(Publicado no Correio
da Manhã de 26 de Janeiro de 1994, texto de João dos Reis e fotos de Luís Forra)
Faro, da nossa
Delegação
Se há terras do Algarve onde as crianças não nascem, os
idosos estão mais velhos, onde não existe nada de nada, uma delas é a freguesia
do Pereiro, uma povoação bem encravada no interior do concelho de Alcoutim,
onde até para se urinar, é necessário recorrer à via pública, porque nem
mictórios públicos existem.
O Pereiro é uma dessas muitas aldeias espalhadas por esta
região onde o Algarve é diferente do outro Algarve, do litoral, onde, apesar de
tudo, se tem de tudo um pouco. O que não acontece nesta nordestina aldeia por
onde passaram os romanos e o Príncipe D. Carlos onde antes de ser rei, caçou.
Para este autarca, o nordeste é uma zona que os algarvios
desprezam porque não há nada, excepto a solidão de se ver todos os dias apenas
o sol, o vento ou a chuva a fustigar os campos xistosos desta freguesia de onde
os jovens desde há muito abalaram para nunca mais regressarem.
Situada a cerca de 15 quilómetros da
vila de Alcoutim, no caminho para Martim Longo, o Pereiro é uma freguesia onde,
como refere João Custódio Marques da Palma, ainda se calçam as bestas como no
antigamente e os pequenos povoados que lhe pertencem têm todos água, luz
eléctrica e caminhos alcatroados.
“Isto tem-se desenvolvido mais ou menos. Não temos postos de
trabalho, que é coisa que não há nem se prevê a curto ou médio prazo.
Indústrias também não existem. Não vejo nada assim que possa incentivar as
pessoas a ficarem, a desenvolverem a própria terra onde nasceram”, disse-nos.
No Pereiro todos os caminhos estão alcatroados. O saneamento
básico funciona bem. A freguesia não possui nenhuma equipa de futebol apesar de
ter campo construído para o efeito.
“Não temos pessoal para jogar. Apenas temos dois rapazes com
18 anos e um deles é meu filho. Temos um clube com estatutos e tudo, mas falta
o essencial, “os jovens”, adianta o Presidente da Junta de Freguesia do Pereiro.
João Marques da Palma tem em vista a construção de um
pequeno parque de campismo, mas a sua construção depende, como nos afirmou, da
“In Loco”, através do seu programa Leader. Mesmo junto ao Pereiro existe uma
reserva de caça, que o Presidente da Junta severamente criticou pelas promessas
que então os seus responsáveis fizeram, que seria a construção de um hotel e
diversas outras infra-estruturas turísticas que muito beneficiariam a
freguesia.
“Gostaria que a reserva de caça funcionasse como deveria
ser. O Pereiro seria muito melhor, haveria muito mais empregos, a vida seria
outra neste nordeste”, afirmou.
Nesta reserva de caça, de 3774 hectares ,
existem muitas lebres, coelhos, javalis e perdizes. Os velhos alfarrábios
dão-nos conta que o Pereiro, em tempos bem distantes, foi uma grande zona de
caça, tanto mais que nesta freguesia, por onde os romanos andaram, foram
encontrados vestígios arqueológicos, entre os quais alguns denários, dos mais
antigos do séc. III a. C., datando do fim da 1ª Guerra Púnica.
Nestes achados foi também encontrado um pequeno busto, que o
historiador e arqueólogo, Leite de Vasconcelos, afirmou tratar-se , talvez, de
Diana, a deusa da caça. O príncipe D. Carlos, mais tarde rei, veio aqui muitas
vezes caçar às suas “achadas” (planuras), de vez em quando aparecendo por esta
zona do nordeste em digressões venatórias.
O presidente da Junta de Freguesia do Pereiro teceu, por
diversas vezes, sérias críticas à actuação dos responsáveis pela referida
reserva de caça, que em sua própria opinião não teriam pago as rendas de alguns
terrenos que a constituem.
Construção
da barragem
beneficiará
a freguesia
Junto a Pereiro está actualmente a ser construída uma
barragem com o mesmo nome, que muito irá beneficiar a freguesia e os povoados
vizinhos. Trata-se de uma barragem que tem como finalidade o principal reforço
do abastecimento de água às populações de Pereiro, Balurcos, Tacões, Vicentes
do Pereiro, Fontes do Zambujo, Coito, Cerro da Vinha e Alcaria Cova, num total
de 628 habitantes.
A sua bacia de recepção pertence à bacia hidrográfica da
Fonte do Barranco. Bacia integrada na baía
hidrográfica do rio Guadiana e a sua linha de água principal terá uma
extensão de 1,5
quilómetros .
“ O pessoal que está a trabalhar na sua construção é que tem
dado um pouco de vida ao Pereiro”, acentuou o presidente da Junta.
Para João Custódio Marques da Palma, que é proprietário no
Pereiro do “Café Central” e que possui ainda um táxi , o único na aldeia, esta
zona do nordeste algarvio é rica em
pedra que se encontra desaproveitada.
“Temos aqui em todo o concelho de Alcoutim pedra de boa
qualidade, mas se precisarmos de pedra para qualquer construção, vamos
comprá-la a Loulé, o que eu critico e condeno. Toda a pedra que se gasta em
Alcoutim tem que vir de Loulé, porquê? Acho isto um absurdo quando temos tanta
pedra e da melhor”, afirmou.
Em sua opinião, não há quem invista neste tipo de indústria
e pedra não falta por toda esta zona.
João Custódio Marques da Palma é de opinião que muita coisa,
apesar de tudo, está a mudar na sua freguesia.
“Isto tem-se desenvolvido bastante para o meio que é”,
finalizou.