sábado, 8 de dezembro de 2012

Recordando!




Escreve

M Dias

Ela veio do Sul e está em Lisboa há poucos dias. Não cabe em si de contente por estar pela 1ª vez a experimentar a liberdade de estar longe dos pais, entregue a si própria. Usa vestido de linha direita, curto, a condizer com o tom da pele bronzeada, os olhos esverdeados, e o cabelo castanho claro atado em rabo-de-cavalo.

 Estávamos em 1968 num fim de tarde agradável de finais de Setembro. Junta-se a um grupo de colegas e decidem ir lanchar a uma pastelaria. Muita algazarra, alegria, risos, tropelias.

Experimenta beber um martini e fumar um cigarrito. Fumar era chique e não se gosta de fazer má figura! Saiu acompanhada dos colegas e passados poucos minutos, o efeito do cigarro e do martini aumenta a euforia!

Ri desalmadamente e ao caminhar pelo passeio ouve a repetição das suas gargalhadas. Eco? Imitação? Pára, escuta, fica intrigada, mas continua o caminho com os colegas que entretanto se divertiam à sua custa.

As gargalhadas continuavam a ser imitadas e aí, de novo intrigada, virava-se na direção do som. Já não estou a achar piada a isto!

Mais risadas dos colegas e assim se fez o caminho até a casa.

Mas, no dia seguinte, ainda intrigada com tal situação, volta à mesma rua e surpreende-se com o que a espera. Um jovem que lhe acenava da varanda de onde lhe parecia vir o som no dia anterior, pergunta-lhe: Hoje não vens da festa? E sem esperar resposta , imita, na perfeição as suas gargalhadas .
Este episódio repetiu-se durante alguns dias. Deu em Namoro. Vivia-se a época dos revolucionários Beatles, dos românticos ADAMO, CHARLES AZNAVOUR, TON JONES, e os ultra românticos Cantores brasileiros. Dançava-se nas matinés do Clube Ferroviário, Da Lareira, Do Ad Lib e tantos outros., ao som de canções como Domingo à Tarde de NELSON NED, do CALHAMBEQUE de ROBERTO CARLOS e outros do género.

Mas os tempos, de grandes receios, de ignorância, de muito secretismo e muita censura, assustavam-nos. As cartas recebidas dos pais vinham repletas de conselhos e precauções!

É preciso estudar! O namoro fica para depois.

Os desentendimentos com o namorado que no início a encantava começaram a ser demasiado frequentes e o namoro termina!

Termina o namoro e começa a perseguição que se torna insuportável! O jovem afável e afectuoso, transforma-se.

Ao fim de muitas e variadas peripécias, consegue afastá-lo do seu quotidiano.

Passaram 25 anos e acontece casualmente o reencontro. Mas este foi um reencontro completamente inesperado e surpreendentemente chocante! O seu ex-namorado, um jovem fisicamente robusto, atlético e muito bonito, surge agora desfigurado.

Sequelas terríveis da guerra, para onde foi para cumprir o seu dever patriótico, não o deixaram prosseguir a vida, conforme os seus sonhos de há 25 anos atrás.

Agora, o nosso abraço, foi longo e molhado. De lágrimas. De tristeza,” alegria”e ternura.