promessas que então os seus responsáveis fizeram, que seria a construção de um hotel e diversas outras infra-estruturas turísticas que muito beneficiariam a freguesia.

“Gostaria que a reserva de caça funcionasse como deveria ser. O Pereiro seria muito melhor, haveria muito mais empregos, a vida seria outra neste nordeste”, afirmou.

Nesta reserva de caça, de 3774 hectares, existem muitas lebres, coelhos, javalis e perdizes. Os velhos alfarrábios dão-nos conta que o Pereiro, em tempos bem distantes, foi uma grande zona de caça, tanto mais que nesta freguesia, por onde os romanos andaram, foram encontrados vestígios arqueológicos, entre os quais alguns denários, dos mais antigos do séc. III a. C., datando do fim da 1ª Guerra Púnica.
Nestes achados foi também encontrado um pequeno busto, que o historiador e arqueólogo, Leite de Vasconcelos, afirmou tratar-se , talvez, de Diana, a deusa da caça. O príncipe D. Carlos, mais tarde rei, veio aqui muitas vezes caçar às suas “achadas” (planuras), de vez em quando aparecendo por esta zona do nordeste em digressões venatórias.

O presidente da Junta de Freguesia do Pereiro teceu, por diversas vezes, sérias críticas à actuação dos responsáveis pela referida reserva de caça, que em sua própria opinião não teriam pago as rendas de alguns terrenos que a constituem.

Construção
da barragem
beneficiará
a freguesia

Junto a Pereiro está actualmente a ser construída uma barragem com o mesmo nome, que muito irá beneficiar a freguesia e os povoados vizinhos. Trata-se de uma barragem que tem como finalidade o principal reforço do abastecimento de água às populações de Pereiro, Balurcos, Tacões, Vicentes do Pereiro, Fontes do Zambujo, Coito, Cerro da Vinha e Alcaria Cova, num total de 628 habitantes.

A sua bacia de recepção pertence à bacia hidrográfica da Fonte do Barranco. Bacia integrada na baía  hidrográfica do rio Guadiana e a sua linha de água principal terá uma extensão de 1,5 quilómetros.

“ O pessoal que está a trabalhar na sua construção é que tem dado um pouco de vida ao Pereiro”, acentuou o presidente da Junta.

Para João Custódio Marques da Palma, que é proprietário no Pereiro do “Café Central” e que possui ainda um táxi , o único na aldeia, esta zona do nordeste algarvio é rica  em pedra que se encontra desaproveitada.

“Temos aqui em todo o concelho de Alcoutim pedra de boa qualidade, mas se precisarmos de pedra para qualquer construção, vamos comprá-la a Loulé, o que eu critico e condeno. Toda a pedra que se gasta em Alcoutim tem que vir de Loulé, porquê? Acho isto um absurdo quando temos tanta pedra e da melhor”, afirmou.

Em sua opinião, não há quem invista neste tipo de indústria e pedra não falta por toda esta zona.

João Custódio Marques da Palma é de opinião que muita coisa, apesar de tudo, está a mudar na sua freguesia.

“Isto tem-se desenvolvido bastante para o meio que é”, finalizou.