quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Manuel António Sebastião (vulgo Manuel André)


Não fui eu que atendi o telefone, mas pressenti logo que a notícia não era boa. Vinha do concelho de Alcoutim, mais propriamente do “monte” de Afonso Vicente.

O Manuel André tinha sido encontrado já sem vida, às primeiras horas do dia junto da estrada das Cortes Pereiras, quando se sai da 122 e se entra nesta.

Como era hábito, deslocava-se com alguma assiduidade a Lisboa onde tinha passado grande parte da sua vida como funcionário do Ministério das Obras Públicas.

Era uns meses mais velho do que eu. De vez em quando telefonava-lhe para saber como se encontrava e saber também notícias do irmão Francisco e do primo António. Nestas conversas havia sempre alguma brejeirice, principalmente, quando se encontrava em Lisboa, como aconteceu da última vez que lhe liguei, pois ao atender disse-me logo que estava em Lisboa. Não pensava que era a última chamada que lhe fazia.

Manuel António Sebastião que na sua terra era só conhecido por Manuel André visto seu pai, que ainda conheci, se chamar André, teve quatro irmãos e dos cinco nenhum constituiu família.

Foi das poucas pessoas que regressou ao monte. Ainda que a pensão de reforma chegasse para a sua manutenção, gostava de brincar à agricultura, principalmente ao hortejo. Semeava, todos os anos e sozinho, uma saca de batatas, fazia grandes sementeiras de alhos e cebolas não deixando de semear favas e griséus. Ainda este ano e sabendo que eu não tinha favas levou-me um cesto delas, apesar de já estarmos numa altura de escassez.

Todos os anos fazia o vinho e eu tinha sempre de o provar para dar a minha opinião.

Possuía uma horta nas Murtosas que ficava a uma distância de três ou quatro quilómetros de casa. Recuperou o poço mandando fazer um novo gargalo e aprofundando-o. Comprou um motor para assim poder tirar água para a rega.

Não deixou de adquirir uma moto-enxada que lhe servia para cavar a terra.

Embora a visão fosse afectada pela diabetes nunca deixou de ter esta actividade que lhe dava prazer e o ocupava, ajudando-o deste modo a passar o tempo.

Outra das coisas que gostava de fazer era cozinhar e nunca se limitou a comer uma bucha como muitos fazem. Mesmo só para ele, fazia comida de “panela”a horas, para usar uma expressão local. Às sete e meia, oito horas, o mais tardar, estava na cama.

Era um benfiquista ferrenho.

Ia pelo menos uma vez por semana à vila, onde comprava os medicamentos e mais alguma coisa que precisava, não deixando de almoçar no restaurante.

Era dos poucos frequentadores da “sociedade” onde tomava o seu cafezinho depois de almoço.

Quando estava no monte, não deixava de o procurar para conversarmos um bocado, principalmente sobre a horta.

Um dia, sentindo as minhas mazelas, observei-lhe:- O senhor não tem dores, não se queixa!  - Eu ter tenho, mas a quem me queixo!

Em 2009, resolveu aplicar algumas economias que tinha e aproveitando um local onde em tempos  existiu uma casa de seus pais, mandou construir uma interessante habitação com todas as condições e onde viveu os três últimos anos. Não deixou de fazer um canteiro onde plantava alfaces, semeava salsa e coentros, plantava algumas cebolas e pimentos para uso na sua culinária.

Em vez de deixar o dinheiro, deixo a casa -  afirmava-nos.

No monte, já são menos de uma dúzia!

Faleceu aos 75 anos.

A autópsia irá indicar a causa da morte.

Será sepultado no cemitério da vila.

Condolências aos irmãos.